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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL FACULDADE DE DIREITO CAMPUS CANOAS Moisés Soares Alves Uma reflexão sobre um homem em busca da verdade, do livre pensamento. Da verdade buscada em si mesmo, no homem interior. Que não se satisfazia com argumentos balizados na religiosidade da época, mas na busca do saber no saber. Na razão do saber. Busca esta, que incomodava os que detinham e comercializavam a sabedoria ditada pela religiosidade enraizada na cultura epocal. A JUSTIÇA E O JULGAMENTO DE SÓCRATES Canoas 2014 A JUSTIÇA E O JULGAMENTO DE SÓCRATES Por volta dos anos 400 a.C, na Grécia Antiga, encontra-se um homem chamado Sócrates. Um homem em busca da verdade, do livre pensamento. Da verdade buscada em si mesmo, no homem interior. Que não se satisfazia com argumentos balizados na religiosidade da época, mas na busca do saber no saber. Na razão do saber. Busca esta, que incomodava os que detinham e comercializavam a sabedoria ditada pela religiosidade enraizada na cultura epocal. Sócrates tinha sede do saber e um senso de justiça muito mais amplo do que o dos seus algozes que o levaram ao tribunal, mais especificamente entre eles e nominalmente, Meleto, Anito e Lícon. As conjunturas política e cultura religiosa não lhe eram favoráveis, justificando-se assim, o fato de seus acusadores o terem levado ao tribunal apresentando a seguinte acusação formal: “Ensinando a não crer nos deuses em que a cidade crê, mas em coisas numinosas diferentes, novas”. Ou seja, esta acusação em específico tinha cunhos religiosos e conservadores. Na busca incessante do saber, conforme supracitado, Sócrates foi, dentre muitas acusações, denunciado por ir contra a doutrina religiosa da época e de influenciar os jovens à reflexão centrada no homem e não em deuses contraditórios. Incoerência esta, que os submetiam (os deuses) a um patamar humano desdivinizando-os (no significado puro do termo “divino”) consequentemente em seus predicados atribuídos pelos próprios homens. Encontrando-se por acaso com Êutifron, um esperto religioso, procurou neste, argumentos convincentes a respeito “das coisas piedosas e não piedosas” para durante o julgamento, usá-los como instrumentos de defesa perante o tribunal. Entrementes, seu prolixo diálogo com este religioso não o ajudou muito, como ele mesmo expressa ao término da discussão. Inicia-se o Julgamento. O resultado duma decisão judicial, segundo Sócrates, deve ser arrimado não na simples oratória (ainda que, em alguns casos, ela não venha ser tão simples assim), mas na verdade dos fatos devidamente comprovados. Entrementes, uma oratória conexiva à verdade contribuiria com uma decisão mais justa, porém, não foi o caso de Sócrates que, mesmo com uma oratória esplêndida e com a verdade ao seu favor, não logrou êxito no que tange à decisão dos jurados. Diante do Tribunal, Sócrates, em suas alfas palavras, esmera-se em passar certa humildade, apropriada à sua condição de réu e, ao mesmo tempo expondo de forma comedida a importância da isonomia jurídica paragonando- se com um estrangeiro no seu modo de expressar-se. Nota-se que Sócrates estava preocupado em receber os mesmos direitos e tratamento que um ser humano deveria de ter em um julgamento. Dentre muitas acusações e nos argumentos de seus acusadores, salienta-se a similitude da doutrina de Sócrates com as doutrinas dos físicos e sofistas contemporâneos que, com seus estudos roubavam os atributos divinos no que tange à Natureza e ao Universo. São apresentados por Sócrates, fatos que se caracterizavam como calúnias e difamações com respeito à sua identidade, expondo assim, a fragilidade da conjuntura jurídica na coibição destas práticas que denigrem a imagem de uma pessoa, que simplesmente era mal compreendida na sociedade na qual estava inserida. Sócrates, na continuidade de sua defesa, apresenta a origem de seu suposto “crime” discorrendo a respeito de sua sabedoria e de como a adquiriu. As inimizades foram aumentadas à medida que se relacionava com os ditos sábios examinando-os em suas próprias sabedorias. Suas conclusões sobre os políticos, poetas e técnicos, após contato com estes, começaram a irritar pessoas influentes a ponto de acarretar em um indiciamento, que, na sua concepção, foi improcedente. Este juízo de valor advindo dos três principais acusadores, apresentado durante sua defesa, culminando em um julgamento injusto, segundo o próprio Sócrates, na condição de réu, é inapropriado como base comprobatória para se condenar alguém por suas convicções filosóficas. Observa-se até o presente momento a ausência de um advogado que provavelmente daria maiores condições e legitimidade na defesa do réu, não se levando em conta, claro, o sistema jurídico de então. Sócrates aborda também a distinção entre uma lei corretiva e uma lei punitiva, discorrendo a respeito do comportamento interpessoal em uma sociedade. Uma lei corretiva tem como primazia a doutrina com objetivo de se corrigir ou moldar um comportamento em que prejudicaria, de alguma forma e em algum aspecto, uma ou mais pessoas em uma sociedade. Sócrates apresenta argumentos comprobatórios de que as acusações de Meleto são incoerentes no que diz respeito ao seu suposto ateísmo. Discorrendo sobre o processo cíclico de democratização de Atenas, em meio às guerras, correndo risco de morte, Sócrates apresenta todo seu esforço no que tange à paz social, mesmo durante este período conturbado. Na visão de Sócrates a composição do júri (se referindo ao atual sistema jurídico no qual estava sendo submetido) não deve estar voltada às questões emocionais, mas às questões fáticas com o intuito de fazer viger a Lei. Quanto ao tempo do processo em si, Sócrates fala sobre a necessidade de tempo hábil para se examinar as provas apresentadas pela defesa. Portanto, sua defesa foi prejudicada pelo tempo exíguo para pôr todas as suas argumentações, do contrário, teria maior probabilidade de absolvição. Seu argumento base é que uma sociedade realmente democrática só pode ser justa quando as individualidades e diferenças sociais, religiosas, políticas e filosóficas forem respeitadas em seu amplo direito de viver e existir. Observa-se um julgamento baseado não em princípios de justiça, mas em meros interesses comerciais e políticos. Sócrates, ao despreciar a sabedoria predominantes dos grandes, foi identificado como uma ameaça à fonte de lucro tanto dos sábios quanto dos religiosos da cidade. Isso consequentizou na formação de um grupo influenciador no meio jurídico grego. Apesar de todos os argumentos racionais de Sócrates apresentados em sua defesa, a cultura social religiosa inserida e predominante na conjuntura jurídica que abarcava o Júri, prevaleceu durante o julgamento, ainda que de forma sutil. Sócrates é sentenciado à morte por envenenamento. Bibliografia: Platão; Apologia de Sócrates. 1 Ed. Porto Alegre - L&pm 2008
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