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UNIP - Universidade Paulista Faculdade de Psicologia Genética Humana Prof. Dr. Márcio Cordeiro Goiânia/GO 2 Capítulo 1 – Introdução à Genética e à Biologia Molecular 1. Conceitos básicos da genética 1.1. CROMOSSOMO, GENE E DNA Genética é a ciência que estuda a transmissão das características hereditárias ao longo das gerações. Por volta de 1986, Gregor Mendel postulou duas Leis que serviriam como ponto de partida e até hoje são a base do estudo da hereditariedade. Abordaremos neste tema alguns conceitos básicos da genética que irão auxiliar no entendimento de outros conteúdos sobre o assunto. Cromossomo X Gene X DNA A molécula de ácido desoxirribonucleico (DNA) carrega todas as informações e características genéticas dos seres vivos. Os cromossomos são constituídos por uma longa fita de DNA que se enovelam com uma proteína, denominada histona. Os cromossomos estão organizados aos pares no interior do núcleo das células diploides (2n) e cada par é denominado cromossomo homólogo. O conjunto de cromossomos de uma célula forma o cariótipo, onde em seres humanos, 22 pares correspondem aos cromossomos autossomos e 1 par aos cromossomos sexuais. Os fragmentos de DNA em um cromossomo são denominados genes, responsáveis pela síntese de uma proteína específica que condiciona um caráter, como por exemplo, a cor dos olhos. Em um cromossomo homólogo, os pares de genes localizados no mesmo local, ou melhor, locus gênico, que determina o mesmo caráter, são denominados genes alelos. Genoma é o conjunto de todos os genes em um organismo. Genótipo X Fenótipo O genótipo corresponde ao conjunto total de genes de um indivíduo. Entretanto, o fenótipo são as características determinadas pelo genótipo manifestadas pelo indivíduo, como por exemplo, o tipo sanguíneo. O fenótipo pode ser alterado pelo meio, ou seja, os fatores ambientais, como, por exemplo, a mudança na coloração dos pelos em coelhos himalaios em função da temperatura do ambiente. À baixa temperatura (5ºC), os coelhos apresentam coloração preto e branco, enquanto que, ao elevar a temperatura para 20ºC, os coelhos ficam com coloração apenas branca. Homozigose X Heterozigose Os genes alelos quando se apresentam iguais num certo locus são denominados homozigotos, sendo considerados puros para um caráter e são representados por duas letras iguais, por exemplo, AA ou aa. Entretanto, quando os genes alelos são diferentes, estes são denominados heterozigotos, sendo considerados híbridos para um caráter e são representados por duas letras diferentes, por exemplo Aa. Gene dominante X Gene recessivo O gene dominante é aquele que determina o mesmo fenótipo, tanto em homozigose (AA) como em heterozigose (Aa). O gene recessivo só se expressa com os alelos em homozigose (aa). Logo, os alelos podem ser representados: AA – homozigoto dominantes aa – homozigoto recessivo Aa - heterozigoto 3 2. Estrutura dos Ácidos Nucléicos Na natureza há dois tipos de ácidos nucléicos: o DNA ou ácido desoxirribonucléico e o RNA ou ácido ribonucléico. Analogamente a um sistema de comunicação, essas informações são mantidas dentro da célula em forma de código, que no caso denomina-se código genético. Em sua estrutura primária, os ácidos nucléicos (DNA e RNA) podem ser vistos como uma cadeia linear composta de unidades químicas simples chamadas nucleotídeos. Um nucleotídeo é um composto químico e possui três partes: um grupo fosfato, uma pentose (molécula de açúcar com cinco carbonos) e uma base orgânica (Figura ao lado). Nas moléculas de DNA a pentose é uma desoxirribose enquanto que nas moléculas de RNA a pentose é uma ribose. A base orgânica, também conhecida como base nitrogenada, é quem caracteriza cada um dos nucleotídeos, sendo comum o uso tanto do termo seqüência de nucleotídeos quanto o termo seqüência de bases. As bases são: adenina (A), guanina (G), citosina (C), timina (T) e uracila (U), sendo as duas primeiras chamadas de purinas e as três últimas chamadas de pirimidinas. No DNA são encontradas as bases A, G, C e T. No RNA encontra-se a base U ao invés da base T. A ligação entre os nucleotídeos (ligações fosfodiéster) de uma cadeia linear é feita entre o grupo químico chamado hidroxila (OH) ligado ao terceiro carbono da pentose de um nucleotídeo, e o fosfato do nucleotídeo seguinte ligado ao carbono 5‟ da pentose do mesmo. Por convenção, as seqüências são representadas na orientação 5' 3'. Moléculas de DNA compõem-se de duas fitas, que se ligam entre si formando uma estrutura helicoidal, conhecida como hélice dupla. As duas fitas unem-se pela ligação regular das bases de seus nucleotídeos. A base A sempre se liga a base T (por 2 pontes de hidrogênio) e a base G sempre liga-se a base C (por 3 pontes de hidrogênio). As duas fitas são antiparalelas, ou seja, as fitas possuem orientação 5' 3' opostas uma em relação a outra. PURINAS PIRIMIDINAS Purina Adenina Guanina Pirimidina Citosina Uracila Timina PURINAS PIRIMIDINAS PURINAS PIRIMIDINAS Purina Adenina Guanina Pirimidina Citosina Uracila Timina Ligação FosfodiésterLigação Fosfodiéster 4 AntiparalelasAntiparalelas O RNA é uma molécula intermediária na síntese de proteínas, ela faz a intermediação entre o DNA e as proteínas. Ele é formado por uma cadeia de ribonucleotídeos, que, por sua vez, são formados por um grupo fosfato, um açúcar (ribose), e uma base nitrogenada. Esses ribonucleotídeos são ligados entre si por meio de uma ligação fosfodiéster entre o carbono 3' do nucleotídeo de anterior e o carbono 5' do nucleotídeo de posterior. As principais diferenças entre o RNA e o DNA são sutis, mas fazem com que o último seja mais estável do que o primeiro. O RNA é formado por uma fita simples, o açúcar de seu esqueleto é a ribose e uma de suas bases pirimídicas (de anel simples) é diferente da do DNA. Ele possui Uracila ao invés de Timina. Os principais tipos de RNA são os RNAs mensageiros (mRNAs), os transportadores (tRNAs) e os ribossomais (rRNA). Os RNAs mensageiros são aqueles que codificam as proteínas e que devem ter seus códons lidos durante o processo de tradução. Os RNAs ribossomais fazem parte da estrutura do ribossomo, junto com diversas outras proteínas e são eles que catalisam a ligação entre dois aminoácidos na síntese de proteínas. Os RNAs transportadores são aqueles que fazem a conexão códon-aminoácido pois carregam um aminoácido específico de acordo com seu anticódon (complementar ao códon do mRNA). 3. Síntese de Proteínas A transcrição é um processo de decodificação da mensagem contida em um gene para uma fita de RNA e é realizado por uma enzima chamada RNA polimerase. Pelo fato dos promotores (seqüências regulatórias dos genes) possuírem seqüências de nucleotídeos comuns (conservadas), esta enzima as reconhece e liga-se nelas, dando início à síntese da molécula de mRNA (transcrição), o que explica como a enzima RNA polimerase consegue reconhecer o lugar onde se ligar. A molécula de RNA que é produzida pode ser um mRNA (RNA mensageiro), um rRNA (RNA ribossomal) ou um tRNA (RNA transportador). Uma molécula de RNA mensageiro contém a informação para produzir proteínas. 5 A tradução é o processo de síntese ou fabricação de proteínas (construção da cadeia de aminoácidos). Para a fabricação das proteínas é necessário que estruturas celulareschamadas ribossomos decodifiquem a mensagem contida na molécula de mRNA para uma cadeia de aminoácidos. A decodificação está baseada em trincas de nucleotídeos, chamadas códons, que são usados para especificar o aminoácido. A correspondência entre uma trinca de nucleotídeos e um aminoácido é chamada de código genético. Combinando os 4 nucleotídeos em triplas obtém-se 64 combinações. Embora esse número seja superior aos 20 aminoácidos existentes, mais do que um códon pode representar um mesmo aminoácido. Dentre os códons possíveis, 3 não especificam aminoácidos, e referem-se a sinais de terminação da síntese de um cadeia de aminoácidos. Esses códons são chamados de códons de parada (stop codons). O código genético estabelece também um códon de início (start codon), pelo qual começa o processo de tradução do mRNA. Na maioria das proteínas o códon de início especifica o aminoácido metionina, que também está presente no interior das cadeias. Sumariamente, o processo de tradução é realizado da seguinte maneira: ao combinar-se com os ribossomos, o mRNA tem sua seqüência de códons lida, e para cada códon o respectivo tRNA é atraído até os ribossomos, e pela complementaridade de bases é feita a ligação entre o códon (do mRNA) e o anticódon (do tRNA), liberando o aminoácido carregado pelo tRNA que é então ligado à cadeia crescente do polipeptídio. Moléculas de tRNA agem como adaptadores entre a seqüência codificante dos nucleotídeos do mRNA e o aminoácido que é codificado. Uma ponta dessa molécula carrega o aminoácido e uma outra ponta consiste de uma seqüência de três nucleotídeos conhecida como anticódon. A síntese da proteína é encerrada quando os ribossomos encontram um códon de parada no mRNA. 4. Dogma Central da Biologia Molecular O Dogma Central da Biologia Molecular foi descrito por Francis Crick na tentativa de relacionar o DNA, o RNA e as proteínas. O DNA pode se replicar e dar origem a novas moléculas de DNA, por um processo denominado replicação, pode ainda ser transcrito em RNA (tradução), e este por sua vez traduz o código genético em proteínas (tradução). Dogma Central: 5. Mutação De acordo com a teoria da evolução, a vida na terra começou com a evolução da célula, a partir da qual se desenvolveram os organismos mais simples. Estes deram origem aos organismos mais complexos. Os novos genes e novas informações surgiram por mutação. As mutações ocorrem ao acaso. A maioria delas é deletéria e diminuirá a adaptação dos organismos ao meio ambiente. Novas combinações do material genético são formadas por meio da recombinação de genes que ocorre na meiose, durante a reprodução sexuada. A seleção natural elimina as mutações deletérias e preserva as combinações disponíveis que estão mais bem adaptadas ao ambiente. Pode-se então perceber que, segundo a teoria da evolução, a mutação e seleção natural constituem-se nos principais fatores evolutivos. Mas será que elas somente seriam capazes de, a partir de organismos unicelulares, originarem toda a grande variedade de seres vivos que temos hoje? A mutação pode ser definida como um evento que dá origem a alterações qualitativas ou quantitativas no material genético. Podem ser de dois tipos: (1) mutação gênica (mutação de ponto): são alterações muito pequenas que não afetam os cromossomos de maneira visível, pois envolvem alterações num número reduzido de nucleotídeos da molécula de DNA. Podem ser substituições de bases ou adições ou deleções de nucleotídeos na molécula de DNA. Como exemplo, podemos citar a anemia falciforme. (2) Mutação cromossômica ou aberração cromossômica: são mutações que alteram de maneira visível ao microscópio, seja o número, seja a estrutura dos cromossomos. As aberrações cromossômicas podem ser numéricas ou estruturais. As numéricas envolvem alterações no número cromossômico. São as aneuploidias. Os organismos euplóides apresentam células com um ou mais conjuntos gênicos: haplóide (n), diplóide (2n), triplóide (3n), poliplóides. Aneuploidias: neste tipo de modificação, o número de cromossomos do genoma fica alterado, formando complementos somáticos que são múltiplos irregulares do genoma característico da espécie. Assim, o indivíduo tem Replicação Transcrição Tradução 6 cromossomos a mais ou a menos em um dos pares, mas não em todos. Como exemplo, podemos citar as síndromes de Down (trissomia do 21), Patau (trissomia do 13), Klinefelter (trissomia dos cromossomos sexuais, XXY), Edwards (trissomia do 18) e Turner (monossomia do cromossomo sexual, X). As estruturais afetam a estrutura dos cromossomos, ou seja, o número ou o arranjo dos genes nos cromossomos. Podem ser divididas em: (1) deleção: é a perda de uma porção maior ou menor do cromossomo, resultando na falta de um ou mais genes; (2) duplicação: é o produto da presença de uma porção extra de cromossomo, resultando na repetição de um ou mais genes; (3) inversão: ocorre quando, num determinado segmento de cromossomo, houver duas fraturas, seguidas da subseqüente união do fragmento mediano, agora, porém, colocado em posição invertida; (4) translocação: ocorre quando os fragmentos de um cromossomo são transferidos para outro cromossomo não homólogo. A maioria das mutações gênicas estudadas é deletéria e recessiva. É altamente improvável que uma mutação possa ser construtiva. Mudanças casuais em qualquer sistema complexo integrado provavelmente perturbarão o sistema. Assim, as mutações podem causar doenças. Apesar de que a maioria das mutações torna os organismos menos eficientes, sendo assim desvantajosas, existe a possibilidade de desenvolver novas características desejáveis por meio das mutações. Segundo a teoria da evolução, a mudança começa com o material genético fornecido por mutações casuais e recombinação. A seleção natural é o processo chave que age sobre a casualidade da mutação e seleciona as características apropriadas para melhorar a adaptação dos organismos. A maioria das mutações é deletéria, mas a seleção natural é efetiva em eliminar as mutações mais destrutivas e preservar as benéficas. Conseqüentemente o efeito resultante melhora a adaptação ao ambiente, o que leva à produção de novos genes, novas adaptações e mesmo novos sistemas de órgãos. 7 Capítulo 2 – Heredograma e Heranças Genéticas 1. Definição: Heredograma é a representação da herança genética de determinada caracteristica de indivíduos de uma mesma famíla, por meio de símbolos. Tais como: 2. Grau de Parentesco: Parentes de 1 o grau são os pais, os irmãos e os filhos, de 2 o grau são os avós, os tios, os sobrinhos e os netos, de 3 o grau são os primos em primeiro grau e finalmente de 4 o grau são os primos de outros graus. 3. Herança Autossômica Dominante Na herança autossômica dominante um fenótipo é expresso da mesma maneira em homozigotos e heterozigotos. Toda pessoa afetada em um heredograma possui um genitor afetado, como no heredograma ao lado. Nos casamentos que produzem filhos com uma doença autossômica dominante, onde ambos os genitores são heterozigóticos para a mutação. Cada filho desse casamento tem uma chance de 75% de receber o alelo anormal (A) e, portanto ser afetado, e uma chance de 25% de receber o alelo normal (a) e, assim não ser afetado (a/a). 3.1. Critérios da Herança Autossômica Dominante O fenótipo aparece em todas as gerações, e toda pessoa afetada tem um genitor afetado. Desta forma, os fenótipos são comuns. Qualquer filho de genitor afetado tem um risco de 50% de herdar o fenótipo. Familiares fenotipicamente normais não transmitem o fenótipo para seus filhos. Homens e Mulheres têm a mesma probabilidade de transmitir o fenótipo aos filhos de ambos os sexos. 8 3.2. Acondroplasia O termo acrondroplasia refere-se a umacausa de baixa estatura, com face característica e membros curtos. A incidência da acondroplasia situa-se entre 1 em 16000 e 1 em 25000 nascimentos. É uma patologia resultante de mutações no gene do receptor do fator de crescimento dos fibroblastos. No diagnóstico diferencial devem tomar-se em consideração as outras formas de nanismo com encurtamento dos membros. Os doentes com acondroplasia têm encurtamento proximal dos membros. As radiografias do esqueleto apresentam alterações específicas, nomeadamente, no nível das vértebras lombares e da bacia. O diagnóstico de acondroplasia é feito pelo exame clínico e pela observação de radiografias do esqueleto do indivíduo afetado. A análise de DNA pode ser realizada, mas não é habitualmente necessária. Apesar da inteligência dos afetados ser normal, as complicações do sistema nervoso central são as maiores preocupações nas crianças com acondroplasia. Nestas crianças, há um risco acrescido de compressão do tronco cerebral e da medula espinhal. Esta compressão pode provocar apneias (interrupção da respiração), atraso de desenvolvimento ou morte súbita. Pode também estar associada à hidrocefalia (acumulação de líquido nas cavidades cerebrais). É importante não esquecer que muitas das crianças com acondroplasia têm diferentes graus de diminuição do tônus muscular e de atraso de desenvolvimento. Outras complicações da acondroplasia incluem: doença pulmonar restritiva com diminuição da oxigenação do sangue ou infecções; e ligeira intolerância à glicose. Os indivíduos do sexo feminino têm um risco acrescido de fibromas uterinos com fluxos menstruais abundantes, e, em conseqüência de terem uma bacia estreita é necessário realizar partos por cesariana. Os cuidados médicos durante a infância são importantes de forma a prevenir as complicações. O perímetro cefálico e o desenvolvimento psicomotor devem ser comparados com tabelas específicas para doentes com acondroplasia, para que alterações destes parâmetros sejam valorizadas precocemente. Os pais devem ser alertados para a possibilidade de ocorrerem apneias. Pode haver necessidade de considerar uma solução cirúrgica. O tempo cirúrgico e a utilidade desta cirurgia ainda não constituem um recurso terapêutico consensual. Outra preocupação precoce são os cuidados preventivos para minimizar as alterações ósseas. As crianças com acondroplasia necessitam de um apoio da cabeça adicional durante a infância. A atividade normal da criança não deve ser sujeita a restrições uma vez que não causa qualquer lesão. Medidas dietéticas devem ser instituídas precocemente para evitar a obesidade, uma vez que esta predispõe à compressão dos nervos e artrose. A avaliação da audição deve ser realizada anualmente até os 3 ou 4 anos, por causa das otites freqüentes e da possibilidade de perda de audição. As novas terapêuticas para a baixa estatura, incluem a terapêutica com hormônio de crescimento e procedimentos cirúrgicos para alongamento dos membros. Ambas as terapêuticas são dispendiosas e envolvem alguns riscos. A hereditariedade da acondroplasia é autossômica dominante. Cerca de 75% dos doentes com acondroplasia apresentam novas mutações, o que explica que a maioria dos doentes tenham pais normais. Para pais não afetados com acondroplasia, o risco de recorrência será inferior a 1%. É de 50% quando um dos pais tem acondroplasia e quando ambos os pais têm acondroplasia, existe um risco de 50% de terem um filho com acondroplasia, 25% de terem um filho com uma forma de acondroplasia homozigótica letal e 25% de terem um filho de estatura normal. Os aspectos essenciais a serem mencionados durante o aconselhamento genético incluem: a estatura média de um adulto com acondroplasia (1,10 a 1,45 m) e o risco de hidrocefalia precoce e de compressão medular. O aconselhamento genético deve ser otimista quanto à inteligência, que está dentro dos parâmetros normais, à expectativa de vida que é normal e também às capacidades extraordinárias de adaptação destes doentes. Comunidades de apoio são necessárias para acompanhar os acondroplásicos, como os familiares, no conhecimento e na aceitação tanto da condição do portador da doença e como formas de trabalhar os problemas de ordem emocional que atinge estas pessoas. Infelizmente não há uma estatística de quantos acondroplásicos existem de fato na sociedade brasileira, isto dificulta a difusão de informações e a criação de fundações ou centros de apoio. Do ponto de vista social, no Brasil, os portadores de acondroplasia sofrem um esquecimento por partes das autoridades responsáveis pelo desenvolvimento do bem estar social de seus cidadãos. 9 3.3. Neurofibromatose A neurofibromatose (NF) é uma doença genética autossômica dominante, de caráter hereditário, que pode prejudicar o desenvolvimento dos indivíduos e elevar as freqüências de tumores benignos e malignos. A NF é a patologia mais comum dentre as neurológicas causadas por um único gene; possui penetrância total e expressividade muito variável, sendo que algumas manifestações são progressivas e resultam em considerável morbidade e mortalidade, afetando igualmente ambos os sexos e nenhuma raça em particular. Essa doença é classificada em dois tipos principais, NF1 e NF2, causadas por diferentes genes, localizados nos cromossomos 17 e 22, respectivamente. A NF1 tem significativa prevalência, de 1:4000 indivíduos, e a maioria dos médicos provavelmente encontrará pelo menos um ou dois pacientes com essa desordem durante a carreira. Por outro lado, a NF2 acomete 1:40000, o que representa cerca de 3% do total de casos diagnosticados. A mais comum das manifestações de NF1 incluem manchas café-com-leite, neurofibromas, nódulos de Lisch e sardas axilares e inguinais. Outras anomalias associadas envolvem os mais variados sistemas: doença cardíaca congênita, fibrose adquirida do miocárdio causando obstrução no fluxo ventricular, fibrose intersticial pulmonar difusa, estenose de artéria pulmonar, dor abdominal, hemorragia do trato gastrointestinal, perfuração intestinal, anemia, icterícia, hipertensão, obstrução por neurofibromas, feocromocitoma, hipoparatireoidismo e raquitismo. Quando um marido ou mulher tem NF, alguns casais podem encontrar dificuldade para decidir se devem ter uma criança. Ninguém pode tomar essa decisão por eles. O médico deve ser prestativo em esclarecer algumas das preocupações freqüentemente manifestadas. Um pai com NF tem 50% de risco em cada gravidez de ter uma criança afetada. Comparado com o risco de 4 a 7% de qualquer casal na população geral de ter um filho com sérios problemas. Pais não afetados que têm uma criança com NF devido a mutação espontânea, não correm risco de 50% em futuras gestações. Suas chances de outra criança com NF1 é quase o mesmo de um casal da população geral, ou seja, uma chance em oito mil. O aconselhamento genético pode ajudar casais a refletir durante o processo de decisão. Conselhos genéticos não dizem ao casal o que fazer, no entanto fornecem informações esclarecem dúvidas e podem também expor possíveis alternativas como uma adoção ou uma inseminação artificial. Dessa forma, o casal é encorajado com o apoio do conselheiro a chegar à melhor decisão para eles. A NF pode ser extremamente estressante para muitos indivíduos afetados. Isolamento social e solidão são comuns. A incerteza sobre as possíveis futuras complicações da desordem e decisões de se contar aos amigos ou de se ter filhos são preocupações expressadas por muitos. Ansiedade sobre a necessidade de tratamento médico, sensação de perda de controle e sentimento de ser diferente dos outros são experiências freqüentes. A reação do público em geral em relação à desfiguração e o medo infundado de que NF é contagioso podem provocar situações desagradáveis. A NF acaba envolvendo tanto os pacientes como os familiares e isso precisaser considerado. 3.4. Doença de Huntington A Doença de Huntington (DH) é uma doença autossômica dominante, neurodegenerativa que afeta o movimento e conduz a um défict cognitivo e perturbações psiquiátricas. Habitualmente, torna-se evidente durante a vida adulta. A DH é a causa genética mais comum de movimentos involuntários arrítmicos, a que se dá o nome de “coréia”, sendo por isso anteriormente chamada “Coreia de Huntington” („khoreia‟ é a palavra grega para dança). A doença é causada por uma mutação autossômica dominante no gene da “Huntingtina” havendo portanto 50% de probabilidade de transmitir a doença à descendência. É mais comum em pessoas com origem na Europa Ocidental que em pessoas de origem Africana ou Asiática. Apresenta uma prevalência de 3 a 10 indivíduos por cada 100.000 no oeste Europeu e América do Norte. O gene da Huntingtina possui informação para uma proteína com o mesmo nome. A expansão da repetição do tripleto CAG, nesse gene, resulta numa forma mutante da proteína, que provoca lesão cerebral, através de mecanismos ainda não totalmente conhecidos. Os sintomas da Doença de Huntington podem aparecer em qualquer idade, no entanto, normalmente, surgem entre os 30 e os 50 anos. Podem variar muito entre indivíduos e até entre membros da mesma família, no entanto tendem a progredir de forma previsível. Geralmente, os sintomas mais precoces são alterações subtis de humor e cognição. As alterações do movimento e a marcha instável aparecem de seguida. Com a progressão da doença surgem os movimentos arrítmicos, súbitos e involuntários, associados a déficits nas capacidades mentais e comportamentais. As capacidades físicas ficam gradualmente afetadas, até que o movimento se torna muito difícil. As capacidades mentais geralmente declinam até à demência. O teste genético para detecção da doença pode ser feito em qualquer fase do desenvolvimento, mesmo antes da instalação de sintomatologia. Aconselhamento genético está disponível para esclarecimentos e orientação sobre os procedimentos de teste, assim como sobre as implicações da confirmação do diagnóstico. Estas implicações incluem o impacto psicológico no indivíduo, a sua carreira, planos para concepção, relações familiares e afetivas. Apesar da disponibilidade deste teste pré- sintomático, apenas cerca de 5% daqueles em risco, optam por fazê-lo. 10 Não existe cura para a DH, no entanto, existem vários tratamentos capazes de reduzir a gravidade dos sintomas, que devem ser experimentados. Essa abordagem inclui a devida atenção a questões cognitivas, psiquiátricas e de apoio social. 4. Herança Autossômica Recessiva Os distúrbios autossômicos recessivos expressam-se apenas em homozigotos, que, portanto, devem ter herdado um alelo mutante de cada genitor. O risco dos filhos receberem o alelo recessivo de cada genitor, e serem afetados é de 1/4. A maioria dos genes dos distúrbios autossômicos recessivos está presente em portadores dos genes. Eles podem ser transmitidos nas famílias por numerosas gerações sem jamais aparecer na forma homozigótica. A chance de isto acontecer é aumentada se os pais forem aparentados. A consangüinidade dos genitores de um paciente com um distúrbio genético é uma forte evidência em favor da herança autossômica recessiva daquela afecção. 4.1. Critérios da Herança Autossômica Recessiva O fenótipo é encontrado tipicamente apenas na irmandade do probando e o fenótipo salta gerações. O risco de recorrência para cada irmão do probando é de 1 em 4. Os pais do indivíduo afetado em alguns casos são consangüíneos. Ambos os sexos têm a mesma probabilidade se serem afetados. 4.2. Albinismo Albinismo é a ausência parcial ou total do pigmento melanina na pele, no cabelo e nos olhos. Pessoas de pele clara e rosada, olhos azul-acinzentados ou róseo-claros e cabelos esbranquiçados sofrem de albinismo, uma patologia congênita em que os pais, não necessariamente albinos, são portadores do gene causador da doença. Na fecundação, se os dois genes se juntam as células do bebê não são programadas para produzirem a melanima. Existe mais de um tipo de albinismo e alguns atingem apenas os olhos. Entretanto, a forma mais perigosa de albinismo é a que determina a total ausência de pigmento por todo o corpo denominada albinismo universal ou óculo-cutâneo. Os albinos apresentam grande susceptibilidade ao câncer de pele: sua longevidade está em média diminuída, devido a isso e a acidentes decorrentes da baixa acuidade visual. Os cuidados médicos consistem na proteção da pele contra a irradiação solar e no uso de óculos escuros e de grau. A doença decorre de um bloqueio incurável da síntese de melanina devido à ausência da enzima tirosinase nos melanócitos os quais estão, entretanto, presentes em número normal, mas são incapazes de produzir o pigmento. O albinismo óculo-cutâneo é um dos erros inatos do metabolismo de terminados por gene autossômico recessivo. Encontra-se consangüinidade entre os pais dos afetados em 20 a 30% dos casos. De uma forma geral, não há meios de prevenir o albinismo. Casais de famílias com histórico da doença devem passar por um trabalho de aconselhamento genético para evitar que seus filhos nasçam albinos. Não são necessários testes para diagnosticar o albinismo, pois seus sintomas são bem visíveis. A doença de forma alguma modifica ou diminui a expectativa de vida de seus portadores, mas o cotidiano de quem tem albinismo é limitado por causa da intolerância à luz solar. O câncer de pele e a cegueira são as maiores ameaças para essas pessoas, o que exige um monitoramento constante desses riscos. 4.3. Fenilcetonúria A Fenilcetonúria (PKU) é o mais comum dos erros congênitos do metabolismo de aminoácidos e afeta aproximadamente 1 em cada 12.000 recém-nascidos no Brasil. Por enquanto, não é curável por via medicamentosa, mas é possível tratá-la desde que o diagnóstico seja feito precocemente, evitando assim as graves conseqüências sobre o desenvolvimento do Sistema Nervoso Central. A doença resulta da 11 deficiência da enzima fenilalanina hidroxilase hepática, que converte a fenilalanina em tirosina, sendo o acúmulo de fenilalanina no sangue, o responsável pelos danos no cérebro. Por meio de testes de triagem realizados nos recém- nascidos, o chamado Teste do Pezinho, os bebês acometidos são diagnosticados e submetidos imediatamente a uma dieta especial, pobre em fenilalanina. Com o programa de triagem, obrigatório em todo Brasil, desde 1990, a PKU pode ser diagnosticada e tratada, possibilitando às crianças ter um desenvolvimento normal, sem as seqüelas neurológicas graves causadas por esta doença. As crianças fenilcetonúricas não podem ser diferenciadas de outras, nos primeiros meses de vida. No entanto, se não forem tratadas, começam a perder o interesse por tudo que as cerca e se tornam apáticas ao redor do 3° ao 6° mês de vida. Até o final do 1° ano de vida, já se verifica o retardo mental. A doença se manifesta, ainda, por meio de outros sintomas, tais como, irritação, ansiedade, e até, por convulsões, embora o retardo mental seja, sem dúvida a conseqüência mais grave. O aparecimento de descamação da pele e eczemas também são comuns, mas o desenvolvimento físico costuma ser normal. As crianças fenilcetonúricas não submetidas a uma dieta especial costumam apresentar níveis de fenilalanina plasmáticos iguais ou superiores a 20 mg/100mL de plasma sanguíneo, enquanto a concentração em crianças sadias se situa ao redor de 1 a 3 mg/100 mL de plasma. O início do tratamento, no primeiro mês de vida, ou preferencialmente entre o 7° e 10° dia de vida, se reflete num desenvolvimento neuro-psico-motor normal. Diversas pesquisas confirmam a necessidade de haver um controle rigoroso da dieta até no mínimo a adolescência. Mas, atualmente,recomenda-se a continuidade do tratamento pela vida inteira. 4.4 Galactosemia A Galactosemia é uma doença metabólica rara, de fundo genético. A deficiência de uma enzima do metabolismo da galactose não permite que esta seja transformada em glicose, principal fonte de energia do organismo. O acúmulo da galactose ou de seus metabólitos é a causa dos danos nos rins, fígado, cérebro e olhos ou até mesmo a morte em casos mais graves. A doença pode se manifestar em crianças e neonatos com a deficiência metabólica assim que a galactose é introduzida na dieta via leite materno, leites em geral, queijos e derivados. Os sinais da doença são normalmente vômitos, aumento do fígado, pigmentação amarelada da criança, entre outros. Os danos causados pela galactosemia podem ser menores se a doença for diagnosticada precocemente. Por isso, em muitos centros médicos a investigação da galactosemia já está sendo incluída no chamado "teste do pezinho" (ou triagem neonatal), uma medida simples que pode melhorar muito o prognóstico da doença. O tratamento é a base de dieta severa sem galactose e sem lactose, desde o período neonatal até, na maioria dos casos, o resto da vida com monitoramento constante através da dosagem do nível de galactose e seus metabólitos nas hemácias. Com o tratamento severo desde o período neonatal, os danos que podem ter ocorrido pré-diagnóstico no fígado, serão sanados, mas a incidência de complicações ovarianas, de linguagem e fala, coordenação motora e aprendizado são altas a longo prazo. 5. Herança Dominante Ligada ao Sexo (X) Um fenótipo ligado ao X é descrito como dominante se ele se expressar regularmente em heterozigotos. Em um heredograma dominante ligado ao X, todas as filhas e nenhum filho de homens afetados são afetados; se alguma filha não for afetada ou algum filho for afetado, a herança deve ser autossômica. 5.1. Critérios da Herança Dominante Ligada ao Sexo Não se distribui igualmente em homens e mulheres Não há transmissão de pai para filho Há mais mulheres do que homens afetados Manifesta em heterozigose ou em hemizigose (homens) Todas as filhas e nenhum filho de um homem afetado, serão afetados 6. Herança Recessiva Ligada ao Sexo (X) Uma mutação ligada ao X se expressa fenotipicamente em todos os homens que a recebem, mas apenas nas mulheres que são homozigóticas para a 12 mutação. Mulheres heterozigotas podem expressar o fenótipo (considerando a Hipótese de Lyon). O gene de um distúrbio ligado ao X às vezes está presente num pai e numa mãe portadora e, então, as filhas podem ser homozigóticas afetadas. 6.1. Critérios da Herança Recessiva Ligada ao Sexo Não se distribui igualmente em homens e mulheres Não há transmissão de pai para filho Há mais homens afetados do que mulheres Manifesta em homozigose ou em hemizigose (homens) Todas as filhas de um homem afetado, serão no mínimo portadoras 6.2. Distrofia Muscular de Duchenne “Eu pensei que a humanidade já estava infringida de males suficientes (...) e não parabenizo o Senhor pelo novo presente que a humanidade ganhou”. Esse pronunciamento dramático foi feito por Guillaume Duchenne (Foto), neurologista francês que primeiro escreveu a doença em 1868. Referia-se a descrição histórica de uma doença neuromuscular progressiva e destrutiva, afetando principalmente meninos. Por um século a doença seria conhecida como uma distrofia. Depois da observação de Duchenne, essa condição seria conhecida e comumente chamada como Distrofia Muscular de Duchenne. Duchenne também foi notável por ressaltar a importância de se estudar a doença em indivíduos vivos. A distrofia muscular de Duchenne (DMD) é uma doença de origem genética, cuja característica principal é o enfraquecimento e posteriormente a atrofia progressiva dos músculos, prejudicando os movimentos e levando o portador a uma cadeira de rodas. Ela é uma doença motora e se diferencia das demais porque qualquer esforço muscular que cause o mínimo de fadiga, contribui para a deterioração do tecido muscular. Isto porque o defeito genético ocorre pela ausência ou formação inadequada de proteínas essenciais para o funcionamento da fisiologia da célula muscular. Na literatura médica são catalogadas mais de trinta tipos de distrofia. A Distrofia Muscular de Duchenne é a mais comum das distrofias, com uma incidência de 1 para cada 3.500 nascimentos masculinos. O tipo Duchenne afeta essencialmente o sexo masculino. Também é a forma mais severa de distrofia muscular, até a idade adulta o paciente estará profundamente debilitado tanto fisicamente devido à fraqueza estabelecida pela fragilidade óssea, quanto psicologicamente, já que ocorre um aparente desânimo devido ao próprio estado de saúde. O homem com esta doença não tem como se reproduzir e esta é a razão principal de as mulheres não apresentarem a Distrofia Muscular de Duchenne. A transmissão se faz por traço recessivo ligado ao sexo e a taxa de mutação é alta. Geralmente, o quadro só é notado quando a criança começa a andar. As primeiras características são: o aumento do volume das panturrilhas, decorrente do grande esforço que os gastrocnêmicos são submetidos para compensar o déficit dos músculos antero-laterais das pernas, para auxiliar o equilíbrio na marcha que estes pacientes apresentam. O gene defeituoso é o que sofreu uma alteração em sua estrutura, que o impede de exercer sua função normal na célula, causando doenças que podem ser transmitidas hereditariamente. Uma mutação ligada ao X se expressa fenotipicamente em todos os homens que a recebem, mas apenas nas mulheres que são homozigóticas para a mutação. Mulheres heterozigóticas podem expressar o fenótipo (considerando a Hipótese de Lion). O gene de um distúrbio ligado ao X às vezes está presente em um pai e em uma mãe portadora e, então, as filhas podem ser homozigóticas afetadas. A incidência do fenótipo é muito mais alta em homens do que em mulheres. O gene responsável pela afecção é transmitido de um homem afetado para todas as suas filhas. Os filhos do sexo masculino de qualquer uma de suas filhas tem uma chance de 50% de herdá-lo. O gene jamais se transmite diretamente do pai para o filho, mas sim de homem afetado para todas as suas filhas. As mulheres heterozigóticas geralmente não são afetadas, mas algumas apresentam afecção com intensidade variável. A DMD tem uma taxa de mutação calculada maior do que as outras doenças genéticas. Há vários estudos onde se prevê que 1/3 dos casos é de mutantes novos e 2/3 dos pacientes são de mães portadoras. A grande maioria das portadoras não exibe qualquer manifestação clínica. Há exemplos raríssimos de meninas com DMD. A DMD compreende 15% das mutações no lócus. A DMD é uma doença genética causada por um gene defeituoso (que sofreu uma mutação genética), localizado no braço curto do cromossomo X, em uma região denominada Xp21. A mulher possui dois cromossomos X, enquanto o homem possui um cromossomo X e um cromossomo Y. Se uma mulher tiver em um dos seus cromossomos X a mutação genética que provoca a DMD, o outro cromossomo X (que não contém a mutação), será capaz de protegê-la dos efeitos do gene defeituoso. Por isso, os afetados pela DMD são sempre do sexo masculino e o gene defeituoso pode ser transmitido por mulheres portadoras assintomáticas. 13 Em cerca de 2/3 dos casos de DMD, a mutação responsável pela doença já está presente na mãe do paciente (portadora assintomática), que corre um risco de 50% de ter outros filhos de sexo masculino afetados. Em 1/3 dos casos, a mutação ocorre no menino afetado pela DMD, sem ter sido herdado pela mãe, ou seja, decorrentes de mutações novas. Nestes casos, dizemos que ocorreu uma mutação nova, e o risco de recorrência para futuros filhos é desprezível. Os meninos afetados são normais até 1 ou 2anos de vida, mas desenvolvem fraqueza muscular por volta dos 3 e 5 anos, quando começam a ter dificuldades para subir escadas, correr, levantar do chão, quedas freqüentes e aumento característico do volume das panturrilhas. O comprometimento muscular é simétrico e inicia-se pelos membros inferiores e quadris, e, mais tarde, atinge os membros superiores. Ocorre uma acentuação da lordose lombar e uma marcha anserina (andar de pato). Contraturas e retrações dos tendões levam alguns pacientes a andar na ponta dos pés. A pseudo-hipertrofia das panturrilhas, o resultado de infiltração do músculo por gordura e tecido conjuntivo, é vista geralmente desde cedo. Alterações da coluna e dos tendões são conseqüências das alterações musculares das pernas. Com o progredir da doença ocorre comprometimento dos músculos dos membros superiores. Há ainda amiotrofias predominantemente na cintura pélvica e escapular. Há progressão lenta com retrações tendíneas e perda da ambulação entre 8 e 12 anos. A fraqueza excessiva evolui para incapacidade de andar, em geral no início da adolescência, embora a situação possa mudar graças a avanços da pesquisa voltada para o tratamento dos meninos afetados. É improvável que o indivíduo com DMD sobreviva aos 20 anos de idade e a sobrevida além dos 25 é incomum. A morte se dá por insuficiência respiratória, broncopneumonia ou, como o miocárdio também é afetado, de insuficiência cardíaca. O cérebro é outro órgão afetado, em média ocorre uma redução de QI de cerca de 20 pontos. 6.3. Hemofilia A Hemofilia é uma doença da coagulação sanguínea provocada por uma alteração genética, que se caracteriza por uma grande tendência para hemorragias. A tendência para as hemorragias característica da hemofilia deve-se a um défict ou a uma anomalia na produção dos fatores VIII ou IX da coagulação sanguínea, substâncias de natureza proteica que circulam no sangue e são ativadas em caso de hemorragia, participando assim no processo de coagulação. Quando a concentração sanguínea de algum destes fatores é insuficiente ou quando a sua estrutura molecular é anómala, o processo de coagulação não se pode completar. O défice ou anomalia na produção destes fatores deve-se à existência de uma alteração nos genes que controlam a sua elaboração. Os genes responsáveis pela produção dos factores VIII e IX da coagulação sanguínea encontram-se no cromossoma X. Esta localização específica dos genes que controlam a elaboração dos factores VIII e IX faz com que as leis que regem a transmissão hereditária da hemofilia estejam relacionadas com o sexo, sendo igualmente responsável pelo facto de a maioria dos pacientes (na sua quase totalidade) ser do sexo masculino. A hemofilia apenas se produz quando um indivíduo não conta, no mínimo, com um cromossoma X saudável, o qual é suficiente para produzir uma quantidade adequada de fatores VIII e IX. Nas mulheres, esta carência só se manifesta se os seus dois cromossomas X forem afetados pela alteração genética que causa a hemofilia, uma circunstância muito pouco frequente. Por outro lado, nos homens, basta que o seu único cromossoma X apresente a alteração para que se produza a doença, o que é muito mais frequente. A hemofilia apenas se transmite de pais para filhos, quando a mãe é hemofílica, algo muito pouco frequente, ou quando é portadora da alteração genética que provoca a doença, ou seja, quando um dos seus dois cromossomas X apresenta uma anomalia no gene que regula a produção do fator VIII ou no que faz o mesmo com o fator IX. Quando uma mulher, embora portadora da alteração genética, não sofre da doença, é sinal de que o seu outro cromossoma X é saudável. Contudo, pode transmitir a alteração genética do cromossoma X afetado aos seus filhos. É possível distinguir dois tipos de hemofilia, embora ambos tenham consequências idênticas, de acordo com o fator de coagulação deficiente ou anómalo: • Na hemofilia A, que compreende sensivelmente 85% do total de casos, o elemento deficitário ou anómalo é o fator VIII ou fator anti-hemofílico A. • Na hemofilia B, a que correspondem 15% dos casos, o elemento deficitário ou anómalo é o fator IX ou fator anti-hemofílico B. De acordo com a gravidade do défict do fator, é possível distinguir: • A hemofilia grave, quando a produção de algum destes fatores é inferior a cerca de 5% do normal. • A hemofilia leve, quando a sua produção se situa entre 5% ou 30% do normal.Quando a produção de algum dos fatores é deficitária, mas supera os 30% dos valores normais, como acontece frequentemente entre as pessoas portadoras, a doença não se manifesta, o que faz com que a pessoa não seja considerada hemofílica. A manifestação mais característica da hemofilia é a tendência para o aparecimento de hemorragias frequentes e persistentes. Na hemofilia leve, as hemorragias são relativamente pouco frequentes e 14 persistentes, tendo em conta que apenas são originadas perante traumatismos de considerável gravidade ou caso não sejam tomadas as medidas terapêuticas adequadas ao longo de intervenções dentárias ou cirurgias. Na hemofilia grave, as hemorragias são muito frequentes e persistentes, podendo ser desencadeadas por qualquer tipo de traumatismo, fricção ou pressão exercida sobre algum tecido ou órgão. Caso não se proceda ao tratamento adequado e atempado, estas hemorragias podem dar origem a vários tipos de complicações, de acordo com a sua localização, gravidade e duração. As hemorragias mais significativas características da hemofilia grave costumam evidenciar-se antes dos 18 meses de idade, com a erupção dos dentes e, sobretudo, com o início do caminhar, quando as frequentes quedas das crianças provocam o aparecimento de equimoses extensas e duradoras, necessitando as feridas cutâneas de muito mais tempo do que o normal para deixarem de sangrar. O tratamento da hemofilia baseia-se na administração do factor de coagulação em défice: factor VIII, na hemofilia A, e factor IX, na hemofilia B. Este tipo de tratamento designa-se terapêutica substitutiva. A terapêutica genética é um tipo de tratamento ainda em fase experimental, consistindo na alteração de um dos componentes do DNA constituinte dos cromossomas que contêm os genes de um organismo para obter um benefício terapêutico. As doenças que podem ser tratadas por este tipo de terapêutica são as provocadas pela existência de um único gene defeituoso, que origina o défice de uma determinada substância no organismo, como é o caso da hemofilia; nestes casos, é possível aumentar a produção da substância mediante a correção do defeito genético em apenas algumas células específicas do organismo. Devido a estes avanços, é provável que nos próximos anos se iniciem, nos seres humanos, as experiências em terapêutica genética para a hemofilia - sem dúvida, irão conduzir à obtenção de um tratamento através do qual se pode conseguir a cura definitiva da doença. Denomina-se de aconselhamento genético o conjunto de exames auxiliares de diagnóstico e a série de sessões informativas efetuados às pessoas que, devido aos seus antecedentes familiares, apresentam risco de transmitir aos seus filhos uma determinada doença genética, como a hemofilia. Devem-se submeter a estes exames todas as mulheres cujo pai seja hemofílico ou cuja mãe seja portadora e todas as que tenham tido algum filho hemofílico ou conhecem a existência de antecedentes desta doença na sua família. Entre os exames auxiliares de diagnóstico, para além de se elaborar a árvore genealógica, realizam-se técnicas sofisticadas para estudar a composição do DNA e detectar a eventual presença da anomalia genética causadora da hemofilia. Um destes exames é o "teste de portadora", através do qual se determina se uma mulher apresenta, de facto, a dita anomalia e quais são as probabilidades de transmissão aos seus filhos. 6.4. DaltonismoO daltonismo é um tipo de acromatopsia (“cegueira de cores”) caracterizado por uma perturbação da percepção da visão devido à incapacidade de reconhecimento e distinção de algumas cores, principalmente o vermelho do verde. Ele pode também afetar a discriminação entre todas as outras cores sendo, nesse caso, mais propriamente denominado discromatopsia. O distúrbio foi chamado assim em homenagem ao químico inglês John Dalton (1766-1844), que foi quem primeiro estudou esta condição. O daltonismo tem causa genética. Está relacionado a um gene recessivo localizado no cromossoma X e ocorre com maior frequência entre os homens que entre as mulheres. A mulher pode ter visão normal, mas ser portadora do gene recessivo e transmiti-lo aos filhos. Assim, podemos ter a mulher de visão normal, não portadora do gene; a mulher de visão normal, mas portadora do gene; a mulher daltônica; o homem normal, não portador do gene e o homem daltônico. O daltonismo pode também resultar de uma lesão neurológica ou dos órgãos responsáveis pela visão. A anomalia é causada por defeitos ou ausência dos cones (um dos tipos de células responsáveis pela visão das cores). O oftalmologista deve basear seu diagnóstico no quadro clínico relatado pelo paciente, já que o exame de fundo de olho não mostrará anormalidades. Contudo, um teste simples de cores pode contribuir para o diagnóstico e uma eletroretinografia (exame que avalia a função da retina utilizando eletrodos que captam a sua atividade elétrica, em resposta a estímulos luminosos) pode ajudar a selar o diagnóstico, revelando ausência de resposta normal dos cones e resposta normal dos bastonetes. O campo visual estará normal ou modificado muito ligeiramente. O daltonismo não tem cura; contudo, suas consequências podem ser minimizadas. A diminuição da luminosidade que atinge os olhos pode auxiliar no controle das manifestações clínicas. O paciente com daltonismo não deve escolher atividades profissionais que requeiram uma visão íntegra. 15 6.5. Síndrome do X-Frágil ou de Martin-Bell É a causa mais freqüente de comprometimento mental com caráter hereditário, afetando o desenvolvimento intelectual e o comportamento de homens e mulheres. A expressão X- Frágil deve-se a uma anomalia causada por um gene defeituoso localizado no cromossomo X, que, por sua vez, passa a apresentar uma falha numa de suas partes. O X está presente no par de cromossomos que determinam o sexo (XY nos homens e XX nas mulheres). Essa falha ou fragilidade do X causa um conjunto de sinais e sintomas clínicos (ou uma síndrome). Daí o nome de Síndrome do X-Frágil (SXF) ou de Martin-Bell. A principal manifestação dos problemas da SXF revela-se no comprometimento da área intelectiva ou cognitiva: desde dificuldades de aprendizagem até graus leve, moderado, severo ou profundo de retardo mental. Como causa geral de retardo mental, é a segunda causa mais freqüente, sendo suplantada somente pela Síndrome de Down. Diferentemente desta, porém, apresenta um caráter de herança e pode atingir vários membros de uma mesma família, sem revelar características físicas marcantes. Os sinais e sintomas da SXF, por serem semelhantes a outros casos de atrasos e distúrbios gerais de desenvolvimento, necessitam de confirmação por meio de exame genético com técnicas especiais. A precisão dessa prova pode orientar ou redirecionar tratamentos, visando torná-los mais específicos. Possibilita, igualmente, aconselhar as famílias afetadas sobre os riscos de recorrência e as possíveis opções reprodutivas. Famílias de todos os grupos étnicos podem ser atingidas pela síndrome, porém acomete mais freqüentemente os homens do que as mulheres. De acordo com dados de pesquisas e estudos epidemiológicos realizados em países desenvolvidos, estima-se que, na população em geral, 1 em cada 2000 pessoas seriam afetadas pela SXF, manifestando seus problemas. Uma em cada 259 mulheres seria portadora ou carregaria o gene com o defeito que causa a síndrome. No Brasil não há estatísticas formais. Constata-se, porém, um freqüente desconhecimento dessa causa de comprometimento mental, tanto por parte de profissionais da área da saúde como da educação e, conseqüentemente, por parte da população em geral. Portanto, não é rara. É pouco conhecida e diagnosticada, já que sua investigação, comprovação e descrição científicas são recentes. Problemas semelhantes de retardo mental, ligados ao cromossomo X e com predominância em homens, foram observados em famílias desde as décadas de 40-50, para os quais dava-se o nome de Síndrome de Martin-Bell. A SXF foi melhor caracterizada em 1970 por meio da observação do cromossomo X-Frágil por estudos de citogenética. Mas somente a partir de 1991, é que estudos moleculares identificaram com precisão a causa de tais problemas: a mutação ou mudança ocorrida num gene FMR1 (Fragile Mental Retardation 1). Tal gene localiza-se no cromossomo X e explica a falha (um sítio frágil) em uma das partes desse cromossomo (na porção subterminal de seu braço longo). O gene FMR1 apresenta, no seu início, cópias repetidas CGG ou Citosina-Guanina-Guanina, que são algumas das bases nitrogenadas que compõem o DNA (molécula de ácido desoxirribunucleico que contém a informação genética, formando os cromossomos). O número normal dessas cópias varia de 6 a 50. Indivíduos afetados pelos problemas da Síndrome do X Frágil apresentam mais de 200 cópias (mutação completa), o que faz com que não ocorra a síntese de uma proteína essencial para o organismo, denominada FMRP. Essa falta, que pode apresentar-se em diferentes proporções, repete-se nas células do organismo. Isso compromete várias estruturas e funções orgânicas, principalmente, às ligadas a capacidades mentais. Indivíduos, que apresentam um número intermediário de cópias (entre 50 e 200), possuem a chamada pré- mutação. Em geral não mostram sintomas, embora possam transmitir a doença. Estudos sobre as formas de ocorrência desse gene FMR1 vieram esclarecer particularidades importantes, próprias da Síndrome do X-Frágil, tanto na variação de suas manifestações como nas suas formas de transmissão entre os membros de uma mesma família. A presença do gene defeituoso (FMR1) pode encontrar-se em estado de pré-mutação (50 a 200 cópias CGG), tornando a pessoa portadora. Ou, encontrar-se na forma de mutação completa (mais de 200 cópias CGG), tornando a pessoa afetada. As pessoas portadoras possuem um defeito menor no gene devido à pré-mutação. Elas podem demonstrar apenas sintomas leves da síndrome ou nenhuma de suas características. Nesse caso, são consideradas clinicamente normais. Um homem portador, mesmo que não apresente problemas intelectivos, transmitirá a pré-mutação a todas suas filhas, mas a nenhum de seus filhos. Suas filhas, mesmo sem alterações físicas, intelectivas e emocionais, poderão ter filhos, netos, bisnetos, etc., com problemas, pois serão portadoras. Cada filho ou filha de uma mulher portadora tem 50% de chance de herdar o gene. Mas se ela for afetada, apresentando retardo mental, a possibilidade de ter filhos também afetados será maior. 16 A pré-mutação pode ser transmitida de forma silenciosa ao longo das gerações de uma família, até que um de seus membros seja afetado pela síndrome. Estudos recentes revelam que a herança, nesta enfermidade, tem padrões peculiares. Por exemplo, o risco de gerar filhos afetados aumenta em mulheres portadoras e clinicamente normais. Esse fenômeno é chamado de antecipação, isto é, após o surgimento de um caso na família poderá haver um aumento na freqüência de aparição e na severidade da doença em gerações posteriores, pois o número de cópias CGG tende a aumentar de geração a geração. As mulheres, tendo dois cromossomos X, apresentam duas cópias do gene FMR1. No entanto, elas são mais raramente afetadaspelos problemas graves da síndrome, porque, comumente, o aumento do número de cópias CGG anormal está presente em apenas um dos cromossomos X, o que pode ser compensado pelo funcionamento do outro gene normal contido no par. Tal compensação não ocorre no sexo masculino, pois existe somente uma cópia do gene FMR1 no único cromossomo X do par XY. Daí, o porquê de apenas 1/3 de mulheres portadoras do gene alterado apresentar algum grau de atraso intelectivo. Os sinais e sintomas da SXF são numerosos. Eles variam conforme o grau de mutação ou pré- mutação em que se encontra o gene FMR1. Portanto, um caso específico pode apresentar poucas ou várias das características enumeradas a seguir. As características fenotípicas (ou de aparência) são sutis. Nem sempre são facilmente reconhecidas, principalmente em mulheres. Pessoas com SXF podem até ser identificadas como tendo traços fisionômicos ditos normais. O reconhecimento da síndrome está associado mais freqüentemente à deficiência mental (de grau moderado a severo), acompanhada de alguns traços faciais e dismórficos, cuja manifestação pode evidenciar-se em fases mais tardias do desenvolvimento. Recém-nascidos não apresentam indícios de aparência física que antecipem uma suspeita precoce da SXF. De forma semelhante a outros quadros clínicos, apresentam macrocefalia (perímetro da cabeça maior que o normal) e hipotonia (baixo tônus muscular), podendo esta revelar-se, por exemplo, na falta de força para sugar na mamada. Características emocionais e comportamentais: Alterações na conduta, mesmo sendo inespecíficas da SXF, podem tornar-se importantes suspeitas para identificar seus primeiros sinais. Elas requerem, contudo, uma observação e interpretação cuidadosas. Por exemplo, um indivíduo com SXF pode alterar seu comportamento num ambiente que mobilize a sua hipersensibilidade a estímulos visuais, ruídos, odores e a estímulos táteis, incluindo textura de alimentos. São freqüentes manifestações como: Hiperatividade e pouca capacidade de atenção. Movimentos estereotipados, principalmente nas mãos, com ações repetitivas de mexer em determinados objetos, bater, morder as próprias mãos, etc. Condutas do tipo autista, porém mais "intencionais" na comunicação com o ambiente e que, geralmente, desaparecem com o crescimento. Comportamentos perseverativos, com fixação em determinados objetos ou assuntos. Ansiedade social e resistência a mudanças no ambiente, podendo ocorrer crises de pânico. Traços de excessiva timidez e inibição social. Contato ocular escasso. Humor instável. Pessoas com X-Frágil podem ser alegres e sorridentes e ter dificuldades para controlar condutas explosivas, às vezes acompanhadas de agressividade verbal ou física (principalmente em homens adolescentes e jovens adultos). Tais reações são freqüentemente precipitadas por excesso de estímulos no ambiente ou por exigências acima de suas capacidades. Estudos têm revelado que as mulheres levemente afetadas, principalmente se forem mães de filhos também afetados, tendem a sofrer de instabilidade de humor, ansiedade e depressão, com dificuldades nas relações interpessoais. Características cognitivas (área intelectual): O comprometimento mental, seja em grau maior ou menor de retardo, pode mostrar-se desarmônico e não uniforme. Na área da linguagem (articulação da fala e linguagem como expressão de pensamento) ocorrem: Dificuldades de comunicação e atrasos no aparecimento das primeiras palavras. Alterações na programação e execução do ato motor da fala (dispraxias verbais), assim como na percepção e articulação de sons. Alterações de ritmo e velocidade (fala rápida e confusa). Fala repetitiva e incoerente, com dificuldades para manter diálogo e fixar-se em assuntos da conversação, embora o uso de vocabulário relativamente desenvolvido seja observado. Na área de processos e habilidades mentais, indivíduos afetados pela SXF podem manifestar: Relativa facilidade em captar informações visuais do ambiente, percebendo-as de forma simultânea e fortuita, mas com tendência a manter-se no nível globalizado (ou indiferenciado) de percepção. Freqüentemente, fixam-se em detalhes visuais irrelevantes e dissociados de um todo com significado. Melhor habilidade para aprender por imitação visual, chegando a resolver problemas práticos e concretos. 17 Dificuldades significativas em: reter informações, principalmente as que dependem de processamento auditivo, seqüencial e analítico ou de assimilar noções abstratas (como as requeridas pela leitura /escrita: perceber, relacionar e fixar seqüências na estrutura de sons e letras com significado); resolver situações-problemas mais abstratas e complexas; generalizar e aplicar informações em situações novas. 18 Capítulo 3 – Método de Gêmeos Os estudos de gêmeos oferecem uma perspectiva melhor sobre o grau em que um transtorno é de fato genético. Esses estudos em geral comparam a taxa de um transtorno específico em gêmeos monozigóticos (idênticos) versus dizigóticos (não idênticos). A justificativa por trás dos estudos de gêmeos é que os monozigóticos têm material genético idêntico, enquanto os dizigóticos compartilham uma média de 50% do material genético. Quanto mais alta a taxa de concordância em gêmeos monozigóticos, comparados com os dizigóticos, maior o grau de influência genética. Portanto, se um transtorno fosse totalmente genético e por completo penetrante, a taxa teórica de concordância em gêmeos monozigóticos seria de 100%, enquanto nos dizigóticos seria de 50%. Na verdade, as taxas de ambos os grupos são mais baixas para a maioria das doenças mentais maiores. A tabela 3.1 mostra as taxas de concordância para uma variedade de condições médicas que foram avaliadas por meio de estudos de gêmeos. Vale observar que as doenças mentais parecem ter mais bases genéticas, como e indicado pelo método de gêmeos, do que outros transtornos médicos. Embora poderosos, os estudos de gêmeos não são um método perfeito para estudar a genética dos grandes transtornos mentais, porque fatores psicológicos não-genéticos podem desempenhar papel significativo. Como os gêmeos são criados juntos, a modelagem de papéis pode ser muito influente. Além disso, esse fator provavelmente terá mais peso em gêmeos monozigóticos do que nos dizigóticos, porque aqueles muitas vezes são tratados como idênticos por seus pais e pares, até mesmo recebendo roupas e brinquedos iguais. Informações mais detalhadas sobre o método de gêmeos são apresentadas no artigo seguinte. Artigo: Herdabilidade do desenvolvimento e do desempenho humano: Aplicação do método de gêmeos João Felipe V. Machado, Paulo M. S. Dantas, José Fernandes Filho. Revista Digital – Buenos Aires – Ano 2 – Nº108 – Mayo de 2007 Resumo Para se obter uma melhor prescrição de atividades físicas em clubes, escolas e academias, tanto visando à performance esportiva quanto a saúde, é importante a compreensão de quais são os fatores que determinam as qualidades morfo-funcionais do ser humano. O estudo de gêmeos tem sido tradicionalmente empregado em diferentes áreas de pesquisa da genética humana, com a finalidade de averiguar a influência relativa do genótipo e do ambiente sobre a variação fenotípica. Neste contexto, o objetivo do presente trabalho é conceituar e demonstrar a importância da identificação da influência genética (herdabilidade) sobre o desenvolvimento e o desempenho humano, utilizando o método de gêmeos. As informações reunidas neste trabalho evidenciam que a aplicação do método relativamente simples citado pode atender ao interesse do profissional de educação física em identificar até que ponto ocorre influências genotípicas e ambientais em diferentes populações. Unitermos: Gêmeos. Herdabilidade. Influência ambiental. Caraterísticasmorfo-funcionais. Introdução O enfoque genético nos estudos investigativos da constituição das qualidades morfo-funcionais do ser humano para performance física ligadas à execução de tarefas laborais e da performance esportiva vem sendo, na atualidade, tema de discussão. Recentemente, uma maior atenção está sendo dada ao enfoque genético no que se refere às predisposições esportivas e à saúde. Sabe-se que a informação genética constitui a base da herança transmitida dos pais para os filhos (o fator genético ou caráter) e que a mesma determina, em um grau considerável, o crescimento, a formação do organismo, suas reações adaptativas às influências exteriores, os ritmos de desenvolvimento e as várias fases ontogênicas (Filin e Volkov, 1998). O fator genético (qualitativo ou quantitativo) manifesta sua totalidade quando encontra condições externas favoráveis para seu desenvolvimento, e quando ocorre à falta da informação genética de 19 determinada característica, esta não se desenvolve, apesar de influências externas ótimas (Filin e Volkov, 1998). As possíveis influências genéticas e do ambiente devem ser consideradas para a melhora do desempenho humano. Desta forma, é fundamental a aplicação de critérios que possibilitem identificar as contribuições de fatores genotípicos e do ambiente nas características individuais e coletivas para que se possa compreender como o indivíduo atinge diferentes níveis de desempenho físico. Porém, os mecanismos através dos quais a influência genética é expressa são ainda um enigma. De acordo com Heck et al. (2004), a identificação e detecção dos genes e das interações gene-ambiente que influenciam a performance humana é difícil devido a fatores como, por exemplo: 1. A resposta ao treinamento é altamente heterogênea e pode ser influenciada por vários componentes em adição aos fatores genéticos; 2. A expressão da variação genética influenciando a performance pode ser dependente do contexto (por exemplo, a predisposição genética para hipertrofia muscular pode ser somente evidente após um tipo específico de treinamento de resistência); 3. Genes e ambientes podem agir independentemente ou em conjunto para influenciar os resultados do treinamento. Devido à escassez de informações em relação a estas questões, assim como por ainda existir poucos estudos sobre variantes genéticas específicas associados ao funcionamento físico (Frederiksen e Christensen, 2002), o conhecimento das influências genotípicas e ambientais no desenvolvimento e desempenho humano, aliado à utilização da dermatoglifia como um fator de prognóstico do potencial genético, pode constituir um importante avanço metodológico. A compreensão da influência genotípica e fenotípica pode constituir um critério essencial para a melhor orientação para a prática de uma atividade física, adequada às características individuais e coletivas. Neste sentido, a comparação entre gêmeos monozigóticos e dizigóticos pode evidenciar melhor a detecção dos efeitos genotípicos do que a avaliação de apenas gêmeos monozigóticos (Watanabe et al., 2001). Segundo Beiguelman (1994), a utilização dos pares de gêmeos em estudos para avaliar o valor relativo do genótipo na determinação do fenótipo (método de gêmeos) exige a aceitação de várias premissas, como: Os gêmeos são uma amostra da população geral; Os gêmeos são uma amostra de todos os gêmeos; Os componentes de cada par de gêmeos estão sujeitos às mesmas influências do ambiente; O meio ambiente, dos gêmeos é, em média, igual ao dos elementos da população geral; As variáveis que atuam sobre os gêmeos monozigóticos, provocando diferenças fenotípicas intra-par, são as mesmas que agem sobre os gêmeos dizigóticos. O objetivo do presente trabalho é conceituar e demonstrar a importância da identificação da influência genética para o desenvolvimento e o desempenho humano, utilizando o método de gêmeos, que busca estimar a herdabilidade de uma determinada característica fenotípica. Este trabalho não apresenta uma revisão extensiva sobre herdabilidade de características de desenvolvimento e desempenho humano, mas sim um exame integrado de conceitos teóricos e resultados de estudos de caso reportados na literatura científica, visando conscientizar o profissional de educação física sobre a aplicação dessa abordagem metodológica, estimulando o avanço do conhecimento científico sobre o tema. Características genéticas Um dos principais fundamentos da genética é o de que o fenótipo de um indivíduo, isto é, o conjunto de suas características perceptíveis, é o resultado da interação de seu genótipo, isto é, de sua constituição genética, com o ambiente. Segundo Beiguelman (1994), a aceitação desse princípio pode sugerir que a distinção entre caracteres genéticos e não-genéticos é absurda, visto que todos os caracteres dependem sempre tanto do genótipo quanto do ambiente, mas esta distinção tem razão de ser, porque ela é de grau, apesar de não ser de espécie. Assim, um caráter será considerado tanto mais genético quanto menor for a influência de variáveis do ambiente sobre a variabilidade fenotípica, e tanto menos genético quanto maior for a influência do ambiente sobre a variabilidade fenotípica. Particularmente nos estudos das interações entre a influência genética e a performance e a forma física humana, é extremamente importante destacar que os efeitos do genes não ocorrerão sempre do mesmo modo e na mesma magnitude nos dois gêneros e em diferentes intervalos de idade (Maia et al., 2003). Por exemplo, na avaliação da aptidão física associada à saúde os efeitos genéticos são moderados a substanciais na explicação das diferenças interindividuais, traduzindo, uma forte variabilidade de resposta dos jovens e dos adultos aos estímulos das aulas de educação física, treinos esportivos e programas de intervenção comunitário (Maia et al., 2003). De acordo com Bouchard (1997), a massa corporal e a forma física são influenciadas por uma variedade de agentes ambientais, como o estilo de vida do indivíduo, incluindo a dieta e o nível de atividade física habitual. Elas podem ser alteradas também por doenças e podem mudar naturalmente com o crescimento e a idade. Além disso, existe uma quantidade crescente de pesquisas científicas indicando que elas são 20 influenciadas pelos genes. Existe uma larga quantidade de dados sustentando a noção de que o índice de massa corporal (IMC) é caracterizado por um significante efeito genético em todas as idades, com a possível exceção nos dois primeiros anos de vida. As tendências das estimativas de herdabilidade para o IMC nos termos dos vários estudos realizados podem ser resumidos da seguinte forma: o nível de herdabilidade é mais alto com os estudos de gêmeos, intermediários, com dados de núcleo familiar e menor quando derivados de dados de adoção. Como outro exemplo, o estudo de Lauderdale et al. (1997) investigou os componentes genéticos e ambientais envolvidos em atividades físicas moderadas (como caminhar ou subir escadas) e intensas (como corrida, ciclismo e natação, por exemplo). Muito da variabilidade fenotípica para ambas as atividades moderadas e intensas é um resultado dos efeitos da agregação familiar. Os genes podem influenciar a participação regular em exercícios intensos específicos mais do que na atividade moderada, como por exemplo, o exercício de caminhada. Desta forma, existe um número crescente de trabalhos científicos que vêm avaliando, de uma maneira quantitativa, a influência genética sobre os níveis de atividade física e a performance humana, por exemplo, por meio de estudos com núcleos familiares (Gaskill et al., 2001; Mitchell et al., 2003). Porém, de acordo com Heck et al. (2004), embora estudos baseados em famílias tenham provido sustentação para função dos genes na performancehumana, a identificação e detecção dos genes e das interações gene-ambiente que influenciam esta performance é difícil devido a fatores como, por exemplo: a resposta ao treinamento é altamente heterogênea e pode ser influenciada por vários componentes em adição aos fatores genéticos; a expressão da variação genética influenciando a performance pode ser dependente do contexto (por exemplo, a predisposição genética para hipertrofia muscular pode ser somente evidente após um tipo específico de treinamento de resistência); e genes e ambientes podem agir independentemente ou em conjunto para influenciar os resultados do treinamento. O estudo de Rankinen et al. (2004) apresenta uma revisão do mapa genético humano para os fenótipos da performance física e do fitness relacionado à saúde, incluindo todos os loci e marcadores genéticos relacionados. Os genes e marcadores com evidência de associação com um fenótipo de performance ou fitness em pessoas sedentárias ou ativas, em adaptação ao exercício agudo, ou para mudanças induzidas pelo treinamento foram posicionados no mapa genético de todos os autossomos e do cromossomo X. O estudo de gêmeos e herdabilidade O estudo de pares de gêmeos tem sido tradicionalmente empregado em diferentes áreas de pesquisa da genética humana, com a finalidade de averiguar a influência relativa do genótipo e do meio ambiente sobre a variação fenotípica normal ou patológica (Beiguelman, 1994). Os gêmeos são subdivididos em monozigóicos (aqueles originados a partir de um único zigoto, portanto geneticamente idênticos) e dizigóticos (aqueles originados da concepção de diferentes zigotos, portanto geneticamente diferentes). Fernandes Filho e Carvalho (1999) realizaram uma compilação sobre a identificação de potencialidades esportivas, na qual reportaram conceitos relacionados com a utilização de gêmeos para a avaliação da influência genética sobre a performance. O essencial do estudo do grau de influência da herdabilidade e ambiente pelo método de gêmeos consiste no seguinte: se o indício a ser estudado do organismo depender da herdabilidade, os monozigotos serão muito parecidos. Pelo contrário, quanto mais indícios dependam do meio ambiente, maior será a diferença entre eles. Isso é explicado pelo fato desta categoria de gêmeos possuir o genótipo igual a quais quer mudanças entre eles serem o resultado da influência do ambiente. As maiores diferenças entre os gêmeos acontecem quando eles se educarem em condições diferentes ou forem sujeitos a fatores desiguais do treinamento. Por exemplo, um gêmeo treina, mas o outro não. Sendo assim, a diferença entre monozigotos que crescerem juntos e monozigotos que crescerem em separado, em condições diferentes, é determinada pela influência dos fatores exteriores. Na maioria dos casos, os monozigotos se educam em condições iguais; por isso, a semelhança entre eles poderá ser explicada pelas condições idênticas exteriores. A diferenças entre monozigotos e dizigotos, crescidos em condições semelhantes, é determinada pela ação dos fatores genéticos. Quanto maiores forem às diferenças, mais dependerá o dado indício da herdabilidade. A comparação de 3 tipos de gêmeos (Tabela 1) permitirá identificar o grau de influência da herdabilidade e ambiente no desenvolvimento de certos indícios do organismo (Fernandes Filho e Carvalho, 1999). O termo herdabilidade traduz a proporção da variância fenotípica que é devida à variância genética aditiva. Duas modalidades de herdabilidade se apresentam (Sobral, 1988): Herdabilidade geral - que representa a contribuição total dos fatores genéticos; 21 Herdabilidade restrita - que resulta dos componentes aditivos da variância genética, ou seja, dos efeitos médios dos genes individuais sobre um caráter, sem considerar os efeitos de outros genes que também possam estar presentes. Estimativa de herdabilidade O processo mais utilizado para obter estimativas de herdabilidade (h2) consiste na comparação de diferenças ao nível de um dado caráter observadas em gêmeos monozigóticos (MZ) e dizigóticos (DZ). Para caracteres de variação quantitativa, tomam-se as diferenças entre pares de gêmeos MZ e entre pares de gêmeos DZ e recorre-se à fórmula seguinte (Sobral, 1988): h2 = (S2 DZ - S2 MZ) / S2 DZ em que S2 representa a variância de cada série de diferenças. Quando h2 = 1, a variância do caráter é atribuível exclusivamente a causas genéticas, já que os gêmeos MZ são concordantes: s2 = 0 e o caráter apresenta em cada par uma expressão constante. Quando h2 = 0, a variação é inteiramente explicada pelos efeitos ambientais. Em ambos os casos, pressupomos que os erros de medida são aleatórios e tendem portanto a anular-se. Uma fórmula equivalente para calcular h2 utiliza os coeficientes de correlação obtidos entre os valores das séries de gêmeos MZ, por um lado, e de gêmeos DZ, por outro: h2 = (r MZ - r DZ) / (1 - r DZ) Interpretação das estimativas de herdabilidade Se o controle genético de um caráter fosse completo, então h2 = r MZ. Porém, o ambiente introduz sempre uma parcela de variação e a melhor maneira de quantificar o efeito da diversidade ambiental é comparar as diferenças entre gêmeos MZ criados em comum (C) e criados separadamente (S), segundo uma fórmula semelhante à que utilizamos para calcular h2. A = (s2 S - s2 C) /.s2 S Quanto mais A se aproximar de 1, maior é o grau de determinação ambiental do caráter em estudo, ou seja, a sua variação é maior na população do que no quadro das famílias tomadas singularmente. As estimativas de herdabilidade são informações que podem ser obtidas entre indivíduos com outros graus de parentescos (entre irmãos ou pais e filhos, por exemplo), mas a dissociação dos efeitos genéticos e dos efeitos ambientais passa a revestir ainda mais dificuldades. Este é aliás um problema que afeta todas as estimativas, em maior ou menor grau, pelo que toda a interpretação deve limitar-se à população de onde as mesmas foram recolhidas e às condições ambientais em que os dados foram obtidos (Sobral, 1988). Estimativa de herdabilidade de dados qualitativos O conhecimento da biologia da gemelaridade permite concluir que a proporção de pares monozigóticos concordantes em relação a um caráter qualitativo qualquer será tanto maior quanto menor for a participação do ambiente na sua determinação (Beiguelman, 1994). As proporções de concordância verificadas nos pares monozigóticos e dizigóticos são, usualmente, relacionadas por intermédio de um índice arbitrário, denominado índice de herdabilidade de Holzinger, que pode ser baseado em valores de concordância expressos em porcentagem, obedecendo a seguinte fórmula (Beiguelman, 1994): h = (CMZ - CDZ) / (100 - CDZ) Onde: CMZ = concordância nos pares monozigóticos CDZ = concordância nos pares dizigóticos Conclusão Diversos estudos encontrados na literatura vêm evidenciando que uma fração significativa de características como: o crescimento físico (Watanabe et al., 2001), o somatotipo (Bouchard, 1997) e a atividade física moderada e intensa (Lauderdale et al., 1997), podem sofrer uma influência genética significativa, gerando o interesse do profissional de educação física para identificar até que ponto ocorre essa influência em diferentes populações. Este interesse pode ser atendido pela aplicação do método relativamente simples mostrado a cima, buscando uma melhor prescrição de atividades físicas em clubes, escolas e academias, tanto visando à performance esportiva quanto a saúde. Referências bibliográficas Beiguelman, B. Dinâmica dos genes nas famílias e nas populações. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 472 p., 1994. Bouchard, C. Long-term stability pf body mass and physique. Nutrition. v. 13, n. 6, p. 573-575, 1997. Fernandes Filho, J. e Carvalho, J.L.T. Potencialidades
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