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Leonardo David – 2º semestre – Antropologia – T2A – 2017.2 DIREITO, PODER, JUSTIÇA E PROCESSO – RESUMO 1. Calmon de Passos começa retratando sobre o saber do homem. Ele diz que todo saber é saber do homem e tem como móvel um saber sobre o homem. A princípio é uma afirmativa confusa, mas aí ele explica: ele diz que tudo aquilo em que a pessoa não tem conhecimento, é como este conhecimento não existisse. Difere então o conceito de informação com o conceito de conhecimento, quando diz que a pessoa pode até ter informação sobre tal coisa, mas não tendo o conhecimento, ele não existe. E, quando se desconhece algo, fica submetido à pessoa que possui este conhecimento, o que leva a afirmativa de que conhecimento é poder. Diante disso, Calmon afirma que o saber não é passível de ser dado a alguém. Ou seja, ele é próprio do sujeito, onde ele deverá construir o seu próprio saber, podendo se utilizar de informações e conhecimentos de outros sujeitos, mas o saber é singular. Diante disso, ele diz que não há um conhecimento desvinculado do homem que sabe. Assim, ele fala que não existe um saber neutro, sendo sempre o saber “de alguém” e um saber “para algo”. Finalizando, nenhum saber é neutro, nenhum saber é definitivo, nenhum saber é absoluto, pois o homem tem sempre o direito de problematizá-lo, ou seja, o saber está a serviço do homem e não o homem a serviço do saber. 2. Calmon faz uma comparação entre os objetos que não foram produzidos pelo homem e, por isso, não se faz necessário identificar os propósitos da sua existência, como é o caso do Sol, que existe e opera não por causa do homem, mas por força de algo; e os objetos que só existem porque existe o homem. Nessa segunda perspectiva, Calmon diz que refletir sobre o próprio homem se faz prioritário, pois, nesse caso, tudo começa com ele e para ele se direciona. 3. Calmon traz a necessidade de o homem indagar sobre o que as coisas são, por que e para que elas existem, quando tais coisas não são frutos da criação do homem. Por exemplo, a energia, antes de conhecer a sua natureza e função, a energia não era utilizada de modo proveitoso. Contudo, quando a coisa é criada pelo homem, a prioridade é saber o porquê e o para que, pois o “o que é” já vem embutido no significado e sentido que o homem imprimiu ao objeto. 4. Calmon aprofunda o seu estudo acerca do pensar sobre o homem. Ele diz que a existência humana é diferente da existência dos demais seres, na medida em que a existência das coisas naturais é subordinada às leis naturais e, por isso, são determinadas a existir sempre do mesmo modo. Esse é o caso do fogo que queima em qualquer lugar, no passado, no presente e queimará no futuro. O homem tem uma existência nessa perspectiva enquanto ser exclusivamente biológico. Contudo, o ser Leonardo David – 2º semestre – Antropologia – T2A – 2017.2 humano tem um modo próprio, exclusivo e original de ser que é constituído pela temporalidade. Ou seja, nós somos existência imutável, enquanto passado, e existência não realizada, enquanto futuro. Logo, a existência do ser humano é de natureza consciente, em parte já determinada, em parte ainda não realizada. Sendo consciente e indeterminada, esta existência é livre e responsável por sua construção. 5. Dito isto, Calmon afirma que o homem é o único ser em condições de ter a si mesmo como objeto de sua consciência. Ou seja, os animais são seres que vivem apenas o presente e não se separam de suas atividades. Seu dever é uma determinação total. O mundo dos animais se configura apenas em um suporte para o seu viver biológico. O ser humano tem consciência de sua atividade e de suas circunstâncias, o seu agir resulta de finalidades que se propõe. Conhece o passado, vive o presente e cogita o futuro. Realiza a sua existência através da sua presença criadora, mudando e adaptando o ambiente, colocando-o como objeto do seu conhecer e do seu agir. 6. Com base nisso, Calmon distingue o mundo da necessidade do mundo da liberdade. O primeiro é onde todo o ser existe, inclusive o homem, parcialmente. No segundo apenas o homem vive, na medida em que somente ele é capaz de se colocar alternativas e optar por uma delas. Ou seja, o homem vive pautado na sua liberdade, não há aqui um determinismo o qual existe no primeiro mundo, onde as coisas são e continuarão a ser do mesmo modo. Há, portanto, o mundo do ser, onde a necessidade é a nota dominante e o mundo do dever ser, onde a vontade do homem, ou seja, sua liberdade de escolha é a nota dominante. Nesse sentido, o homem participa dos dois mundos e, por isso, está condenado a assumir a responsabilidade pelo seu existir. A partir daí que Sartre qualificou a liberdade como uma maldição, onde o homem está condenado a ser livre. Ser livre, portanto, é estar vivo na condição humana. 7. Nesse sentido, Calmon afirma que a liberdade, antes de ser o poder de realizar o que quiser, é a ausência de suficiente informação biológica do homem, a respeito do quanto ele pode fazer. Fazendo uma comparação, o animal sabe o seu agir, o homem precisa se propor o seu agir. Daí há a necessidade de distinguir o ser livre e o viver a liberdade. Nós somos livres no momento do querer, mas podemos ter nossa liberdade limitada na hora do fazer, tanto por limites dados pelos homens, quanto por limites da natureza. Exemplo disso é o direito. Por isso o agir do homem é sempre fruto da escolha de alternativas, as quais deve se responsabilizar pelo seu sucesso ou pelo seu fracasso. 8. A ação humana, diferente dos fenômenos naturais que são simples ligações causais, se realiza em conformidade com as razões ou motivações, as intenções e os Leonardo David – 2º semestre – Antropologia – T2A – 2017.2 objetivos. Calmon diz, então, que entre as razões e o resultado da ação há uma conexão lógica e não meramente causal. 9. Nesse sentido, o efeito jamais será consequência de uma razão inicial que se fez necessária, mas sim daquela que permanece eficaz por força da opção do homem. Calmon traz o exemplo da ação de subir em uma árvore para colher uma fruta, por causa da fome. Nesse exemplo, a fome foi a causa desta ação, ou seja, a razão. Contudo, se o risco de cair for maior do que a fome, o sujeito pode não subir na árvore e continuar com fome. Dessa maneira, há aí uma razão nova, seguido de um novo efeito. Reafirma, então, que esse elo é de natureza lógica e não causal. Na relação causal, A será B por um determinismo. Ou seja, se aquecermos a água ao ponto de ebulição ela irá evaporar. 10. Com isso, a ação do homem põe necessariamente o problema da responsabilidade. Quando há a indeterminação da ação, isto é, a possibilidade de tomada de várias opções, a decisão por uma delas vincula o resultado ao querer do agente. Ou seja, se tal efeito se produziu, foi porque tal iniciativa foi tomada. Nesse sentido, a responsabilidade se relaciona com as ações que já foram realizadas (refere- se ao passado). 11. No ser humano há uma tensão interior entre o ser, como ele é no presente, e o ser como aparece a si mesmo, no futuro. Nesse sentido, o futuro não constitui um ser exterior ao ser presente, pois, de certa forma, já existe no presente, como uma exigência. Segundo Calmon, é isso que fundamenta a responsabilidade, pois sentir-se responsável por si mesmo é sentir a exigência do futuro. É como você se enxerga, por exemplo, com o seu diploma em sua profissão. Ter um diploma é uma exigência sua e isso, de certa forma, já está no presente, na medida em que as suas ações são pautadas para atingir a essa finalidade. O ser humano, portanto, é um ser como ele é atualmente, e um ser ainda a se transformar naquilo que foi apenas prometidoa si mesmo. A ação é a iniciativa que se situa entre esses dois componentes do ser, aquilo que preenche o intervalo que os separa. 12. Para traduzir essa reflexão, Calmon diz que o homem tem perfeita consciência do tempo passado, imutável, do tempo presente, e do tempo futuro, incerto. Dessa maneira, homem é um ser impossibilitado de pensar o presente sem os condicionamentos do passado e sem envolver nessa cogitação o tempo futuro, até porque o seu agir está pautado no futuro que lhe tem vontade. O homem está nesse constante devir, é um ser inconcluso, jamais algo pronto e acabado, mas um sujeito que se autoconstrói. Leonardo David – 2º semestre – Antropologia – T2A – 2017.2 13. O homem é um ente polarizado entre a exigência de ser sujeito (singularidade) e a necessidade da interação com seus semelhantes (pluralidade). Nesse sentido, para realizar a nossa liberdade, temos que ser limitados para que possamos tornar possível a realização da liberdade dos outros. A responsabilidade, portanto, se dá em face de todos os outros. Exemplo disso é a necessidade de se definir a melhor conduta para se conviver em sociedade. Portanto, os homens são livres e responsáveis, mas prisioneiros de um passado imutável e de um futuro imprevisível. 14. É indispensável compreender o homem em suas três dimensões: o labor, o trabalho e a ação. O labor é a atividade que se vincula ao processo biológico do corpo humano e nisso em nada distingue o humano dos animais. Contudo, enquanto os animais são presos pelo ciclo da sobrevivência, o homem sai dessa situação com a sua capacidade de fazer, fabricar e produzir. 15. Dito isto, a ação é a atividade que nos torna exclusivamente humanos. Enquanto laboramos, colocamo-nos em igualdade com todos os animais. Enquanto trabalhamos, permanecemos vinculados à natureza e nela nos inserimos. Mas na ação, no discurso, na palavra e na comunicação, somos exclusivamente humanos; é a ação que nos singulariza na série de todos os entes, que marcamos presença específica no existente. 16. O homem se relaciona com os objetos sob diferentes perspectivas. Há aqueles que independem da existência do homem, há aqueles que a sua forma depende da existência do homem, mas a coisa, enquanto matéria, independe e, por fim, há aquelas coisas que dependem exclusivamente da existência do homem. Na primeira categoria trata-se das árvores, das montanhas, pedras, etc., que, sem a existência do homem não teria esse significado, mas ainda sim existiriam. Para o segundo, há um exemplo da cadeira que depende do homem para ter a sua forma, mas a cadeira é, enquanto matéria, essencialmente, madeira. Por fim, o que existe exclusivamente pela existência do homem é o agir do homem em termos de comunicação, expectativas compartilhadas, onde inexiste a matéria. 17. Tratando do direito, ele se encaixa nessa terceira perspectiva de objeto. Ou seja, o direito situa-se no universo do discurso e da ação. O jurídico é sentido e significação que os homens emprestam a determinados atos seus, para ter atendida certa imprescindível e específica necessidade de convivência social. O direito não nos é dado, mas sim elaborado pelo homem, mas incapaz de reificação, ou seja, não dá para transformar em realidades concretas, em objetos físicos, como no caso do trabalho humano. O direito é, portanto, sempre o resultado do agir comunicativo dos homens, Leonardo David – 2º semestre – Antropologia – T2A – 2017.2 situado no mundo do dever ser, que inclui os valores, a ética, um tecido de comunicações. 18. Assim como a música, que inexiste como fenômeno, realidade sensível, fora do processo de sua produção, o direito se constitui da mesma forma. A simples partitura, os acordes, as notas não são a música. Quando o cantor silencia, tudo cessa. Assim ocorre com o direito. O direito não é o texto escrito, nem a norma que dele formalmente se infere, nem os códigos ou leis. Tudo isso é silêncio. O direito somente é enquanto processo de sua criação ou de sua aplicação no concreto da convivência humana. 19. Voltando à ideia do saber e suas indagações, o direito, portanto, já que não é algo dado ao homem, o saber que dele faça seu objeto deve responder a indagações sobre o seu “por que” e “para que”. A relação entre o processo de produção do direito e o que dele resulta como produto, seja sob a forma de enunciado, seja em termos de decisão não é de caráter instrumental, meio-fim, como se dá no âmbito dos produtos do trabalho do homem, mas sim de natureza substancial, orgânica, integrativa, como ocorre necessariamente no âmbito da ação especificamente humana.
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