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AVALIAÇÃO DE FILOSOFIA DA CIENCIA 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA – UESB
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E CIENCIAS HUMANAS – DFCH
CURSO DE FILOSOFIA 
"Ciência" através de um prisma e de uma abordagem filosófica:
LEITURAS INICIAIS DA DISCIPLINA DE FILOSOFIA DA CIÊNCIA.
 DANIEL GOMES CUNHA
VITÓRIA DA CONQUISTA,
2017
DANIEL GOMES CUNHA 
"Ciência" através de um prisma e de uma abordagem filosófica:
LEITURAS INICIAIS DA DISCIPLINA DE FILOSOFIA DA CIÊNCIA.
Trabalho realizado sob a orientação do prof. José Fabio da Silva Albuquerque para aproveitamento geral da disciplina Filosofia da Ciência. 
VITÓRIA DA CONQUISTA,
2017
Introdução
	A relação entre filosofia e ciência é caracterizada por parecer existir em nosso tempo a noção de que podem continuar a existir independente uma da outra ou de que uma é apenas a continuidade da outra. A origem desse modo de pensar se dá através do processo que nossa sociedade contemporânea e as influencias do século recente puderam transmitir a ela. As duas, porém, fazem as mesmas afirmações em detrimento uma da outra. A ciência afirma que a filosofia está ultrapassada, não acompanha o recente desenrolar dos fatos do mundo e que suas convicções devem ser substituídas pelas evidencias apresentadas tempo após tempo pelas descobertas cientificas e indaga; diante de tantos avanços estabelecidos pelas ciências através das novas tecnologias, haveria espaço para a continuidade da Filosofia? 
	Já a Filosofia apresenta seus questionamentos; pode a Ciência apresentar a validade de suas afirmações com base apenas na experiência? Ela o pode fazer a parte de qualquer raciocínio teorético abstrato, que não seja de modo algum filosófico, por uma linguagem exclusivamente cientifica? Afinal é possível um discurso cientifico não filosófico? O que caracterizaria esse discurso que o distinguiria dos demais? Por outro lado será a filosofia independente do fazer cientifico? Poder-se-ia de modo autônomo, assentir com qualquer premissa da Filosofia a parte de qualquer apresentação cientifica? Sem ao menos levar em consideração os desdobramentos das descobertas e experiências cientificas? Através do puro raciocínio logico dedutivo como sugeriria se a partir de uma perspectiva aristotélica? Ou será que existe uma solução para o problema dessa discussão? Existe alguma alternativa apresentada tanto por filósofos quanto cientistas?
A relação entre Filosofia e Ciência
	O filosofo João de Fernandes Teixeira, em uma revista brasileira de Filosofia, tratando da temática em torno da necessidade da Filosofia, mostra como a Ciência tem assumido papeis que antes eram apenas de âmbito filosófico perdendo autoridade sobre questões importantes. A Ciência tem feito parte integral da nossa sociedade, de modo que não se crê mais em uma vírgula que não possua comprovação cientifica. 
Por que, então, nos últimos anos, passamos a ouvir com frequência que a Filosofia acabou? Talvez a resposta esteja na maneira em como Ciência e Filosofia passaram a se relacionar a partir da segunda metade do século XX. Não apenas questões filosóficas foram assimiladas pela Ciência como, também, a percepção do papel da ciência na historia foi radicalmente alterada. Pela primeira vez, a Ciência ingressou efetivamente na Historia da humanidade. (TEIXEIRA, JOÃO DE FERNANDES; Filosofia Ciência &Vida. Novembro 2014, p.62).
	As descobertas científicas e o desenvolvimento tecnológico tomaram de tal modo, um significado espetacular na vida das pessoas, que influenciam quase a totalidade de suas ações, levando as pessoas a um estilo de vida afastado da reflexão e à apropriação de meros postulados práticos. A Filosofia então perdeu o seu sentido para a sociedade contemporânea.
	Na antiguidade o que conhecemos por Filosofia e Ciência eram feitos pela mesma pessoa. Foram os antigos gregos que buscando os princípios fundamentais para se compreender o mundo fizeram surgir a Filosofia. Nela toda investigação racional concentrava em um único saber. A partir da Metafisica aristotélica as ciências do ser e as da natureza começaram a tomar contornos diferentes. Aristóteles separa os modos de saber, discernido o saber cientifico do saber das crenças em geral e as ações que exigem tal saber científico em suas especificidades das ações operárias do dia a dia (ZILLES, 2008, p.139). Nesse momento a Filosofia e a Ciência, permeiam os mesmos caminhos entrelaçadas e mal podendo se distinguir uma da outra. Uma disciplina que estude uma relação entre ambas parece ser impensável. 
	Durante muito tempo permaneceu a ideia de que a partir de categorias logicas e matemáticas puras, pudesse se estabelecer proposições universais que explicassem tudo. 	Porém isto de certo modo se esquipara ao próprio fazer filosófico que procura descrever a realidade do mundo através de proposições e jamais tal coisa foi alcançada absolutamente por nenhum filosofo (SKLAR, 1994, P.14). É durante o renascimento que surge com Francis Bacon sua critica a dependência da filosofia aristotélica. que de maneira geral, limitava a investigação da natureza a questões especulativas, o valor do pensamento era mais importante do que da experiência. Foi nesse período que inspirado pelas experiências de Galileu, liberta-se o pensamento cientifico da subordinação pela Filosofia e Teologia e o leva a patamares diferentes. Os avanços proporcionados pelos cientistas da modernidade fizeram abalar as estruturas da Filosofia, trazendo questionamentos e tensões entre as duas grandes disciplinas. 
 	A Filosofia poderia ser então, numa visão mais recente: uma critica da ciência, julgando a epistemologia da ciência. Nesse caso, na atual perspectiva entende-se a necessidade de um consenso entre as duas disciplinas; a ideia seria de que a Filosofia e Ciência são interdependentes e complementares. Ambas necessitam tanto dos dados da experiência quanto do pensamento para a sua continuidade (SKLAR, 1994, P.16). É inaugurada então a disciplina Filosofia da Ciência, que toma em amplitude conta de um cenário abrangente do conhecimento humano, considerando toda a sua evolução no decorrer da historia em como a mente humana concebe e constrói o mundo que temos hoje.
Diferença entre Epistemologia e Filosofia da Ciência.
	De acordo com Pascal Nouvel, antes de tudo é necessário fazer a distinção entre Filosofia da Ciência e Filosofia do Conhecimento ou Epistemologia. A Filosofia do Conhecimento tem por objeto o “logos sobre a episteme". Nesse aspecto não se leva em consideração o que se conhece, mas como se conhece. O outro sentido de Filosofia da ciência se detém no aspecto pratico, no contato material experimental com o objeto, este sim tem o enfoque no conteúdo do conhecimento (NOUVEL, 2013, P.17). O intuito de se fazer essa diferenciação, está na importância dada a essas definições como explicando o processo cientifico. Algumas vertentes interpretativas podem se apoiar em alguma dessas definições para exemplificar o que se entende por Filosofia da Ciência. Umas com o olhar voltado para o raciocínio puro, outras para a experimentação.
	Enquanto a Filosofia busca de certo modo através do discurso logico dedutivo englobar as leis gerais motrizes do impulso ao conhecimento elaborando uma perspectiva universal sobre todo o conhecimento e seus desdobramentos nas ciências particulares. O grande descompasso está em que geralmente as ciências particulares apropriam-se de limitações na intenção de restringir-se ao campo da observação e dar concretude aos resultados da investigação cientifica. Partindo de um sentido inverso, ela quer formar conhecimentos particulares a partir de experiências cada vez mais especificas e precisas. É nesse ponto em que Filosofia e Ciência, criam seu ponto de tensão.
A interdependência entre Filosofia e Ciência
	A filosofia durante muito tempo deteve sua atenção principalmente em temas metafísicos, éticos e outros de puro caráter especulativo e abstrato, relegando as questões da natureza as ciências particulares. Tornou-se, pois, um tipo de problemapara a própria Filosofia, que negligenciou as causas da natureza e se aventurou por problemáticas quase insolúveis do espirito, deixando aos cientistas a função de explicar a realidade material. A Filosofia, sem sua autoridade viu se na obrigação de revisar seus conteúdos a cada nova descoberta e a cada novo avanço nas pesquisas cientificas.
	A Ciência passou a coletar informações da natureza e sobre as coisas, a partir da observação do mundo, acumulando informações e organizando os conhecimentos de forma a transmitir os dados para outras ciências e outros cientistas, que baseiam suas pesquisas de acordo as anteriores. O conhecimento científico avança com relação aos resultados obtidos, lançando novos dados nas pesquisas que permitirão novas descobertas futuras. Porém é importante notar que as ações da Filosofia não vão manter-se distantes do fazer cientifico, em todos os casos a Filosofia aparece com suas especulações investigativas, mesmo que para tratar das questões e práticas trazidas por outros. As grandes indagações surgem após analise dos procedimentos da Ciência, que em geral presume a possibilidade de obter um resultado concreto e dado como absoluto a partir de observações limitadas, a isso se nomeia indutivismo. Outra questão que se põe como um problema à ciência é se a própria técnica ou metodologia usada pelo cientista é suficiente para a verificação do objeto estudado, e claro; as condições mentais as quais o cientista se aproxima do objeto e adquire dele conhecimento. 
O problema da Indução
	Um dos principais fatores que levaram os filósofos a criticarem o método científico foi denominado problema da indução. Nela, o cientista parte sempre das experiências particulares para estabelecer seus resultados como conclusões gerais. São afirmativas que partem dos entes particulares para os universais. Após a revolução cientifica liderada por Bacon, Galileu e outros, o estigma que se formou é de que; a partir do contato direto com os objetos podemos obter o verdadeiro conhecimento. É justamente por essa postura de se ater a própria natureza para encontrar a verdade sobre as coisas que levam Bacon a se tornar o pai do empirismo; tradição que supervaloriza a obtenção do conhecimento através dos sentidos. As sensações se tornam fundamentais para o processo do conhecimento cientifico, a ciência toma contornos puramente empíricos e absorve a ideia de que é a experiência direta com as coisas que faz com que o conhecimento apresente-se a nós. 
	Esse ideal de que a ciência trabalha com fatos concretos trazidos pela experiência, pelos quais, o cientista encontra a verdade, permanece ativo e bem cultivado no senso comum, como critica Alan Chalmers em seu livro; “O que é a Ciência afinal?”.
Conhecimento científico é conhecimento provado. As teorias científicas são derivadas de maneira rigorosa da obtenção dos dados da experiência adquiridos por observação e experimento. A ciência é baseada no que podemos ver, ouvir, tocar etc. Opiniões ou preferências pessoais e suposições especulativas não têm lugar na ciência. A ciência é objetiva. O conhecimento científico é conhecimento confiável porque é conhecimento provado objetivamente. (Chalmers, 1993 p.18)
	
	É esse ideal do cientista moderno que reflete o indutivismo que nos mostra como o cenário atual é tão mais complexo do que imaginamos. Quantas coisas serão consideradas verdades absolutas; mas que foram verificadas em algumas dezenas de fatos apenas? A Filosofia tem há muito pontuado essa questão.
	 Para Freire-Maia a ciência acredita que a partir dos fatos "puros" da experiência se pode conceber a realidade. Porém os postulados científicos a partir de um mesmo dado da experiência podem ser diversos, pois cada cientista possui uma base teórica diferente o que produz uma interpretação do fato diversificada. Para que haja continuidade no conhecimento cientifico o cientista assume sempre um postulado teórico anterior e assim antecedendo a esse cientista outro obteve também suas conclusões a partir de outro postulado teórico prévio. Isso mostra como a Ciência de certo modo possui necessariamente uma estrutura de fé e de igual modo isto ocorre na Filosofia. (NEWTON, F-MAIA, 1990, p.31). 
	O que se entende por fé nesses moldes se distingue da fé religiosa que detém se naquilo que está, em muitas vezes, fora dos âmbitos investigativos tradicionais da ciência e da reflexão filosófica, mas são as crenças básicas necessárias que se assumem verdadeiras, independentes de uma comprovação empírica imediata. O fazer científico exige meticulosamente, esforços reflexivos sem os quais, sem a possibilidade imaginativa de se pressupor modelos diferentes e até que irrompam com os modelos teóricos tradicionais e postulados científicos, a ciência se torna apenas, mera reprodutora de técnicas de laboratório. A própria Ciência tem em sua estrutura, fundamentalmente ideias e são a partir das ideias que a ciência pode romper limites e ampliar seus conhecimentos. 
	Karl Popper criticou ferozmente o indutivismo, para ele a lógica indutivista é extremamente contraditória e na melhor das hipóteses a indução não existe.
Ora, a meu ver, não existe a chamada indução. Nestes termos, inferências que levam a teorias, partindo-se de enunciados singulares “verificados por experiência” (não importa o que isto possa significar) são logicamente inadmissíveis. Consequentemente as teorias nunca são empiricamente prováveis. (POPPER, 2013, P. 41).
	Um fato interessante é uma carta dirigida ao Sr. Karl Popper pelo ilustre cientista Albert Einstein, ícone da ciência contemporânea. Em que ele faz críticas a certas demonstrações de Karl Popper, contudo neste ponto apresenta sua concordância.
Não me agrada absolutamente a tendência “positivista”, ora em moda (...), de apego ao observável. Considero trivial dizer que, no âmbito das magnitudes atômicas, são impossíveis predições com qualquer grau desejado de precisão, e penso (como o senhor, aliás) que a teoria não pode ser fabricada a partir de resultados de observação, mas há de ser inventada (POPPER, 2013, P.525).
	Pelo visto, para o bem estar da racionalidade científica não se pode negar a validade das formas de pensamento e abrir mão dos processos lógicos já estabelecidos. Nesse caso o indutivismo entra em conflito com um dos princípios primordiais da própria logica. O de não contradição; nenhuma premissa em particular pode levar a conclusão de uma afirmação geral, já demonstrava a logica antiga.
	É certo que a experiência tem fundamental importância para o conhecimento humano, mas existem princípios que norteiam nossa racionalidade, a qual nenhuma disciplina, por maior contribuição que tenha apresentado ao saber, poderá desfazer. Em nenhuma hipótese podem negligenciar as capacidades inerentes do saber de outra área. Não se pode decretar independência de uma disciplina, pois existe em cada contribuição, cada experiência e cada reflexão um poder que integre o universo racional dos seres humanos. Como é visto a historia da Filosofia e da Ciência, estão intimamente ligadas. E as divergências entre ambas, só são meras atitudes de ressentimento entre os atores destas disciplinas. A humildade de entendermos que, em nenhum aspecto conhecemos plenamente ainda assim será o guia para o crescimento do conhecimento humano, seja filosófico ou cientifico. 
	A Filosofia não pode ser aceita como uma continuação da Ciência mesmo que ambas procurem de certo modo a verdade sobre os fatos. A ciência possui suas especificidades e a Filosofia é responsável por questionar os pressupostos e procedimentos do fazer científico, não por dar continuidade à ciência. A filosofia da ciência busca responder aos questionamentos sobre a diferença básica da indagação cientifica, se os cientistas têm satisfeito as condições necessárias para que as explicações sejam aceitas como corretas, quais procedimentos devem usar e a forma como se conhecem os princípios científicos. O cientista não necessita da filosofia para fazer ciência. Mas necessita para fazê-la da melhor maneirae também esclarecer seu método. A filosofia da ciência se desdobra sobre duas extremidades grandiosas e suas indagações; uma sobre princípios gerais e outra sobre resultados particulares (NEWTON, F-MAIA, 1990, p.32-33).
	A filosofia da ciência procura se ocupar dos métodos do fazer cientifico e o rigor que a ciência deve satisfazer para a demonstração desse conhecimento. Historicamente se mostra inquestionável que a Filosofia sempre foi fundamental para as formulações e reformulações dos conceitos científicos. Entretanto a Filosofia não pode negligenciar as descobertas das ciências, por risco de tornar-se inconsistente com o real. Exames críticos dos significados dos conceitos, justificação racional de asserção de uma teoria em detrimento a outra e a avaliação das generalizações feitas para explicação são sinais de dependência da Filosofia por parte da ciência. Conclui-se que as teorias científicas se baseiam em postulados filosóficos e que a Filosofia não pode negligenciar as descobertas da produção cientifica (NOUVEL, 2013 P. 17-20).
	Uma perspectiva amadurecida sobre esse debate, entre Filosofia e Ciência, irá concluir sua interdependência. Contudo é necessário apreço pela razão e dialogo incessante dos atores de cada lado. A satisfação intelectual humana está no conhecer e mais ainda em saber que há muito a se explorar. Seja no âmbito da teoria ou da pratica, trabalhando conceitos ou equipamentos tecnológicos. O conhecimento humano é uma constante, que seja por qualquer dessas vias, irá sempre buscar estar um passo além do instante ou momento em que está agora. Resta apenas privilegiar o discurso honesto, racional e inteligente.
Referências.
TEIXEIRA, João de Fernandes. Filosofia pra quê? Filosofia Ciência &Vida, São Paulo, Ano 8, N. 100, P. 55-62, Novembro 2014.
SKLAR, Lawrence. Filosofía de La Física, Madrid: Alianza Editorial, 1994.
NOUVEL, Pascal. Filosofia das Ciências. Campinas, SP: Papirus, 2013.
NEWTON, Freire-Maia. A Ciência por dentro. 4ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1990.
CHALMERS, Alan. O que é Ciência Afinal? 2ª ed. São Paulo, SP:. Brasiliense, 1993.
ZILLES, Urbano. Teoria do Conhecimento e Teoria da Ciência. 2ª ed. São Paulo, SP: Paulus, 2008
POPPER, R. Karl. A Lógica da Pesquisa Científica. 2ª ed. São Paulo, SP: Cultrix, 2013

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