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O corpo sob a ótica de Foucault e sua influência na dança de salão

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II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
O CORPO SOB A ÓTICA DE FOUCAULT
E SUA INFLUÊNCIA NA DANÇA DE
SALÃO
BRUNO BLOIS NUNES 105
MÁRCIA FROEHLICH106
Resumo: O corpo e seus movimentos são repletos de significados. Através
da linguagem corporal, o homem, ao pôr em destaque sua sensibilidade,
intervém na sensibilidade de outra pessoa. O corpo é utilizado para
compartilhar emoções, ordens, sendo considerado uma forma de linguagem.
Para tanto, este trabalho faz parte de uma pesquisa que envolve o estudo dos
conceitos de disciplina, controle e vigilância desenvolvidos por Michel
Foucault em trabalhos como As Malhas do Poder (1982), Microfísica do
Poder (1998) e Vigiar e Punir (1999). Busca-se abordar os conceitos do
corpo desde a Grécia Antiga até os dias atuais; além disso, investiga-se a
vigilância obtida através do modelo panóptico e a mudança de controle do
corpo passando da punição corporal ao sistema de vigia. A partir desses
conceitos, procura-se analisar as influências que essas noções de
comportamento corpóreo exercem em alunos de dança de salão. Considera-
se que a dança de salão pode servir como um instrumento de auxílio para a
tentativa de harmonizar dois corpos. Dois corpos de experiências e
objetivos diferentes, silenciados pelas normas sociais, mas que podem
buscar novas formas de relacionamento através da dança.
Palavras-Chave: Foucault, controle, vigilância, corpo, dança de salão.
105 IFSul – Campus Pelotas - Mestre em História (UFPel). bruno-blois@hotmail.com
106 IFSul – Campus Pelotas - Mestre em Letras (UFSM) - froehlich.marcia@gmail.com
388
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
1. INTRODUÇÃO
Como fazer com que dois corpos que possuem suas experiências
e objetivos distintos e que lutam constantemente e, silenciosamente com
as normas sociais entrem em sintonia um com o outro? A dança de salão
seria um instrumento de auxílio para essa questão?
As danças, expressões da corporeidade viva, ainda seguem
ditames das épocas em que surgiram. Contudo, essa corporeidade se
expressa, ou não, dependendo do contexto em que está inserida. Tanto
na era primitiva como no período contemporâneo, a dança tem um
potencial muito revelador do “desenvolvimento e afirmação da
identidade dos povos” (GRANGEIRO, 2014, p. 43). Através da
comunicação corporal, o homem, ao pôr em destaque sua sensibilidade,
intervém na sensibilidade de outra pessoa. O corpo é utilizado para
“compartilhar emoções, transmitir ordens, partilhar ideias” (RECTOR;
TRINTA apud VIANA; NÓBREGA, 2004, p. 3).
Assim, o corpo e seus movimentos são repletos de significados.
Entretanto, muitos deles podem parecer incompreensíveis num primeiro
momento. “A capacidade de entrar em contato com os outros indivíduos
valoriza as diferenças e a originalidade de cada ser através de uma
profunda compreensão dada ao corpo” (CASSIMIRO; GALDINO; SÁ,
2012, p. 77).
No entanto, o corpo tem uma longa trajetória de menosprezo.
Tanto os componentes clássicos como os judaico-cristãos de nossa
herança cultural ajudaram na formação de uma visão fundamentalmente
dualista do homem que elevava, por caminhos e razões diferentes, a
mente ou a alma e depreciava o corpo (PORTER, 1992, p. 292).
389
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
Michel Foucault mostra, através de trabalhos como As Malhas do
Poder (1982), Microfísica do Poder (1998) e Vigiar e Punir (1999), um
corpo que antes era punido e, a partir do século XIX, passa a ser vigiado
e controlado. A vigilância e o controle do corpo são fatores de extrema
influência nas atitudes cotidianas das pessoas e, consequentemente,
também podem ser identificados nas formas de comportamento dos
alunos em aulas de dança de salão107.
Este trabalho contempla, primeiramente, uma análise do corpo
através da história. Em seguida, serão abordados alguns conceitos
importantes acerca do panoptismo e do controle do corpo. Por fim,
veremos a influência de algumas questões relevantes desses conceitos
na prática da dança de salão.
2. O CORPO ATRAVÉS DA HISTÓRIA
É interessante percebermos que as transformações do corpo,
desde a Grécia Antiga até os dias atuais, ocorreram por determinações
políticas, econômicas e religiosas das classes de maior influência em
cada período (CASSIMIRO; GALDINO; SÁ, 2012, p. 64). A ciência, a
religião, a educação, a moral, os costumes e outros serviram de
motivação para manipular a “política de compreensão do corpo”
(CASSIMIRO; GALDINO; SÁ, 2012, p. 67).
Do ponto de vista ocidental, habituamo-nos a considerar o corpo
como o oposto da mente, considerada superior. Essa “é uma herança
que estamos carregando desde Platão” (PINTO; JESUS, 2000, p. 89).
Para o filósofo grego, “a alma racional pertencente ao mundo das ideias,
107 Esse trabalho apresenta reflexões que constituem a fase preliminar de uma pesquisa que pretende
analisar a influência de tais fatores de vigilância e controle corporais sobre o comportamento de
alunos de dança de salão. As considerações aqui expostas baseiam-se nas observações advindas do
exercício da atividade de professor de dança de salão, pois a etapa de observação sistemática da
pesquisa ainda não foi concluída.
390
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
é a parte mais nobre do homem. O corpo pertence ao mundo físico e é
ruim, pior. O mundo das ideias é o bem supremo” (PINTO; JESUS,
2000, p. 90).
Esse pensamento platônico atravessa a Idade Média e a Igreja
Católica produz a associação do corpo com o pecado e estabelece uma
estreita relação desse corpo com a sexualidade. Dessa maneira, o corpo
somente obtinha valorização pelo fato de servir de morada para o
espírito (PINTO; JESUS, 2000, p. 90). O homem subjugava a carne
através de “obrigações religiosas e sociais” e descobria a purificação do
corpo através de “torturas, flagelos, autopunição e castração de desejos”
(PINTO; JESUS, 2000, p. 90). Vítimas de uma “ideologia anticorporal”,
a dança e o esporte desaparecem na Idade Média (LE GOFF; TRUONG
2012, p. 147).
Ao chegarmos à modernidade, em Descartes, atingimos o auge da
exaltação do intelecto frente ao corpo. O corpo é considerado uma
simples matéria incapaz de compreender o mundo, que só pode ser
compreendido pelo intelecto (PINTO; JESUS, 2000, p. 90). 
A influência do modo de pensar cartesiano é visível até hoje no
modo de pensar ocidental. Embora muito se tenha feito para superar a
visão dualista do nosso mundo, essa “postura utilitarista e reducionista”
ainda se faz presente na ciência atual (PINTO; JESUS, 2000, p. 91). 
Embora as relações entre corpo e mente não sejam inatas e a
distribuição de suas funções e responsabilidade distingue-se entre os
tempos, os contextos, as sociedades e as culturas, “a mente é
canonicamente superior à matéria” (PORTER, 1992, p. 303, 307 e 308).
Ou seja, a “mente, o desejo, a consciência ou o ego tem sido indicado
391
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
como os guardiães e governantes do corpo, e o corpo deve ser seu
criado” (PORTER, 1992, p. 303).
Contudo, têm-se observado, atualmente, esforços para derrubar
essas “velhas hierarquias culturais” que privilegiam a mente sobre o
corpo (PORTER, 1992, p. 293). A grande questão que fica é se tais
esforços buscam simplesmente elevar o valor do corpo sobre o da
mente, mas mantendo a relação dualista; ou tratá-los irmãmente,
mudando a relação de mente ou corpo para corpo e mente juntos em um
“corpo” só.
3. O PANÓPTICO NOS DIAS ATUAIS
No final do século XVIII, Jeremy Bentham idealizou um modelo
de construção que fosse ideal para as prisões inglesas (ZIMMER, 2009,
p.26). Entretanto, esse modelo, o Panóptico, também é uma forma de
planejamento para instituições educacionais, assistenciais e de trabalho
(PERROT, 2008, p. 127).
O Panóptico tinha como característica mais importante provocar
na pessoa um efeito de vigilância permanente mesmo que o encarregado
não o estivesse vigiando de maneira efetiva (FOUCAULT, 1999). O
olhar exige muito menos despesa sem a necessidade de “armas,
violências físicas e coações materiais” (FOUCAULT, 1998, p. 218).
Apenas um olhar vigilante e cada indivíduo sentindo essa observação
contínua acaba por interiorizar esse ato, levando o indivíduo a exercer o
papel de vigia sobre si mesmo (FOUCAULT, 1998, p. 218).
Uma sujeição real nasce mecanicamente de uma relação
fictícia. De modo que não é necessário recorrer à força
para obrigar o condenado ao bom comportamento, o
louco à calma, o operário ao trabalho, o escolar à
392
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
aplicação, o doente à observância das receitas. Bentham
se maravilha de que as instituições panópticas pudessem
ser tão leves: fim das grades, fim das correntes, fim das
fechaduras pesadas (FOUCAULT, 1999).
O Panóptico de Jeremy Bentham, tão estudado por Foucault, foi
remodelado para um formato mais atual e eletrônico. As câmeras de
segurança e os seus avisos “Sorria, você está sendo filmado” encontram-
se em locais dos mais variados: shoppings, supermercados, bancos,
aeroportos; além de elas poderem ser vistas pelas ruas monitorando o
tráfego e as pessoas. As câmeras invadiram a privacidade das pessoas e
podem ser encontradas tanto em edifícios para zelar pela segurança
como em formatos menores espalhadas por todos os cantos da casa,
vigiando o comportamento de babás e o movimento de curiosos que a
frequentam.
De uma realidade “fabricada” como um reality show para TV
(por exemplo em O Show de Truman: O Show da Vida, 1998), ao
controle e rastreamento ilimitado de indivíduos através da inteligência
artificial os transformando em fantoches humanos dominados pela
tecnologia (como em Controle Absoluto, 2008), os filmes também
retratam esses novos modelos panópticos desenvolvidos na atualidade.
Entre as possíveis consequências dos modernos panópticos, está o
desenvolvimento de uma paranoia diante do estilo de vida a que se está
sujeitado. Paranoia semelhante a que sofreu Winston no clássico 1984
de George Orwell ao desafiar a ditadura totalizante do Grande Irmão.
Esse mesmo “Grande Irmão” pode ser visto representado na
figura do professor de dança de salão. Ele seria o “grande vigia”, aquele
que observa se o aluno está executando os passos de forma correta e se
os faz elegantemente, de acordo com a música, com uma boa postura e
com respiração adequada. 
393
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
Para isso, muitas vezes, o professor de dança conta com o auxílio
de um espelho. O espelho funcionaria como um dispositivo de expansão
auxiliar da capacidade de vigilância do professor que ajudaria na
observação dos alunos e remete à disposição espacial do panóptico. O
espelho, além de colaborar na autopercepção do aluno durante a
execução dos passos de dança, impelindo-o à autorregulação de seus
movimentos, funciona como um segundo par de olhos do professor nas
aulas de dança.
4. O CONTROLE DO CORPO
Durante toda a nossa vida, somos controlados das mais diversas
maneiras. Esse controle pode ser visível ou invisível: censo, controles de
natalidade e mortandade, câmeras de segurança, escuta telefônica, filas
nos mais diversos estabelecimentos e horários fixos de trabalho são
alguns exemplos que mascaram o nosso livre direito de ir e vir previsto
no Art. 5 da Constituição Brasileira (BRASIL, 1988). 
Esse controle corporal está intimamente relacionado às
concepções de corpo, as quais sofreram mudanças em diversos períodos
históricos. Passando pela prática do esporte na Antiguidade, a “ideologia
anticorporal” da Idade Média (LE GOFF; TRUONG 2012, p. 10), as
reduções do contato corporal e o controle do gesto excessivo no período
Renascentista (ARIÈS, 2009, p. 14), foi um longo caminho até chegar
aos dias atuais. 
As análises foucaultianas dos anos 1970 investigavam como o
corpo passou de “superfície de inscrição de suplícios e de penas” para
um método que buscava “formar, corrigir e reformar o corpo” (REVEL,
2005, p. 31). Passou-se do controle social do corpo dado pela pena e
detenção até o final do século XVIII, para a vigilância desse corpo a
partir do início do século XIX (REVEL, 2005, p. 31).
394
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
A partir de então, toda penalidade transforma-se em controle.
Não estamos falando aqui apenas das ações que estão ou não de acordo
com a lei, mas também “sobre aquilo que eles podem fazer, que eles são
capazes de fazer, daquilo que eles estão sujeitos a fazer, daquilo que eles
estão na iminência de fazer” (FOUCAULT apud REVEL, 2005, p. 29),
pois
a noção de corporeidade liga-se à realidade bio-política-
histórica, representando as marcas da sintomatologia
social que assujeitam e subjugam o corpo às vicissitudes
da época e do local. Essencial em Foucault é a percepção
que ele desenvolve do corpo, como elemento de poder e
saber, o que confere ao estatuto do corpo um papel
estratégico exponencial como lugar de resistência do
sujeito na sociedade (FERREIRA, 2013, p. 80).
Segundo Foucault, é a partir do século XVIII que a vida e o corpo
tornam-se “objetos de poder” (1982, p. 38), isto é, “o controle da
sociedade sobre os indivíduos começa pelo corpo” (CASSIMIRO;
GALDINO; SÁ, 2012, p. 73).
As tecnologias de política mostram uma importante invenção dos
séculos XVII e XVIII: a disciplina (FOUCAULT, 1982, p. 36). Ela não
nasce nesse período, mas sim, torna-se “fórmulas gerais de dominação”
a partir de então (REVEL, 2005, p. 35). Para o pensador francês:
Disciplina é, no fundo, o mecanismo de poder pelo qual
chegamos a controlar no corpo social até os elementos
mais tênues pelos quais chegamos a atingir os próprios
átomos sociais, isto é, os indivíduos. Técnicos de
individualização do poder. Como vigiar alguém, como
controlar sua conduta, seu comportamento, suas aptidões,
como intensificar seu rendimento, como multiplicar suas
capacidades, como colocá-lo no ponto em que ele será
395
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
mais útil, isto é o que é, a meu ver, a disciplina”
(FOUCAULT, 1982, p. 36).
Essa tecnologia disciplinar é muito aplicada na educação onde “os
indivíduos são individualizados dentro da multiplicidade” (FOUCAULT,
1982, p. 36). Colocados em filas, o professor tem a possibilidade de
observá-los um a um e ver se estão presentes, o que estão fazendo, se
demonstram desinteresse pela aula (FOUCAULT, 1982, p. 37).
No ensino da dança de salão, muito dessa disposição comentada
acima é utilizada. O professor demonstra um passo na frente do espelho
(quando há um) e os alunos atrás se posicionam para “imitá-lo”. Não é
necessário nem pedir para se organizarem, pois, a disciplina recebida no
Instituto Educacional parece já estar incorporada, de maneira
inconsciente, e a disposição dos seus lugares assemelha-se com a da sala
de aula, os alunos formam fileiras de maneira que todos consigam
enxergar o professor, mesmo sabendo que todos eles estão sendo
observados.
O professor de dança de salão mantém o mesmo modelo de
observação dos tempos da escola com um acréscimo: o deslocamento
constante para analisar a execução dos passos dos alunos e fazer
possíveis correções. E é a partir dessa vigia que o aluno busca um
controle maior do movimento, perdendo sua espontaneidade provocadapela vigilância e fazendo com que sua mensagem corporal não seja
disposta em sua totalidade.
Por isso, é importante para o professor a observação não somente
do gesto executado, mas também de sua interrupção.
Talvez isso seja o que tem de mais importante: a dança é
o que, além da mostração dos movimentos ou da
396
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
prontidão em seus desenhos exteriores, revela a força de
sua retenção. Certamente, só se mostrará essa força no
próprio movimento, mas o que conta é a legibilidade
poderosa da retenção (BADIOU, 2002, p. 80).
Isso significa que a dança vai produzir significado não somente
com os gestos executados, mas também através dos gestos não
realizados, bloqueados, imobilizados. A dança irá dialogar tanto no
movimento quanto na sua própria retenção.
O corpo na dança é um corpo atraente, sedutor e elegante. Muitas
vezes, é essa provocação corporal que faz com que outros corpos não se
ofereçam à prática da melhor maneira possível e, dessa forma, os corpos
são controlados, evitando a expressão possível através da dança.
Da mesma forma que podemos perceber o exercício de poder do
professor perante o aluno, é possível também observar as relações de
poder entre os alunos. A tentativa de controle do corpo do parceiro
através de uma condução de força excessiva feita de maneira
dissimulada, a força utilizada na execução de um movimento por parte
dos homens como forma de mostrar virilidade são algumas das técnicas
de controle observadas nas aulas de dança.
5. A DANÇA DE SALÃO NOS DIAS DE HOJE E ALÉM
A dança chega aos dias atuais em um contexto de exploração
capitalista. A revolta do corpo, sobretudo sexual, enfrenta uma nova
forma de repressão: ao invés do “controle-repressão”, nos deparamos
com o “controle-estimulação”. Estimula-se a ficar nu, ser magro, bonito
e bronzeado (FOUCAULT, 1998, p. 147). Padrões são impostos à
sociedade, sendo reforçados pelos meios de comunicação. 
397
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
Os avanços da Internet deslocam as relações entre os corpos em
outro patamar. Muito embora Pierre Levy acredite que a comunicação
por meio de computadores substitua os encontros físicos (LEVY, 1999,
p. 128), a influência dessas novas práticas é notória. Alguns autores,
como David Le Breton, vão mais além e já preveem uma sociedade
incorpórea. Em sua obra Adeus ao Corpo, o autor traz uma nova forma
de se pensar o corpo em uma sociedade tecnologicamente avançada
mostrando até certa repulsa à carne. Esse desprezo ao corpo não é
novidade, visto sua aplicabilidade desde as ideias platônicas, mas o que
impressiona é a repugnância que o corpo parece causar.
Em meio à liberdade tanto corpórea como das convenções sociais
proporcionada pelo ciberespaço, a dança poderia perder seu espaço no
futuro. Não haveria mais a preocupação com a vigilância e controle dos
alunos, mas sim, com a “presença corpórea” deles. Não se trataria mais
de o professor tentar controlar o comportamento de um corpo em sua
aula, mas sim, de fazer com que o aluno esteja presente em sua aula de
corpo e alma, além de manter pleno interesse na valorização de trocas
de experiência entre seres humanos por meio da dança de salão.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vimos que, pela ótica Ocidental, costumamos pensar a relação
corpo/mente através de uma perspectiva dualista que remonta aos
tempos de Platão. Esse pensamento atravessou a Idade Média e, ao
chegar no século XVII, com René Descartes, alcançou o seu apogeu,
sendo influente até os dias atuais. Tal visão levou ao desenvolvimento
de técnicas de controle e vigilância dos corpos, tidos como inferiores à
mente.
398
EIXO III | LINGUAGEM, REPRESENTAÇÃO E EDUCAÇÃO
A idealização de um modelo de construção voltado à vigilância
(panóptico) foi deveras influente na sociedade ocidental e pode ser visto,
atualmente, devido aos avanços tecnológicos, nas mais diversas formas:
das câmeras de segurança a canetas espiãs. A sujeição provocada pelo
modelo de vigilância se desfez do uso da força física para criar uma
vigilância de maior efeito nas pessoas, produzindo corpos disciplinados.
A dança de salão encontra, nesse contexto capitalista e de
evolução tecnológica, uma dificuldade das práticas de controle e
vigilância exercidas nas salas de aula frente às permissões concedidas
no ciberespaço. As facilidades das mudanças identitárias, as relações
afetivas virtuais e, consequentemente, um menor convívio presencial
entre indivíduos parecem afetar consideravelmente as propostas de
ensino da dança de salão.
Acredita-se que a dança de salão possui um papel de extrema
relevância nas práticas das relações sociais “de corpo presente” e pode
ser usado como um instrumento de auxílio para a tentativa de
harmonização de dois corpos. Corpos esses de experiências e objetivos
diferentes, silenciados vigiados e controlados pelas normas sociais, mas
que podem buscar novas formas de relacionamento através da dança.
7. REFERÊNCIAS
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CHARTIER, Roger. (Orgs.). História da vida privada 3: Da 
Renascença ao Século das Luzes. Tradução: Hildegard Feist. São Paulo: 
Companhia de Bolso, 2009. p. 9-25.
BADIOU, Alain. A dança como metáfora do pensamento. In: ______. 
Pequeno manual de inestética. Tradução: Marina Appenzeller. São 
Paulo: Estação Liberdade, 2002. p. 79-96.
399
II SEMINÁRIO INTERNACIONAL MICHEL FOUCAULT – CINQUENTENÁRIO DE AS PALAVRAS E AS COISAS
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. 
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discursiva. Revista Eletrônica de Estudos do Discurso e do Corpo, 
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Rio de Janeiro: Graal, 1998.
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Petrópolis: Vozes, 1999.
GRANGEIRO, M. Ai, pisaram no meu pé. São Paulo: Scortecci, 2014.
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LÉVY, P. Cibercultura. Tradução: Carlos Irineu da Costa. São Paulo: 
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PERROT, Michelle. O Inspetor Bentham. In: TADEU, Tomaz. O 
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401

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