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1/4 Medicina Social No final do século XVIII, a Europa era o centro das ciências. As bases doutrinárias dos discursos políticos sobre a saúde emergem nessa época, na Europa Ocidental. A responsabilidade do Estado como definidor de políticas, leis e regulamentos referentes à Saúde Coletiva e como agente fiscalizador de sua aplicação social foi estabelecida. Nessa fase, ocorreram diversos tipos de intervenção estatal sobre a questão da saúde das populações. Foulcault (1979) relatou que com a Revolução Francesa (1789) foi implantada uma Medicina Urbana, com a finalidade de sanear os espaços das cidades e isolar áreas miasmáticas. A Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra, em meados do século XVIII e expandida para o mundo a partir do século XIX, produziu um grande impacto nas condições de vida e saúde das populações. Com a organização e o aumento da participação política das classes trabalhadoras, evidenciados principalmente na França, Alemanha e Inglaterra, temas relativos à saúde foram incorporados na pauta das reivindicações dos movimentos sociais. Era o início do movimento pela Medicina Social: ela deveria ser um instrumento de transformação social. Postulava-se que a participação política fosse a mais importante estratégia de transformação da realidade de saúde e que as revoluções populares deveriam resultar nos principais determinantes da Saúde Social: democracia, justiça, igualdade, liberdade e fraternidade. O médico Louis Villermé (1782-1863) analisou a mortalidade nos diferentes bairros de Paris, investigou a pobreza, as condições de trabalho e suas repercussões sobre a saúde. Concluiu que havia uma estreita relação entre a situação socioeconômica e a mortalidade. 2/4 Rudolf Virchow (1821-1902), médico alemão, é um importante personagem da Medicina Social. Extremamente versátil, desenvolveu intensa e criativa atividade em várias áreas: Patologia, Antropologia, Política (ativista da Saúde Pública). Entretanto, com o avanço da Fisiologia, da Patologia e da Bacteriologia no século XIX, devido principalmente a Bernard, Virchow e Pasteur, houve um fortalecimento da Medicina Científica. As enfermidades de maior prevalência eram as de natureza infectocontagiosa, favorecendo a abordagem individual e curativa, superando o aspecto coletivo e os determinantes da saúde. Naomar de Almeida Filho (2006) relata que a hegemonia da Medicina Científica não representou obstáculo para evolução da Epidemiologia. Nos Estados Unidos, vários ex-alunos de Pierre Louis alcançaram posições acadêmicas importantes e continuaram engajados no ensino da Estatística Médica como fomentadora de uma reforma sanitária resultando na organização do National Public Health Service. Oliver Wendell Holmes (1809-1894), professor da Universidade de Harvard, assumiu um papel de destaque nesse contexto: foi o primeiro epidemiologista norte-americano. Segundo Holmes: “Se uma nova ideia expande a mente de uma pessoa, ela jamais volta às suas dimensões originais”. Em 1850, organizou-se na Inglaterra a London Epidemiological Society, fundada por jovens favoráveis à Medicina Social, profissionais da Saúde Pública, entre outros. Dentre os membros dessa sociedade científica encontrava-se Florence Nightingale (1820-1910), a fundadora da moderna Enfermagem e John Snow (1813- 1858) que realizou investigações sobre a epidemia de cólera, sendo considerado o pai da “Epidemiologia de Campo” devido às coletas planejadas de dados. 3/4 O movimento sanitarista surgiu inicialmente na Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos. Os sanitaristas eram, na sua maioria, funcionários de agências de controle de doenças. Suas ações fundamentavam-se na aplicação de tecnologia e medidas profiláticas, como saneamento, imunização e controle de vetores e destinavam-se principalmente, aos pobres e aos excluídos da população. A influência da Microbiologia representou um grande reforço ao movimento sanitarista ― a Saúde Pública ― redefinindo as diretrizes da teoria e prática no campo social da saúde. A crise econômica mundial de 1929 desencadeou um problema social intenso abalando os pilares da Medicina Científica, na década seguinte. O clássico filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, concluído em 1935, representa uma sátira à grave crise social desencadeada nos Estados Unidos. Foi nesse contexto que se iniciou a consolidação da Epidemiologia como ciência. O avanço tecnológico característico do capitalismo promoveu a elevação dos custos e a elitização da saúde, promovendo uma redução do alcance social. De acordo com Sérgio Arouca (2003) buscava-se a consolidação de um discurso sobre o social capaz de dar conta dos processos culturais, econômicos e políticos. O retorno ao social se deu através da Epidemiologia. As investigações de Joseph Goldberg (1874-1929) sobre a pelagra estabeleceram a natureza carencial dessa doença. Não era uma doença infecciosa, mas sim uma carência nutricional, uma hipovitaminose causada pela deficiência de niacina (vitamina B3) que acometia principalmente as pessoas que se alimentavam exclusivamente de milho e dos seus derivados. Nesse contexto, a Epidemiologia ampliava seu campo para além das doenças infectocontagiosas. 4/4 A Epidemiologia buscava, então, retornar a tradição médico-social de privilegiar o coletivo. Na década de 1950, novos desenhos de investigação, como os estudos de coorte, foram desenvolvidos. Novos modelos explicativos foram propostos reforçando o paradigma da história natural das doenças. Nessa época, emergiu uma forte tendência ecológica na Epidemiologia.
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