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FORMAS DE ESTADO: FEDERALISMO 1 Márcia Miranda Soares INTRODUÇÃO Este capítulo apresenta a forma de Estado designada como federalismo, que consiste em uma das três principais formas de organização territorial do poder político no mundo atual. As outras duas são a forma Unitária e a forma Confederada. O texto buscará explicar o significado, a origem e as características do federalismo, assim como sua distinção das outras duas formas de Estado. O federalismo, tal como o concebemos na atualidade, teve sua origem nos Estados Unidos da América (EUA), em 1787, como resultado de um intenso debate e busca pela conciliação de dois interesses, constituir um Estado nacional a partir das 13 colônias inglesas, que juntas proclamaram a independência da Inglaterra em 1776, e preservar a autonomia dos estados constituídos a partir das colônias na condução de seus interesses políticos, econômicos e sociais. A grande novidade do federalismo foi possibilitar unidade política nacional e autonomia subnacional através de um complexo desenho institucional de controles mútuos, para evitar o domínio da União (governo nacional) sobre os estados (governos subnacionais) e vice-versa. A virtude deste arranjo político territorial foi comprovada pela estabilidade política dos Estados Unidos da América ao longo dos dois últimos séculos, com a superação de crises importantes, inclusive envolvendo conflitos territoriais. Outro indicador de sucesso do federalismo foi sua expansão pelo mundo, alcançando 30 países que se designam como Estados federados, em um contingente de mais de 200 nações soberanas. A devida compreensão do federalismo envolve mobilizar dois outros termos, descentralização e democracia. Na segunda seção, será defendido que a descentralização e a democracia são condições para o federalismo, assim como o federalismo exige uma configuração particular de descentralização do poder político e traz consequências para a democracia. Finalizamos o capítulo com a apresentação da experiência federativa brasileira. O Brasil adotou o sistema federativo conjuntamente com o regime republicano, em 1889. É fato que o modelo americano foi a grande inspiração, mas isto não elimina as motivações próprias que 1 Agradeço à Marta Leone Andrade a colaboração na elaboração deste capítulo, principalmente na coleta de informações sobre os países federalistas no mundo. fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce levaram a adoção do federalismo e certas características diferenciadoras da experiência brasileira. A federação brasileira, ao contrário da experiência dos EUA, foi adotada a partir de um Estado nacional unitário e para prover autonomia às províncias; sua trajetória foi marcada pelas oscilações entre democracia federativa e autoritarismo centralizador. Por fim, o Brasil chega à atualidade como um dos poucos países federalistas a ter uma terceira esfera de poder territorial, os municípios. O objetivo do texto é oferecer ao leitor um entendimento básico do significado de federalismo e de suas características, apresentar a origem e a evolução do federalismo pelo mundo, apontar a relação entre federalismo, descentralização e democracia e introduzir a experiência federativa brasileira. 1. CONCEITO, ORIGEM E CARACTERÍSTICAS DO FEDERALISMO Conceito O federalismo é uma forma de organização do poder político no Estado nacional caracterizado pela dupla autonomia territorial. Isto significa a existência de dois níveis territoriais autônomos de governo: um central, que constitui o governo nacional, e outro descentralizado, que constitui os governos subnacionais. Os entes governamentais têm poderes únicos e concorrentes para governarem sobre o mesmo território e povo, sendo que a União governa o território nacional e seus cidadãos, enquanto as unidades subnacionais governam uma parte delimitada do territorial nacional com seus habitantes; sendo ambos atuam dentro de um campo pactuado de competências. A complexidade de fatores que envolve o federalismo não pode ser captada em poucas linhas, mas o conceito é um importante ponto de partida porque apresenta os termos centrais para o seu entendimento: o âmbito em que a federação deve ser entendida, o Estado nacional, e termos chaves como dupla autonomia territorial, níveis central e descentralizados. O federalismo surgiu e se expandiu pelo mundo como um pacto (a origem da palavra vem do latim foedus que significa pacto) entre forças centrípetas e centrífugas. As forças centrípetas defendiam a formação ou manutenção de um Estado nacional, entendido como unidade política que possibilita às diversas comunidades territoriais que o compõem maior força e prosperidade, seja na defesa frente a inimigos externos, seja nas trocas comerciais internas (formação de um mercado comum) ou externas (proteção do mercado interno), entre outros fatores. As forças centrífugas defendiam autonomia política para as comunidades territoriais fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce em determinado campo de atuação, evitando que as mesmas tenham que se submeter aos ditames de um governo central. Desta forma, o federalismo é uma organização política com dupla autonomia territorial porque deve conciliar e maximizar os benefícios de uma comunidade política centralizada (Estado nacional) com a garantia de autonomia aos seus componentes (descentralização). Origem do federalismo nos Estados Unidos da América O federalismo surgiu nos Estados Unidos da América, em 1787, como resultado de um pacto constitucional para estabelecer um Estado nacional a partir da unificação das treze colônias inglesas independentes e para garantir a autonomia política destas colônias. As treze colônias da Inglaterra no Hemisfério Norte do Continente Americano desfrutaram de grande autonomia durante o período colonial, o que propiciou a formação de uma forte identidade territorial e o apego à condição de autonomia. Ao proclamarem a independência do Reino Unido da Grã- Bretanha, em 1776, as colônias tinham interesse em uma unidade política, mas não queriam abrir mão da autonomia, por isto optaram por um criar um governo central bastante limitado em suas atribuições e constituíram, em 1777, a Confederação dos Estados Unidos das Américas. O governo central teria como propósitos: 1) a defesa do território contra ameaças externas, 2) criar um mercado econômico comum para os novos estados e 3) manter a ordem interna, devendo limitar suas ações a este escopo. Os novos estados manteriam seus aparatos de poder e teriam o controle de todas as outras ações de governo. Contudo, a Confederação não foi bem sucedida, o governo central era demasiado fraco para levar adiante suas atribuições, o que representava ameaça à paz, à liberdade e à prosperidade da nação. A Convenção da Filadélfia, que elaborou a primeira Constituição dos Estados Unidos da América, em 1787, foi o palco de grande embate entre as forças centrípetas, que defendiam um governo central mais forte, e as forças centrífugas, que temiam que um governo central fortalecido significasse o fim da autonomia dos estados. O resultado do fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce embate foi uma institucionalidade territorial sem precedentes na históriamundial, o federalismo. Terminada a Convenção, a Constituição deveria ser ratificada pelos estados. Em defesa do federalismo, que naquele contexto significava aumentar o poder do governo central, foram publicados na imprensa de Nova York, em 1788, vários artigos escritos por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, designados como “O Federalista”. Esta obra representa uma referência importante para o entendimento da nova forma de Estado e das motivações para sua criação nos Estados Unidos da América (Limongi, 1989). Características institucionais do Estado federal O pacto federativo que conciliou os interesses centrípetos e centrífugos no processo de formação dos Estados Unidos da América exigiu um árduo trabalho de desenho institucional na busca pela dupla autonomia territorial, do centro político federal (União) e das subunidades federadas (Estados). Este desenho estabeleceu um sistema de controles mútuos, os chamados pesos e contrapesos institucionais (checks and balances), que limitavam a atuação dos poderes centrais e subnacionais, propiciando o equilíbrio de poder. Como tal, configurou as características institucionais e constitucionais do Estado nacional de tipo federal, adotado nos EUA e difundido pelo mundo (Riker, 1964:10; Klatt, 1993: 10;12): 1. Constituição Federal como forma de estabelecer o pacto federativo entre os entes territoriais. 2. Divisão do Estado nacional em várias subunidades territoriais que constituirão os entes federados ou as unidades-membro da Federação. 3. Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário autônomos nos âmbitos nacional e subnacionais; 4. Divisão de competências fiscais e administrativas, com recursos financeiros e competências administrativas asseguradas a cada nível de governo; fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce 5. Sistema legislativo bicameral, com representação das subunidades nacionais no governo central através de uma segunda casa legislativa (Senado). 6. Corte Suprema de Justiça responsável pela regulação dos conflitos federativos e garantia da ordem federal. Formas de Estado: Federal, Unitária e Confederada As três formas principais de organização territorial do poder político, federal, unitária e confederada, se distinguem pela maior centralização ou descentralização do poder político em bases territoriais. O federalismo, como vimos, é caracterizado pela dupla autonomia territorial, ou seja, por uma divisão mais igualitária do poder político entre o governo central e as subunidades nacionais, combinando centralização e descentralização na organização interna do poder no Estado nacional. A unidade e a autonomia políticas subnacionais são tidas como valores essenciais do Estado e estabelecidas através de um pacto constitucional. O Estado unitário, ou seja, a forma de organização unitária do Estado nacional, é caracterizado pela centralização do poder político. O governo central controla a vida política em todo território nacional, estando as subunidades nacionais em posição subordinada à estrutura central de poder. Portanto, sua principal distinção do federalismo reside nas relações intergovernamentais dentro do Estado nacional, ao invés de governo central e subunidades territoriais autônomos, o que temos são relações hierarquizadas, com o governo central ocupando o ápice da hierarquia. Assim, as unidades territoriais se subordinam, devem obediência, ao governo nacional, em menor ou maior grau, dependendo do país. Esta é a forma predominante de organização territorial do poder político no mundo atual e seu maior mérito reside na agilidade na tomada de decisões, dada a existência de um único comando político territorial. A confederação é uma forma de Estado marcada por ampla descentralização territorial do poder político, sendo formada por comunidades territoriais que preservam a soberania política. O poder central é constituído por um tratado internacional entre comunidades soberanas para atender a objetivos específicos partilhados entre as partes - geralmente militares e/ou econômicos. O fator diferenciador deste sistema em relação ao sistema federal é a debilidade do poder central frente às unidades territoriais que compõem a confederação. Além de preservarem a soberania política, elas podem abandonar a União a qualquer fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce momento, tendo direito de secessão (Klatt, 1993:8). A fragilidade do poder central se expressa na dificuldade de fazer valer suas leis e decisões frente aos governos membros. Esta fragilidade significa a fragilidade da união e responde por que a confederação tem um caráter altamente instável e tem tido uma existência residual no mundo. A União Europeia, constituída pelo tratado de Maastrich, em 1992, seria o melhor exemplo de confederação atual. Outros exemplos devem ser buscados em períodos mais remotos: a Grécia Antiga, a Itália antes de sua unificação em 1870, os EUA (1778-1787), a Alemanha (1815- 1866) e a Suíça (1815-1848). A falência das confederações antigas exemplifica o caráter instável deste arranjo que, muitas vezes, sucumbiu à guerra civil, aos golpes de Estado e à secessão. Observe que os três últimos exemplos citados de confederações antigas acabaram por adotar o federalismo. De forma simples, a distinção entre as três formas de Estado pode ser feita a partir de um continuum que tem em um extremo a centralização e no outro extremo a descentralização. Os Estados unitários estariam mais próximos do extremo da centralização, os confederados mais próximos do extremo da descentralização e os Estados federados ocupariam uma posição intermédia neste continuum, longe dos dois extremos. Evidentemente, não existe caso de centralização ou descentralização absoluta de poder político. Uma comunidade confederada que chegasse à extremidade da descentralização não seria mais uma unidade política e, por mais centralizado que pretenda ser um Estado unitário, o poder central não consegue absorver em si todo o exercício de poder com o controle absoluto sobre todo o território. FIGURA 1: Formas de Estado: Continuum Descentralização e Centralização Política Unitários Federados Confederados Cent raliza ção Desc entra lizaçã o O federalismo no mundo O federalismo originado nos Estados Unidos da América rapidamente tornou-se uma referência para outros países que apresentavam problemas similares de conciliar interesses centrípetos e centrífugos na conformação ou manutenção de um Estado nacional. Conforme fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce Stepan (1999), algumas federações surgiram para unir comunidades autônomas (come together), como foi o caso dos EUA, e outras federações surgiram para manter a unidade política (hold together) em um contexto de pressões por descentralização, este seria o caso brasileiro. Em qualquer dos casos, a adoção do federalismo é resultado do interesse em formar ou manter uma unidade política em um contexto na qual estão presentes forças territoriais relevantes que reivindicam um campo autônomo de atuação política e resistem à submissão de um poder central. A constituição de forçascentrífugas territoriais que impelem uma unidade política, em constituição ou já estabelecida, à organização federativa pode ter motivações diversas, sendo possível, no entanto, destacar três fatores importantes na conformação destas forças: 1) Processo histórico marcado por ampla autonomia das esferas territoriais. A maioria das federações (Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, Estados Unidos, México, Venezuela, entre outros) passou por um processo de colonização cuja estrutura de poder, centralizada na metrópole, conferia ampla autonomia política às esferas territoriais que formavam a unidade colonial. 2) Extensão territorial. Grandes territórios se conformam melhor com uma estrutura descentralizada de poder, até pela dificuldade de um poder central controlar um amplo espaço geográfico. Isso explica, em parte, a autonomia de muitas colônias frente às metrópoles e sua opção pelo sistema federal, posteriormente. Não é coincidência que dentre os casos de sistemas federativos no mundo, se encontrem quatro dos seis maiores países em extensão territorial: Canadá, Estados Unidos, Brasil e Austrália. Sem contar México, Argentina e Índia, que são países de grandes dimensões. Riker (1964:5) diz que o federalismo é no mundo moderno a principal alternativa ao império enquanto técnica de agregar largas áreas sob um único governo. 3) Existência de heterogeneidades culturais de base territorial. Sociedades que apresentam clivagens culturais concentradas territorialmente, étnicas, linguísticas, religiosas ou de outra natureza, têm problemas em contornar estas diferenças sob um governo único que faz valer suas decisões para todos. O desejo de preservar as identidades culturais e ter um governo afim aos seus interesses faz com que estes grupos representem forças centrífugas relevantes na conformação do poder político territorial. Este é o caso da África do Sul, da Bélgica, do Canadá, da Espanha, da Índia e da Suíça. fviana Realce fviana Realce Na atualidade, são 30 os países classificados como federalistas, um número pequeno diante de mais de 200 nações constituídas, nas quais prevalecem a forma unitária de Estado. Contudo, é um conjunto expressivo de países quando consideramos dimensão territorial, população e riqueza. QUADRO 1: Países Federalistas no Mundo País (Ano de adoção) 1 Unidades federadas 1 Política 2 Posição no PIB (2010) 3 e IDH (2011) 4 Clivagens Culturais 2 África do Sul (1996) 9 províncias República Parlamentarista PIB: 26º IDH:123º Heterogeneidade: linguística (11 línguas oficiais) e étnica Alemanha (1949) 16 länder República Parlamentarista PIB: 6º IDH: 9º Homogeneidade Argentina (1853) 23 províncias 1 cidade autônoma República Presidencialista PIB: 24º IDH: 45º Homogeneidade Austrália (1901) 6 estados 2 territórios Monarquia Parlamentarista PIB: 18 º IDH: 2º Homogeneidade Áustria (1920) 9 províncias República Parlamentarista PIB: 36º IDH: 19º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e outras nacionais) Bélgica (1993) 3 comunidades 3 regiões Monarquia Parlamentarista PIB: 31º IDH: 18º Heterogeneidade lingüística (3 línguas oficiais) e étnica Bósnia-Herzegovina (1995) 1 Federação 1 República República Parlamentarista PIB: 107º IDH: 74º Heterogeneidade: linguística (3 línguas oficiais) e étnica Brasil (1889) 26 estados 1 Distrito Federal 5.565 municípios República Presidencialista PIB: 9º IDH: 84º Homogeneidade Canadá (1867) 10 províncias 3 territórios Monarquia Parlamentarista PIB: 15º IDH: 6º Heterogeneidade: linguística (2 línguas oficiais), étnica e religiosa Comores (1978) 3 ilhas República Presidencialista PIB: 205º IDH: 163º Heterogeneidade: linguística (3 línguas oficiais) e étnica Emirados Árabes Unidos (1971) 7 emirados Monarquia Parlamentarista PIB: 51º IDH: 30º Heterogeneidade: linguística (1 oficial e 5 nacionais) e étnica Espanha (1978) 17 comunidades autônomas 2 cidades Monarquia Parlamentarista PIB: 14º IDH: 23º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e 4 nacionais) Estados Federados da Micronésia (1979) 4 estados República Presidencialista PIB: 213º IDH: 116º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e 9 nacionais) e étnica Estados Unidos (1789) 50 estados 1 Distrito Federal República Presidencialista PIB: 2º IDH: 4º Heterogeneidade: étnica e religiosa Etiópia (1952) 9 estados 2 cidades República Parlamentarista PIB: 76º IDH: 174º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial, 80 nacionais e dialetos), étnica e religiosa Federação Russa (1993) 50 regiões 21 repúblicas República Parlamentarista PIB: 7º IDH: 66º Heterogeneidade: étnica e religiosa 6 territórios 2 cidades federais 10 áreas autônomas País (Ano de adoção)1 Unidades federadas1 Política2 Posição no PIB (2010)3 e IDH (2011)4 Clivagens Culturais2 Indonésia (1949) 30 províncias 2 regiões especiais 1 distrito capital República Presidencialista PIB: 16º IDH: 124º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial, 3 nacionais e dialetos locais) e étnica Índia (1950) 28 estados 7 territórios da União República Parlamentarista PIB: 5º IDH: 134º Heterogeneidade: lingüística (18 línguas oficiais), étnica e religiosa Iraque (2005) 18 províncias República parlamentarista PIB: 66º IDH: 132º Heterogeneidade: linguística (2 línguas oficiais), étnica e religiosa Malásia (1957) 13 estados 2 territórios federais Monarquia Parlamentarista PIB: 30º IDH: 61º Heterogeneidade: lingüística (1 língua oficial e 8 nacionais), étnica e religiosa México (1824) 31 estados 1 distrito federal República Presidencialista PIB: 12º IDH: 57º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e 60 nacionais) Nepal (2007) 14 zonas República Parlamentarista PIB: 102º IDH: 157º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e 9 nacionais), étnica e religiosa Nigéria (1954) 36 estados 1 território federal República Presidencialista PIB: 32º IDH: 156º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial, 5 nacionais), étnica e religiosa Palau (1994) 8 ilhas República Presidencialista PIB: 217º (2008) IDH: 49º Heterogeneidade: linguística (2 línguas oficiais, 8 nacionais) e étnica República Bolivariana da Venezuela (1811) 23 estados 1 distrito federal 1 dependência federal República Presidencialista PIB: 35º IDH: 73º Heterogeneidade: étnica República Democrática do Congo (2006) 10 províncias 1 cidade República Semipresidencia lista PIB: 119º IDH: 187º Heterogeneidade: linguística (1 língua oficial e 4 nacionais) e étnica. República Islâmica do Paquistão (1956) 4 províncias 2 áreas adm. federais 1 distrito federal República Parlamentarista PIB: 28º IDH: 145º Heterogeneidade: lingüística (2 línguas oficiais), étnica e religiosa São Cristóvão e Nevis (1983) 2 ilhas Monarquia Parlamentarista PIB: 209º IDH: 72º Homogeneidade Sudão (2005) 25 estados República PresidencialistaPIB: 71º IDH: 169º Heterogeneidade: linguística (2 oficiais e 5 nacionais) e étnica Suíça (1848) 26 cantões República Parlamentarista PIB: 38º IDH: 11º Heterogeneidade: lingüísticas (4 línguas oficiais), étnica e religiosa Fontes: 1. Government of Canada (2011); 2. CIA (2011a); 3. CIA (2011b); 4. UNDP, (2011). Obs. O ranking de PIB da CIA coloca a União Européia no primeiro lugar, o que explica, por exemplo, o segundo lugar dos EUA. 2. FEDERALISMO, DESCENTRALIZAÇÃO E DEMOCRACIA Devemos evitar certa confusão comum com os termos federalismo, descentralização e democracia. Eles têm significados distintos, mas apresentam importantes conexões. Esta seção buscará distinguir e relacionar estes termos. Federalismo e Descentralização A descentralização é o elemento distintivo da federação em relação ao Estado unitário, por um lado. Por outro lado, é a maior centralização do poder político que separa a federação da confederação. O conceito de federalismo como um arranjo político de dupla autonomia territorial remete exatamente a este caráter de centralização e descentralização. Com isto, temos uma primeira observação importante, quase óbvia em termos teóricos, mas freqüentemente sujeita a erros no linguajar de senso-comum: federalismo não é descentralização do poder político ou, ao menos, esta é somente parte da história que tem como contraface a centralização. É exemplar a sua origem nos EUA através de um processo de centralização do poder. A descentralização característica da federação é a descentralização territorial, na qual o poder político dentro do Estado nacional é distribuído por mais de um nível de governo. Ressaltar este aspecto é importante porque descentralização é um termo usado para designar diferentes fenômenos políticos. O processo de democratização, por exemplo, envolve a descentralização do poder no âmbito da relação Estado e Sociedade e o poder é democratizado à medida que mais indivíduos de uma sociedade participam, de forma igualitária, das decisões sobre quem governa e como governa. A descentralização pode se referir também à relação entre Estado e Mercado e, neste caso, significa fortalecer o mercado diante do Estado, via diminuição do tamanho econômico do Estado – menor carga tributária, via desregulamentação da economia, via transferências de competências estatais para o mercado etc. O traço característico destes três diferentes processos descentralizadores é que o poder político do Estado é limitado, pela federalização, democratização ou liberalização econômica. A conclusão, portanto, é que a federação diz respeito a um processo específico de descentralização, apesar de este ter relações com os outros processos. Feita a devida distinção e relação entre federalismo e descentralização, cabe ainda entender o que é esta descentralização que diferencia experiências federativas e unitárias. Poderíamos atribuir a condição de federal a todo país que assim se denomina e que apresenta em sua fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce constituição as características institucionais apontadas acima. Mas, e se os preceitos constitucionais não tiverem aplicação real, forem “letra morta”? E se a federação for uma “mera formalidade” constitucional em um país dominado por forças centrais? Para evitar este engodo, sugerimos distinguir federação formal e federação efetiva e analisarmos algumas condições necessárias para identificar a descentralização do poder político que caracteriza uma federação efetiva. A autonomia subnacional que caracteriza uma federação requer quatro tipos de descentralização do poder político, estabelecidos na constituição e aplicados no governo do Estado nacional: 1. Descentralização política ou autogoverno: é condição primeira e indispensável para vigência de uma federação efetiva, significa a liberdade que têm os níveis subnacionais para constituírem seus governos sem a interferência do poder central. 2. Descentralização legislativa ou jurisdicional: a divisão de campos de atuação política para a União e os governos subnacionais significa estabelecer quem legisla sobre o que e de que forma: privativa ou concorrente. A descentralização legislativa significa assegurar aos entes subnacionais um espaço próprio para legislar, em assuntos de sua alçada que não podem ser assumidos pelo governo central. 3. Descentralização fiscal: envolve a garantia de recursos próprios aos governos subnacionais, através de arrecadação própria de tributos ou via repasses intergovernamentais obrigatórios (transferências do governo central, por exemplo). A autonomia para despender os recursos é outro aspecto da descentralização fiscal e significa que os recursos disponíveis para os níveis subnacionais não estão vinculados ou amarrados a determinados gastos, mas que há liberdade de escolha para alocar estes recursos. Por fim, a capacidade para endividar-se seria outro aspecto da descentralização fiscal e diz respeito à liberdade que têm os níveis subnacionais para contraírem empréstimos junto ao setor financeiro, interno e externo. 4. Descentralização administrativa: significa que esferas subnacionais de governo apresentam competências administrativas próprias, o que pressupõe a divisão territorial entre os níveis central e subnacionais das atribuições de governo (defesa externa, moeda, saúde, educação, segurança, habitação etc). fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce Os quatro tipos de descentralização permitem entender melhor o campo de constituição e competências dos governos territoriais em um Estado nacional e comparar as experiências federativas para verificar maior ou menor grau de descentralização entre elas. Antes, é possível verificar a condição de federação efetiva e, neste aspecto, a descentralização política tem destaque. Não há como falar de uma federação efetiva sem a existência de autonomia política subnacional, o que significa liberdade para a constituição dos poderes executivos e legislativos independentes do governo central. Um Estado em que os detentores de poder nos níveis territoriais subnacionais detenham competências legislativas, administrativas e recursos fiscais, mas estejam subordinados ao governo central, devendo obedecer às suas determinações, não é um Estado onde há autonomia subnacional e, portanto, federalismo. É nesta perspectiva que temos países unitários que delegam para esferas subnacionais competências administrativas e fiscais, sem o governo central abrir mão do controle sobre quem governa estas esferas e, ainda, podendo retomar tais atribuições a qualquer momento. Alguns estudiosos preferem o termo desconcentração, ao invés de descentralização, para caracterizar esta situação marcada por uma situação hierárquica nas relações intergovernamentais. Federalismo e Democracia No mundo moderno predominam duas formas de organização territorial do poder político nos Estados nacionais: federalismo e unitarismo. Por outro lado, o regime político nestes mesmos Estados pode ser democrático ou autoritário. A forma de distribuição do poder político territorialmente é algo muito distinto de como este mesmo poder político se estrutura na relação Estado e sociedade. O que determina a condição democrática de um Estado é a vigência de soberania popular, entendida como a participação igualitária dos cidadãosna escolha de seus governantes através de "eleições livres, periódicas e competitivas" - para ficarmos nas condições mínimas definidas por Schumpeter, 1943. Será autoritário, portanto, todo o Estado cujo governo não for expressão da soberania popular. Por outro lado, a diferença entre federação e unitarismo diz respeito à forma como o poder político está organizado territorialmente: há um único centro político territorial (governo central) que controla todo o Estado nacional ou o poder político está distribuído por mais de um nível territorial de governo (governo central e governos constituintes). Desta forma, podemos ter Estados unitários democráticos ou autoritários. Contudo, em relação ao federalismo, defenderemos que ele só é compatível com um regime democrático e que todo Estado fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce autoritário só comporta uma organização territorial de poder: a unitária. Isto significa dizer que a democracia é condição para a vigência de um federalismo efetivo. A federação surgiu como resposta à formação ou manutenção de Estados nacionais marcados por interesses centrífugos de autonomia política subnacional. Esta resposta foi essencialmente democrática: um pacto constitucional que possibilitou a acomodação dos dois interesses conflitantes, o de unificação e o de autonomia às subunidades territoriais. Em contextos distintos, autoritários, pode o federalismo emergir ou se sustentar? A resposta é negativa porque o federalismo como um pacto corporificado em uma constituição é uma organização territorial que requer garantias legais, e estas só podem ser sustentadas num estado liberal democrático, onde o governo está subordinado à lei. O pacto federal significa: 1) que as comunidades acatam a existência de um centro político nacional, 2) que há consenso do centro e das partes envolvidas em torno das políticas que estabelecerão a comunidade política - o que significa delimitar o campo de ação de cada nível de governo e (3) que há garantia constitucional e institucional de autonomia para cada ente federativo, o que significa, entre outras coisas, a autonomia para cada ente constituir seu próprio governo (autogoverno). Regimes autoritários podem prescindir do pacto federal porque a unidade pode ser alicerçada em bases muito distintas: o núcleo central pode promover, via coerção, a união de territorialidades heterogêneas, caminho que dispensa barganhas. A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), que teve vigência de 1922 a 1991, é exemplar de como o autoritarismo pode ser uma via alternativa ao federalismo para criar um amplo Estado nacional. Diversos grupos territoriais foram incorporados à União Soviética através da força militar, uma constituição dita federal foi elaborada e definiu institucionalidades típicas de um arranjo federalista, mas a prática política era de domínio do governo central, comandado sempre pelo Partido Comunista da União Soviética (regime de partido único), sobre as repúblicas soviéticas. O pacto federal não somente é avesso a um Estado nacional que se constitui pela coerção, como não pode persistir sob um regime autoritário. Desta forma, mesmo estabelecido, o pacto deixa de ter vigência quando o regime passa a ser autoritário. Isto porque a federação é a negação, no nível das relações territoriais de poder, do autoritarismo. É difícil imaginar, e a história ratifica isto, que um regime autoritário possa conviver com o "desvio" federalista, ou seja, com governos subnacionais autônomos e que podem confrontar sua autoridade frente à União. A natureza do regime autoritário é incompatível com o federalismo porque sua fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce ascensão e manutenção ocorrem pela concentração do poder no nível central, definindo este como única autoridade soberana com poder para determinar toda a vida do Estado. Para chegar a esta situação, necessita cercear a livre expressão dos cidadãos na escolha de seus representantes políticos e na manifestação dos seus interesses. Desta forma, o autoritarismo é avesso ao federalismo que se define pela barganha política, pelo reconhecimento recíproco entre União e unidades subnacionais, pelos checks and balances, pela livre expressão dos interesses centrífugos. Os regimes autoritários que assolaram os países federalistas da América Latina (Brasil, México, Argentina e Venezuela) e os regimes autoritários socialistas da URSS e da Iugoslávia exemplificam a incompatibilidade entre governo central autoritário e autonomia subnacional. Apesar destes países preservarem constituições e instituições caracterizadas como federais e mesmo certa descentralização administrativa e fiscal, a condição de autogoverno subnacional foi suprimida. Os governos subnacionais não tinham autonomia para constituir seus próprios governos e atuar de forma autônoma frente ao governo central, prevalecia o centralismo autoritário que controlava os Executivos, Legislativos e Judiciários subnacionais. A democracia é um requisito para o federalismo efetivo, mas há também importantes implicações do federalismo para a democracia. Em outras palavras, um regime democrático federal é distinto de um regime democrático unitário. O federalismo em um país imprime um caráter consociativo à democracia, conforme sustenta Lijphart (2008). O trabalho de Lijphart (2008), a partir da observação do funcionamento da democracia em 36 países, distinguiu dois modelos de democracia: o modelo majoritário e o modelo consociativo. Os dois modelos se distinguem porque defendem diferentes princípios para as tomadas as decisões políticas dentro de um país. O modelo majoritário defende a igualdade plena entre os indivíduos nos processos de tomada de decisões e o predomínio da regra da maioria – a vontade da maioria prevalece diante de alternativas minoritárias. O modelo consociativo nega que a vontade da maioria seja a legítima expressão da soberania popular e defende uma democracia capaz de incorporar nos processos decisórios o maior número possível de pessoas e mecanismos capaz de limitar o poder da maioria e garantir os direitos de minorias. O federalismo é uma dimensão fundamental da democracia consociativa ao reconhecer o direito de autogoverno às comunidades territoriais relevantes e ao definir um campo próprio de atuação para estas, não submetido às decisões da maioria nacional. Ainda, é garantido aos entes subnacionais um espaço de representação no governo nacional, geralmente uma segunda fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce casa legislativa denominada Senado, na qual cada unidade territorial tem participação igualitária, independente do tamanho de sua população. Neste caso, a representação de interesses territoriais prevalece sobre a representação dos indivíduos e tem o intuito de evitar que as decisões de uma maioria nacional possam contrariar interesses caros às comunidades territoriais que compõem o Estado nacional. A democracia federativa é particularmente recomendável para sociedades marcadas por clivagens territoriais relevantes. Em sociedades mais homogêneas, a democracia unitária pode não apresentar maiores problemas porque as decisões da maioria nacional nãodiferem muito dos interesses subnacionais. Contudo, em sociedades marcadas por clivagens territoriais relevantes, que podem ter origem linguística, étnica, religiosa ou histórica, a configuração unitária do poder pode significar instabilidade política e ameaça à democracia, na medida em que submete os interesses subnacionais às decisões da maioria nacional representada no governo central. A conclusão é que a relação entre federalismo e democracia é crucial. Por um lado, a democracia é condição para a vigência de uma federação efetiva, por outro, a democracia, em países marcados por heterogeneidades de base territorial, adquire maior estabilidade sob a forma federada e apresenta uma perspectiva consociativa. 3. O FEDERALISMO NO BRASIL Os interesses centrífugos que impeliram o Brasil à adoção do federalismo no final do século XIX têm origens longínquas, no processo de colonização portuguesa. Portugal tinha o desafio de manter o domínio sobre um amplo território, no além-mar, e contava com poucos recursos e interesse para gastar tão vultosas somas em tal empreitada. A solução, adotada em 1534, foi privatizar a conquista do território, transferindo a particulares (donatários) o direito de explorar subdivisões territoriais da colônia denominadas capitanias hereditárias. Isto resultou em uma estrutura marcada por um poder central débil e por unidades territoriais que detinham ampla autonomia política, algo que persistiu ao longo do período colonial, mesmo após a instalação do Governo Geral, em Salvador, em 1458. O período pós-independência, o primeiro reinado de D. Pedro I (1822-1831) e o período regencial (1831-1840), foi marcado pelo confronto entre as forças centrípetas, que defendiam um Estado unitário, e as forças centrífugas, que reivindicam autonomia às esferas subnacionais (províncias). As forças centrífugas resistiram ao unitarismo absolutista que D. fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce Pedro I pretendia implementar no país e o monarca abdicou do poder em 1831. Estas forças expressavam os interesses das oligarquias agrárias regionais de conservarem a autonomia e o poder político que desfrutavam no período colonial. A democracia federal não era interesse das oligarquias e, quando as rebeliões regionais do período regencial (1831 a 1840) passaram a contar com maior apoio popular e constituir-se em ameaça à unidade nacional e à ordem econômica e social vigente, elas aderiram ao centralismo monárquico como resposta para "acomodar" os interesses territoriais conflitantes. O segundo reinado, iniciado com o golpe da maioridade de D. Pedro II, em 1840, foi marcado pelo centralismo monárquico que estabeleceu uma estrutura unitária de organização territorial do poder em nome da unidade política do país e da manutenção da ordem. Os conflitos regionais e as demandas subnacionais foram apaziguados, houve um acordo político no plano central para contemplar os interesses das oligarquias provinciais dominantes e acomodá-las no poder legislativo central. Isto propiciou uma longa estabilidade política ao país e consolidou uma identidade nacional e um poder central fortes, afastando o perigo de fragmentação do Estado nacional. Contudo, ao final do século XIX, forças políticas descentralizadoras, compostas pelas novas oligarquias rurais dominantes e por setores intelectuais e de classe média urbanos, abraçaram a bandeira do federalismo e da república para confrontar o centralismo monárquico. A República Federativa foi proclamada no Brasil pelo Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889: Art 1º - Fica proclamada provisoriamente e decretada como a forma de governo da Nação brasileira - a República Federativa. Art 2º - As Províncias do Brasil, reunidas pelo laço da Federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil. Esta condição foi ratificada na Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, em 1891. Contudo, uma efetiva República Federativa foi algo distante do modelo político que vigorou na Primeira República (1891 a 1930). As oligarquias rurais situadas nos estados mais ricos do país, São Paulo e Minas Gerais, ampliaram seu poder e dominaram o governo central, conduzindo-o em função de seus interesses, mantendo a grande massa da população excluída do processo decisório e marginalizando as outras províncias. fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce A Revolução de 30, início da Era Vargas, foi resultado de uma nova conformação social e política no país, na qual passam a ter relevância atores sociais urbanos que mobilizam e passam a reivindicar espaço político: profissionais liberais, comerciantes, militares, empresários e trabalhadores industriais, etc. Neste contexto, a política deixa de ser oligárquica e ganha conotação de massa, com a ampliação do direito de voto e maior rigor no processo eleitoral (voto secreto, feminino, criação da Justiça eleitoral). A expansão dos direitos políticos e sociais expõe a tensão de conciliar capitalismo e democracia e, na busca de acomodação para esta tensão, prevaleceram os golpes políticos do Estado Novo (1937-45) e da Ditadura Militar (1964-85). O período republicano pós 1930 configura um período de grande instabilidade na política brasileira, marcada pela oscilação entre períodos de autoritarismo unitário e democracia federativa. O Estado Novo, a despeito de designar o Brasil como Estado federal na Constituição de 1937, promoveu uma ampla centralização política, na qual o governo central passou a nomear interventores estaduais e as assembleias estaduais foram dissolvidas (Carvalho, 1996). O período posterior, de 1946 a 1964, correspondeu à primeira experiência democrática e de federalismo efetivo no país. Os poderes executivos e legislativos nacionais e subnacionais passaram a ser eleitos pelo voto universal e com transparência e liberdade política, houve também descentralização fiscal, administrativa e legislativa em favor dos estados e, em menor grau, dos municípios, estabelecendo as condições de autonomia subnacional e de maior equilíbrio de poder entre União e Estados (Abrucio, 1998). O golpe militar de 1964, diante da “ameaça comunista”, trouxe a volta do autoritarismo unitário. O governo central, controlado pelos militares, suprimiu os partidos políticos e impôs o bipartidarismo, cancelou as eleições diretas para os executivos estaduais e passou a indicar os governadores. Em síntese, podemos dizer que a federação não foi uma constante na história do Brasil República porque a democracia não o foi. As experiências autoritárias do Estado Novo e de 1964 evidenciam como o autoritarismo é unitarista, visto que a sua natureza (centralista) acaba por suprimir a autonomia subnacional. O atual modelo federativo brasileiro surgiu a partir do processo de abertura política do regime autoritário na década de 1970, que culminou no restabelecimento da democracia e da organização federativa no Brasil. Assim, a segunda experiência democrática e federativa brasileira, é iniciada oficialmente com a eleição de Tancredo Neves, em 1985, tendo seus contornos mais nítidos definidos na Constituição de 1988. fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realcefviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce Em decorrência do papel proeminente que assumiram os governadores de estado no processo de transição democrática e o trauma, ainda recente, da experiência centralista autoritária, a questão federal ganhou primazia no debate político da época numa perspectiva centrífuga. A descentralização territorial era defendida em nome do federalismo e da democracia, pois se tratava de restabelecer as condições políticas e econômicas de autonomia das unidades federadas. O resultado deste contexto foi um amplo processo de descentralização territorial, com a retomada da autonomia política dos estados e municípios, podendo estes estabelecer seus próprios governos de forma independente do poder central; a emergência do município como terceiro ente federativo, algo raro nas experiências federativas mundiais; e a ampla descentralização fiscal que aumentou a participação dos estados, mas principalmente dos municípios, na distribuição das receitas públicas. Houve também alguns desajustes. A descentralização fiscal não foi acompanhada de maior descentralização administrativa, principalmente no campo das políticas sociais que se expandiram com a Constituição, o que provocou uma contradição entre maiores recursos fiscais para estados e municípios e maiores responsabilidades sociais para União. Outro desajuste foi devido à descentralização não ter sido acompanhada de maior responsabilização fiscal dos entes federados, o que resultou em endividamento público crescente e ameaça à estabilidade econômica do país. A partir de 1994, algumas destas inconsistências foram minimizadas. O governo central ampliou seus recursos, principalmente através das contribuições sociais, o que possibilitou o aumento de gastos em políticas sociais; estados e municípios passaram a ter que destinar um patamar maior de seus gastos para educação e saúde; e foi produzida uma rígida legislação de responsabilização fiscal para os entes federados, com destaque para a Lei de Responsabilidade Fiscal, do ano 2000. A conclusão é que o Brasil é hoje uma federação democrática e que tem evoluído positivamente na direção de consolidar estas duas condições. Contudo, muitos desafios precisam ser enfrentados no campo das relações territoriais de poder, dentre estes, se destacam: 1) o papel pouco definido dos estados na dinâmica federativa, 2) os poucos mecanismos de coordenação e cooperação intergovernamental que fazem do federalismo brasileiro altamente competitivo e, 3) mais importante, a superação do alto grau de desigualdade social entre as regiões e os indivíduos (Souza, 2005). fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce fviana Realce QUADRO RESUMO Neste capítulo apresentamos o federalismo, forma de Estado surgida nos Estados Unidos da América, em 1787, que se expandiu pelo mundo, sendo adotado por um conjunto de 30 países na atualidade, incluindo o Brasil, que estabeleceu o federalismo com a proclamação da República, em 1889. Vimos que o federalismo é um arranjo marcado pela dupla autonomia territorial do poder político e, como tal, possibilita conciliar centralização e descentralização política, unidade e diversidade de interesses territoriais, em um Estado nacional. Assim, se diferencia do Estado Unitário pela maior descentralização e do Estado Confederado pela maior centralização. A relação entre federalismo, descentralização e democracia foi destacada. O federalismo requer um tipo de descentralização do poder político que engloba autogoverno, descentralização legislativa, descentralização fiscal e descentralização administrativa. Com respeito à democracia, foi defendido que a democracia é uma condição para a existência de uma federação efetiva, não podendo esta emergir ou se manter em um regime autoritário, que tem por cerne a centralização do poder, inclusive em termos territoriais. Por outro lado, vimos que o federalismo impacta a democracia, dotando-a de um caráter mais includente (consociativo) e propiciando maior estabilidade a Estados nacionais marcados por heterogeneidades de base territorial. A apresentação da trajetória do federalismo no Brasil aponta que, apesar do federalismo sempre ter sido preceito constitucional, desde 1891, sua vigência efetiva somente ocorreu na República Democrática de 1946 e a partir de 1985. Na Primeira República (1891 a 1930), o “federalismo” assumiu a forma de domínio das oligarguias rurais das províncias de São Paulo e Minas Gerais sobre o governo central e as outras províncias. No período pós 1930, o federalismo brasileiro oscilou, resultado da instabilidade democrática do período republicano, sendo banido nas experiências autoritárias do Estado Novo (1937-45) e da Ditadura Militar (1964-85). O período atual, pós 1985, restabelece plenamente a democracia e o federalismo ao país e apresenta perspectivas positivas, mas também desafios importantes para o federalismo, o maior deles consiste em promover uma maior igualdade social entre nossas territorialidades. PARA RESPONDER Ao final da leitura do capítulo, o leitor deverá estar hábil para responder as seguintes questões: 1. O que é federalismo e quais suas principais características? 2. Qual é a origem e a evolução do federalismo no mundo? 3. Quais são as outras formas de Estado e como elas se diferenciam do federalismo? 4. Qual é a relação entre federalismo, descentralização e democracia? 5. Qual é a trajetória do federalismo no Brasil? 6. Quais são as principais características e desafios da federação brasileira no período democrático atual? BIBLIOGRAFIA BÁSICA ABRUCIO, Fernando Luiz. (1998), Os Barões da Federação: os governadores e a redemocratização brasileira. São Paulo: Hucitec/USP. CARVALHO, José Murilo. 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