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Autor: Prof. Lair da Silva Loureiro Filho Colaboradores: Prof. Flávio Celso Müller Martin Prof. Fábio Gomes da Silva Profa. Angélica Lúcia Carlini Instituições de Direito Professor conteudista: Lair da Silva Loureiro Filho Lair da Silva Loureiro Filho, natural da cidade de Santos/SP, é bacharel em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo – FFLCH/USP (1985), bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – FD/USP (1992), Especialista em Direito Constitucional pela Samford University – AL/EUA (1994), Mestre em Direito do Estado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – FD/ USP (2002) e Doutorando em Direito pela mesma Instituição. É Professor Universitário desde 1987 e atua como Professor e Coordenador Auxiliar do Curso de direito da Universidade Paulista – UNIP, Campus Norte. Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP, é autor de inúmeros livros (Notas e registros públicos, 4ª ed., ed. Saraiva; Responsabilidade pública por atividade judiciária, ed. Revista dos Tribunais; Guia do concurso público, ed. Saraiva; Introdução ao Direito, ed. Del Rey, entre outros) e artigos jurídicos. © Todos os Direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) L892i Loureiro Filho, Lair da Silva Instituições de direito / Lair da Silva Loureiro Filho. – São Paulo: Editora Sol, 2013. 172 p., il. Notas: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XIX, n. 2-003/13, ISSN 1517-9230. 1. Direito. 2. Instituições. 3. Contratos. I. Título. CDU 342 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Cid Santos Gesteira (UFBA) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Virgínia Bilatto Cristina Zordan Sumário Instituições do Direito APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8 Unidade I 1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ..............................................................................................................................9 1.1 Conceito de Direito .................................................................................................................................9 1.2 Origem e finalidade do Direito ....................................................................................................... 10 1.3 Direito objetivo e Direito subjetivo ............................................................................................... 12 1.4 Direito e moral ....................................................................................................................................... 14 1.5 Ramos do Direito .................................................................................................................................. 16 1.6 Fontes do Direito .................................................................................................................................. 18 1.7 Lei escrita ................................................................................................................................................. 21 1.8 Do processo legislativo ...................................................................................................................... 24 2 DIREITO CONSTITUCIONAL........................................................................................................................... 26 2.1 Noções introdutórias .......................................................................................................................... 26 2.1.1 Conceito...................................................................................................................................................... 26 2.1.2 Constituição .............................................................................................................................................. 26 2.1.3 Poder Constituinte ................................................................................................................................. 27 2.1.4 Espécies de Constituição e de normas constitucionais ........................................................... 29 2.1.5 Controle de constitucionalidade das Leis ..................................................................................... 30 2.2 Da organização nacional ................................................................................................................... 32 2.2.1 Do Estado federado ................................................................................................................................ 32 3 DA SEPARAÇÃO DOS PODERES ................................................................................................................. 36 3.1 Poder Executivo (CF, arts. 76 a 91) ................................................................................................ 37 3.2 Poder Legislativo (CF, arts. 44 a 75) .............................................................................................. 41 3.3 Poder Judiciário (CF, arts. 92 a 126) .............................................................................................. 45 4 DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS ..................................................................... 55 4.1 Gerações dos Direitos Fundamentais ........................................................................................... 55 4.2 Direitos e garantias individuais e coletivos (CF, 5º) ................................................................ 59 4.2 Da nacionalidade (CF, arts. 12 e 13).............................................................................................. 74 4.4 Dos direitos políticos (CF, arts. 14 a 16) ...................................................................................... 76 Unidade II 5 DIREITO CIVIL .................................................................................................................................................... 83 5.1 Da validade dos negócios jurídicos ............................................................................................... 83 5.1.1 Conceitos e requisitos ........................................................................................................................... 83 5.1.2 Dos defeitos do negócio jurídico ...................................................................................................... 85 5.2 Responsabilidade civil e ato ilícito (CC, arts. 186 a 188 e 927 a 954) ............................ 89 5.2.1 Conceito e requisitos............................................................................................................................. 89 5.2.2 Responsabilidade objetiva e subjetiva ........................................................................................... 90 5.2.3 Responsabilidade penal ........................................................................................................................ 92 5.2.4 Reparação do dano ................................................................................................................................ 92 6 CONTRATOS ....................................................................................................................................................... 95 6.1 Conceito e requisitos .......................................................................................................................... 95 6.2 Princípios contratuais ......................................................................................................................... 96 6.3 Fases da formação dos contratos (CC, arts. 427 a 435) ....................................................... 97 6.4 Classificação dos contratos .............................................................................................................. 99 6.5 Pagamento, pagamento indireto e inadimplemento ..........................................................101 6.6 Garantias contratuais .......................................................................................................................106 6.7 Extinção dos contratos (CC, arts. 472 a 480) ..........................................................................107 6.8 Confissão de dívida ............................................................................................................................108 7 DIREITO DO CONSUMIDOR........................................................................................................................109 7.1 Relação de consumo .........................................................................................................................109 7.2 A política nacional das relações de consumo (CDC, arts. 4º e 5º)...................................111 7.3 Diretos básicos do consumidor (CDC, arts. 6º e 7º) ..............................................................112 7.4 Práticas comerciais (CDC, arts. 29 a 45) ....................................................................................117 7.5 Proteção contratual (CDC, arts. 46 a 54) ..................................................................................119 8 DIREITO ADMINISTRATIVO .........................................................................................................................120 8.1 Conceitos fundamentais e estrutura da administração pública .....................................120 8.1.1 Conceitos ................................................................................................................................................. 120 8.1.2 Estrutura ...................................................................................................................................................121 8.1.3 Princípios fundamentais ................................................................................................................... 125 8.1.4 Deveres e poderes da administração ........................................................................................... 126 8.2 Ato administrativo .............................................................................................................................130 8.2.1 Requisitos e atributos ........................................................................................................................ 130 8.2.2 Classificação e espécies (MEDAUAR, 2009, pp. 145-151) ....................................................131 8.2.3 Controle dos atos administrativos ................................................................................................ 134 8.3 Atos administrativos vinculados e discricionários ................................................................137 8.4 Contratos administrativos ..............................................................................................................138 8.5 Licitação .................................................................................................................................................142 8.5.1 Disposições gerais ................................................................................................................................ 142 8.5.2 Princípios (art. 3º) ................................................................................................................................ 142 8.5.3 Fases .......................................................................................................................................................... 142 8.5.4 Modalidades licitatórias .................................................................................................................... 143 8.5.5 Contratação direta .............................................................................................................................. 145 7 APRESENTAÇÃO A disciplina apresenta uma introdução ao Direito, permeando os diversos ramos, como Direito Constitucional, Direito Civil, Direito do Consumidor e Direito Administrativo de forma a demonstrar que as organizações e os cidadãos estão inseridos em um sistema normativo que deve ser respeitado, constituindo-se uma ameaça e ao mesmo tempo uma oportunidade. Objetivos gerais: • proporcionar aos alunos conhecimentos indispensáveis sobre os vários institutos jurídicos do Direito Público e do Direito Privado, de modo a compreender o Estado de Direito, o comportamento de cidadão e despertar o espírito de pesquisa; • conhecimento/compreensão das principais áreas do Direito e seus respectivos enfoques dentro da sociedade e da organização; • percepção do Direito como parte do ambiente organizacional e, portanto, como fator de ameaças e oportunidades. O administrador do futuro deve preocupar-se com os ambientes internos e externos, contribuindo para o desenvolvimento da organização e da sociedade na qual está inserida, em absoluta sintonia com o Estado. Acrescenta-se a isso o fato de que, por meio das estratégias de trabalho e de avaliação, os alunos deverão ter a oportunidade de desenvolver as seguintes competências: • compreender que a organização está inserida dentro de uma sociedade, com um conjunto de regras que devem ser respeitadas; • identificar oportunidades com o conhecimento do ordenamento jurídico. As oportunidades aqui mencionadas devem sempre respeitar os aspectos éticos e legais; • senso crítico e capacidade de contextualização; • trabalho em equipe; • comunicação e expressão; • desenvolvimento pessoal; • capacidade de identificar, analisar e solucionar problemas. Objetivos específicos Espera-se que o aluno compreenda a relação do Direito com a Administração na empresa e nas relações sociais, respeitando os preceitos éticos e legais. Com o conhecimento apreendido, deverá identificar oportunidades para a organização. 8 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 O aluno deve compreender que as organizações têm de submeter-se a uma série de normas legais e saber como identificá-las quando necessário. Esperamos proporcionar aos alunos condições para perceber a presença do Direito em todas as manifestações do homem na sociedade, principalmente na vida profissional do administrador. INTRODUÇÃO A disciplina Instituições do Direito tem por escopo possibilitar ao aluno do curso de Administração a compreensão dos elementosfundamentais do sistema normativo de um país, o domínio de conceitos fundamentais da ciência jurídica e a percepção da diversidade de sistemas normativos construídos pela sociedade contemporânea, que é imprescindível a todo e qualquer cidadão. Por meio desta disciplina, o aluno irá perceber que, no âmbito de sua vida privada regulamentada pelo Direito Civil, no exercício da cidadania assegurada no texto constitucional, ou ainda no trato com a Administração Pública, o Direito está sempre presente em todos os aspectos da vida social, induzindo ou coibindo condutas, pois onde está a sociedade, está o Direito. O aluno terá a possibilidade de otimizar potencialidades e reduzir custos, mormente considerados os entraves e gargalos do chamado custo Brasil, pois se exige que o administrador domine as características de um sistema normativo complexo e em constante transformação. Nesta quadra o curso oferece ao aluno: a principiologia exposta no título Instituições do Direito; os elementos estruturais do Estado Brasileiro plasmados no texto constitucional, acompanhado do arcabouço que assegura o exercício dos Direitos Fundamentais; os atributos e requisitos que normatizam a atividade contratual privada prevista no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor; o delineamento dos limites da atuação da Administração Pública, seja coibindo ou regulamentando a atuação privada por meio do exercício do poder de polícia, ou fomentando e estimulando atividade econômica por intermédio de sua atuação contratual. 9 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO Unidade I 1 INTRODUÇÃO AO DIREITO 1.1 Conceito de Direito A palavra Direito vem do latim directum, que corresponde à ideia de regra, direção, sem desvio, em alemão recht, em italiano diritto, em francês droit, em espanhol derecho, tendo em todas essas línguas o mesmo sentido. Os romanos denominavam-no de jus, diverso de justitia, que corresponde ao nosso sentido de justiça, ou seja, qualidade do Direito. Para o Professor Miguel Reale (2002, p. 10): O Direito é Lei e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros. Assim sendo, quem age de conformidade com essas regras comporta-se Direito; quem não o faz, age torto. O Direito é uma ciência cultural normativa de conteúdo ético, ou seja, de conteúdo normativo; é também um subsistema de controle social dotado de eficácia sancionatória plena. Distinção terminológica relevante é estabelecida pela dicotomia Direito positivo e Direito natural. Direito positivo é aquele criado, posto, positivado pelo Estado, decorrente da atuação de seus órgãos, do processo legislativo e da jurisprudência dos tribunais. Os romanos distinguiam o ius civile, direito do cidadão romano, dos jus gentium, Direito dos estrangeiros residentes no império romano. Depois, os distinguiram dos jus naturale, tendo por fonte a natureza. Esta dicotomia atingiu maior expressão no século XIX, conforme lembrado por Nader (2004, pp. 364-365): Durante o século XIX, o positivismo de inspiração comtiana alcançou ampla repercussão no âmbito do Direito, colocando-se em posição antagônica ao jusnaturalismo. A partir daí, estabeleceu-se a maior e definitiva cisão na área da Filosofia do Direito, porque, enquanto o jusnaturalismo preconizava outra ordem jurídica além da estabelecida pelo Estado, o positivismo reconhecia como Direito apenas o positivo. O Direito natural corresponde aos ideais de justiça presentes na sociedade, em todas as sociedades desde tempos imemoriais, como o ideal de liberdade, igualdade, respeito à vida e à dignidade humana. 10 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 Do ponto de vista filosófico, a existência de um Direito inerente à própria natureza do homem surge a partir dos séculos XVII e XVIII, fruto da laicização e racionalização (Descartes) ocorrida em países, em regra, não católicos, o que faz surgir o Direito criado pela razão. Defendem os jusnaturalistas (Grotius, Spinoza, Hobbes, Locke e Rousseau) que acima do Direito positivo e, portanto das Leis humanas, existe um Direito natural, isto é, um conjunto de normas e princípios válidos para todos os tempos e lugares, e que o Direito só é Direito se for compatível com o Direito natural, isto é, se for justo. Em contraposição, para os juspositivistas o Direito é apenas o Direito positivo, o ordenamento vigente e a qualificação de uma conduta como de acordo com o Direito independe de sua justiça ou injustiça. Lembrete Direito positivo é aquele legislado, criado pelo Estado, Direito natural é aquele inerente à própria natureza do homem, reconhecido pelo Estado. 1.2 Origem e finalidade do Direito A viabilidade da vida social está condicionada ao desenvolvimento de alguma ordem jurídica, com maior ou menor grau de positivação, mais ou menos vinculadas às manifestações religiosas ou costumeiras da rica e dinâmica vida social. Para evitar a luta de todos contra todos, a sociedade deverá lançar mão de um sistema de controle social, de maior ou menor complexidade, conforme o seu grau de heterogeneidade social e cultura, apresentado em determinado momento histórico. Saiba mais Conferir obra indispensável: RIBEIRO, D. Processo civilizatório. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. Assim, ao longo da história, foram desenvolvidos diversos subsistemas de caráter normativo: a família, a religião, a moral, a mídia, a economia e, enfim, o Direito. Todavia, desde os primórdios da civilização, a função normativa foi exercida enfeixando Direito, moral e religião em um único polo, um único centro emanador de poder e, portanto, de produção normativa. 11 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO Saiba mais A religião sempre exerceu papel de dominação social. No século XX, a cultura de massas passou a servir a esse propósito. Conferir: MORIN, E. Cultura de massas no século XX. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. 2 v. Como visto, para alcançar a mínima eficácia desejada, o Direito é o único dos subsistemas a utilizar a força estatal. O Estado é detentor do monopólio do uso da força, a força organizada, fruto da evolução histórica da sociedade que veda a justiça de mão própria, ou vendetta, salvo exceções previstas e detalhadamente regulamentadas pelo próprio Estado de Direito, como a legítima defesa e o estado de necessidade. O Direito é, portanto, subsistema de caráter normativo dotado de eficácia sancionatória plena e inafastável, que intervém de maneira efetiva ou potencial, direta e indiretamente em face do fato social, utilizando a força organizada e monopolizada no âmbito do Estado. Ademais, Direito é controle e defesa contra o controle, pois, como instrumento de controle, age de forma a utilizar o poder estatal a fim de evitar a anarquia e o caos, o estado natural caracterizado pela luta de todos contra todos, enfim, a ausência de poder. Enquanto instrumento de defesa contra o controle, limita o poder estatal, impondo-lhe normas e procedimentos, rigorosamente observáveis sob o prisma da legalidade estrita, a fim de evitar o excesso, o abuso de poder, a tirania. Saiba mais Sobre a origem do Estado Moderno e o contratualismo, verificar as obras: HOBES, T. O Leviatã. 2. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008. LOCKE, J. Segundo tratado sobre os Direitos civis. São Paulo: Martin Claret, 2002. MAQUIAVEL, N. O Príncipe. 18. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007. MONTESQUIEU,C. L. O espírito das Leis. São Paulo: Martin Claret, 2010. ROUSSEAU, J. J. Contrato social. Tradução de Paulo Neves. Porto Alegre: L & PM, 2007. 12 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 1.3 Direito objetivo e Direito subjetivo Direito objetivo, ou norma agendi, costuma ser associado à ideia de ordenamento jurídico, conforme preceitua Reale (2002, pp. 189-190): O Direito objetivo, como conjunto de normas e modelos jurídicos, – exatamente porque se destina a ter vigência e eficácia na universalidade de um território, – constitui, no seu todo, um sistema global que, através de um termo italiano já integrado em nossa língua, se denomina ordenamento jurídico. São características do ordenamento jurídico: a) universalidade, compreendida por meio do enunciado ubi societas, ibi jus, porquanto presente em todas as sociedades; b) unidade, pois toda e qualquer norma deverá estar em conformidade com um fundamento único, em regra a supremacia constitucional; c) coerência implica a impossibilidade da manutenção (e não existência) das chamadas antinomias, ou conflitos de Leis, pois não podem coexistir, em um mesmo tempo e sobre o mesmo espaço, dois ou mais comandos antagônicos; d) completude, ao prever o recurso à integração do Direito, ou o chamado fenômeno da colmatação de lacunas, toda vez que o juiz se deparar com omissão normativa, recorrendo a outras fontes do Direito, como a analogia, os costumes e os princípios gerais de Direito. Saiba mais Sobre ordenamento jurídico, vale conferir obra: BOBBIO, N. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. São Paulo: EDIPRO, 2011. O Direito anglo-americano coloca uma pá de cal na questão, designando o Direito objetivo como law e o subjetivo como right. No Direito brasileiro, a controvérsia acerca da exata compreensão do conteúdo e alcance da expressão Direito subjetivo, atravessou as últimas décadas como um dos temas mais controvertidos e debatidos pela doutrina. Ao Direito subjetivo, parte da doutrina atribui à natureza de mera facultas agendi, ou seja, faculdade de agir, de exercer Direitos, ou ainda o interesse juridicamente protegido enquanto atribui a alguém o poder de querer. 13 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO Saiba mais Sobre o conceito de Direito subjetivo: REALE, M. Lições preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. DINIZ, M. H. Compêndio de introdução ao estudo do Direito. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. Outra questão a ser debatida é a abrangência do Direito subjetivo, se pertinente a um indivíduo, a uma coletividade ou a toda a sociedade. Os Direitos individuais são aqueles em que, no polo ativo, é possível encontrar um único titular de determinada pretensão. Em relação aos Direitos individuais homogêneos, há que se ressaltar que os seus titulares, embora tenham identidade de causa em relação à origem de seus Direitos, apresenta-os a partir de manifestações qualitativas e quantitativas distintas. Os Direitos difusos são aqueles Direitos e interesses transindividuais indivisíveis, de que são titulares pessoas indeterminadas ligadas por uma situação de fato. São transindividuais porque transcendem a esfera subjetiva de um único titular, são de titularidade indeterminada por não ser possível quantificar ou nomear os seus titulares, são indivisíveis porque não há como identificar o grau de lesão sofrida por cada um. Seus titulares são ligados por uma situação de fato, pois não há uma relação jurídica de base preexistente à lesão que vincula de antemão os seus titulares, sendo um fenômeno do mundo fático a sua causa comum, como uma agressão ao meio ambiente, ao patrimônio histórico, paisagístico e cultural, economia popular etc. São defendidos precipuamente pelo Ministério Público, por meio da ação civil pública, entre outros instrumentos. Os Direitos coletivos são, da mesma forma que os difusos, transindividuais. Sua titularidade, contudo, pertence a pessoas determinadas, identificadas, nomeáveis e quantificáveis, ligadas por uma relação jurídica de base, havendo entre os seus titulares um vínculo anterior à lesão sofrida, como os membros de uma associação, partido, sindicato ou adquirentes de um determinado bem. São defendidos por entidades, associações, partidos ou sindicatos constituídos há pelo menos um ano e com legítimo interesse na causa, podendo também ocorrer a sua tutela por meio da atuação do Ministério Público, pela via do mandado de segurança coletivo ou da ação civil pública. Lembrete Não confunda: Direitos coletivos são aqueles de titularidade determinada, de uma coletividade ou categoria profissional; difusos são os Direitos de titularidade indeterminada, de toda a sociedade. 14 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 1.4 Direito e moral A ética é a ciência do comportamento humano, da conduta. Sob seu domínio, estão reunidos a moral, a religião e o Direito. A partir de premissas distintas, empregando metodologia e instrumental diversos, cada qual desses campos terá, no limite, afinidade teleológica, tendo em vista os fins desejados: regrar a conduta humana. No campo do Direito foi preciosa a vinculação da ética centrada neste, a partir de um diferencial: a definição do homem (ou pessoa), como paradigma. Por certo que o homem é o centro, a medida de todas as coisas, mas de que forma esse personalismo ético pode se manifestar na defesa dos Direitos subjetivos dos quais esse homem vem a ser titular? A partir da graduação dos Direitos subjetivos, podem ser estabelecidas três esferas distintas e interdependentes: a física, a moral e a patrimonial. Tem-se, assim, a visualização do espectro de posições subjetivas de que a pessoa é titular. Se o homem é a medida de todas as coisas e o Direito é uma ciência cultural, infere-se, portanto, ser ele a única medida possível do Direito. Este, por sua vez, deverá tutelar seus Direitos e interesses conforme a sua natureza jurídica. Observação O filósofo alemão Immanuel Kant representa o marco de maior expressão da doutrina do personalismo ético, que entende ser o homem o centro de todas as coisas. As diferenças entre Direito e moral, entretanto, são mais numerosas, apesar do Direito nascer da moral assim como o filho da mãe, mas, da mesma forma, adquire autonomia e vida própria. Na verdade, nem todas as condutas lícitas são moralmente aceitas e, inversamente, nem todas as condutas moralmente aceitas são lícitas. É certo que a grande zona comportamental está abrangida pelos dois, havendo, contudo, pontos incongruentes o que comprova a distinção aqui esboçada. Figura 1 – Algumas questões podem receber proteção jurídica embora sejam polêmicas sob o prisma moral 15 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO Podem-se visualizar as três situações distintas, a partir de dois círculos, um contendo o Direito e o outro a moral. Na primeira, a ordem jurídica estaria incluída totalmente no campo da moral, os dois círculos seriam concêntricos, com o maior pertencendo à moral. É o caso das sociedades primitivas ou estagnadas, as fundamentalistas religiosas, nas quais todo o Direito é regulamentado pela moral, não havendo espaço nem liberdade para a existência de diferenças. D = M. Na segunda situação, tem-se a separação total entre as duas esferas, o que dificilmente ocorrerá por muito tempo, pois o Direito precisa e deve ter fortebase na eficácia da moral social, sob pena de se tornar letra morta, ineficaz. Neste caso, tem-se a imposição de uma ordem jurídica estranha à vida social, o que poderia ocorrer durante a invasão ou a anexação de um Estado por outro, de culturas distintas ou, até mesmo, antagônicas: D ≠ M. A terceira visão estabelece uma grande zona coincidente entre Direito e moral, reservando, contudo, espaços próprios para cada campo ético. Flexibiliza-se, assim, a vida social, respeitando as diferenças e possibilitando a sua evolução. É a sociedade tolerante, plural, contemporânea e democrática. Nesse diapasão, emerge o Direito como o mínimo de moral, o denominador comum, o ponto de intersecção necessário entre as diversas morais individuais, o núcleo mínimo de condutas obrigatórias sem ao qual a sociedade não subsiste: D ~= M. Observação O Direito nasce da moral como o filho nasce da mãe, adquirindo autonomia. Não são iguais, tampouco diferentes, apenas semelhantes. O Direito é igual para todos, pois o mesmo ordenamento jurídico vincula todo um Estado, independentemente do padrão moral de cada pessoa. Ressalvas, contudo, são feitas por Lei, levando-se em conta a idade, a capacidade e o tirocínio, bem como outros aspectos. A moral, contudo, é relativa, variando de pessoa para pessoa, construindo padrões que vão do mais conservador ao mais liberal. Varia de acordo com a idade, religião, classe social, origem, procedência, grau de instrução e outros fatores. A moral não é igual para todos. A sanção jurídica é predeterminada, específica, tipificada e racional, resultante do longo processo evolutivo do Direito positivo. Varia da multa à prestação de serviços, da restrição de Direitos à privativa de liberdade, da prisão perpétua à pena de morte. Contudo, sempre predeterminada, possibilitando ao infrator ou à sociedade em geral o seu conhecimento de antemão, prévio, percebendo quais serão as consequências de sua violação. Ao contrário, a sanção moral é indeterminada, imprecisa, sendo impossível prever a sua intensidade e natureza antes de seu descumprimento. Pode variar da negação do afeto ao desapreço, da ruptura de uma amizade à agressão física, da vaia ao linchamento. A assistência material que os pais devem prestar aos filhos necessitados ou a cessão de assento na condução para pessoa idosa são matérias reguladas pelo Direito e com base na moral. 16 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 Há assuntos de alçada exclusiva da moral, como o pagamento de dívida prescrita, a atitude de gratidão a um benfeitor ou a cessão de assento no transporte público a uma jovem carregada de sacolas. De igual modo, há problemas jurídicos estranhos à ordem moral, como, por exemplo, a divisão de competência entre um Tribunal Regional Federal e um Tribunal de Justiça Estadual. Há ainda condutas antijurídicas toleradas pela moral como avançar semáforo fechado durante a madrugada em via de fluxo pouco intenso. Saiba mais Sobre a evolução da sanção: BECCARIA, C. Dos delitos e das penas. 5. ed. São Paulo: WM Martins Fontes, 2005. FOUCAULT, M. Vigiar e punir. 36. ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 2007. 1.5 Ramos do Direito O Direito privado precede o Direito público. O Direito romano consagra essa afirmação, ao consolidar os fundamentos do Direito privado contemporâneo, especialmente do Direito Civil. As relações de Direito privado possuem estabilidade maior do que aquelas encontradas no Direito público, porque são menos suscetíveis de variações políticas, remanescendo viáveis ainda que em ambientes e contextos autoritários, o que por certo não ocorre com o Direito público. Observação No transcorrer do século XX o país teve sete Constituições na vigência de um único Código Civil. As relações jurídicas características do Direito privado apresentam perfil horizontal, pois tendem ao equilíbrio. São, portanto, relações de coordenação. Vigora, no âmbito do Direito privado, o princípio da liberdade das formas, da autonomia da vontade das partes, da disponibilidade jurídica, observadas as devidas exceções. Sob o vasto campo, ao Direito privado é lícito fazer tudo aquilo que não seja vedado por Lei, desde que seja o agente capaz, o objeto lícito e a forma prescrita ou não de defesa em Lei. Como principal ramo do Direito privado encontra-se o Direito Civil congregando as vastas áreas das obrigações contratuais e extracontratuais, Direitos da personalidade, posse e propriedade, família e sucessões. 17 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO Figura 2 – O direito de família é o ramo do Direito civil no qual as relações entre particulares devem sofrer a menor intervenção possível Têm-se, ainda, importantes ramos como o Direito Comercial com o estudo dos contratos mercantis, sociedades comerciais, títulos de crédito, falência, propriedade industrial, marcas e patentes. Aponta-se ainda o Direito Autoral, Direito Agrário e Direito do Trabalho. Em relação a este último, remanesce forte controvérsia relegando-o à chamada área mista, em razão de sua origem fortemente impregnada da intervenção estatal. O Direito público tem origens relativamente recentes, associadas à evolução dos Direitos Fundamentais e à consagração do contratualismo ou pactualismo, a partir da Carta Magna de 1215, na Inglaterra, bem como os demais textos constitucionais ingleses (habeas corpus act, Bill of right, petition of right, entre outros), estabelecendo a linha evolutiva do Direito público com forte impulso a partir da Revolução Francesa de 1789, da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Declaração de Virgínia de 1776 e, enfim, da Constituição dos Estados Unidos da América do Norte, de 1787. As relações jurídicas características do Direito público apresentam perfil vertical, pois são marcadas pela constante tensão entre Estado e sociedade, permanentemente em controle recíproco. São, portanto, relações de subordinação, de poder. Vigora, no âmbito do Direito público, o princípio da legalidade estrita, pois não é lícito ao agente da administração fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude e na forma da Lei. Ao contrário, a legalidade vista sob o prisma do Direito privado, o que não for expressamente proibido, será permitido. O Direito Constitucional compreende a doutrina da separação dos poderes, organização do Estado, forma de Estado e sistema de governo, Direitos e garantias fundamentais. Tem-se, ainda, o Direito Administrativo o qual incumbe o estudo do ato administrativo, o controle da administração, bens, serviços e servidores públicos, a intervenção do Estado no domínio econômico. Ao lado do Constitucional, forma a viga mestra do Direito público. Outros ramos da ciência jurídica integram o Direito público, como o Direito Tributário (impostos, taxas e contribuições), Direito Ambiental, Direito Urbanístico, Direito Internacional Público (relações entre Estados soberanos), todo o Direito Processual (Civil, Penal, Trabalhista), o Direito Penal, entre outros. 18 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 A evolução de disciplinas como o BioDireito, a Informática Jurídica, o Direito Comunitário, entre outros, demandam os desafios com os quais se depara a ciência jurídica no mundo contemporâneo. Da mesma forma, a dicotomia público/privado vem perdendo força. Nas denominadas áreas mistas encontram-se o Direito do Consumidor, o Direito Internacional Privado, o Direito do Trabalho e o Previdenciário, além da publicização cada vez maior do Direito Civil. Assim, crê-seter perdido relevância a referida distinção, permanecendo válida apenas para fins didáticos e metodológicos. Há ainda disciplinas zetéticas, não dogmáticas ou crítico-reflexivas, como História do Direito, Sociologia Jurídica, Lógica Jurídica, Filosofia do Direito, Teoria do Direito, Introdução ao Estudo do Direito, por estarem situadas em um plano lógico anterior à referida distinção público/privada, distinção esta que apresenta ainda alguma relevância. Lembrete Direito público: Constitucional, Administrativo, Tributário, Financeiro, Ambiental, Urbanístico, Processual, Penal, Internacional, Previdenciário, Infância e Juventude. Direito privado: Civil, Empresarial, Agrário, Autoral. Misto: Trabalho, Consumidor. 1.6 Fontes do Direito São os processos ou meios destinados à formulação de regras e, portanto, normas com a consequente produção de efeitos jurídicos. Com maior ou menor grau de positivação, fontes foram construídas ao longo de toda sua evolução histórica, constituindo, nas sociedades contemporâneas, complexo feixe capaz de fornecer ao operador do Direito os recursos necessários à pacificação dos conflitos sociais. São fontes do direito a Lei (a ser tratada em capítulo apartado em face de sua importância no sistema brasileiro, de base romanista), os costumes, analogia, princípios gerais de Direito, equidade, doutrina e a jurisprudência. Os sistemas de origem romano-germânica (Europa continental e América Latina), também denominados Civil Law, definem a Lei escrita como espinha dorsal do ordenamento jurídico, admitindo 19 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO as demais fontes em caráter subsidiário, ou seja, secundário. Os países de tradição anglo-americana (Inglaterra, EUA, Austrália, Nova Zelândia e também Índia e Japão), denominados Common Law, utilizam os costumes e o precedente (jurisprudência), como principais fontes do Direito. Na atualidade há expressiva aproximação entre as duas escolas, pois o sistema romano-germânico adota cada vez mais os costumes e a jurisprudência, e a Common Law passou a produzir expressiva atividade legislativa. a) Costumes – observância reiterada de um hábito social, investido de autoridade. Estabelece-se, assim, um elemento objetivo para a sua caracterização, a prática de um hábito reiterado, contínuo e não eventual, ao lado de outro de maior subjetivismo, e o fato de ser revestido de autoridade, faz com que não seja, portanto, qualquer hábito. Ao contrário da Lei, o costume deve ser provado por quem o invoca, pois não goza do grau de objetividade da Lei escrita e nem da natureza estatal de sua fonte. Embora não seja a principal fonte de Direito na maioria dos ordenamentos jurídicos contemporâneos é, sem dúvida, a mais antiga de todas, sendo encontrada na origem de todos os povos. Algumas sociedades primitivas ainda possuem o costume como fonte exclusiva do Direito e mesmo nos ordenamentos complexos ainda representa importante fonte, invariavelmente chamada a suprir lacunas no processo de integração do Direito. Saiba mais Sobre sistemas jurídicos: DAVID, R. Grandes sistemas do Direito contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002. GILLISSEN, J. Introdução histórica ao Direito. 6. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011. SOARES, G. F. Common law: introdução ao Direito dos EUA. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. Se contrário à Lei (contra legem), o costume não poderá ser invocado como fonte de Direito. Se estabelecidos à margem da Lei (praeter legem) ou conforme a Lei (secundum legem) será invocável enquanto fonte do Direito, recebendo a denominação de costume jurídico. b) Analogia – é o método integrativo por meio do qual o juiz, na ausência de Lei escrita e específica a ser aplicada ao caso concreto, utiliza norma aplicável a situação fática semelhante. Na hierarquia do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, a analogia inaugura o rol ali estabelecido, tendo em vista sua origem positiva, eis que originária da atividade estatal. 20 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 Não se trata, portanto e propriamente, de modalidade de fonte do Direito, eis que a fonte a ser aplicada à situação concreta não é a Lei, mas, sim, instrumento de colmatação de lacunas ou método integrativo. c) Princípios Gerais de Direito – são enunciados normativos situados na base da ciência jurídica, paradigmas utilizados na construção das normas, institutos e sistemas jurídicos. São ideias fundamentais que podem encontrar correspondente previsão positiva (como a ampla defesa, a boa-fé, a equidade, a justa causa ou o devido processo legal) ou não constar expressamente de nenhum texto ou dispositivo legal (viver honestamente, dar a cada um o que é seu), embora estejam explícitos ou implícitos, a todo o tempo, no ordenamento. d) Doutrina – embora não constitua fonte direta do Direito, assume papel de inegável relevo para o operador do Direito. A partir dos trabalhos realizados pelos estudiosos, colhem-se elementos que podem, ou não, ser considerados à formação da livre convicção do julgador. Sua natureza subjetiva, eis que fruto do trabalho científico nem sempre desprovido de posicionamentos pessoais, leva a colocá-la sob suspeita. É, contudo, útil sob três prismas: na formação da Lei, no processo de interpretação do Direito positivo e na crítica aos institutos vigentes. Contudo, malgrado a sua importância no campo do ensino jurídico e o seu papel de servir à crítica científica, embora útil ao julgado, não pode ser alçada à categoria de fonte de direito da mesma forma que as demais. e) Jurisprudência – é representada pelo conjunto das decisões de um determinado tribunal. Tem por funções interpretar a Lei (pois a Lei é um preceito geral), vivificar a Lei (pois dá vida à norma publicada no veículo oficial), humanizar a Lei (pois o fim da norma não é ser dura, mas justa), suplementar a Lei (em face de suas inevitáveis lacunas) e rejuvenescê-la (adaptando-a à realidade social e ao cotidiano). Formada a partir das decisões colegiadas de segunda instância (tribunais estaduais, regionais ou ainda de instância superior), decorrentes do julgamento dos recursos interpostos às sentenças proferidas em primeiro grau (ou instância), constitui importante referência a ser observada em razão da apreciação da lide por órgão jurisdicional inferior. Malgrado a sua importância e utilização cada vez maior não representavam no ordenamento brasileiro, até o advento da Emenda Constitucional 45/2004, fonte de Direito equiparável à Lei, pois não possuía efeito vinculante a instância inferior. Nesse sentido, a adoção da súmula vinculante pela Emenda Constitucional 45/2004, expõe acalorado debate. As súmulas expressam a posição uniforme e pacífica de um tribunal a respeito de determinada tese jurídica, manifestadas por meio de verbetes aprovados pelos plenários das respectivas Cortes, mas não possuíam, mesmo assim, efeito vinculante. O art. 103-A da CF/88 institui a chamada Súmula Vinculante, com a seguinte redação: O STF poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, depois de reiteradas decisões sobre matéria 21 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como procederà sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em Lei. Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em Lei, sua aprovação, revisão e cancelamento poderá ser provocado pelos legitimados para a propositura da Adin, devendo a matéria controvertida acarretar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. f) Fonte Negocial – decorre da livre manifestação da vontade das partes, enquanto maiores e capazes, o objeto lícito e a forma prescrita ou não defesa em Lei. Base das obrigações contratuais, pode conter ou não correspondente legal, pois nem todos os negócios jurídicos pertencem à modalidade dos contratos nominados. Um sem número de atos, pactos e negócios são estabelecidos tendo por fonte a livre manifestação da vontade, pois sabido é que o contrato faz Lei entre as partes. 1.7 Lei escrita Lei é toda relação necessária, de ordem causal ou funcional, estabelecida entre dois ou mais fatos, segundo a natureza que lhes é própria (REALE, 2002, p. 162). Embora não seja a única fonte e tampouco a mais antiga, é a que, entre todas, apresenta o maior grau de racionalidade e objetividade. É característica do sistema romano-germânico, embora presente, e cada vez mais presente, em todas as sociedades cuja escrita seja conhecida. A Lei tem origem certa, o costume não, pois em regra não se sabe bem ao certo como, quando e por que um costume surgiu. A Lei possui numeração específica, vinculada à data de sua promulgação e de publicação, além da menção ao local e autoridade da qual emana. A Lei é obrigatória, válida igualmente para todos os indivíduos, enquanto que o costume é espontâneo, não possuindo a força vinculante característica da Lei escrita. O trâmite da Lei é determinado, pautado por procedimentos exatos, previamente conhecidos e esperados, com cada fase do processo legislativo disciplinada na Constituição ou nos regimentos das casas legislativas. O caráter da Lei é racional, manifestação positivista por excelência, enquanto que o costume é espontâneo, oriundo do convívio social. A Lei escrita, conceituada como norma geral e permanente, editada por autoridade soberana e dirigida coativamente aos cidadãos, pode ser caracterizada por ser genérica e abstrata, impessoal e permanente, até que seja por outra revogada. Seguem algumas consequências relevantes da aplicação da Lei escrita, fonte preponderante no ordenamento jurídico brasileiro: • Validade, vigência e eficácia da norma jurídica – para atingir os fins aos quais se destina, a norma terá de ser válida, vigente e eficaz. 22 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 O plano da validade traz à tona o seu valor axiológico, sua correspondência com a valoração que a sociedade, em um determinado momento histórico, empresta a determinado fato jurídico. Outra acepção do aspecto da validade é o da validade formal, ou procedimental, consistindo na adequação às regras previamente definidas nas normas que disciplinam o processo legislativo, tais como a Constituição, as normas regimentais das Casas Legislativas. O plano da vigência destaca o tempo de vida útil da norma, a teor do art. 1º e 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Na ausência da data de início de vigência da norma, dar-se-á 45 dias depois de oficialmente publicada (no Diário Oficial ou em jornal de grande circulação). O lapso de tempo compreendido entre a data de sua publicação e o início de vigência recebe o nome de vacatio legis. O plano da eficácia corresponde à aceitação social da norma, à observância de seus ditames pelo destinatário da norma jurídica, ou seja, corresponder à expectativa social. Outro entendimento acerca da ideia de eficácia traz o caráter instrumental ou operacional da norma, pois não haverá de se falar em eficácia de uma norma que vise sanar um determinado problema ou implementar um determinado plano caso não haja o adequado aparelhamento em sua implementação. Lembrete Validade: aspecto formal; vigência: aspecto temporal; e eficácia: aceitação social. Observação O Professor Miguel Reale, autor da Teoria tridimensional do Direito (Direito = fato+valor+norma), entende que a atenção é deslocada à aplicação da Lei e não mais à sua elaboração. • Interpretação da Lei – o processo de interpretação da Lei escrita é o mecanismo por meio do qual o juiz adéqua a Lei in abstracto ao caso in concreto. Assim, o trabalho do intérprete é o de “decodificar e, para isto, percorre inversamente o caminho seguido pelo codificador”. O ordenamento jurídico dispõe sobre a sua previsão legal, ao vincular a aplicação da norma jurídica ao seu proveito teleológico, caracterizado pela atenção aos preceitos do fim social e bem comum a que a Lei se destina (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB –, art. 5º). Observação Na impossibilidade de se ter boas Leis e bons juízes, o que seria melhor, boas Leis ou bons juízes? 23 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO • Integração do Direito – em face da omissão legislativa, o julgador deverá recorrer ao processo integrativo do Direito, previsto no art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que estabelece a ordem a ser seguida na colmatação das lacunas: analogia, costumes e dos princípios gerais do Direito. A soberania da Lei escrita, contudo, permanece inconteste, pois só na sua ausência é que as lacunas serão colmatadas. Observação Na integração não há Lei (art. 4º da LINDB), na interpretação há Lei (art. 5º da LINDB). • Aplicação da Lei no tempo – a irretroatividade da Lei é princípio esculpido no inc. XXXVI do art. 5º do texto constitucional e também no art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, tutela a segurança das relações jurídicas. Entende-se por irretroatividade a produção dos efeitos da Lei nova apenas projetada ao futuro, direcionada a partir da sua entrada em vigência, não atingindo situações jurídicas já consolidadas. Assim, a Lei, em regra, não retroage, salvo em benefício do exercício de Direitos, a exemplo de uma Lei que concede anistia fiscal a determinados grupos de contribuintes devedores, ou que descriminaliza determinada conduta, decorrendo daí a soltura daqueles que cumpriam pena em razão de sua infração. Não serão, destarte, atingidos o ato jurídico perfeito (já consumado, segundo norma vigente, ao tempo em que se efetuou) o direito adquirido (situação que tem início, mas não se consumou na vigência da Lei anterior, sendo, portanto, atingido pela Lei nova em pleno curso de sua vigência) e a coisa julgada (decisão judicial da qual não cabe mais recurso). Saiba mais DINIZ, M. H. Compêndio de introdução ao estudo do Direito. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. Lembrete A dicotomia Civil Law/Common Law vem perdendo força no mundo globalizado. 24 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 1.8 Do processo legislativo Saiba mais Sobre legística, técnica legislativa destinada à produção de um texto legal claro e coerente, conferir a LC nº 35/98. Deixemos de lado os procedimentos destinados à elaboração das Leis Delegadas (CF, art. 68), Decreto Legislativo e Resolução (CF, art. 49), por serem pouco usuais e de interesse restrito ao âmbito deste trabalho, para conferir ênfase à Emenda Constitucional, Lei Complementar, Lei Ordinária e Medida Provisória. Figura 3 – O processo legislativo é realizado no plano federal pelo Congresso Nacional, composto pelo Senado Federal e Câmara dos Deputados • Emenda Constitucional(CF, art. 60) – altera o texto constitucional, amplificando-o ou restringindo-o, passando a integrar o texto constitucional, observadas as limitações postas pelo art. 60 da Constituição Federal. Pode ser proposta pelo Presidente da República; por 1/3 dos membros da Câmara ou do Senado (o texto anterior exigia 1/3 de ambas as Casas); por mais da metade das assembleias estaduais com maioria dos membros de cada uma delas (CF, art. 60, III). Será considerada aprovada se obtiver quorum de 3/5 dos votos dos membros de cada uma das Casas, observados dois turnos de votação, com apreciação em separado em cada Câmara – art. 60, §2º (limitações formais). Se rejeitada ou prejudicada, não poderá ser reapresentada na mesma sessão legislativa. Não poderá ser votada durante a vigência de intervenção federal, estado de sítio e de defesa – CF, art. 60, § 1º (limitações circunstanciais) não será objeto de ementa proposta destinada a suprimir a forma federativa do Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos poderes; Direitos e garantias individuais – CF, art. 60, § 4º (limitações materiais – chamadas “Cláusulas Pétreas”). 25 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO • Leis Complementares (CF, arts. 61 e 69): – o constituinte reserva certas matérias à disciplina por Lei Complementar, evidenciando, assim, um tratamento distinto. A Constituição, claramente, enuncia quais os dispositivos que deverão ser disciplinados por meio de Lei Complementar. Só nessas matérias, expressamente indicadas, caberá a Lei Complementar, que deverá ser votada por maioria absoluta (CF, art. 69) dos membros das duas Casas do Congresso. • Lei Ordinária (CF, art. 61 a 67) – é o ato legislativo típico, geral e abstrato, um comando imposto a todos. Resulta do processo legislativo composto por três fases: introdutória, constitutiva e complementar: — Fase introdutória – a iniciativa é o ato que o desencadeia. Pode ser geral, competindo concorrentemente ao Presidente da República, a qualquer deputado ou senador, a qualquer comissão de qualquer das casas, ao STF, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos (CF, art. 61); reservada, limitada a decisão de propor Direito novo aos interessados de determinadas matérias; vinculada, se imposta pela Constituição; ou Popular (CF, art. 61, §2º), para Leis Ordinárias e Complementares condicionada à manifestação de pelo menos 1% (um por cento) do eleitorado nacional, distribuído em no mínimo cinco estados, exigida em cada um deles a manifestação de 3/10 (três décimos) do seu eleitorado. A iniciativa por parlamentar é depositada na mesa da Câmara a que pertence; a do Presidente da República, do STF e Tribunais Superiores, bem como a popular deverá ser exercida perante a Câmara dos Deputados. — Fase constitutiva – é a principal fase do processo legislativo, compreendendo a deliberação e a sanção. A primeira abrange a instrução do projeto, que deverá ser feita por comissão ou comissões, conforme a natureza do projeto apresentado, que o preparam para a discussão e votação; votação, o projeto votado por uma casa (iniciadora) será revisto pela outra casa (revisora). Caso a casa revisora aprove o projeto, este seguirá para a apreciação pelo Executivo; caso o rejeite, será arquivado; se emendado, voltará para a casa iniciadora para apreciação das emendas. A apreciação pelo Executivo completa a fase constitutiva, podendo resultar em sanção ou veto. A sanção transforma o projeto em Lei, congregando as vontades do Legislativo e do Executivo, podendo ser expressa (formalizada no prazo de 15 dias úteis a contar do recebimento do projeto – CF, art. 66) ou tácita (se deixa escoar esse prazo – CF, art. 66, § 3º). O veto evita que o projeto de Lei aprovado pelo Congresso se transforme em Lei (art. CF, 66, § 1º). A recusa, contudo, deverá ser fundamentada. Esta estará embasada na inconstitucionalidade (razão jurídica) ou na inconveniência (razão política). O veto deverá ser sempre expresso, não há veto tácito. Por determinação do art. 66, § 4º da Constituição, a apreciação do veto presidencial dar-se-á em sessão conjunta das Casas do Congresso, necessitando do voto da maioria absoluta dos deputados e senadores (em votação secreta), para a aprovação do projeto de Lei. — Fase complementar – promulgação e publicação – a promulgação cabe ao Presidente da República por ser ato que prepara a execução (CF, art. 66, § 5º), aliás, como ocorre com os atos normativos em geral, exceção feita à emenda constitucional. Deverá, a partir da sanção ou da comunicação 26 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 da rejeição do veto, fazê-la em 48 (quarenta e oito) horas. Se inerte, terá o Presidente do Senado o mesmo prazo, bem como o Vice-Presidente do Senado. A publicação, regida pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (CF, art. 1º) é condição de eficácia do ato normativo. • Medida Provisória (CF, art. 62) – são editadas pelo Presidente da República, observados os requisitos de relevância, a questão disciplinada deverá ser importante a ponto de se “atropelar” o processo legislativo ordinário; e urgência, a ausência de disciplina imediata poderá resultar em transtornos à ordem pública e ao interesse social. Após a sua edição, o Congresso Nacional terá o prazo de 30 (trinta) dias, a partir de sua publicação, para deliberação, podendo ser reeditadas uma única vez por igual período. Caso não sejam apreciadas em 45 (quarenta e cinco) dias, entrará em regime de urgência e a pauta será trancada, ou seja, nenhuma outra votação poderá ocorrer. Se aprovadas, serão convertidas em Lei; se não forem apreciadas, perderão a eficácia. Se rejeitadas, não poderão ser reeditadas na mesma sessão legislativa. 2 DIREITO CONSTITUCIONAL 2.1 Noções introdutórias 2.1.1 Conceito Direito Constitucional “É o conhecimento sistematizado das regras jurídicas relativas à forma do Estado, à forma do governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, ao estabelecimento de seus órgãos e aos limites de sua ação” (FERREIRA FILHO, 2008, p. 16). O movimento denominado Constitucionalismo surge a partir da elaboração de documentos históricos precedentes à Constituição, tais como os pactos, convenções entre monarcas e súditos concernentes ao modo de governo e às garantias dos Direitos individuais, tendo como fundamento o acordo de vontades (ex.: Magna Carta de 1215, Petition of rights de 1628); forais ou cartas de franquia: têm em comum com os pactos a forma escrita e a matéria (proteção a Direitos individuais); contratos de colonização: história das colônias da América do Norte, estabelecimento e organização do poder pelos próprios governados; Leis Fundamentais do Reino: criação de regras para defender a coroa das fraquezas do monarca; doutrinas do pacto social: a própria sociedade se funda num pacto, através de um acordo tácito entre os homens. O contexto histórico que lhe dá substrato pode ser delineado pelo Iluminismo, ideologia revolucionária do século XVIII, plasmada na supremacia do indivíduo a na razão, como meio de se atingir a felicidade e o progresso; e pelo Liberalismo, ideologia que prega a não intervenção do Estado na atividade econômica, livre concorrência e expansão do capitalismo. 2.1.2 Constituição Conjunto de regras concernentes à forma do Estado, do governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, ao estabelecimento de seus órgãos, aos limites de sua ação (FERREIRA FILHO, 2008, p.11). 27 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12INSTITUIÇÕES DE DIREITO 2.1.3 Poder Constituinte É o poder capaz de estabelecer regras constitucionais, não se confundindo com o poder de implementar normas de acordo com a Constituição. É considerado poder de fato, no sentido de que se funda a si próprio, não se baseando em regra jurídica anterior, e poder de Direito, fundado num poder natural de organizar a vida social. O Poder Constituinte pode se manifestar de diversas formas, por outorga ou imposição; promulgação ou Convenção (assembleia constituinte); referendum (consulta popular posterior ao ato que se pretende legitimar); plebiscito (escolha popular prévia entre duas alternativas postas). Espécies de poder constituinte: • originário, por iniciar a organização jurídica fundamental, ao editar Constituição nova substituindo a anterior ou criando um Estado. Inicial, pois não se funda noutro, nele se fundam os demais poderes. Ilimitado, porque não sofre limitação; se sujeita ao Direito natural; incondicionado por não ter fórmula prefixada; • derivados, constituídos pelos originários, deles retiram a força que têm, podendo ser de Revisão, previsto pela própria Constituição para alterá-la; ou decorrente, permitindo aos Estados-Membros elaborar suas próprias Constituições. É derivado, pois provém de outro poder; subordinado porque é limitado ao poder originário; condicionado, pois só pode agir nas condições fixadas pelas normas constitucionais. A Constituição do Brasil de 1988 estabelece as seguintes limitações ao Poder Constituinte Derivado: — limitações formais: o órgão de poder de reforma (o Congresso Nacional), a iniciativa reservada da proposta de ementa (CF, art. 60, I, II e III), o processo especial de elaboração (CF, art. 60, §§ 2º, 3º e 5º); — limitações circunstanciais: a Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio (CF, art. 60, § 1º); — limitações temporais: a Constituição só pode ser alterada em épocas certas, espaçadas, podendo ser, durante certo tempo, vedada a sua alteração (ou dificultada); — limitações materiais (CF, 60, § 4º, I, II, III e IV), também denominadas Cláusulas Pétreas, sendo estas as que seguem: Art. 60, § 4º. Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa do Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; 28 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 III – a separação dos Poderes; IV – os Direitos e garantias individuais (CF, 60, § 4º, I, II, III e IV). a) A forma federativa de Estado – a República deixa de constituir dogma, até então existente em todas as Constituições, desde a de 1891 (l891, art. 85, § 4º; 1934, art. 178, § 5º; 1946, art. 217, § 6º; 1967, art. 50, III, § 1º; 1969, art. 47, § 1º), acreditamos que em função de plebiscito popular sobre a forma de governo (art. 2º do ADCT) realizado em 1993. De qualquer forma, determinados países colocam somente como núcleo constitucional das Leis Magnas a república, como a França de 1958, art. 89; a Itália, art. 139; outros acrescentam a Federação e a República, como os EUA e o Brasil até então. b) O voto direto, secreto, universal e periódico – tais elementos são essenciais para o exercício da democracia e o fortalecimento do Estado Democrático de Direito. A periodicidade encontra justificativa a evitar que pessoas ou grupos se perpetuem no poder, permitindo a sua avaliação com consequente manutenção ou alternância a períodos previamente estabelecidos (no caso brasileiro, constantemente alterados). A universalidade objetiva evitar o voto censitário e outras formas de discriminação, exceção feita àqueles incapazes e impedidos por expressa e prévia determinação legal (a propósito, deveria ser facultativo para ser realmente democrático). Ser secreto é a garantia da liberdade de escolha, fugindo às perseguições que certamente advirão em muitas regiões do país. O voto direto, contudo, apesar de importante, não é imprescindível, para todos os cargos, para a garantia da democracia, a exemplo do sistema parlamentarista e de democracias como a norte-americana. c) A separação dos Poderes – o princípio da separação dos poderes é marcado por certa interferência de um poder sobre o outro, justamente para atingir o equilíbrio e estabelecer o sistema de freios e contrapesos, visando a sua divisão em funções distintas, impedindo, assim, o despotismo ou o predomínio absoluto de um poder sobre os demais. A independência dos poderes, portanto, não é absoluta, implicando sua redução em conformação necessária à convergência harmônica de suas atuações. d) Os Direitos e garantias individuais – tomando os fundamentos da República Federativa do Brasil (e a forma republicana não é mais cláusula pétrea) consistente em Estado Democrático de Direito, consubstanciados no art. 1º, os objetivos fundamentais do art. 3º e os princípios regentes das relações internacionais dispostos no art. 4º, o extenso rol do art. 5º e, para parte da doutrina, os Direitos sociais do art. 7º, todos da Constituição Federal. Observação Cláusulas Pétreas só podem ser suprimidas por meio de nova Constituição. 29 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO 2.1.4 Espécies de Constituição e de normas constitucionais Espécies de Constituição Em relação à forma, as Constituições podem ser escritas, contendo regras em documento elaborado para fixar a organização fundamental; não escritas, quando baseadas nos usos e costumes reiterados. Observação Embora a Constituição da Inglaterra seja classificada como não escrita ela é, na verdade, constituída por um conjunto de textos elaborados ao longo dos séculos, sendo, portanto, escrita, mas não sistematizada. Quanto à força que a legitima, são consideradas outorgadas, se positivadas por obra de um indivíduo ou por um grupo de indivíduos (ex.: Constituição de 1967, Constituição do Império); ou promulgadas, decorrentes da manifestação de uma Assembleia Popular Constituinte (ex.: Constituições Brasileiras de 1946 e 1988). Em relação à possibilidade de sua alteração, são rígidas, se alteráveis por um processo especial, dificultoso, mais qualificado que o processo de alteração da legislação ordinária; semirrígidas, alteráveis em parte por processo especial, em parte por processo comum; flexíveis: alteram-se através de um processo idêntico à legislação comum (ordinária); dogmáticas: Constituições escritas que se assentam em princípios e dogmas. Outras classificações as definem como Histórica, Constituição não escrita ou costumeira; garantia, visa a garantir a liberdade, limitando o poder; balanço, é a Constituição que descreve e registra a organização política estabelecida; dirigente, anuncia um ideal a ser alcançado, estabelecendo um plano para dirigir uma evolução política. Normas constitucionais Quanto ao conteúdo as normas constitucionais são dividias em: materiais que, por seu conteúdo, versam sobre a forma do Estado, do governo, modo de aquisição e exercício do poder, estrutura do Estado e os limites de sua ação – ex.: organização dos Poderes (Título IV); organização do Estado (Título III); princípios fundamentais (Título I); Direitos e garantias individuais –; formais são as que têm apenas a forma de regra constitucional, não o seu conteúdo. Ex.: dispositivos relativos aos seringueiros (art. 54 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT); Zona Franca de Manaus (art. 40 do ADCT); Colégio Dom Pedro II (CF, art. 242); taxa de juros reais etc. Quanto à possibilidade de aplicação, as normas são: autoexecutáveis, com aplicabilidade imediata, não dependendode legislação integrativa; não autoexecutáveis, de eficácia limitada, dependem de legislação integrativa que as complemente; podem ser incompletas, condicionadas ou programáticas; eficácia contida, aplicáveis desde logo, podendo ser contidas por Lei ou ato infraconstitucional. 30 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 2.1.5 Controle de constitucionalidade das Leis É a verificação da adequação de um ato jurídico ou Lei à Constituição (FERREIRA FILHO, 2008, p. 34). A ideia de controle jurisdicional de constitucionalidade postula a da supremacia da Constituição no quadro do Direito interno dos Estados. O princípio da supremacia requer que todas as situações jurídicas se conformem com os princípios e preceitos consagrados na Constituição, não se satisfazendo apenas com a atuação positiva, ou seja, de acordo com a Constituição, mas também combate à inércia regulamentar, visto que constitui conduta inconstitucional a omissão na elaboração de normas quando a Constituição assim o determina. Cabe aos mecanismos de controle de constitucionalidade das Leis verificarem a coordenação dos atos jurídicos com a Constituição e, retirar do sistema toda norma de caráter inferior que esteja com ela dissonante. O Direito brasileiro adota as seguintes formas de controle de constitucionalidade: • concentrado – é aquele no qual a competência para julgar ou examinar a constitucionalidade pertence a um único órgão julgador. Por ser concentrado, não há disparidade de decisões para questões iguais; • difuso – permite a qualquer juiz apreciar a alegação de inconstitucionalidade. É o sistema adotado pelos EUA a partir do emblemático caso Marbury vs. Madison (1803). Neste caso, permanece por muito tempo a dúvida sobre a constitucionalidade, uma vez que diversos juízes apreciam questões iguais e poderão ter opiniões diferentes, acarretando decisões que se contradizem entre si. Somente com a manifestação do mais alto tribunal ficará definida a questão da constitucionalidade. Este sistema foi denominado judicial review, ou difuso; • político – há controle político sempre que a verificação de constitucionalidade é confiada a órgão não pertencente ao Poder Judiciário. Seu fundamento principal é a alegação de que a Constituição deve ser interpretada por órgãos com sensibilidade política, bem como evitar que se dê poder aos juízes de anular as decisões do Legislativo e do Executivo, atentando contra o princípio da separação dos poderes; • judiciário – o controle judiciário se dá sempre que a verificação da concordância entre um ato e as regras constitucionais é atribuída a órgão integrado no Poder Judiciário. As críticas residem na judiciocracia; • ação direta – exercido por meio de uma ação judicial com a finalidade específica de examinar a constitucionalidade da Lei, sem que nenhuma relação jurídica esteja em discussão. A declaração de inconstitucionalidade resulta na anulação da Lei, com efeitos erga omnes (direcionados a todas as pessoas). Desta maneira, uma única decisão de uma Corte Constitucional resolve a questão definitivamente; 31 Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 INSTITUIÇÕES DE DIREITO • incidental – no curso de qualquer ação judicial, se uma das partes pretender a aplicação de uma Lei e a outra poderá defender-se dessa pretensão alegando a inconstitucionalidade da referida Lei. Procedente a alegação, a Lei não será aplicada pelo juiz à relação jurídica em litígio. Entendido no sentido de defesa pode ser tanto do autor como do réu. A Lei continua em vigor em relação aos que não participaram da causa, cuja decisão atinge apenas as partes litigantes; • preventivo – opera antes que a Lei se aperfeiçoe, havendo um controle de constitucionalidade do projeto de Lei, podendo ser entregue a um órgão de natureza jurisdicional. O controle prévio, contudo, na maioria dos países é realizado sob a forma de autocontrole de constitucionalidade, que se inicia com o exame do projeto de Lei na comissão de Constituição das casas legislativas, prossegue no seu plenário e termina na ocasião da apreciação pelo Poder Executivo, que deve vetá-lo se o julgar inconstitucional; • repressivo – opera depois de perfeito o ato, de promulgada a Lei, havendo o controle de constitucionalidade da Lei; • abstrato – em tese porque, desvinculado de um caso concreto, de lesão a Direito, visa à declaração de inconstitucionalidade da Lei ou ato normativo, podendo ser repressivo ou preventivo; • concreto – vinculado apenas aos casos concretos; • ação declaratória de constitucionalidade – a ADC veio a integrar o texto da Constituição por obra do poder constituinte reformador, por meio da EC 3, de 17.03.1993. Por essa via, busca-se a declaração de constitucionalidade de Lei ou ato normativo federal, ao contrário da ADIN. Tem como fundamento, portanto, conferir segurança ao ordenamento jurídico nacional, havendo, por trás de tal argumento, o verdadeiro intuito de defender o Governo Federal, facilitando sua ação executiva, em detrimento das garantias individuais; • inconstitucionalidade por omissão – a inconstitucionalidade não implica apenas a contradição a uma norma cogente, autoexecutável (porque se não o for não haverá omissão), da Constituição, mas igualmente deixa de tomar as providências necessárias para a efetividade das normas programáticas. Assim, este tipo de controle de constitucionalidade só pode ter como parâmetro as normas constitucionais de eficácia limitada, que são aquelas cujos efeitos jurídicos dependem da edição de regras infraconstitucionais. A omissão legislativa somente pode significar que o legislador não faz algo que positivamente lhe era imposto pela Constituição. Não se trata, apenas, de um não fazer, mas de não fazer aquilo a que, de forma concreta e explícita, estava ele constitucionalmente obrigado; • arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF – previsto no art. 102, § 1º, da Constituição, foi regulamentada pela LF nº 9.882/99. Ao ser avocada pelo Supremo Tribunal Federal, atribui eficácia erga omnes (geral, contra todos) e vinculante, à ação cuja constitucionalidade de ato federal, estadual ou municipal que esteja sendo apreciada por juízes ou tribunais regionais. • modelos coexistentes no Direito Brasileiro: 32 Unidade I Re vi sã o: V irg ín ia / Cr ist in a - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 13 /1 2/ 12 I. Político (Preventivo). I. 1. Veto do Presidente (66, § 1º). I. 2. Sustação do ato pelo Congresso (49. V). II. Jurídico (Repressivo). II. 1. incidental, por via de defesa ou de exceção – modelo americano com adaptações (102, III, 97 e 52, X). II. 2. Ação. II.2.1. Positivo. a. direta interventiva – Legit. Proc. Rep. (35, III); b. direta de inconstitucionalidade – modelo austríaco sem Corte Constitucional (102, I, a); c. declaratória de constitucionalidade (EC3/93); d. ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, § 1º). II.2.2. Negativo. • abstrata – direta de inconstitucionalidade por omissão (103, §2); • legitimidade – o art. 103 da Constituição Federal elenca os legitimados à propositura de ADIN e ADC: I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa da Assembleia Legislativa; V – o Governador de Estado; VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da OAB; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. 2.2 Da organização nacional 2.2.1 Do Estado federado Disposições gerais Estado é uma
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