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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO HOSPITAL DAS CLÍNICAS CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NUTRIÇÃO NUTRIÇÃO E DIABETES MELLITUS Marilia Duarte Sales Ribeirão Preto 2008 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO HOSPITAL DAS CLÍNICAS CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM NUTRIÇÃO NUTRIÇÃO E DIABETES MELLITUS Marilia Duarte Sales Ribeirão Preto 2008 2 Monografia, apresentado à Universidade de São Paulo (USP) como parte das exigências para a conclusão do Programa de Aprimoramento Profissional – Especialização em Nutrição. Orientador: Prof. Dr. José Eduardo Dutra de Oliveira Supervisor: Dra Luciana Bueno RESUMO O Diabetes Mellitus (DM) é uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/ou incapacidade da mesma de exercer suas funções adequadamente, é caracterizada pela presença de hiperglicemia crônica, freqüentemente, acompanhada de dislipidemia, hipertensão arterial e disfunção endotelial. Esta deficiência de insulina inicia uma série de reações no organismo, porque a glicose não pode ser transportada do líquido extracelular para o líquido intracelular; assim as células não têm fonte de energia, utilizando a proteína do músculo e a gordura do tecido adiposo, como fontes de energia. O diagnóstico realizado precocemente do DM e das alterações de tolerância à glicose é extremamente importante, porque permite a adoção das medidas terapêuticas necessárias. Os tipos de diabetes mais freqüentes são DM tipo 1, DM tipo 2, e o diabetes gestacional. Medidas de prevenção do DM são eficazes em reduzir o impacto desfavorável sobre a morbimortalidade destes pacientes, principalmente em razão de se poder evitar as complicações cardiovasculares. Enfatiza-se em especial a adoção de estilo de vida saudável, com dieta balanceada e exercícios físicos regulares. A restrição energética moderada, baseada no controle de gorduras saturadas, acompanhada de atividade física leve, pode reduzir a incidência desta doença. Não há evidências claras de benefícios da suplementação de vitaminas e minerais em indivíduos com DM, comparando com a população em geral, que não apresentam deficiências. A atenção à nutrição e princípios de planejamento de refeição são essenciais para o controle glicêmico e boa saúde geral. Um nutricionista que tenha conhecimento e habilidade na execução de princípios nutricionais atuais e faça as recomendações para DM é o membro da equipe multidisciplinar de saúde que deve planejar, executar e avaliar a terapia nutricional. Palavras-chave: “diabetes mellitus”, “nutrição” e “nutrientes”. 3 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.............................................................................................................................6 2 OBJETIVO....................................................................................................................................7 3 METODOLOGIA..........................................................................................................................9 4 DESENVOLVIMENTO BIBLIOGRÁFICO..............................................................................10 4.1 Fisiopatologia.......................................................................................................................10 4.1.2 A insulina e o metabolismo dos carboidratos...........................................................11 4.1.3 A insulina e o metabolismo das proteínas.................................................................12 4.1.4 A insulina no metabolismo dos lipídeos....................................................................12 4.2 Diagnóstico...........................................................................................................................13 4.2.1 Principais sintomas....................................................................................................13 4.2.2 Exames laboratoriais.................................................................................................14 4.2.3 Critérios de diagnóstico.............................................................................................14 4.2.4 Fatores de risco..........................................................................................................15 4.3 Classificação.........................................................................................................................16 4.3.1 Diabetes Mellitus tipo 1.............................................................................................17 4.3.2 Diabetes Mellitus tipo 2.............................................................................................19 4.3.3 Diabetes Mellitus Gestacional...................................................................................21 4.4 Complicações........................................................................................................................22 4.4.1 Hipoglicemia..............................................................................................................22 4.4.2 Hiperglicemia de jejum..............................................................................................25 4.4.3 Cetoacidose Diabética (DKA)...................................................................................26 4.5 Prevenção..............................................................................................................................26 4 4.6 Tratamento............................................................................................................................28 4.6.1 Tratamento medicamentoso.......................................................................................28 4.6.1.1 Medicações..........................................................................................................29 4.6.1.2 Administração de Insulina...................................................................................30 4.6.2 Tratamento não-medicamentoso................................................................................32 4.6.2.1 Avaliação Nutricional..........................................................................................32 4.6.2.2 Terapia Nutricional..............................................................................................32 4.6.2.3 Características da dieta........................................................................................34 4.6.2.3 Nutrientes e DM...................................................................................................46 4.6.2.3.1 Zinco........................................................................................................46 4.6.2.3.2 Cobre........................................................................................................48 4.6.2.3.3 Vitamina C...............................................................................................49 4.6.2.4 Exercício físico e DM..........................................................................................49 5 CONCLUSÕES...........................................................................................................................51 6 REFERÊNCIAS..........................................................................................................................52 5 1 INTRODUÇÃO O Diabetes Mellitus (DM) é uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/ou incapacidade da mesma de exercer suas funções adequadamente, o que resulta em resistência insulínica. É caracterizada pela presença de hiperglicemia crônica, freqüentemente, acompanhada de dislipidemia,hipertensão arterial e disfunção endotelial (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; MCLELLAN et al, 2007). Os indivíduos com DM têm organismos que não produzem ou não respondem à insulina, que é um hormônio produzido pelas células beta do pâncreas que é necessário para o uso ou armazenamento de glicose. Sem insulina eficiente ocorre hiperglicemia (FRANZ, 2005). A hiperglicemia se manifesta por sintomas como poliúria, polidipsia, perda inexplicada de peso, polifagia e visão. A hiperglicemia crônica está associada a dano, disfunção e falência de vários órgãos, principalmente olhos, rins, sistema nervoso, coração e vasos sanguíneos (UKPDS, 1998). O DM é uma situação clínica freqüente, acomete cerca de 7,6% da população adulta entre 30 3 69 anos e 0,3% das gestantes. Alterações da tolerância à glicose são observadas em 12% da população adulta e em 7% das gestantes. Aproximadamente 50% dos portadores desta doença desconhecem o diagnóstico (GROSS et al, 2002; ADA, 2001). A prevalência do DM vem aumentando, adquirindo características epidêmicas em vários países, particularmente os desenvolvidos. Contribui para este processo as alterações na estrutura da dieta, na prática de exercício físico e o conseqüente aumento da prevalência da obesidade (SARTORELLI; FRANCO, 2003). O DM atinge em todo o mundo grande número de pessoas de qualquer condição social. Essa enfermidade representa um problema pessoal e de saúde pública com grandes proporções, apesar dos progressos no campo da investigação e da atenção aos pacientes (WHO, 1985). 6 O número de indivíduos diabéticos está aumentando devido ao crescimento e ao envelhecimento populacional, à maior urbanização, à crescente prevalência de obesidade e sedentarismo, bem como à maior sobrevida do paciente. Quantificar a prevalência e o número de pessoas diabéticas, no presente e no futuro, é importante para permitir uma forma racional de planejamento e alocação de recursos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). O manejo do DM deve ser feito dentro de um sistema hierarquizado de saúde, sendo sua base o nível primário. Na prestação de serviços apropriados para os diabéticos, é preciso levar em consideração os principais componentes do sistema de saúde, especialmente a determinação das necessidades e dos recursos locais; o consenso sobre as normas de atenção; os mecanismos para aplicar os últimos avanços das investigações; a educação e a utilização de todos os profissionais de saúde; e a contínua avaliação da efetividade e da qualidade do tratamento dos pacientes (ASSUNÇÃO et al, 2001). No DM, estão presentes anormalidades no metabolismo de carboidratos, proteínas e gorduras (FRANZ, 2005), portanto, a terapia nutricional é parte fundamental no tratamento do DM, apesar de a adesão aos princípios do plano alimentar ser um dos aspectos de maior desafio. Para atingir os objetivos dietoterápicos é necessário um trabalho em equipe (SACHS, 2005). O DM é uma doença com critérios diagnósticos bem definidos, porém de manejo complexo, uma vez que sua abordagem além da terapêutica medicamentosa envolve uma série de mudanças nos hábitos de vida dos pacientes (ASSUNÇÃO et al, 2002). O DM contribui para um aumento nas taxas de morbidade e mortalidade, que pode ser reduzido por diagnóstico e tratamento precoces (ADA, 2003). As conseqüências do DM a longo prazo decorrem de alterações micro e macrovasculares que levam a disfunção, dano ou falência de vários órgãos. As complicações crônicas incluem a nefropatia, com possível evolução para insuficiência renal, a retinopatia, com a possibilidade de 7 cegueira e/ou neuropatia, com risco de úlceras nos pés, amputações, artropatia de Charcot e manifestações de disfunção autonômica, incluindo disfunção sexual. Pessoas com diabetes apresentam risco maior de doença vascular aterosclerótica, como doença coronariana, doença arterial periférica e doença vascular cerebral (WHO, 1999). De maneira geral, mulheres tem uma maior expectativa de vida do que os homens, mas isto não ocorre na presença de DM, há evidências de que acidentes vasculares encefálicos (AVE) e doenças coronarianas têm uma maior prevalência em mulheres com DM do que em homens com DM. Mulheres também consideram a DM como ter um efeito negativo em suas vidas e se preocupam mais com as complicações associadas a esta doença. Enquanto que os homens se preocupam com as limitações provocadas pela doença, que acreditam que seja possível de controlar, também apresentam menores níveis de estresse e maior bem-estar em relação às mulheres (GUCCIARDI et al, 2008). 8 2 OBJETIVO Investigar através de revisão literária, a importância da nutrição e terapia nutricional na prevenção e no tratamento do DM. 3 METODOLOGIA Trata-se de uma revisão bibliográfica a partir dos descritores “diabetes mellitus”, “nutrição” e “nutrientes” realizada nos bancos de dados científicos LILACS (Literatura Latino Americana e do Caribe), SCIELO (Scientific Eletronic Library Online) e PubMed (U.S. National Library of Medicine) nos idiomas Português, Inglês e Espanhol . O período de análises dos estudos compreendeu os anos de 1994 a 2008, com exceção de três artigos referentes aos anos de 1984, 1985 e 1991, e um livro, referente ao ano de 1980, que foram utilizados por terem grande importância para o desenvolvimento do tema proposto. 9 4 DESENVOLVIMENTO BIBLIOGRÁFICO 4.1 Fisiopatologia O DM pode ser conceituado como uma doença na qual a insulina não exerce suas funções metabólicas adequadamente. As manifestações fisiopatológicas desta doença estão ligadas aos distúrbios agudos e crônicos decorrentes da ineficácia insulínica (MILECH, 1980). A deficiência de insulina pode ser resultante de: lesão das células beta das ilhotas de Langerhans, inativação da insulina e aumento dos requerimentos de insulina; alterando o metabolismo dos macronutrientes, levando a cetose e à acidose (BODINSK, 2001). Esta deficiência de insulina inicia uma série de reações no organismo, porque a glicose não pode ser transportada do líquido extracelular para o líquido intracelular; sem glicose, as células não têm fonte de energia, utilizando a proteína do músculo e a gordura do tecido adiposo, como fontes de energia. O uso da proteína leva à perda de tecidos e a um balanço nitrogenado negativo, devido ao catabolismo protéico. O uso da gordura ,como fonte de energia, leva a cetose, pelo rápido catabolismo da gordura (BODINSK, 2001). A glicose, estando incapacitada para deixar o líquido extracelular, se acumula e o seu nível se eleva, produzindo hiperglicemia. Aumentada a glicose sanguínea, aumenta a pressão osmótica dentro dos vasos, com perda de líquido nas células, acarretando uma desidratação celular. Quando o nível de glicose sanguínea ultrapassa o limiar renal, a glicose passa para a urina, originando glicosúria, que aumenta a pressão osmótica da urina e impede a reabsorção tubular de água, levando a desidratação extracelular. Estas modificações acarretam nos seguintes sintomas do diabetes: poliúria, polidsia e polifagia (BODINSK, 2001). 10 Altos níveis de gordura no sangue criam uma hiperlipidemia crônica, que pode ser responsável por lesões vasculares. Problemas neuropáticos estão relacionados com o aumento dos níveis de glicose no sangue. O aumento do teor de glicose sanguínea também propicia maior suscetibilidade às infecções. A má cicatrização de feridas está associada a problemas circulatórios, resultantes de aterosclerose (BODINSK, 2001). 4.1.2 A insulina e o metabolismodos carboidratos A insulina influencia de várias maneiras o metabolismo dos carboidratos, possui um efeito anticatabólico que diminui a degradação e a liberação de glicose proveniente de glicogênio no fígado; efeito anabólico que facilita a conversão de glicose em glicogênio para o armazenamento no fígado e músculos; e no transporte, ativando o sistema de transporte de glicose no músculo e células adiposas (FRANZ, 2005). A deficiência de insulina irá dificultar a penetração de glicose no músculo e tecido adiposo, assim como a sua fixação no hepatócito, resultando uma elevação do nível glicêmico. Nos casos mais brandos, essa deficiência só poderá ser detectada após a administração de uma sobrecarga glicídica (teste oral de tolerância à glicose). À medida que esta deficiência se agrava, surge a hiperglicemia de jejum. No fígado, livre dos efeitos inibidores da insulina, os hormônios glicogenolíticos (adrenalina e glucagon) estimulam as fosforilases responsáveis pela degradação do glicogênio, contribuindo para a elevação da glicemia (MILECH, 1980). 11 4.1.3 A insulina e o metabolismo das proteínas A insulina influencia de várias maneiras o metabolismo das proteínas, possui um efeito anticatabólico que inibe a degradação e diminui a gliconeogênese; efeito anabólico que estimula a síntese protéica; e no transporte, diminuindo aminoácidos em paralelo com os níveis de glicose sanguínea (FRANZ, 2005). Quando ocorre a deficiência de insulina, os aminoácidos não são mais incorporados às proteínas musculares, que sofrem uma lise, liberando seus aminoácidos constituintes, elevando assim o teor destes no sangue. Não podendo ser captados pelo músculo, são levados ao fígado, onde serão utilizados na produção de glicose (MILECH, 1980). 4.1.4 A insulina no metabolismo dos lipídeos A insulina influencia de várias maneiras o metabolismo dos lipídeos, possui um efeito anticatabólico que inibe lipólise, previne excessiva produção de cetonas e cetoacidose; efeito anabólico que facilita a conversão de piruvato em ácidos graxos livres, estimulando a lipogênese; e no transporte, ativando a lipoproteína lípase, facilitando o transporte de triglicerídeos ao tecido adiposo (FRANZ, 2005). Com a deficiência de insulina, nos adipócitos, os ácidos graxos não são mais incorporados aos triglicerídeos teciduais, quando esta deficiência está acentuada, as lípases teciduais são ativadas, ocorreria lise dos triglicerídeos e liberação dos seus componentes: ácidos graxos e glicerol. Os ácidos graxos são normalmente utilizados nos músculos como fonte de energia. No DM descompensado, são produzidos em quantidade superior e transportados ao fígado, onde sua transferência para a mitocôndria será facilitada devido à condição clínica, gerando acetil-CoA. O 12 fígado não possui a capacidade de utilizar esses ceto-ácidos, que são conseqüentemente liberados na circulação (MILECH, 1980). 4.2 Diagnóstico O diagnóstico não se refere a uma doença única, mas sim a várias desordens de diferentes causas (SCOBIE, 2008). O diagnóstico realizado corretamente e precocemente do DM e das alterações de tolerância à glicose é extremamente importante, porque permite que sejam adotadas medidas terapêuticas que podem evitar o aparecimento de diabetes nos indivíduos com tolerância diminuída e retardar o aparecimento das complicações crônicas nos pacientes diagnosticados com diabetes (GROSS et al, 2002). O diagnóstico do DM baseia-se fundamentalmente nas alterações da glicose plasmática de jejum ou após uma sobrecarga de glicose por via oral. A medida da glico-hemoglobina não apresenta acurácia diagnóstica adequada e não deve ser utilizada para o diagnóstico de diabetes (GROSS et al, 2002). 4.2.1 Principais sintomas Os sintomas clássicos de DM são: poliúria, polidipsia, polifagia e perda involuntária de peso. Outros sintomas que levantam a suspeita clínica são: fadiga, fraqueza, letargia, prurido cutâneo e vulvar, balanopostite e infecções de repetição. Algumas vezes o diagnóstico é feito a partir de complicações crônicas como neuropatia, retinopatia ou doença cardiovascular aterosclerótica. Entretanto, o DM é assintomático em proporção significativa dos casos, a 13 suspeita clínica ocorre então a partir de fatores de risco para o desenvolvimento de DM (Ministério da Saúde, 2006). 4.2.2 Exames laboratoriais Os testes laboratoriais mais comumente utilizados para suspeita de DM ou regulação glicêmica alterada são (Ministério da Saúde, 2006): • Glicemia de jejum: nível de glicose sangüínea após um jejum de 8 a 12 horas; • Teste oral de tolerância à glicose (TOTG -75g): O paciente recebe uma carga de 75 g de glicose, em jejum, e a glicemia é medida antes e 120 minutos após a ingestão; • Glicemia casual: tomada sem padronização do tempo desde a última refeição. Pessoas cuja glicemia de jejum situa-se entre 110 e 125 mg/dL (glicemia de jejum alterada), por apresentarem alta probabilidade de ter diabetes, podem requerer avaliação por TOTG-75g em 2h. Mesmo quando a glicemia de jejum for normal (< 110 mg/dL), paciente com alto risco para diabetes ou doença cardiovascular podem merecer avaliação por TOTG. 4.2.3 Critérios de diagnóstico Os critérios diagnósticos baseiam-se na glicose plasmática de jejum (8 horas), nos pontos de jejum e de 2h após sobrecarga oral de 75g de glicose (teste oral de tolerância à glicose – TOTG) e na medida da glicose plasmática casual, conforme descrição na tabela 1. O quadro inclui as diversas categorias diagnósticas para adultos e para o diabetes gestacional (GROSS et al, 2002). 14 Tabela 1. Critérios para o diagnóstico do DM e alterações da tolerância à glicose de acordo com valores de glicose plasmática (mg/dl). Categoria Jejum TOTG 75g – 2h Casual Normal Hiperglicemia Intermediária: Glicose plasmática de jejum alterada Tolerância à glicose diminuída Diabetes mellitus Diabetes gestacional < 110 ≥ 110 e < 126 < 126 ≥ 126 ≥ 110 < 140 ≥ 140 < 200 ≥ 200 ≥ 140 ≥ 200 com sintomas (GROSS et al, 2002; ADA, 2006). TOTG = Teste oral de tolerância à glicose Indivíduos com hiperglicemia intermediária apresentam alto risco para o desenvolvimento do DM. São também fatores de risco para doenças cardiovasculares, fazendo parte da assim chamada síndrome metabólica, um conjunto de fatores de risco para diabetes e doença cardiovascular. Um momento do ciclo vital em que a investigação da regulação glicêmica alterada está bem padronizada é na gravidez, em que a tolerância à glicose diminuída é considerada uma entidade clínica denominada diabetes gestacional. O emprego do termo diabetes nessa situação transitória da gravidez é justificado pelos efeitos adversos à mãe e concepto, que podem ser prevenidos e atenuados com tratamento imediato, às vezes insulínicos (Ministério da Saúde, 2006). 4.2.4 Fatores de risco Segundo Oliveira (2004) são considerados fatores de risco para o desenvolvimento de DM: • Obesidade (Índice de massa corporal (IMC) ≥ 25 kg/m2); 15 • Parente de primeiro grau com DM (pais, filhos, irmãos); • Membros de populações de alto risco (migrantes); • Diagnóstico prévio de diabetes gestacional ou história de macrossomia fetal, abortos de repetição ou mortalidade perinatal; • Hipertensão arterial; • HDL baixo ou triglicérides elevados; • Sedentarismo; • Uso de medicação hiperglicemiante (exemplo: tiazídicos, corticóides, beta-bloqueadores). 4.3 Classificação A classificação atual do DM é baseada na etiologia e não no tipo detratamento, portanto os termos diabetes mellitus insulinodependente e diabetes mellitus insulinoindependente devem ser eliminados (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). Esta síndrome é classificada de acordo com os fatores etiológicos peculiares envolvidos no aparecimento de cada uma de suas doenças. O aumento do conhecimento tem nos permitiu identificar discretas condições causadas por anormalidades genéticas, enquanto que outros tipos de diabetes continuam difíceis de classificar em uma base etiológica. (OLIVEIRA, 2004; SCOBIE, 2008). Os tipos de diabetes mais freqüentes são o diabetes tipo 1, anteriormente conhecido como diabetes juvenil, que compreende cerca de 10% do total de casos, e o diabetes tipo 2, anteriormente conhecido como diabetes do adulto, que compreende cerca de 90% do total de casos. Outro tipo de diabetes encontrado com maior freqüência e cuja etiologia ainda não está 16 esclarecida é o diabetes gestacional, que, em geral, é um estágio pré-clínico de diabetes, detectado no rastreamento pré-natal (Ministério da Saúde, 2006). A classificação proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Associação Americana de Diabetes (ADA) inclui quatro classes clínicas: DM tipo 1, DM tipo 2, outros tipos específicos de DM e diabetes mellitus gestacional. Ainda existem duas categorias, referidas como prédiabetes, que são a glicemia de jejum.alterada e a tolerância à glicose diminuída. Essas categorias não são entidades clínicas, mas fatores de risco para o desenvolvimento do DM e de doenças cardiovasculares (DCV). Outros tipos específicos de diabetes menos freqüentes podem resultar de defeitos genéticos da função das células beta, defeitos genéticos da ação da insulina, doenças do pâncreas exócrino, endocrinopatias, efeito colateral de medicamentos, infecções e outras síndromes genéticas associadas ao diabetes (Ministério da Saúde, 2006). 4.3.1 Diabetes Mellitus tipo 1 O DM tipo 1 (DM1) é responsável por 5 a 10% de todos os casos diagnosticados de diabetes (FRANZ, 2005). O DM1 É uma das mais importantes doenças endócrino-metabólicas na faixa etária pediátrica. O tratamento deve ser orientado de forma individualizada, por uma equipe multiprofissional, e exige autodisciplina e cuidadosa educação do paciente e sua família (RODRIGUES; SILVA, 2001). O termo tipo 1 indica destruição da célula beta que eventualmente leva ao estágio de deficiência absoluta de insulina, quando a administração de insulina é necessária para prevenir cetoacidose, coma e morte. A destruição das células beta é geralmente causada por processo auto- imune, que pode se detectado por auto-anticorpos circulantes como anti-descarboxilase do ácido 17 glutâmico (anti-GAD), anti-ilhotas e anti-insulina, e, algumas vezes, está associado a outras doenças auto-imunes como a tireoidite de Hashimoto, a doença de Addison e a miastenia gravis. Em menor proporção, a causa da destruição das células beta é desconhecida (tipo 1 idiopático) (Ministério da Saúde, 2006). Apesar de uma minoria de pessoas com DM1 se enquadrar nesta categoria (tipo 1 idiopático), a maioria delas são de origem africana ou asiática (Expert Commitee on the Diagnosis and Classification of Diabetes Mellitus, 1997). Esses anticorpos circulantes podem estar presentes meses ou anos antes do diagnóstico clínico, ou seja, na fase pré-clínica da doença, e em até 90% dos indivíduos quando a hiperglicemia é detectada. Além do componente auto-imune, o DM1 apresenta forte associação com determinados genes do sistema antígeno leucocitário humano (HLA), alelos esses que podem ser predisponentes ou protetores para o desenvolvimento da doença (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). A destruição das células beta leva normalmente à deficiência absoluta de insulina e pode resultar em hiperglicemia, poliúria, polidpsia, perda de peso, desidratação, distúrbio eletrólitos e cetoacidose. A taxa de destruição destas células é bastante variável, ocorrendo rapidamente em lactentes e crianças, e lentamente em adultos (FRANZ, 2005). O desenvolvimento do DM 1 pode ocorrer de forma rapidamente progressiva, principalmente, em crianças e adolescentes (pico de incidência entre 10 e 14 anos), ou de forma lentamente progressiva, geralmente em adultos, (LADA, latent autoimmune diabetes in adults; doença auto-imune latente em adultos). Esse último tipo de diabetes, embora se assemelhando clinicamente ao DM 1 auto-imune, muitas vezes é erroneamente classificado como tipo 2 pelo seu aparecimento tardio. Estima-se que 5-10% dos pacientes inicialmente considerados como tendo diabetes tipo 2 podem, de fato, ter LADA (Ministério da Saúde, 2006). 18 Freqüentemente, após o diagnóstico e a correção da hiperglicemia, acidose metabólica e cetoacidose, a secreção de insulina endógena se recupera. Durante esta fase, as necessidades de insulina exógena diminuem drasticamente por até um ano, entretanto, a necessidade de aumentar a reposição é inevitável, e em 8 a 10 anos após o início clínico, a perda de células beta é completa e a deficiência de insulina é absoluta (FRANZ, 2005). 4.3.2 Diabetes Mellitus tipo 2 O DM tipo 2 (DM2) é a forma presente em 90%-95% dos casos e é caracterizada por defeitos na ação e secreção da insulina. Em geral ambos os defeitos estão presentes quando a hiperglicemia se manifesta, porém pode haver predomínio de um deles. A maioria dos pacientes com essa forma de DM apresenta sobrepeso, obesidade ou deposição central de gordura, e a cetoacidose raramente desenvolve-se espontaneamente, ocorrendo apenas quando associada a outras condições, como por exemplo infecções ou estresse muito grave (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). O termo tipo 2 é usado para designar uma deficiência relativa de insulina. A administração de insulina nesses casos, quando efetuada, não visa evitar cetoacidose, mas alcançar controle do quadro hiperglicêmico. Em geral, os pacientes mostram evidências de resistência à ação da insulina e o defeito na secreção de insulina manifesta-se pela incapacidade de compensar essa resistência. Em alguns indivíduos, no entanto, a ação da insulina é normal, e o defeito secretor mais intenso (Ministério da Saúde, 2006). O DM2 pode ocorrer em qualquer idade, mas é geralmente diagnosticado após os 40 anos. Os pacientes não são dependentes de insulina exógena para sobrevivência, porém podem necessitar de tratamento com insulina para a obtenção de um controle metabólico adequado. 19 Diferentemente do DM1 auto-imune não há indicadores específicos para o DM2 (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). O aumento da incidência do DM entre crianças e adolescentes é observado em diversas comunidades. Esforços são empreendidos, em vários níveis, com o objetivo de se detectar fatores responsáveis pela eclosão da doença nessa faixa etária, passíveis de correção ou intervenção. Paralelamente ao número cada vez maior de casos, observa-se a incidência crescente de formas da doença, principalmente em determinados grupos étnicos, até então consideradas raras nesta faixa etária, como é caso do DM2. Nos últimos anos, tem-se observado um aumento crescente na prevalência do DM2 entre jovens. Anteriormente, essa forma correspondia a 1-2% dos casos de diabetes na juventude. Atualmente, observa-se que de 8% a 45% dos casos novos de diabetes diagnosticados nessa faixa etária, nos Estados Unidos, não tem a etiologia auto-imune demonstrada (FAGOT-CAMPAGNA et al, 2000; ROSEMBLOOM, 1999; GABBAY et al, 2003) Os fatores de riscopara DM2 englobam fatores genéticos e ambientais, como história familiar, idade avançada, obesidade, obesidade intra-abdominal, sedentarismo, história anterior de diabetes gestacional, homeostese deficiente de glicose e raça ou etnia (FRANZ, 2005). A distribuição central de gordura também assume um papel importante na gênese do DM. Há evidencias de que pacientes com IMC normal e relação cintura/quadril > 0,8 apresentam risco aumentado de apresentar a doença (HARTZ et al., 1984). Um estudo chama a atenção para outro fator de risco modificável, o gasto energético através de exercícios físicos, demonstrando que quanto menor o nível de atividade física, maior o risco de se desenvolver DM (HELMRICH et al., 1994). Gimero et al. (2002) fizeram um estudo observacional numa comunidade de origem japonesa residente no Brasil. Em um período de sete anos, a prevalência de diabetes nessa população aumentou de 21% para 36%, valores atribuídos à mudança no padrão dietético, particularmente a maior ingestão de gordura. 20 4.3.3 Diabetes Mellitus Gestacional O DM gestacional (DMG) é a hiperglicemia diagnosticada na gravidez, de intensidade variada, geralmente se resolvendo no período pós-parto, mas retornando anos depois em grande parte dos casos. Seu diagnóstico é controverso. A OMS recomenda detectá-lo com os mesmos procedimentos diagnósticos empregados fora da gravidez, considerando como DMG valores referidos fora da gravidez como indicativos de diabetes ou de tolerância à glicose diminuída. (Ministério da Saúde, 2006). O DMG ocorre em cerca de 7% de todas as gestações, resultando em 200.000 casos anualmente. As mulheres com diagnóstico prévio de DM não recebem o diagnóstico de DMG. É comumente diagnosticado durante o segundo ou terceiro trimestre da gravidez. Neste ponto, aumentam os níveis de hormônios antagonistas de insulina e, normalmente, ocorre resistência à insulina (ADA, 2001) São fatores de risco para DMG (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2005): • Idade superior a 25 anos; • Obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual; • Deposição central excessiva de gordura corporal; • História familiar de diabetes em parentes de 1º grau; • Baixa estatura (≤ 1,51 m); • Crescimento fetal excessivo, hipertensão ou pré-eclâmpsia na gravidez atual; • Antecedentes obstétricos de morte fetal ou neonatal, de macrossomia ou de diabetes gestacional. 21 O DMG não é indicação para cesariana, e a via do parto é uma decisão obstétrica. Em partos com evolução prolongada, deve ser realizada uma cuidadosa reavaliação das proporções fetopélvicas, se forem observados sinais de desproporção, o parto cesáreo deve ser indicado (KELLER et al, 1991). Durante o trabalho de parto, a glicemia deve ser mantida em níveis próximos do normal e recomenda-se a monitorização fetal intraparto. Os níveis de glicemia devem ser observados nos primeiros dias após o parto. A maior parte das mulheres não mais requer o uso de insulina. O aleitamento natural deve ser estimulado e, caso ocorra hiperglicemia durante esse período, o uso de insulina está indicado. A tolerância à glicose deverá ser reavaliada a partir de seis semanas (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2005). 4.4 Complicações As complicações crônicas do DM são as principais responsáveis pela morbidade e mortalidade dos pacientes diabéticos. As doenças cardiovasculares representam a principal causa de morte (52%) em pacientes diabéticos do tipo 2. Diversos fatores de risco, passíveis de intervenção, estão associados ao maior comprometimento cardiovascular observado nos pacientes diabéticos. Entre eles estão a presença da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS). (GROSS, NEHME, 1999) 4.4.1 Hipoglicemia A hipoglicemia é a complicação aguda mais freqüente no tratamento do DM. Sua ocorrência é de extrema importância tanto pelos efeitos clínicos agudos e sua potencial gravidade 22 quanto pelas possíveis seqüelas neurológicas decorrentes de casos graves e repetidos. Além das conseqüências objetivamente mensuráveis, os efeitos de episódios de hipoglicemia, principalmente se ocorridos no início do tratamento, podem ter conseqüências devastadoras na adesão futura, comprometendo para sempre o controle glicêmico de um determinado paciente. A hipoglicemia é a principal barreira para obtenção de um bom controle e níveis permanentemente baixos de hemoglobina glicosilada. Atualmente os objetivos de níveis glicêmicos do tratamento intensivo aproximam-se muito do limiar de hipoglicemia, tornando esse ajuste extremamente difícil (LTEIF, SCHWENK, 1999) A hipoglicemia em geral é identificada pela tríade de Whipple, descrita em 1938, que consiste em sinais e sintomas de hipoglicemia, glicemia abaixo de 40 mg/dl e melhora da sintomatologia após a administração de glicose. Os sintomas podem ser decorrentes da resposta autonômica por aumento de catecolaminas, que inclui palidez, sudorese, apreensão, tremores, taquicardia; ou da neuroglicopenia, que se manifesta por fome, tonteira, confusão mental, convulsões e coma. Alterações de humor e da personalidade podem ser características de cada paciente, constituindo-se em sinal de advertência para episódio de hipoglicemia. Valores de glicemia abaixo dos quais ocorrem sintomas de hipoglicemia pode variar entre pacientes diabéticos. Indivíduos mal-controlados podem apresentar sintomas com níveis elevados de glicemia, enquanto pacientes diabéticos, com episódios repetidos de hipoglicemia, podem ter sintomas abolidos mesmo em níveis glicêmicos extremamente baixos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2005). Grande parte das hipoglicemias percebidas e tratadas não chega a ser medidas ou registradas, por esse motivo, a Associação Americana de Diabetes (2005) propõe classificar hipoglicemia em: 23 • Hipoglicemia grave: evento que requer assistência de outra pessoa para administração de carboidrato, glucagon, glicose oral ou endovenosa. Implica neuroglicopenia suficiente para induzir convulsão, alteração de comportamento ou coma. A medida da glicemia não é obrigatória no momento da hipoglicemia para classificá-la retrospectivamente como tal. A recuperação neurológica é considerada evidência suficiente; • Hipoglicemia sintomática documentada: evento com sintomas e glicemia menor que 70 mg/dL; • Hipoglicemia assintomática (sem alarme): evento sem sintomas típicos de hipoglicemia, mas com a medida inferior a 70 mg/dL; • Hipoglicemia sintomática provável: evento no qual os sintomas não são confirmados por medida de glicemia. Esses são eventos dificilmente quantificáveis em estudos clínicos; • Hipoglicemia relativa: evento no qual a pessoa portadora de DM atribuídos a hipoglicemia, mas com medida superior a 70 mg/dL. Isto ocorre quando o controle glicêmico é inadequado. Todos os pacientes diabéticos com sintomas de hipoglicemia devem ter a medida da glicemia realizada para confirmação. Diante de um paciente hipoglicêmico, a conduta depende da gravidade do episódio. Hipoglicemias leves, caracterizadas por fome, tremor, nervosismo, ansiedade, sudorese, palidez, taquicardia, déficit de atenção e comprometimento cognitivo leve, ou assintomáticas devem ser tratadas com 15 g de carboidrato, preferencialmente glicose. Se não houver disponibilidade dos tabletes de glicose, pode-se utilizar uma colher de sopa de açúcar ou mel, ou 150ml de suco de laranja ou 150ml de refrigerante comum. Nos casos moderados a graves, com cefaléia, dor abdominal, agressividade,visão turva, confusão, tonteira, dificuldade para falar ou midríase, devem-se oferecer imediatamente 30 g de carboidrato (açúcar ou glicose) por via oral. Todo evento de hipoglicemia deve ser seguido por monitoração freqüente e um 24 lanche ou refeição com alimentos ricos em carboidratos, visto que o efeito da glicose é rápido, durando em torno de duas horas. Apesar da necessidade do tratamento imediato e eficaz, é importante evitar hiperglicemia de rebote. Alimentos ricos em gordura, como doces e chocolate, devem ser evitados como tratamento, pois têm um início de ação mais lento e provocam efeito hiperglicêmico prolongado (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2005). 4.4.2 Hiperglicemia de jejum As possíveis razões para hiperglicemia de jejum incluem a diminuição da ação da insulina, o fenômeno de amanhecer e a hiperglicemia de rebote (efeito Somogyi). A primeira situação decorre da uma dose inadequada de insulina durante a noite e requer um ajuste nas doses de insulina (FRANZ, 2005). A quantidade de insulina necessária para normalizar os níveis de glicose sanguínea durante a noite é menor no período pré-amanhecer (de 1h às 3h) do que no amanhecer (4h às 8h), esta elevação dos níveis de glicose sanguínea de jejum é o fenômeno de amanhecer e pode ocorrer se os níveis de insulina caírem entre o pré-amanhecer e o amanhecer ou se o débito de glicose hepática se tornar excessivo durante a noite, como é comum em DM2 (FRANZ, 2005). A hiperglicemia de rebote se origina durante a hipoglicemia com a secreção de hormônios contrareguladores (glucagon, epinefrina, hormônio do crescimento e cortisol) e é normalmente causada por doses excessivas de insulina exógena. Se a hiperglicemia de rebote não for reconhecida e as doses de insulina aumentadas, pode ocorrer um ciclo de insulinização (FRANZ, 2005). 25 4.4.3 Cetoacidose Diabética (DKA) A DKA é resultante da hiperglicemia, é uma complicação potencialmente fatal, mas reversível, caracterizada por graves distúrbios no metabolismo de carboidratos, proteínas e gorduras. É sempre o resultado de insulina inadequada para a utilização de glicose, portanto o organismo depende de gordura para a formação de energia, como conseqüência ocorre a formação de cetonas. A acidose resulta do aumento da produção e diminuição da utilização de ácido acetoacético e ácido 3-beta-hidroxibutírico provenientes dos ácidos graxos (FRANZ, 2005). A DKA é caracterizada por níveis elevados de glicose sanguínea e a presença de cetonas no sangue e na urina. O quadro clínico inclui os seguintes sintomas: poliúria, polidipsia, perda de peso apesar da polifagia, com evolução para vômitos, dor abdominal, desidratação, hiperventilação, hálito característico (maçã). A duração dos sintomas é relativamente curta, podendo variar de horas a alguns dias, devido aos efeitos tóxicos da cetose e acidose (OLIVEIRA, 2004; FRANZ, 2005). Se não for tratada a DKA pode levar ao coma e ao óbito, o tratamento inclui insulina suplementar, reposição de líquidos e eletrólitos e monitorização médica. Doenças agudas, como gripes, resfriados, vômito e diarréia, quando não tratadas adequadamente podem levar a um quadro de DKA (FRANZ, 2005). 4.5 Prevenção Medidas de prevenção do DM são eficazes em reduzir o impacto desfavorável sobre a morbimortalidade destes pacientes, principalmente em razão de se poder evitar as complicações 26 cardiovasculares. Enfatiza-se em especial a adoção de estilo de vida saudável, com dieta balanceada e exercícios físicos regulares. A restrição energética moderada, baseada no controle de gorduras saturadas, acompanhada de atividade física leve, como caminhar trinta minutos cinco vezes por semana, pode reduzir a incidência de diabetes do tipo 2 em 58% das pessoas com risco elevado para o desenvolvimento desta afecção (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003) Prevenção efetiva também significa mais atenção à saúde de forma eficaz. Isso pode ser feito através da prevenção do início do DM (prevenção primária) ou de suas complicações agudas ou crônicas (prevenção secundária). A prevenção primária protege indivíduos suscetíveis de desenvolverem o DM. Ela tem impacto por reduzir ou retardar tanto a necessidade de atenção à saúde como a de tratar as complicações do DM (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007) Atualmente, a prevenção primária do DM1 não tem uma base racional que possa ser aplicada a toda a população. As intervenções populacionais ainda são teóricas, necessitando de estudos que as confirmem. Quanto ao DM2, no qual a maioria dos indivíduos também apresenta obesidade, hipertensão arterial e dislipidemia, e a hiperinsulinemia seria o elo de ligação entre esses distúrbios metabólicos há necessidade de intervenções abrangendo essas múltiplas anormalidades metabólicas. Existem evidências de que as alterações no estilo de vida, com ênfase na alimentação e na redução da atividade física estão associadas ao acentuado aumento na prevalência do DM2. Os programas de prevenção primária do DM2 têm se baseado em intervenções na dieta e na prática da atividade física, visando a combater o excesso de peso (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). 27 4.6 Tratamento O tratamento do DM inclui as seguintes estratégias: educação; modificações do estilo de vida, que incluem suspensão do fumo, baixo consumo de bebidas alcoólicas, aumento da atividade física e reorganização dos hábitos alimentares; e, se necessário, uso de medicamentos. O tratamento concomitante de outros fatores de risco cardiovascular é essencial para a redução da mortalidade cardiovascular. Mudança no estilo de vida é difícil de ser obtida, mas pode ocorrer se houver uma estimulação constante ao longo do acompanhamento. Isto é particularmente importante, porque após o aparecimento do DM há uma piora progressiva do controle glicêmico, independente do emprego de agentes antidiabéticos. É possível que esta piora possa ser atenuada ou evitada com modificações no estilo de vida e/ou com o uso de medicamentos anti- hiperglicemiantes (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003). No tratamento do paciente diabético, uma questão a ser definida é o objetivo a ser atingido no controle glicêmico. Para isso, é fundamental a análise global do paciente, com o diagnóstico do tipo de DM, o nível educacional, as condições socioeconômicas e emocionais, a idade, o tempo de evolução da moléstia, o nível da glicemia, a presença de complicações, entre outras, que deverão ser analisadas e consideradas de maneira criteriosa (OLIVEIRA, 2004). 4.6.1 Tratamento medicamentoso Existe uma grande variedade de substâncias químicas cujo emprego farmacológico objetiva a redução da taxa glicêmica, que são especialmente importantes para os indivíduos com DM2 e quando utilizados em conjunto com dietas hipocalóricas constituem a base medicamentosa desta doença (FONTES, 2005). 28 4.6.1.1 Medicações • Acarboses Atua no intestino delgado (ID), diminuindo o ritmo de ataque às ramificações das moléculas de amido, impedindo parcialmente a digestão de açúcares da dieta. Estas drogas são úteis em minimizar picos glicêmicos pós-prandiais, melhorar os níveis de hemoglobina glicosilada. Este agente pode ser combinado com praticamente todos os hipoglicemiantes orais. Seus efeitos indesejáveis são ligados à própria digestão: provocam sensação de fastio, dores abdominais, cólicas e gases, e eventualmentediarréia (FONTES, 2005). • Metformina O mecanismo exato deste medicamento num á bem estabelecido, mas sabe-se que é capaz de reduzir a produção hepática de glicose em até 20%, reduzir discretamente a absorção de glicose no ID, além de contribuir para a melhora da absorção periférica da glicose em até 25%. Este medicamento não provoca aumento da taxa de síntese ou secreção de insulina, não provocando ganho de peso. Recomenda-se que a metformina não seja utilizada por diabéticos que tenham doença coronariana, enfisema pulmonar, insuficiência renal crônica, hepatite ou que sejam etilistas. Seus efeitos indesejáveis são: dores abdominais, náusea, diarréia e gosto metálico na boca (FONTES, 2005). 29 • Sulfoniluréias São as drogas hipoglicemiantes mais difundidas e conhecidas, mas não se conhece sue mecanismo exato de ação. No primeiro momento do tratamento o paciente aumenta a sua secreção de insulina pelas células beta. Após um uso contínuo do medicamento, os níveis de insulina voltam aos níveis iniciais, sem a detecção de alterações na taxa glicêmica que permanece controlada. Sem razão aparente, após cinco a sete anos de tratamento, é comum observar que o medicamento subitamente deixa de fazer efeito, alguns diabéticos do tipo 2 nunca respondem a estas drogas. Pacientes grávidas com insuficiência renal ou complicações hepáticas não devem fazer uso desta droga. Seus efeitos indesejáveis são: retenção hídrica, depleção de K+, elevação da pressão arterial e eventualmente hipoglicemia, o que pode ser extremamente perigoso, mas este efeito é eliminado com o ajuste da dosagem (FONTES, 2005). • Tiazolidinedionas Estes medicamentos agem como restauradores da sensibilidade periférica à insulina, aparentemente por uma ação intracelular na sinalização pós-receptor de insulina. O mecanismo destas drogas é muito complexo e merece estudos mais detalhados (FONTES, 2005). 4.6.1.2 Administração de Insulina A insulina é um hormônio protéico, que contem 51 resíduos de aminoácidos e peso molecular de 5.733Da, é composto por duas cadeias polipeptídicas unidas por pontes dissulfeto 30 (EL-BACHA, 2005), liberado pelas células beta do pâncreas e permite às células metabolizar e armazenar glicose e outros combustíveis (FRANZ, 2005) O emprego da insulina pode se associar a aumento de peso e presença de reações hipoglicêmicas. Segundo o Consenso Brasileiro sobre Diabetes (2002), as principais indicações do uso de insulina são: • No diagnóstico, quando os níveis de glicose plasmática estiverem muito elevados, especialmente se acompanhados de perda de peso, cetonúria e cetonemia. Alguns destes pacientes provavelmente não são DM2, mas sim DM1 de início tardio e, portanto, são dependentes de insulina. Pacientes obesos, com glicemia elevada na fase inicial do trata- mento, podem não requerer insulina; • Durante a gravidez quando não houver normalização dos níveis glicêmicos com dieta; • Quando os medicamentos orais não conseguirem manter os níveis glicêmicos dentro dos limites desejáveis; • Durante o tratamento com outros medicamentos quando surgirem intercorrências tais como cirurgias, infecções e acidente vascular cerebral, nas quais os níveis glicêmicos elevados podem piorar o prognóstico; • Em pacientes com infarto agudo do miocárdio e com níveis de glicose plasmática superiores a 200mg/dl devem-se utilizar insulina por via endovenosa contínua e solução de glicose a 5% com cloreto de potássio. O emprego destas medidas pode reduzir a mortalidade cardiovascular em 30%. Os tempos de início de ação, duração e tempo de ação da insulina sofrem influências, como: sítio de aplicação, técnica de aplicação, presença de anticorpos antiinsulina, tipo ou quantidade de hormônio aplicado. A ação da insulina pode ser ultra-rápida (com início de ação 31 entre 5 e 15 minutos, pico de ação em 1 ou 2 horas e duração de 3 a 5 horas); rápida (início de ação de 30 a 60 minutos, pico de ação varia de 2 a 4 horas e o tempo de ação é de três a seis horas); intermediária (início de ação de 2 a 4 horas, pico entre 8 e 12 horas e tempo de ação entre 12 e 20 horas); e longa (início de ação de 4 a 5 horas, pico entre 8 e 14 horas e tempo de ação entre 20 e 36 horas) (PINTO; OLIVEIRA, 2004). 4.6.2 Tratamento não-medicamentoso A orientação nutricional e o estabelecimento de dieta para controle de pacientes com DM associados a mudanças no estilo de vida, incluindo a atividade física, são consideradas terapias de primeira escolha. Está comprovado que essa associação provoca uma melhora na sensibilidade à insulina, diminui os níveis plasmáticos de glicose, reduz de forma expressiva a circunferência abdominal e a gordura visceral, melhorando o perfil metabólico com redução nos níveis de LDL- C e triglicerídeos e aumento do HDL-c (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). 4.6.2.1 Avaliação Nutricional A avaliação nutricional é usada para determinar a prescrição dietética, que é baseada nos objetivos do tratamento e no que o paciente é capaz de realizar. Devem ser sempre considerados os aspectos culturais, éticos e financeiros para facilitar a adesão ao tratamento (SACHS, 2005). O nutricionista deve realizar uma avaliação completa do indivíduo com DM; o que inclui dados antropométricos (peso, estatura, para o posterior cálculo do IMC), histórico dietético, e recordatório de 24 horas, para determinar a ingestão habitual e atual de macro e micronutrientes, 32 que servirão de base para a adaptação do plano alimentar, adaptado às necessidades metabólicas, nutricionais e de estilo de vida (SACHS, 2005). 4.6.2.2 Terapia Nutricional A composição da dieta indicada para portadores de DM assemelha-se à da recomendada para a população em geral, devem ser encorajados a ingerir uma dieta balanceada, que forneça todos os macro e micronutrientes essenciais, em quantidades corretas. Pelo fato do DM ser diretamente relacionado ao metabolismo dos macronutrientes, a nutrição desempenha um importante papel no seu controle (LOTTENBERG, 2008). Até o advento da terapia insulínica, apenas o tratamento dietético viabilizava o controle do DM, neste tratamento acreditava-se que deveria fazer restrição de alguns alimentos, prevenindo assim a elevação do índice glicêmico, porém esta conduta poderia provocar desnutrição grave e conduzir os indivíduos à morte precoce. Por este motivo, ainda persistem alguns mitos alimentares (LOTTENBERG, 2008). Após o início do uso da insulina, houve liberação quanto ao conteúdo calórico da dieta, mas manteve a restrição quanto à ingestão de carboidratos, cuja recomendação era de 20% do valor calórico da dieta. Este baixo consumo era justificado pela grande vulnerabilidade à hiperglicemia que os portadores de DM apresentavam e pelo risco de cetoacidose. Dessa forma os indivíduos consumiam dietas com alto teor de gorduras, aumentando o risco cardiovascular, e comprometendo o consumo adequado de fibras e determinadas vitaminas e minerais (KELLEY, 2003). 33 No decorrer do século passado, as diretrizes nutricionais foram gradativamente revisadas e se passou a recomendar aumento do consumo de carboidratos e controle na ingestão de gorduras (LOTTENBERG, 2008). Os objetivos da terapia nutricional (TN) em DM são (SILVA; BORGES; WAITZBERG, 2004): • Baixar a glicemia; • Alcançar ótimos níveis de lipídeos; • Fornecer calorias apropriadas; • Prevenir, retardar ou tratar complicações ligadas à nutrição; • Melhorar a saúde; • Individualizar a oferta denutrientes; • Equilibrar a ingestão alimentar, medicamentos e exercícios; • Manter o peso adequado. 4.6.2.3 Características da dieta • Recomendação energética e controle de peso A quantidade de caloria prescrita deve levar em conta o estado nutricional; para indivíduos acima do peso, uma pequena perda de peso pode causar uma melhora na resistência à insulina (ADA, 2008), por isso, deve ser prescrita uma dieta hipocalórica, restringindo de 250 a 500 calorias do consumo médio habitual diário. Para indivíduos eutróficos as calorias 34 provenientes da alimentação devem ser suficientes para manter o peso corpóreo saudável (MOLINA, 2004). O total de calorias da dieta no DM1 em crianças e adolescentes deve ser suficiente para, ao lado do tratamento insulínico, normalizar os níveis de glicose, prevenindo a hipoglicemia, e garantir o crescimento e o desenvolvimento adequados (LOTTENBERG, 2008). Além da ingestão inadequada de alimentos, a insulinização excessiva pode contribuir para o ganho de peso, por meio do estabelecimento de um círculo vicioso, no qual o paciente toma cada vez mais insulina, ingere quantidade cada vez maior de alimentos, ganha mais peso, necessita de mais insulina e come mais, tornando-se cada vez mais obeso e mais resistente a insulina (LOTTENBERG, 2008). • Carboidratos O percentual de calorias proveniente de carboidratos pode variar conforme hábitos alimentares individuais e de acordo com os níveis de glicemia e lipídeos sanguíneos (MOLINA, 2004). Os carboidratos deverão representar cerca de 50 a 60% do valor calórico total (VCT) (MOLINA, 2004). Considerando que uma porção de carboidratos corresponde, por exemplo, a uma fatia de pão de forma ou meio pão francês, ou uma escumadeira rasa de arroz ou macarrão, ou uma batata média ou meia concha de feijão, o paciente deverá ingerir seis ou mais porções diárias de alimentos ricos em carboidratos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003). É recomendado dar preferência aos carboidratos complexos (fontes de amido) e ricos em fibras e com baixo índice glicêmico. O total de porções diárias desse grupo de alimentos variará 35 de acordo com o VCT da dieta prescrita e, portanto, IMC, a idade e o nível de atividade física do indivíduo. Assim, mulheres com IMC > 27kg/m2 e sedentárias poderão receber apenas seis porções ao dia. Homens ativos com peso normal poderão ingerir até 11 porções ao dia (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003). Deve-se procurar manter constante, a cada dia, a quantidade de carboidratos ingerida, bem como sua distribuição nas diferentes refeições (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003), e a ingestão mínima de carboidratos deve ser de 130g/dia (ADA, 2002; ADA, 2008). Alimentos que contêm sacarose devem ser evitados para prevenir oscilações acentuadas da glicemia. Quando consumidos, o limite é de 20 a 30g por dia de açúcar de forma fracionada e substituindo outro carboidrato para evitar o aumento calórico (Ministério da Saúde, 2006). A frutose produz uma menor resposta na glicemia pós-prandial quando comparada à sacarose, porém pode afetar os lipídeos plasmáticos. Entretanto não há razão para que indivíduos com DM evitem alimentos que contenham naturalmente frutose (frutas e vegetais), que corresponde apenas por 3 a 4% do valor calórico total (ADA, 2008). • Índice glicêmico Os alimentos diferem na sua resposta glicêmica. Em relação ao efeito do índice glicêmico dos carboidratos, podemos afirmar que a quantidade do carboidrato na refeição ou lanche é mais importante que a fonte ou tipo de carboidrato.Embora dietas com baixo índice glicêmico possam reduzir a glicemia pós-prandial e o perfil lipídico, a capacidade dos indivíduos para manter essas dietas em longo prazo não está bem estabelecida. Não são encontradas evidências suficientes para recomendar o uso de alimentos de baixo índice glicêmico como estratégia primária no plano 36 alimentar Desta forma, a monitorização da glicemia ainda é considerada um guia para identificar as respostas específicas de cada alimento sobre a glicemia. (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007; Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a) • Contagem de carboidratos A contagem de carboidratos deve ser inserida no contexto de uma alimentação saudável, que ofereça todos os nutrientes necessários para o corpo humano, promovendo saúde e bem-estar. Uma boa alimentação é importante para todas as pessoas, pois é a partir dos alimentos que o organismo retira os nutrientes necessários para seu crescimento e desenvolvimento, manutenção de tecidos, resistência às doenças, etc. Uma das grandes conquistas na área de nutrição, e mais especificamente na terapia nutricional em diabetes, é a individualização do plano alimentar, respeitando necessidades nutricionais, hábitos alimentares, estado fisiológico, atividade física, medicação e situação socioeconômica (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Os macronutrientes são as fontes exógenas de produção de glicose, portanto influenciam diretamente a elevação da glicemia. Contudo não são todos absorvidos e utilizados em sua totalidade ou na mesma velocidade. Entre 35% e 60% das proteínas são convertidas em glicose em três a quatro horas e somente 10% das gorduras podem ser convertidas em aproximadamente cinco horas ou mais (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). O carboidrato é o nutriente que mais afeta a glicemia – quase 100% são convertidos em glicose em um tempo que pode variar de 15 minutos a duas horas. Os carboidratos não-refinados, com fibra natural intacta, têm distintas vantagens sobre as versões altamente refinadas, em virtude dos seus outros benefícios, tais como menor índice glicêmico, maior saciedade e 37 propriedades de ligação com o colesterol. A Figura 1 mostra a resposta glicêmica de alguns alimentos fontes de carboidratos. Desta forma, os carboidratos são os maiores responsáveis pela glicemia pós-prandial, evidenciando que a prioridade deve ser a quantidade total de carboidrato, e não mais a qualidade do mesmo. Vale ressaltar que os macronutrientes podem estar presentes de maneira combinada em um único alimento e/ou refeição e podem, desta forma, alterar a resposta glicêmica (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Figura 1. Resposta glicêmica de indivíduos não-diabéticos que ingeriram 50g de carboidratos de batata ou feijão comum. Fonte: Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a. Para o método de contagem de carboidratos é importante levar em conta o total de carboidratos consumido por refeição, que deverá obedecer às necessidades diárias deste nutriente. Entre os métodos de contagem de carboidratos existem dois que são mais amplamente utilizados, que são: lista de equivalentes e contagem em gramas de carboidratos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). No método lista de equivalentes, os alimentos são agrupados de tal forma que cada porção de alimento escolhido pelo paciente corresponde a 15g de carboidratos, classificando-os em 38 categorias (grupo de alimentos) e porções de uso habitual de nossa realidade. Os grupos são formados com base na função nutricional e na composição química. A lista de equivalentes ou escolhas (Tabela 2) classifica em categorias e porções baseadas em gramas de carboidratos, proteínas e gordura, esta lista facilita a contagem de carboidratos. No plano alimentar, pode haver trocas de porções de amido por porções de frutas, porque um equivalente de cada porção fornece 15g de carboidratos. (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Tabela2. Conteúdo nutricional para substitutos ou escolhas. Grupo Carboidratos (g) Proteínas (g) Gordura (g) Amido 15 3 - Carne 0 7 5 Vegetais 5 2 0 Frutas 15 0 0 Leite 12 8 0 Gordura 0 0 5 (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). O método contagem em gramas de carboidrato consiste em somar os gramas de carboidratos de cada alimento por refeição, obtendo-se informações em tabelas e rótulos dos alimentos. Pode-se, de acordo com a preferência do paciente e com os carboidratos predefinidos por refeição, utilizar qualquer alimento (Tabela 3) (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Tabela 3. Quantidade de carboidratos de uma refeição Alimento Carboidratos (g) 4 colheres de sopa (rasas) de arroz 20 2 colheres de sopa de feijão 8 2 pires de verduras e$legumes 0 1 bife pequeno 0 1 caqui pequeno 17 Total 45 (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). O método de contar carboidratos por gramas oferece informações mais precisas, porém mais trabalhosas, pois para o bom ajuste é importante que se pesem os alimentos, utilizando 39 informações de embalagens e tabelas de referência. Estimar carboidratos por substituições é um método mais simples, mas não tão preciso.A escolha do método deve levar em consideração a necessidade do paciente e à do profissional responsável pela orientação, sendo que muitas vezes estes métodos podem ser utilizados ao mesmo tempo (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). • Fibras As fibras são classificadas como solúveis e insolúveis, tendo a primeira importante função no controle glicêmico. As fibras insolúveis são importantes na fisiologia intestinal sendo basicamente expelidas por completo. A recomendação é a ingestão de 21-30g de fibras, quantidade igual à aconselhada para a população em geral (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Também pode ser recomendado o consumo de fibras de acordo com o total calórico da dieta, assim seria 14g de fibras por 1000kcal (ADA, 2008). O consumo diário de fibras pode ser sob a forma de hortaliças, leguminosas, grãos integrais e frutas, que fornecem minerais, vitaminas e outros nutrientes essenciais para uma dieta saudável. O recomendado seria de duas a quatro porções de frutas (sendo pelo menos uma rica em vitamina C) e de três a cinco porções de hortaliças (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). Embora altas quantidades de fibras (50g/dia) mostrem efeitos benéficos sobre o controle glicêmico e lipídico, não é conhecido se a palatabilidade e os efeitos gastrintestinais colaterais dessa quantidade de fibras seriam aceitáveis pela população. Assim, como para a população em geral, o consumo de fibra da dieta deve ser encorajado, entretanto não existe razão para 40 recomendar que pessoas com DM consumam uma maior quantidade do que outros indivíduos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). As fibras diminuem a absorção dos carboidratos, embora pertençam a este grupo, não são digeridas e absorvidas como os demais tipos de carboidratos. Quando o alimento contiver cinco ou mais gramas de fibras por porção, deve-se subtrair tal valor do total de gramas de carboidrato do alimento, determinando quanto carboidrato será convertido em glicose. Por exemplo: em um alimento que contém 48g de carboidrato e 8g de fibra, devemos reduzir os 8g de fibra do total de carboidrato, restando 40g de carboidrato disponível a ser transformado em glicose. Deve-se ficar atento à quantidade de fibras encontradas nos rótulos dos alimentos, principalmente no caso de frutas secas e farelos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). As fibras contribuem para redução do colesterol por diminuir a absorção de ácidos biliares no íleo. Dessa forma, o fígado recruta colesterol da circulação para a síntese de novas moléculas de ácidos biliares. Mas é importante ressaltar que, isoladamente, a eficiência das fibras na redução do colesterol é pequena, portanto, deve-se associar a uma dieta balanceada e com quantidade e qualidade adequadas de gordura (LOTTENBERG, 2008). • Lipídeos Os lipídios são componentes orgânicos dos alimentos que, por conterem menos oxigênio que os carboidratos e as proteínas, fornecem taxas maiores de energia. São também importantes condutores de vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) e possuem ácidos graxos essenciais (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). 41 Os lipídeos deverão representar menos de 30% do VCT da dieta. As gorduras saturadas deverão corresponder, no máximo, a 10% do VCT e menos de 7% do VET àqueles com LDL-c acima de 100mg/dl, e não exceder a 300mg/dia de colesterol.. Os alimentos gordurosos em geral, como carnes gordas, embutidos, laticínios integrais, frituras, gordura de coco, molhos, cremes e doces ricos em gordura e alimentos refogados ou temperados com excesso de óleo ou gordura, deverão ser evitados. Em algumas situações, como na hipertrigliceridemia ou quando o HDL-c se apresenta abaixo do desejável, pode ser aconselhável aumentar a quantidade de gorduras monoinsaturadas ou poliinsaturadas (azeite, abacate, óleo de canola, de girassol, de milho ou de soja), reduzindo, neste caso, a oferta de carboidratos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; Ministério da Saúde, 2006). • Proteínas As proteínas devem corresponder de 15 a 20% do VCT da dieta, podendo ser derivadas de fontes animais ou vegetais. (ADA, 2008). O conteúdo protéico deve ser de 0,8g/kg a 1g/kg de peso desejado por dia. Com o aparecimento de nefropatia, consumos menores de proteínas devem ser considerados, porém nunca devem ser inferiores a 0,6g/kg. Em termos práticos, isso corresponde a duas porções pequenas de carne por dia, que podem ser substituídas com vantagem pelas leguminosas (feijão, lentilha, soja, ervilha ou grão de bico) e duas a três porções diárias de leite desnatado ou queijo magro. O consumo de peixes deve ser incentivado por sua riqueza em ômega-3. Os ovos também podem ser utilizados como substitutos da carne, respeitando-se o limite de duas gemas por 42 semana, em função do teor de colesterol. Excessos protéicos devem ser evitados (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; SACHS, 2005). Dietas com alto teor protéico (> 20% VCT) não são recomendadas como método para a perda de peso, porque suas complicações não são muito esclarecidos. Apesar de que essas dietas promovem perda de peso e melhora na glicemia, não está estabelecido se esses benefícios são conservados a longo prazo e seus efeitos na função renal em indivíduos com DM são desconhecidos (ADA, 2008). • Álcool Não é recomendável o uso habitual de bebidas alcoólicas. Contudo estas ser consumidas com moderação, sendo 30ml de etanol por dia para homens e 15ml por dia para mulheres, sempre acompanhado de algum alimento, já que o excesso de álcool pode produzir hipoglicemia Pacientes com hipertrigliceridemia, obesos ou aqueles com mau controle metabólico devem restringir a bebida alcoólica, devido ao seu alto valor calórico (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; MOLINA, 2004). Deve-se observar o comportamento do organismo com a ingestão de álcool, realizando glicemias antes e duas horas após, para avaliar e adequar a dose de insulina a ser administrada. O álcool não é convertido em glicose, e sim metabolizado de forma semelhante às gorduras. Não deve ser considerada uma escolha de carboidrato no momento da decisão de quantas unidades de insulina devem ser aplicadas. Um grama de álcool contribui com 7kcal no plano alimentar. Portadores de diabetes que utilizam antidiabéticosorais podem apresentar reações como 43 palpitações, rubor facial e calor ao ingerirem bebidas alcoólicas (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). • Adoçantes Os alimentos dietéticos podem ser recomendados considerando-se o seu conteúdo calórico e de nutrientes. Os refrigerantes e gelatinas dietéticas têm valor calórico próximo de zero. Alguns produtos dietéticos industrializados, como chocolate, sorvetes, alimentos com glúten (pão, macarrão, biscoitos), não contribuem para o controle glicêmico, nem para a perda de peso, portanto seu uso não deve ser encorajado. Vale ressaltar a importância de se diferenciar alimentos diet (isentos de sacarose, quando destinados a indivíduos diabéticos, mas que podem ter valor calórico elevado, por seu teor de gorduras ou outros componentes) e light (de valor calórico reduzido em relação aos alimentos convencionais). Em função dessas características, o uso de alimentos dietéticos deve ser orientado pelo nutricionista, que se baseará no conhecimento da composição do produto para incluí-lo no plano alimentar proposto (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003). Os adoçantes ou edulcorantes podem ser utilizados, considerando-se o seu valor calórico. O aspartame, o ciclamato, a sacarina, o acessulfame K e a sucralose são praticamente isentos de calorias. Já a frutose tem o mesmo valor calórico do açúcar. Os alegados efeitos danosos dos adoçantes artificiais não têm fundamentação científica. A Organização Mundial de Saúde recomenda seu uso dentro de limites seguros, em termos de quantidade e, do ponto de vista 44 qualitativo, recomenda alternar os diferentes tipos. A seguir estão representados os limites seguros de ingestão de adoçantes dietéticos (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2000): • Acessulfame-K: 15mg/kg peso corporal • Aspartame: 40mg/kg peso corporal • Ciclamato: 11mg/kg peso corporal • Esteviosídeo: 5,5mg/kg peso corporal • Sacarina Sódica: 5 mg/kg peso corporal • Sucralose: 15 mg/kg peso corporal • Sal de cozinha Deve ser limitado a 6g/dia. Devem ser evitados os alimentos processados, como embutidos, conservas, enlatados, defumados e salgadinhos de pacotes do tipo snacks. Deve ser encorajado o consumo de temperos naturais como salsa, cebolinha e ervas aromáticas em vez de condimentos industrializados (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2007). • Fracionamento Devem ser enfatizadas as vantagens do fracionamento no consumo dos alimentos, distribuídos em três refeições básicas e duas a três refeições intermediárias, nelas incluída a refeição noturna (composta preferencialmente por alimentos como leite ou fontes de carboidratos complexos), sempre em horários regulares, permitindo um melhor controle glicêmico e auxiliando na terapia medicamentosa (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003; MOLINA, 2004). 45 • Rótulo dos alimentos É importante conhecer a composição dos alimentos que serão consumidos observando o rótulo contido na embalagem. A informação nutricional do alimento mostra as quantidades de nutrientes em gramas por porção do alimento (tabela 4). Deve-se ficar atento tamanho da porção que está sendo avaliada na embalagem; à quantidade total de gordura; à quantidade total de carboidratos; e ao valor calórico (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). Tabela 4. Informação nutricional de uma porção ou unidade de barra de cereal Barra de cereal Informação nutricional 1 unidade 25g Carboidratos 18g Lipídeos 1,9g Proteínas 1,6g Fibras 0,6g Calorias 95,6kcal (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2003a). 4.6.2.3 Micronutrientes e DM Não há evidências claras de benefícios da suplementação de vitaminas e minerais em indivíduos com DM, comparando com a população em geral, que não apresentam deficiências. Em alguns grupos como idosos, gestantes, lactantes, vegetarianos ou indivíduos com dietas hipocalóricas muito restritas, um suplemento multivitamínico pode ser necessário (ADA, 2008). 4.6.2.3.1 Zinco 46 As principais funções do zinco são: participação na síntese e degradação dos macronutrientes, na manutenção do crescimento e do desenvolvimento normais, no funcionamento adequado do sistema imunológico, na defesa antioxidante, na função neurosensorial, e, também, na transcrição e tradução de polinucleotídios (SENA, PEDROSA, 2005). Além de outras manifestações clínicas, a deficiência deste mineral causa o retardo do crescimento, hipogonadismo, alteração da resposta imune, dificuldade de cicatrização, aumento do risco de aborto, diarréia, anorexia, perda de peso, alopecia, e a prematuridade na gestação (SALGUEIRO et al, 2000). A relação zinco e DM baseia-se no fato de que este mineral desempenha inúmeras funções orgânicas, que se encontram normalmente alteradas neste grupo de indivíduos, principalmente, o estímulo à secreção e estocagem de insulina, e no metabolismo da glicose; indivíduos com DM também apresentam o riso aumentado para a deficiência de zinco, devido às perdas urinárias, diminuição na capacidade intestinal de absorção, além da possível baixa ingestão dietética (SALGUEIRO, 2005; SENA et al, 2003; SALGUEIRO et al, 2000). As alterações do metabolismo do zinco em indivíduos com DM geralmente manifestam-se por zincúria elevada, concentrações baixas ou altas de zinco no plasma e eritrócito (SENA et al, 2003). A hiperzincúria é preferencialmente um resultado da hiperglicemia; os mecanismos têm sido atribuídos a proteinúria, afinidade do zinco por complexos de aminoácidos com glicose presentes na urina e aumento deste mineral circulante na forma livre, devido a glicosilação da albumina, intensificando assim a fração filtrável de zinco glomerular. A elevação da excreção de zinco não depende de sua fonte, quer seja alimentar ou medicamentosa (SENA et al, 2003). 47 A suplementação com zinco pode apresentar efeitos benéficos em diferentes situações de doenças em crianças, adultos ou idosos.Nos indivíduos com DM, são constatados efeitos diversificados e controversos. Estes resultados podem favorecer programas que envolvam suplementação com zinco, como conduta nutricional na prevenção da deficiência deste mineral em populações de risco (PEDROSA, 2005). 4.6.2.3.2 Cobre A importância biológica, funcional e estrutural do cobre em animais e humanos está relacionada com as funções metabólicas de enzimas cobre-dependentes; que catalisam reações fisiológicas importantes relacionadas com fosforilação oxidativa, inativação de radicais livres, biossíntese de colágeno e elastina, formação de melanina, coagulação sanguínea, metabolismo de ferro e síntese de catecolaminas. As implicações patogênicas das alterações do estado nutricional de cobre no DM não estão bem claras, principalmente se ocorrem por deficiência ou excesso deste mineral (PEDROSA, COZZOLINO, 1999). A associação da deficiência de cobre com o DM parece aumentar a demanda de cobre pelo organismo, para compensação do estresse oxidativo, por meio das enzimas antioxidantes dependentes deste nutriente (PEDROSA, COZZOLINO, 1999). As principais alterações metabólicas e funcionais de cobre, identificadas nos estudos com animais diabéticos, referem-se ao acúmulo tecidual por meio da ligação cobre-metalotioneína, principalmente nos rins e fígado; e desordens na síntese de colágeno e elastina. Extrapolando estes dados, existem especulações no sentido de que estas alterações renais podem ser um dos fatores desencadeantes da nefropatia diabética (PEDROSA, COZZOLINO, 1999). Na maioria dos estudos com
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