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RAIVA HUMANA Valéria Piveta Raiva humana A raiva é uma antropozoonose transmitida ao homem pela inoculação do vírus presente na saliva e secreções do animal infectado, principalmente pela mordedura. Encefalite viral aguda. Apresenta letalidade de aproximadamente 100% e alto custo na assistência preventiva às pessoas expostas ao risco de adoecer e morrer. Apesar de ser conhecida desde a antiguidade, continua sendo um problema de saúde publica. Antropozoonose: doença primária de animais e que pode ser transmitida aos humanos 2 Raiva humana Todos os mamíferos são considerados fontes de infecção para o vírus da raiva e, portanto, podem transmiti-lo ao homem. Cães, gatos, morcegos, cachorros do mato, saguis, raposas, bovinos, equinos, suínos, caprinos, dentre outros. Lyssavirus Neurotrópico e sua ação no SNC causa quadro clínico característico de encefalomielite aguda, decorrente da sua replicação viral nos neurônios. Pertence ao genero Lyssavirus, da família Rhabdoviridae, possui a forma de projétil e seu genoma é constituído por RNA. Notificação Conforme portaria do Ministério da Saúde No 5, de 21 de fevereiro de 2006, todo caso humano suspeito de raiva é de notificação individual, compulsória e imediata à Secretaria de Vigilância em Saúde. Ficha de atendimento anti rábico (mostrar) Transmissão Transmissão O vírus contido na saliva e secreções do animal infectado penetra no tecido, principalmente através de mordedura e, mais raramente, pela arranhadura e lambedura de mucosas e/ou pele lesionada. Em seguida, multiplica-se no ponto de inoculação, atinge o SNP e migra para o SNC protegido pela camada de mielina. Não há viremia. A partir do SNC, dissemina-se para vários órgãos e glândulas salivares, onde também se replica e é eliminado na saliva das pessoas ou animais infectados. Fases da doença Período de incubação: variável, 1 mês a 1 ano; a maioria dos casos ocorre de 2 semanas a 3 meses após a agressão. Pródromos: duração de 2 a 4 dias, inespecíficos: mal-estar geral, pequeno aumento de tpt, anorexia, cefaleia, náuseas, dor de garganta, entorpecimento, irritabilidade, inquietude e sensação de angústia. Podem ocorrer hiperestesia e parestesia no trajeto de nervos periféricos, próximos ao local da mordedura, e alterações de comportamento. Periodo de incubação: 10 a 60 dias no animal 9 Fases da doença Fase neurológica: deve ser identificada de acordo com as duas apresentações clássicas da doença –forma furiosa (relacionada principalmente a vírus transmitidos por canídeos) e forma paralítica (associada, na maioria dos casos, a vírus transmitidos por morcegos). Forma furiosa: manifestações de ansiedade e hiperexcitabilidade crescentes, febre, delírios, espasmos musculares involuntários, generalizados e/ou convulsões. Espasmos dos músculos da laringe, faringe e língua ocorrem quando o paciente tem hidrofobia, apresentando concomitantemente sialorréia intensa, disfagia, aerofobia, hiperacusia, fotofobia. Fases da doença Forma paralítica: ocorre parestesia, dor e prurido no local da mordedura, evoluindo com paralisia muscular flácida precoce. Em geral, a sensibilidade é preservada. A febre também é marcante, geralmente elevada e intermitente. O quadro de paralisia leva a alterações cardiorrespiratórias, retenção urinária, obstipação intestinal; embora se observem espasmos musculares, não se percebe claramente a hidrofobia, e a consciência é preservada na maioria dos casos. A disautonomia (bradicardia, bradiarritmia, taquicardia, taquiarritmia, hipo ou hipertensão arterial) e a insuficiência respiratória são as principais causas de morte, podendo ocorrer nas duas formas. Sem suporte cardiorrespiratório, o paciente evolui à óbito entre 5 e 7 dias na forma furiosa e até 14 dias na forma paralítica. Conduta Limpeza do ferimento com água corrente abundante e sabão ou outro detergente, pois essa conduta diminui, comprovadamente, o risco de infeccção. É preciso que seja realizada o mais rápido possível após a agressão e repetida na unidade de saúde, independentemente do tempo transcorrido. A limpeza deve ser cuidadosa, visando eliminar as sujidades sem agravar o ferimento, e, em seguida, devem ser utilizados antissépticos que inativem o vírus da raiva, como o PVPI, povidine e clorexidina ou alcool-iodado. CONDUTA Nas seguintes consultas, devem-se realizar cuidados gerais orientados pelo profissional de saúde, de acordo com a avaliação da lesão. Deve-se fazer anamnese completa, utilizando-se a Ficha de Atendimento Antirrabico Humano, visando a indicação correta da profilaxia da raiva humana. As exposições (mordeduras, arranhaduras, lambeduras e contatos indiretos) devem ser avaliadas de acordo com as características do ferimento e do animal envolvido para fins de conduta de esquema profilático. Características do ferimento 1. Local: regiões próximas ao SNC (cabeça, face ou pescoço) ou em locais muito inervados (mãos, polpas digitais e planta dos pés) são graves, porque facilitam a exposição do SN ao vírus. A lambedura de mucosas é considerada grave. 2. Profundidade: Superficiais (sem presença de sangramento) ou Profundos (apresentam sangramento, ultrapassam a derme). Os ferimentos profundos, além de aumentar o risco de exposição do SN, oferecem dificuldades à assepsia. Os ferimentos puntiformes são considerados como profundos, mesmo que não apresentem sangramento. 3. Extensão e número de lesões: deve-se observar a extensão da lesão e se ocorreu apenas uma única lesão ou múltiplas (uma porta de entrada ou várias). Classificação do ferimento ACIDENTES LEVES 1. Ferimentos superficiais, pouco extensos, geralmente únicos, em tronco e membros (exceto mãos, polpas digitais e planta dos pés); podem acontecer em decorrência de mordeduras ou arranhaduras causadas por unha ou dente. 2. Lambedura de pele com lesões superficiais. ACIDENTES GRAVES 1. Ferimentos na cabeça, face, pescoço, mão, polpa digital e/ou planta do pé. 2. Ferimentos profundos, múltiplos ou extensos, em qualquer região do corpo. 3. Lambedura de mucosas. 4. Lambedura de pele onde já existe lesão grave. 5. Ferimento profundo causado por unha de animais. 6. Qualquer ferimento por morcego. Características do animal Cão e gato O estado de saúde do animal no momento da agressão: avaliar se o animal estava sadio ou se apresentava sinais sugestivos de raiva. A maneira como ocorreu o acidente pode fornecer informações sobre seu estado de saúde. Agressão espontânea (sem causa aparente). A possibilidade de observação do animal por 10 dias: se o animal estiver sadio no momento do acidente, é mantido em observação por 10 dias. Nos cães e gatos, o período de incubação da doença: cerca de 60 dias. A excreção de vírus pela saliva,ocorre a partir do final do período de incubação, variando entre 2-5 dias antes do aparecimento dos sinais clínicos, persistindo até sua morte, que ocorre em até 5 dias apos o inicio dos sintomas. A procedência do animal: é necessário saber se a região de procedência do animal é área de raiva controlada ou não controlada. Os hábitos de vida do animal: o animal deve ser classificado como domiciliado (baixo risco) ou não domiciliado (alto risco). Características do animal 2. Animais silvestres Animais silvestres como morcego de qualquer espécie devem ser classificados como animais de risco, mesmo que domiciliados e/ou domesticados, pois nesses animais a raiva não é bem conhecida. Esquema profilaxia (mostrar) Imunobiológicos Vacina humana de cultivo celular: Potentes e seguras Produzidas em cultura de células e apresentadas sob a forma liofilizada, acompanhadas de diluente. Conservação em geladeira, fora do congelador, na temperatura entre + 2°C e + 8°C, até o momento de sua aplicação. Esquema vacinal: 0, 3, 7, 14 e 28 A potencia mínima das vacinas é 2,5 UI/dose. Manifestações: dor, prurido, edema, enduração e urticária, febre, mal-estar, cefaléia, náuseas, dor abdominal, dores musculares. Imunobiológicos IM: dose 0,5 ml e 1 ml, dependendo do fabricante. A dose indicada pelo fabricante não depende da idade ou do peso do paciente. A aplicação IM deve ser profunda, na região do deltóide ou vasto lateral da coxa. Em cças até 2 anos de idade é indicado o vasto lateral da coxa. ID: dose 0,1 ml. Deve ser aplicada em locais de drenagem linfática, geralmente nos braços, na inserção do deltóide. A vacina não deve ser aplicada na região glútea. Não tem contraindicação Imunobiológicos Soro heterólogo: Solução concentrada e purificada de anticorpos, preparada em equídeos imunizados contra o vírus da raiva. Iniciar antes da 3ª dose da vacina Conservação em geladeira, entre +2°C e +8°C A dose indicada é de 40 UI/kg de peso do paciente. Deve-se infiltrar na(s) lesão(ões) a maior quantidade possível da dose do soro. Imunobiológicos Quando as lesões forem muito extensas ou múltiplas, a dose pode ser diluída, o menos possível, em SF, para que todas as lesões sejam infiltradas. Caso a região anatômica não permita a infiltração de toda a dose, a quantidade restante, a menor possível, deve ser aplicada por via intramuscular, na região glútea. O uso do soro não é necessário quando o paciente recebeu esquema profilático completo. No entanto, em situações especiais, como no caso de pacientes imunodeprimidos ou de duvidas com relação ao esquema profilático anterior, se houver indicação, o soro deve ser recomendado. Imunobiológicos Manifestações locais: dor, edema, hiperemia, abscesso, urticária, tremores, tosse, náuseas, dor abdominal, prurido e rubor facial. Antes da administração do soro heterólogo, aconselha-se sempre a seguinte rotina, para qualquer paciente: 1. Garantir bom acesso venoso, mantendo-o com SF a 0,9%. 2. Dentro das possibilidades, é conveniente deixar preparado: a) laringoscópio com laminas e tubos traqueais; b) frasco de SF e/ou RL e solução aquosa de adrenalina e de aminofilina. Após receber o soro, o paciente deverá ser observado pelo prazo de 2 horas. Imunobiológicos Imunoglobulina humana hiperimune antirrábica – soro homólogo: Solução concentrada e purificada de anticorpos, preparada a partir de hemoderivados de indivíduos imunizados com antígeno rábico. Mais seguro que o soro antirrábico, porém de produção limitada, de baixa disponibilidade e alto custo. Diagnóstico Laboratorial Deve ser considerado em pacientes que apresentam encefalopatia de causa desconhecida. Imunofluorescência direta – IFD: aplicado em amostras de saliva (esfregaço), impressão de córnea (Cornea-test) ou raspado de mucosa lingual, e isolamento viral em camundongo – IVC ou cultivo celular – IVCC de amostra de saliva. Os resultados laboratoriais serão emitidos em até 72 horas após o recebimento das amostras. Conduta antes de ter o diagnóstico confirmado laboratorialmente Conduzir todo paciente com suspeita clinicoepidemiológica de raiva humana no serviço de referência do estado para tratamento de raiva e em ambiente de UTI. Colocar o paciente em isolamento de contato, usando equipamento de proteção individual adequado (avental de manga longa, máscara, luvas e óculos). Providenciar precocemente acesso venoso central, sondagem vesical de demora e sondagem nasoenteral. Dieta: hipercalórica e hiperproteica. Iniciar o mais precocemente, por via enteral quando possível. Conduta antes de ter o diagnóstico confirmado laboratorialmente Manter paciente normovolêmico usando soluções isotônicas. Intubação traqueal: seguir as indicações clássicas; ressaltar a necessidade de vigilância quanto à possível hipersalivação. Suporte ventilatório: oxigenação, normoventilação e proteção pulmonar. Sedação para adaptação à ventilação mecânica: Midazolan e Fentanil. Nimodipina – 60mg via enteral de 4h/4h. Vitamina C – 1g IV ao dia. Profilaxia para TVP e de hemorragia digestiva alta: Ranitidina. Conduta antes de ter o diagnóstico confirmado laboratorialmente Redução do risco de lesão neurológica secundária: a. Cabeceira elevada a 30° com cabeça centralizada em relação ao tronco. b. PAM ³ 80mmHg. c. PVC = 8-12mmHg (10-14mmHg quando em ventilação mecânica). d. Saturação periférica de oxigênio (oximetria / SpO2) ³ 94%. e. PaCO2 = 35-40mmHg; não fazer hiperventilação. f. Pressão de platô das vias aéreas < 30cmH2O (proteção pulmonar). g. Hemoglobina ³ 10g%. h. Natremia (Na+) = 140-150mEq/L. i. Glicemia = 70-110mg%; em adultos iniciar infusão venosa contínua de insulina quando Glicemia >180mg%, conforme protocolo próprio. j. Manter diurese >0,5ml/kg/h com adequada hidratação; evitar uso de diuréticos. k. Aferir temperatura central (esofágica, retal ou timpânica) e manter entre 350C e 37°C com: controle da temperatura ambiental, drogas e resfriamento superficial. Conduta após confirmação laboratorial Manter todas as condutas descritas anteriormente e acrescentar as relacionadas a seguir. Amantadina – 100mg via enteral de 12h/12h; Biopterina – 2mg/kg via enteral de 8h/8h (disponível no Ministério da Saúde). Sedação profunda: a. Deve-se usar: Midazolan (1mg/kg/h a 2mg/kg/h) associado a Ketamina (2mg/kg/h) – suspender Fentanil se estiver em uso. b. As doses descritas no item anterior não devem ser muito aumentadas; caso seja necessário, para otimizar a sedação, associar Fentanil. c. Evitar o uso de barbitúricos e propofol. d. Monitorar com escala de sedação Não existe tratamento! Monitorização 1. Contínua: • ECG; • Oximetria de pulso; • Capnografia (quando em ventilação mecânica); • PAM (se instabilidade hemodinâmica); •Escala de sedação BIS ou EEG; • Temperatura central (quando monitor disponível). 2. Intermitente: • PA (PNI) de 2h/2h; • PVC de 4h/4h; • glicemia capilar de 4h/4h; • diurese de 4h/4h; • balanço hídrico de 12h/12h; • temperatura central de 2h/2h (se não puder ser contínua); • densidade urinária de 4h/4h; e • dosagem sérica de Na+ 2x ao dia. Exames sequenciais Sódio – dosagem sérica 2x/dia Gasometria arterial – para monitoração de PaO2 e PaCO2; quantas vezes for necessário. Magnésio – dosagem sérica diária pelo risco de estar reduzida em associação ao vasoespasmo cerebral. Zinco – dosagem sérica semanal. T4 livre e TSH ultrassensível – dosagem semanal. LCR para dosagem de biopterina (Bh4) Soro para dosagem de anticorpos. Saliva e folículo piloso e LCR para realização de RT-PCR Doppler transcraniano – DTC Ressonância nuclear magnética de encéfalo – RNM TC Complicações Hipernatremia (Na+ >155mEq/l) Hiponatremia (Na+ <140mEq/l) Hipertensao Intracraniana – HIC* Vasoespasmo Cerebral – VEC* Convulsões* Infecções Mimetização de morte enfefálica Morte encefálica *velocidade de fluxo elevada em artéria cerebral média (circulação anterior) e em artéria vertebral (circulação posterior) Medidas assistenciais de enfermagem c Acabou... Obrigada!
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