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DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 1 LEI DOS CRIMES HEDIONDOS (Lei nº 8.072/90) 1. Fundamento Constitucional O art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, dispõe que: a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. O constituinte, ao inserir no título dos direitos e garantias fundamentais, uma expressa recomendação para que a lei considere determinados tipos de delitos mais graves, tratando-os com mais rigor, teve a preocupação de salvaguardar com evidente zelo certos bens jurídicos, como a vida, a saúde pública, a dignidade sexual, entre outros. A Lei nº 8.072/90 nasceu com o objetivo de elevar penas, impedir benefícios e impor maior aspereza no trato dessa espécie de delinquência. No sentido comum, hediondo significa horrível, disforme, repugnante. Crime Hediondo indica delito que provoca repulsão. Hediondez é a qualidade de uma conduta que inspira repugnância. Para Aurélio Buarque de Holanda, hediondo é o depravado, imundo, vicioso, repugnante, que cheira mal. Além disso é bom frisar que a Lei nº 13.285/2016 alterou o Código de Processo Penal, estabelecendo que os processos que apurem crimes hediondos terão prioridade de tramitação em todas as instâncias. 2. Critério para classificação como hediondo Há vários sistemas para fixação dos crimes que são considerados hediondos: I) Sistema legal: No Brasil adota-se o sistema legal para os crimes hediondos, ou seja, não é dado ao juiz a liberdade de decidir se é ou não é hediondo. A lei é expressa ao dizer quais são os hediondos e seus equiparados e assim eles devem ser tratados sempre – Rol legal taxativo (garante a segurança jurídica). II) Sistema judicial: não é o adotado no Brasil – o juiz declara a hediondez diante do caso concreto. Permite a flexibilidade ao juiz. De outro lado, causa insegurança jurídica. III) Sistema misto: também não é o adotado no Brasil – parte de um rol legal que é flexível ao caso concreto. A hediondez que a lei estabelece seria, ao final, confirmada ou afastada pelo juiz na sentença. Art. 394-A. Os processos que apurem a prática de crime hediondo terão prioridade de tramitação em todas as instâncias. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 2 A Lei 8072/90, simplesmente enumera os delitos que o legislador considerou hediondos – mais graves que outros, portanto – sem explicar ou fundamentar as razões que o levaram a tomar tal medida. O Brasil adotou o sistema legal, estabelecendo taxativamente quais crimes são considerados hediondos. Portanto, são hediondos os seguintes crimes: I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V); I-A – lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2º) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição; II - latrocínio (art. 157, § 3o, in fine); III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o); IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lo, 2o e 3o); V - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o); VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o); VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o); VII-B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998). VIII - favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B, caput, e §§ 1º e 2º). 3. Análise dos crimes considerados hediondos (análise do art. 1º da Lei, genocídio e terrorismo) I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V): Tratou o legislador de considerar o homicídio simples como hediondo, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por uma só pessoa. O dispositivo é extremamente criticado pela doutrina em virtude da sua imprecisão técnica. Guilherme de Souza Nucci, entende que se pretende que seja considerado hediondo o crime praticado por “justiceiro” ou “vigilante”, que resolva fazer justiça com as próprias mãos. Lembra o doutrinador que nessas hipóteses, o homicídio será qualificado pela torpeza, logo, será qualificado e não simples. De qualquer forma, extermínio é a matança generalizada, é a chacina que elimina a vítima pelo simples fato de pertencer a determinado grupo ou determinada classe social ou racial (mendigos, prostitutas, homossexuais, etc). DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 3 A lei exige que o homicídio seja praticado em atividade típica de grupo de extermínio, o que não se confunde com associação criminosa. O grupo pode ser formado por, no mínimo, duas pessoas. Já com relação ao Homicídio Qualificado não há dúvida de que o legislador se referiu às hipóteses previstas no artigo 121, § 2º do C.P. Lembrando que o Feminicídio foi incluído como Homicídio Qualificado e, consequentemente, é crime hediondo. Lembrando ainda que o homicídio privilegiado-qualificado não foi inserido no rol de crimes hediondos. Assim, não há que se admitir essa hipótese como hediondo. Portanto, na hipótese do pai que mata o estuprador de sua filha (relevante valor moral) utilizando-se de meio cruel (qualificadora), não responderá por crime hediondo. I-A – lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2o) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição II – latrocínio: Latrocínio é o roubo seguido de morte (art. 157, § 3º, parte final). Cuida-se de roubo praticado com violência física (excluída a violência moral, que é a grave ameaça), resultando do emprego da violência a morte de pessoa presente no evento. Também devemos lembrar que a morte pode ser em decorrência de dolo como de culpa. O art. 157, § 3º, constitui um crime qualificado pelo resultado, motivo pelo qual não afasta a possibilidade do agente querer roubar e querer matar a vítima ou querer roubar e, exagerando na violência por imprudência, matar o ofendido. III - extorsão qualificada pela morte: Se da violência utilizada na prática da extorsão resultar morte para alguém envolvido no cenário, cuida-se de delito hediondo. Também aqui se aplica a hipótese de crime qualificado pelo resultado. A morte ocorrendo por dolo ou culpa, o crime será hediondo. IV- extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada: O sequestro de pessoa com a finalidade de obtenção de vantagem, como condição ou preço do resgate é de fato repugnante, gerando trauma para as vítimas e muitas vezes, inclusive, para a família, motivo de ser considerado hediondo. O que se entende por Homicídio Condicionado?Trata-se de matéria que se insere na tipificação do homicídio simples como crime hediondo. De acordo com o artigo 1º, I, da Lei 8.072/90, "são considerados hediondos os seguintes crimes: homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e o homicídio qualificado". Partindo dessa premissa, verifica-se que, somente em uma hipótese, o homicídio simples é tipificado como crime hediondo. Do que se vê, para a caracterização da hediondez do homicídio simples, uma condição deve ser atendida: o crime deve ter sido praticado em atividade típica de grupo de extermínio. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 4 V - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o): O estupro, com a alteração produzida pela Lei nº 12.015/09, passou a abranger a conjunção carnal, bem como a prática de ato libidinoso. O § 1º se refere se a vítima sofre lesão corporal de natureza grave ou é menor de 18 anos e maior de 14 anos. Já o § 2º trata do estupro com resultado morte. Devemos lembrar que as hipóteses de lesão grave e morte são preterdolosas (dolo no antecedente e culpa no consequente). VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o): Grupo de Vulnerável é o conjunto de pessoas que por questões ligadas a gênero, idade, condição social, deficiência e orientação sexual, tornam-se mais suscetíveis à violação de seus direitos. Para efeito didático esse grupo pode ser classificado em seis categorias: mulheres, crianças e adolescentes, idosos, população de rua, pessoas com deficiência física ou sofrimento mental e a comunidade LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis). Assim, o legislador considerou os menores de 14 anos como um grupo mais suscetível à violação de seus direitos, no caso, sexuais. O dispositivo se refere à hipótese de estupro de vulnerável como crime hediondo, abrangendo o estupro (conjunção carnal ou prática de ato libidinoso) com menor de 14 anos ou com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. Abrangeu também o legislador qualquer das outras formas de estupro de vulnerável, havendo como resultado lesão corporal grave ou morte. VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o): Somente é considerado crime hediondo a figura qualificada pelo resultado. Não inseriu o legislador a figura prevista no caput do dispositivo. Temos novamente aqui uma hipótese de crime qualificado pelo resultado em que este é produzido em virtude de culpa. VIII- falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B): A questão aqui colocada é extremamente interessante em alguns aspectos. O crime previsto no artigo 272 (falsificação de alimentos) não é considerado hediondo, enquanto este é hediondo. Também se deve observar que algumas condutas previstas, em especial no art. 273, §1º-A (falsificação de cosmético, por exemplo), não tem o menor sentido em ser considerado hediondo. IX- favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B, caput, e §§ 1º e 2º) X- O parágrafo único do art. 1º, também considera como Hediondo o Genocídio: Cuida-se de delito contra a humanidade, envolvendo objeto jurídico de interesse supranacional, que é a preservação da pessoa humana, qualquer que seja a sua nacionalidade, etnia, raça ou credo. De acordo com a Lei nº 2.889/56, a conduta típica consiste em: Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal: DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 5 a) matar membros do grupo; b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo; c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial; d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo XI- Terrorismo: A Lei nº 13.260/2016, estabeleceu o terrorismo no Brasil, além de disciplinar as investigações e disposições processuais. O conceito estabelecido é o que segue: Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. § 1o São atos de terrorismo: I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa; II – (VETADO); III - (VETADO); IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento; V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa: Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência. 4. Artigo 2º da Lei nº 8.072/90 São considerados assemelhados a hediondos os crimes de: I- Genocídio (Lei n. 2889/56) DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 6 II- Tortura (Lei n. 9455/97 III- Tráfico de Drogas (Lei n. 11.343/06) IV- Terrorismo Observações: Racismo não é crime hediondo Em relação ao Tráfico de Drogas: mencionando tráfico de drogas está se referindo ao artigo 33 da lei. Com relação ao § 4º (diminuição de pena), a Súmula 512 do STJ estabelece ser crime hediondo - “A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas.” Não têm equiparação as figuras do art. 33, § 2º e 3º (participação no uso de drogas ou fornecimento, de maneira eventual e sem lucros, para as pessoas de seu relacionamento). Essas duas figuras não são consideradas tráfico (apesar de constarem no art. 33) Art. 34 – Petrechos para o tráfico. Petrechos são instrumentos ou objetos destinados para a preparação – prevalece à posição de equiparação e hediondo (não tem precedente dos tribunais superiores afastando a hediondez). Art. 35 – Associação para o tráfico - não se equipara a hediondo, pois não se confunde a associação, como crime autônomo, com o seu objetivo (tráfico de drogas) – para configurar esse crime basta que se associem duas ou mais pessoas com o fim específico de cometer tráfico. (decisão isolada entende ser equiparado – HC 118.213) Art. 36 – Financiamento para o tráfico – prevalece à posição de equiparação para o tráfico Art. 37 – Colaboração para o tráfico na condição de informante (caso do fogueteiro) – prevalece que esse crime não seria equiparado. O artigo 2º estabelece também que os crimes hediondos e outros que especifica são insuscetíveis de: I- anistia, graça e indulto: A anistia é o esquecimento jurídico da infração penal, sendo atribuição do Congresso Nacional, por meio de lei penal de efeitoretroativo. A graça é a concessão de clemência pelo Presidente da República, feita mediante decreto. A graça é sempre individual. O indulto também é uma clemência do Presidente, entretanto, é coletivo. Conforme jurisprudência firmada pelo Plenário do STF, é constitucional o art. 2º, I da Lei nº 8072/90, pelo qual se veda a concessão de indulto aos condenados por crimes hediondos, tráfico de drogas e terrorismo. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 7 II- fiança: Fiança é uma garantia real, consistente no pagamento em dinheiro ou na entrega de valores ao Estado, para assegurar o direito de permanecer em liberdade, durante a tramitação do processo criminal. ► Possibilidade legal da liberdade provisória sem fiança: Com a edição da Lei nº 11.464/07, suprimiu-se a proibição à concessão de liberdade provisória sem fiança. Passa a ser, pois, autorizado o seu deferimento pelo magistrado, naturalmente, se não estiverem presentes os requisitos para a prisão preventiva. Admitem, entretanto, a liberdade provisória (art. 321 do CPP), desde que seja sem fiança, com cautelares diversas encontradas nos artigos 319 e 320 CPP. Para o STF, a CF não veda a liberdade provisória como um todo, mas apenas a fiança como meio para obtenção da liberdade provisória. § 1º: Cumprimento da pena em regime inicial fechado: O § 1º cuida da possibilidade da progressão do regime. Essa mudança foi patrocinada pela Lei nº 11.464/07. Até a entrada da Lei nº 11.464/07 em vigor, a Lei nº 8.072/90 estabelecia regime integralmente fechado para o cumprimento da pena nos crimes hediondos e equiparados. O STF entendeu que referido dispositivo era inconstitucional (HC 82.959/SP, rel. min. Marco Aurélio, DJ 01/09/2006) e passou então, a decidir que para os crimes Hediondos deveria ser aplicada as regras da Lei de Execução Penal (Lei nº 7210/84), que previa progressão de regime após o cumprimento de 1/6 da pena. Em virtude da decisão do STF, houve a entrada em vigor da Lei nº 11.464/07, estabelecendo o regime inicial fechado no caso dos crimes hediondos. Para os presos por crimes hediondos anteriores a 2007, o STF editou a Súmula Vinculante nº 26: Súmula Vinculante 26/09 Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico. Em relação ao exame criminológico, o entendimento atual é de que sua realização é facultativa, mas deve ser fundamentado. O STJ editou a Súmula nº 439, sobre o tema: Súmula 439/STJ - Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada. (Súmula 439, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/04/2010, DJe 13/05/2010) ► Inconstitucionalidade da imposição de regime inicial fechado para crimes hediondos DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 8 Apesar das decisões acima, a questão da constitucionalidade, agora do novo § 1º do artigo 2º, determinando o regime inicial fechado para crimes hediondos, também é objeto de questionamento no STF. Vejamos a decisão abaixo: Portanto, a Corte Constitucional, no julgamento do HC no 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, removeu o óbice constante do § 1º do art. 2º da Lei no 8.072/90, com a redação dada pela Lei no 11.464/07, o qual determinava que '[a] pena por crime previsto nes[s]e artigo será cumprida inicialmente em regime fechado', declarando, de forma incidental, a inconstitucionalidade da obrigatoriedade de fixação do regime fechado para o inicio do cumprimento de pena decorrente da condenação por crime hediondo ou equiparado. Esse entendimento abriu passagem para que a fixação do regime prisional - mesmo nos casos de tráfico ilícito de entorpecentes ou de outros crimes hediondos e equiparados - seja devidamente fundamentada, como ocorre nos demais delitos dispostos no ordenamento. Com relação à admissão do Sursis em crimes hediondos, a questão também tem sido polêmica, entretanto, com a alteração da Lei nº 11.464/07, o posicionamento majoritário parece estar no sentido de sua admissão. Também em relação à admissão ou não da aplicação de penas restritivas de direitos, a questão é bastante controvertida, havendo julgamentos nos dois sentidos. § 2º: Progressão de regime: O § 2º estabelece regras para a progressão do regime nos casos de condenados por crimes hediondos. "Entendo que, se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou equiparado. Deixo consignado, já de início, que tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o magistrado, em eventual apreciação das condições subjetivas desfavoráveis, vir a estabelecer regime prisional mais severo, desde que o faça em razão de elementos concretos e individualizados, aptos a demonstrar a necessidade de maior rigor da medida privativa de liberdade do indivíduo, nos termos do § 3º do art. 33 c/c o art. 59 do Código Penal.A progressão de regime, ademais, quando se cuida de crime hediondo ou equiparado, também se dá em lapso temporal mais dilatado (Lei nº 8.072/90, art. 2º, § 2º). (...) Feitas essas considerações, penso que deve ser superado o disposto na Lei dos Crimes Hediondos (obrigatoriedade de início do cumprimento de pena no regime fechado) para aqueles que preencham todos os demais requisitos previstos no art. 33, §§ 2º, b, e 3º, do CP, admitindo-se o início do cumprimento de pena em regime diverso do fechado. Nessa conformidade, tendo em vista a declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, na parte em que impõe a obrigatoriedade de fixação do regime fechado para início do cumprimento da pena aos condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados, concedo a ordem para alterar o regime inicial de cumprimento das reprimenda impostas ao paciente para o semiaberto." (HC 111840, Relator Ministro Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgamento em 27.6.2012, DJe de 17.12.2013). DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 9 a) Apenado primário: cumprimento de 2/5 da pena; b) Apenado reincidente: cumprimento de 3/5 da pena. Lembrando que no caso de sentenciados por delitos comuns, o prazo para a progressão de regime continua sendo de 1/6 da pena. § 3º: Apelo em liberdade: O recurso de apelação, nos crimes hediondos e assemelhados, tem como pressuposto de admissibilidade o recolhimento do réu à prisão. Somente em caráter excepcional, e motivadamente, pode o juiz autorizar o contrário. Nesse sentido, a Súmula 09 do STJ: “A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”. O parágrafo estabelece que em havendo condenação por crimes hediondos, o juiz deverá decidir se o condenado poderá apelar em liberdade. Apesar do princípio da presunção de inocência, em se tratando de crimes hediondos, deixou a lei a decisão ao juiz se é caso ou não da prisão do autor do crime hediondo, uma vez já havendo condenação. § 4º: Prazo da prisão temporária em crimes hediondos: A prisão temporária está disciplinada na Lei nº 7.960/89 e tem como finalidade a investigação policial. Em se tratando de crimes que nãosão hediondos e que estão especificamente elencados na lei, o prazo da prisão temporária é de 05 dias, prorrogáveis por mais 05 dias. O dispositivo previsto no § 4º permite que em se tratando de crimes hediondos o prazo da prisão temporária será de 30 dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. 5. Artigo 8º da Lei nº 8.072/90 O dispositivo alterou a pena do crime previsto no artigo 288 do C.P. (associação criminosa), de um a três anos de reclusão para o montante de três a seis anos, quando os crimes visados forem hediondos e equiparados. Portanto, se 04 pessoas se associam para o crime de roubo, respondem pelo crime previsto no art. 288 do Código Penal (pena de 01 a 03 anos). Se quatro pessoas se associarem para o cometimento de crime de homicídio qualificado, respondem pelo crime previsto no art. 288 do Código Penal, entretanto, com pena de 03 a 06 anos. O § único do dispositivo ainda trata da chamada delação premiada. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 01 a 2/3. 6. Artigo 9º da Lei nº 8.072/90 Um problema sério do presente dispositivo é a recente entrada em vigor da Lei nº 12.015/09. É que houve um lapso do legislador ao editar a lei citada e ao deixar de remodelar o art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos para adaptá-lo às mudanças que ocorreram. O deslize pode ensejar o surgimento de possibilidade de sua não aplicação e retroatividade benéfica. Aliás, essa é a nossa posição a respeito do tema. As hipóteses anteriormente estabelecidas pelo artigo 224 (presunção de violência) integram os novos tipos penais (arts. 213 e outros do C.P. com a alteração da lei). O legislador estabeleceu expressamente nos novos tipos penais as causas de presunção de violência DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 10 constantes no antigo artigo 224 do Código Penal. Não mais podem ser usadas para aumento de pena, pois ocorreria inegável bis in idem. Mas há que se lembrar que o artigo 9º, estabelece aumento de pena em relação aos arts. 157, §3º, 158, §2º, 159 “caput” e seus parágrafos, quando estiverem presentes as causas do artigo 224 (agora revogado). Como aplicar o aumento de pena a esses dispositivos (art. 157, §3º, art. 158, §2º e 159 “caput) se o artigo 224 foi revogado? Entendemos não mais ser possível o aumento de pena previsto no artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos. Se este dispositivo faz referência a artigo já revogado, não há como ocorrer as causas de aumento de pena ali previstos, simplesmente, por não mais constarem do tipo penal indicado. LEI MARIA DA PENHA – LEI Nº 11.340/06 A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) recebeu este nome em homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes (biofarmacêutica residente em Fortaleza) que foi agredida pelo seu marido durante seis anos, sendo que, em duas oportunidades, ainda sofreu tentativa de homicídio: na primeira vez, em virtude dos tiros recebidos, acabou paraplégica; na segunda, a tentativa de homicídio ocorreu por eletrocução e afogamento. Apesar dos lamentáveis fatos, o marido da Sra. Maria da Penha só foi punido dezenove anos mais tarde, tendo permanecido preso por apenas dois anos. O caso foi levado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA) em petição contra o Estado brasileiro, que não respondeu à denúncia. Em 2001, o Estado brasileiro foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência contra a mulher, sendo aplicada pela primeira vez a Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher – Convenção de Belém do Pará. Fundamento Constitucional e Conceitos Básicos: O fundamento Constitucional à Lei Maria da Penha encontra-se no artigo 226, “caput” e § 8º, da Constituição Federal: O entendimento do STJ e do STF é no sentido de que a causa de aumento prevista no art. 9º da Lei de Crimes Hediondos foi revogada tacitamente pela Lei n. 12.015/2009, considerando que esta Lei revogou o art. 224 do CP, que era mencionado pelo referido art. 9º. STF. Primeira Turma. HC 111246/AC, rel. Min. Dias Toffoli, 11/12/2012 DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 11 “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.” A própria ementa da Lei 11.340/2006 traz a sua fundamentação lastreada além da Constituição Federal, na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 4.377/2002) e na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Promulgada pelo Decreto nº 1.973/96): “Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.” A Lei Maria da Penha será, assim, aplicada quando presentes os requisitos nela contidos: Violência (física, psicológica, moral, patrimonial, sexual) + Âmbito Familiar (ou doméstico) + Sujeito Passivo Mulher São formas de violência, definidas pelo próprio artigo 7º da Lei Maria da Penha: “Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física; II - a violência psicológica; III - a violência sexual; IV - a violência patrimonial; V - a violência moral.” DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 12 Há de se notar, entretanto, que não é qualquer violência doméstica que incidirá na aplicação da Lei nº 11.340/2006, a violência há de ser em razão de ser mulher, em detrimento de sua imagem, colocando a mulher em situação de desigualdade, em situação de rebaixamento social, vulnerabilidade. Outro não é o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul1[1]: “A Lei nº 11.340/2006 não fere o princípio constitucional da isonomia, porquanto apenas visa proteger adequadamente as mulheres que se encontram em situação jurídica desvantajosa, criando mecanismos processuais diferenciados para a sua realidade diversa da dos seus semelhantes (...)” Oportuno ressaltar que não houve desamparo ou qualquer forma de quebra na isonomia entre homens e mulheres sendo certo que o homem, ou o ser masculino, que sofre violência doméstica restou também amparado pelo artigo 129, § 9º do Código Penal que passou a vigorar com a seguinte redação: “§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.” Verifica-se que o § 9º supra mencionado não faz qualquer distinção relativa ao sexo do ofendido: “A pena máxima de 03 anos exclui do conceito de delito de menor potencial ofensivo as lesões corporais praticadas não só contra a mulher como também das pessoas ali referidas ou que se encontram dentro das relações domésticas, de coabitação ou hospitalidade.” (Precedente TJRS, Apelação Criminal nº 70019194398)Não há violação do princípio constitucional da igualdade no fato de a Lei n.º 11.340/06 ser voltada apenas à proteção das mulheres. STF. Plenário. ADC 19/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012. A qualificadora prevista no § 9º do art. 129 do CP aplica-se também às lesões corporais cometidas contra HOMEM no âmbito das relações domésticas. STJ. 5ª Turma. RHC 27.622-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 7/8/2012. Obs: isso não significa que a Lei Maria da Penha aplique-se para vítimas homens. Não se aplica! DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 13 Em verdade, o que houve foi uma inovação no aspecto processual, visando proteger a mulher em desamparo social. Para tanto é necessário demonstrar o que vem a ser entendido como âmbito doméstico, familiar ou em qualquer relação íntima de afeto, como demonstrado pelo art. 5º da Lei: “Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.” Portanto, o legislador não exige a coabitação para a configuração do âmbito doméstico: basta que o agressor conviva ou tenha convido com a ofendida, encontrando-se aí relações como namoro, noivado ou, até mesmo, meros casos amorosos, desde que esteja presente o referido requisito da relação íntima de afeto. ► Sujeito ativo e sujeito passivo da violência doméstica e familiar A Lei nº 11.340/06, em vários de seus dispositivos, refere-se ao sujeito ativo da violência doméstica e familiar como “agressor”. Forçoso, concluir, portanto, que tanto o homem quanto a mulher podem ser sujeitos ativos da violência doméstica e familiar, de vez que o termo “agressor” foi utilizado genericamente, abrangendo o sexo masculino quanto o sexo feminino. Já quanto ao sujeito passivo, somente a mulher pode sofrer violência doméstica e familiar. É possível a aplicação da Lei Maria da Penha para violência praticada por irmão contra irmã, ainda que eles nem mais morem sob o mesmo teto. STJ. 6ª Turma. HC 184.990-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 12/06/2012. É possível que a agressão cometida por ex-namorado configura violência doméstica contra a mulher ensejando a aplicação da Lei nº 11.340/06. STJ. 5ª Turma. HC 182.411/RS, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ), julgado em 14/08/2012. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 14 Apesar da posição majoritária no sentido de que a Lei Maria da Penha só pode ser aplicada a vítimas mulheres, há julgados no sentido da possibilidade de aplicação a homens, conforme o julgado abaixo do TJMT (questão conflitante e discutível): Decisão da Segunda Turma Recursal do TJMT: "HABEAS CÓRPUS. MEDIDAS PROTETIVAS, COM BASE NA LEI Nº. 11.340/2006, A CHAMADA LEI MARIA DA PENHA, EM FAVOR DO COMPANHEIRO DA PACIENTE. POSSIBILIDADE. PRINCIPIO DA ANALOGIA IN BONAM PARTEM. AFASTAMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS E TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PEDIDOS DENEGADOS, SEJA PORQUE OS ATOS DA PACIENTE SÃO REPROVÁVEIS, POIS QUE CONTRÁRIOS AO ORDENAMENTO JURÍDICO, SEJA POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ORDEM DENEGADA. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. Louve-se a coragem cívica do autor da representação, em procurar resolver a questão que lhe aflige, na justiça; louve-se o nobre advogado que teve o necessário discernimento para buscar na Lei Maria da penha, arrimado no princípio da analogia, a proteção de seu constituinte, mesmo quando todas as evidências indicavam que a referida Lei não poderia ser invocada para proteger o homem, haja vista que esta norma veio e em boa hora, para a proteção da mulher; louve-se, por fim, o diligente e probo magistrado que ousou desafiar a Lei. Com sua atitude, o magistrado apontado como autoridade coatora, não só pôs fim às agruras do ex companheiro da paciente, como, de resto e reflexamente, acabou por aplicar a Lei em favor da mesma. O raciocínio tem sua lógica, levando-se em conta que, em um dado momento, cansado das investidas, o autor da representação poderia revidar e, em assim agindo, poderia colocar em risco a incolumidade física da paciente. Da análise de todo o processado, não vislumbrei possibilidade de atender aos reclamos dos impetrantes, em favor da paciente, seja para afastar as medidas protetivas em favor do seu ex-companheiro, (afinal as atitudes da beneficiária do HC são reprováveis, posto que contra o ordenamento jurídico); seja para determinar o trancamento da ação penal. (lembremos que ao tempo da impetração não havia ação penal instaurada e mesmo que houvesse, não foi demonstrada a justa causa para tal). (TJMT; HC 6313/2008; Segunda Turma Recursal; Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias; Julg. 09/06/2009; DJMT 24/06/2009; Pág. 35)". Portanto, necessárias as seguintes considerações sobre o tema, obviamente com posições em contrário: “A Lei Maria da Penha não pode ser aplicada para casos de violência contra homens, já que o âmbito de proteção da lei é a mulher. No entanto, a norma não distingue a opção sexual, podendo, portanto, ser empregada normalmente em caso de uma mulher agredida por sua companheira. A lei já vem sendo aplicada no caso de violência contra transexuais que se identificam como mulheres em sua identidade de gênero. O fato de a lei não amparar o homem não significa que ele esteja fora da proteção legal nos casos de agressão. Algumas medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha têm servido de inspiração aos juízes de varas comuns no exercício de suas funções, inclusive em casos de violência contra homens. Ao se sentir agredido, o homem deve recorrer às delegacias e aos juizados especiais ou varas criminais, para crimes com menor potencial ofensivo, como, por exemplo, ameaça ou lesão corporal leve”. ASPECTOS PROCESSUAIS DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 15 Competência O artigo 14 da Lei Maria da Penha estabelece a faculdade de criação de varas especializadas em violência doméstica e familiar contra a mulher: “Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.” Não se pode confundir com os Juizados Especiais, os quais têm competência para julgamento de ações cíveis de menor complexidade e delitos de menor potencial ofensivo. Evidentemente, não é o caso dos “Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher”, os quais têm por objeto a especialização no atendimento aos casos de violência doméstica, tanto na esfera cível, quanto na criminal. E a realidade fática nos mostra que há necessidade de um órgão jurisdicional especializado no atendimento à mulher que sofre violência. De fato, positiva foi a criação de Delegacias de Polícia de Defesa da Mulher, exemplo a ser seguido. Os profissionais tornam-se mais capacitados e são preparados para as medidas protetivas necessárias. Inclusive,louva-se a criação do Centro de Referência da Mulher, “local onde as vítimas de violência doméstica receberão atendimentos especializados médico, psicológico e social, que inclui capacitação profissional para geração de renda - serviços que se integrarão aos já oferecidos pela DDM, como assistência jurídica”2[1] Em caráter transitório a lei estabelece que enquanto não forem criadas as varas especializadas, a competência será das Varas Criminais comuns, as quais acumularão as competências cível e criminal: “Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente. Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput.” No entanto, lamentamos o fato de que ainda não houve a instalação destes Juizados de Violência Doméstica e Famílias contra a mulher em todo o território nacional, mesmo depois de quase dois anos de vigência da Lei Maria da Penha. Medidas a serem adotadas pela Autoridade Policial DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 16 Os artigos 10, 11 e 12 da Lei Maria da Penha, estabelece as providências que devem ser adotadas pela autoridade policial quando do atendimento de ocorrências desta natureza. O artigo 11 estabelece providências que deve adotar a autoridade policial no atendimento de mulher em situação de violência doméstica: - garantir proteção policial; - encaminhar a ofendida ao hospital ou IML; - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida; - acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar; - informar à ofendida os direitos conferidos pela lei. Já o artigo 12 estabelece as providências quando da elaboração da ocorrência policial e as medidas a serem adotadas pelo Delegado de Polícia. De se observar a necessidade da representação da ofendida (inciso I), a remessa no prazo de 48 horas de autos apartados ao juízo para concessão de medidas protetivas (inciso III) e as declarações da ofendida com as medidas protetivas solicitadas (inciso I e § 1º do art. 12). Medidas Protetivas de Urgência As medidas protetivas de urgência previstas na Lei nº 11.340/2006 direcionam-se tanto contra o agressor, quanto à defesa da ofendida. MEDIDAS CONTRA O AGRESSOR (ART. 22): suspensão da posse ou restrição do porte de armas; afastamento do lar, domicílio ou local de convivência; proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas; c) frequentação de determinados lugares; restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores; prestação de alimentos provisionais ou provisórios. MEDIDAS PROTETIVAS À MULHER (ART. 23): DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 17 encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; afastar a ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; concessão de separação de corpos; acesso prioritário à remoção, se a ofendida for servidora pública, integrante da administração direta ou indireta; manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. MEDIDAS PROTETIVAS AO PATRIMÔNIO (ART. 24): restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida; proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial; suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor; As medidas protetivas de urgência da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) podem ser aplicadas em ação cautelar cível satisfativa, independentemente da existência de inquérito policial ou processo criminal contra o suposto agressor. STJ. 4ª Turma. REsp 1.419.421-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2014 (Info 535). DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 18 prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida. Cabe habeas corpus para apurar eventual ilegalidade na fixação de medida protetiva de urgência consistente na proibição de aproximar-se de vítima de violência doméstica e familiar. STJ. 5ª Turma. HC 298.499- AL, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 1º/12/2015 (Info 574). Imagine a seguinte situação hipotética: João e Maria viviam juntos em união estável e um dia tiveram uma grave discussão na qual ele chegou até a ameaçá-la de morte. No mesmo instante, Maria decidiu que não queria mais viver com ele e, com medo da ameaça, procurou o Juizado da Violência Doméstica. A juíza deferiu diversas medidas protetivas de urgência, dentre elas que João mantivesse distância mínima de 500 metros de Maria e de seus familiares e não tentasse nenhum contato com ela por qualquer meio de comunicação (art. 22, III, “a” e “b”). Na decisão, a magistrada consignou, ainda, que, em caso de descumprimento de quaisquer das medidas aplicadas, seria aplicada ao requerido multa diária de R$ 100, conforme previsto no § 4º, do art. 22 da Lei nº 11.340/2006. Diante disso, indaga-se: João poderá impetrar um habeas corpus no Tribunal de Justiça questionando a legalidade desta decisão? SIM. Cabe habeas corpus para apurar eventual ilegalidade na fixação de medida protetiva de urgência consistente na proibição de aproximar-se de vítima de violência doméstica e familiar. Como vimos acima, o eventual descumprimento de medida protetiva arrolada na Lei Maria da Penha pode gerar sanções de natureza civil (art. 22, § 4º, da n. Lei 11.340/2006, c/c art. 461, §§ 5º e 6º do CPC), bem como a decretação de prisão preventiva, de acordo com o art. 313, III, do CPP. Logo, existe um risco à liberdade de locomoção do interessado. Segundo o art. 647 do CPP, dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar. Se o paciente não pode aproximar-se da vítima ou de seus familiares, decerto que se encontra limitada a sua liberdade de ir e vir. Assim, afigura-se cabível a impetração do habeas corpus. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 19 Inaplicabilidade dos institutos da Lei 9.099/95 A Lei Maria da Penha é clara ao determinar que aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95): “Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.” O Superior Tribunal de Justiça editou ainda a Súmula 536/2015, com o seguinte teor: Da Ação Penal - Representação Outro destaque que merece ser feito à Lei Maria da Penha diz respeito à representação nos crimesde ação penal pública condicionada. De acordo com o seu artigo 16, a renúncia (retratação) à representação somente poderá ser realizada perante o magistrado e apenas até o recebimento da denúncia: Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), mesmo que a pena seja menor que 2 anos. STF. Plenário. ADI 4424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012. Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. O descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei 11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). STJ. 5ª Turma. REsp 1.374.653-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/3/2014 (Info 538). STJ. 6ª Turma. RHC 41.970-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/8/2014 (Info 544). DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 20 Após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter decidido que a ação penal nos casos de violência doméstica é pública incondicionada, em 26/08/2015 o STJ editou Súmula 542/2015, a respeito da Ação Penal no caso de violência doméstica contra a mulher, a saber: Prisão Preventiva Inicialmente devemos lembrar que o artigo 20 da lei estabelece que em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial. A Lei Maria da Penha acrescentou um inciso no artigo 313 do Código de Processo Penal, desta forma: “Art. 42. O art. 313 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV: “Art. 313. ................................................. ................................................................ IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” Ressalte-se que para a decretação da prisão preventiva permanece indispensável a presença dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, isto é, somente poderá ser decretada a custódia cautelar como garantia da ordem pública ou da ordem econômica ou por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, e desde que haja prova da materialidade e indícios de autoria. O crime de lesão corporal, mesmo que leve ou culposa, praticado contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, deve ser processado mediante ação penal pública incondicionada. No julgamento da ADI 4.424-DF, o STF declarou a constitucionalidade do art. 41 da Lei n. 11.340⁄2006, afastando a incidência da Lei n. 9.099⁄1995 aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista. Precedente citado do STF: ADI 4.424-DF, DJe 17/2/2012; do STJ: AgRg no REsp 1.166.736-ES, DJe 8/10/2012, e HC 242.458-DF, DJe 19/9/2012. AREsp 40.934-DF, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ-SE), julgado em 13/11/2012. Em 26/08/2015 o STJ editou Súmula a respeito da Ação Penal no caso de violência doméstica contra a mulher, a saber: SÚMULA 542- A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. Terceira Seção, aprovada em 26/8/2015, DJe 31/8/2015. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 21 Impossibilidade de Penas Restritivas de Direitos e Vedação de pena de cestas básicas e outras: No contexto da proteção integral à mulher em situação de violência doméstica e familiar, proibiu expressamente a Lei nº 11.343/06, no art. 17, a aplicação de penas de cestas básicas ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição da pena que implique o pagamento isolado de multa. Sob a vigência da nova lei, não mais sendo cabível transação penal, por impossibilidade de aplicação da Lei nº 9.099/95, não poderá o juiz, no final do processo, quando da prolação da sentença condenatória, substituir a pena privativa de liberdade aplicada ao agressor por pena restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária ou prestação de cestas básicas, nem tampouco operar substituição que implique pagamento isolado de multa. O STJ editou a seguinte Súmula a esse respeito: Súmula 588-STJ: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. LEI MARIA DA PENHA Impossibilidade de penas restritivas de direito. Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico (art. 129, § 9º do CP). STF. 2ª Turma. HC 129446/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 20/10/2015 (Info 804). Veja, portanto, que esse dispositivo proíbe que o juiz aplique as seguintes penas restritivas de direitos à pessoa que praticou violência doméstica e familiar contra a mulher: • Pena de "cesta básica"; • Quaisquer espécies de prestação pecuniária (art. 45, §§ 1º e 2º); • Pagamento isolado de multa (art. 44, § 2º do CP). Alguns doutrinadores sustentaram a tese de que o art. 17, ao proibir apenas esses tipos de penas, teria, a contrario sensu, permitido que fossem aplicadas outras espécies de penas restritivas de direitos. Essa interpretação, contudo, não foi aceita pela jurisprudência. O entendimento que prevalece é o seguinte: além das sanções previstas no art. 17, são proibidas quaisquer penas restritivas para os condenados por violência doméstica e familiar contra a mulher. Isso porque o art. 44, I, do CP veda penas restritivas de direito em caso de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa. Nesse sentido: (...) Não se pode diminuir a abrangência da norma trazida no art. 44, inciso I, do Código Penal, com a finalidade de se contornar a impossibilidade de aplicação da Lei n. 9.099/1995 aos crimes cometidos no âmbito familiar. Com efeito, não obstante a Lei n. 11.340/2006 não vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, restringindo apenas a aplicação de pena de prestação pecuniária e o pagamento isolado de multa, o inciso I do art. 44 do Código Penal é claro ao proibir a substituição quando o crime for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. (...) STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 288.503/MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 26/08/2014. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 22 Aplicação do Princípio da Insignificância à Lei Maria da Penha O STJ editou a seguinte Súmula a esse respeito: LEI DE DROGAS LEI Nº 11.343/06 Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica. Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à expressiva ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento e lesão jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao direito penal. O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância e da bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra amulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal da conduta. Vale ressaltar que o fato de o casal ter se reconciliado não significa atipicidade material da conduta ou desnecessidade de pena. STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 12/04/2016. STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318.849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/10/2015. STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 10/5/2016 (Info 825). Súmula 589-STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 23 I – INTRODUÇÃO A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/06 de 23 de agosto de 2006) estabelece já no seu artigo 1º, parágrafo único, o conceito de drogas. Segundo a lei, drogas “são as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. Verifica-se de início que o legislador conceituou drogas como as substâncias ou os produtos que causam dependência, sem se referir a dependência física ou psíquica. Também se verifica que temos aqui uma norma penal em branco, uma vez que as substâncias ou os produtos que causam dependência estão elencados em outra norma (hoje, a Portaria SVS/MS nº 344/98 do Ministério da Saúde). A autoridade administrativa é quem estabelece as substâncias consideradas drogas. Não será preciso mudar a lei para atualizar a lista ou para inserir ou retirar substâncias consideradas drogas, basta alterar a portaria citada. Não utiliza mais o legislador a expressão “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica”. Os dispositivos penais passam a falar em “drogas”, cujo conceito está dado no § único do artigo 1º da lei. A dependência significa o condicionamento do organismo humano à droga, de tal forma que nasce um invencível desejo ou necessidade de continuar a consumi-la e a sua falta lhe cause efeitos desagradáveis. Esta dependência pode ser física ou psíquica. A dependência psíquica produz uma sensação de satisfação e um impulso psíquico que leva o indivíduo a consumi-la, periódica ou continuamente. A dependência física é o estado de adaptação que a droga causa ao organismo do indivíduo que a sua falta causa intensos transtornos físicos, conhecidos como síndrome de abstinência. A lei proibiu em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas. (artigo 2º). Criou o legislador o chamado SISNAD que tem por finalidade a prevenção e a repressão ao uso e tráfico de entorpecentes. II- USUÁRIOS OU DEPENDENTES DE DROGAS Trouxe a lei um capítulo específico visando à prevenção ao uso de drogas e a reinserção dos usuários e dependentes de drogas. Prevê o respeito ao DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 24 usuário, o investimento em alternativas esportivas, culturais, artísticas e profissionais e a educação nos três níveis de ensino. Dos crimes e das penas em relação aos usuários Primeiramente merece comentários o artigo 27 da lei. Este estabelece que: “Art. 27. As penas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo, ouvidos o Ministério Público e o defensor.” O que interessa para nós no dispositivo é sua parte inicial. O dispositivo diz que as “penas” previstas neste capítulo. Logo, devemos observar que o legislador considerou as medidas a serem aplicadas aos usuários como penas. O artigo 28 da nova lei estabelece que: “Art. 28 Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.” 1. Objeto Jurídico Visa à lei proteger a saúde pública. Quer o legislador evitar que as pessoas utilizem-se de drogas e, conseqüentemente, a saúde da população de uma maneira geral fique prejudicada, já que o consumo de drogas traz graves problemas de saúde. 2. Sujeito ativo e passivo Sujeito ativo é qualquer pessoa, ou seja, qualquer pessoa poderá adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, drogas para consumo pessoal. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 25 Sujeito Passivo é a coletividade e também o próprio usuário de drogas. 3. Conduta típica Cinco são as condutas típicas descritas pelo legislador para o usuário de drogas: - adquirir ; - guardar; - ter em depósito; - transportar; e - trazer consigo. Portanto, a lei considerou crime a conduta não só daquele que adquire (comprar), guarda (ter sob vigilância) ou traz consigo (carrega consigo), como também os que a têm em depósito (retêm a coisa à sua disposição) e transporta (leva de um local para outro) drogas. Não se apena a conduta de “usar”. Fumar maconha, simplesmente, não é crime. Assim, quem consome a erva e tem a sorte de não ser surpreendido com a mesma em seu poder, delito algum comete. Também é necessário mencionar que as condutas típicas são praticadas com uma finalidade específica ou exclusiva: consumo pessoal. O sujeito adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo drogas, para consumo pessoal. O § 1º do artigo 28, ainda estabelece como condutas típicas as situações de: - semear (lançar a semente ao solo); - cultivar (manter a plantação); e - colher plantas (retirar plantas da plantação), para o consumo pessoal. Temos aqui uma inovação na nova lei, uma vez que estas condutas só estavam previstas no antigo crime de tráfico do artigo 12 da Lei nº 6368/76. Aqui também a conduta é para consumo pessoal. O legislador ainda acrescentou a necessidade de que tais condutas sejam também destinadas a uma finalidade específica, ou seja, a “preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.” DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 26 Outra novidade da lei vem estabelecida no § 2º, quando estabelece que “para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.” É necessário esclarecer, portanto, que o juiz, para verificar se a droga se destinava a consumo pessoal, deverá analisar as seguintes situações: a) Natureza e quantidade da substância apreendida: o juiz deverá analisar a “natureza” da droga apreendida, referindo-se a que espécie ou tipo de droga foi apreendida. Algumas drogas são muito mais nocivas do que outras. Também deverá analisar a “quantidade da substância apreendida”, ou seja, a lei não estabeleceu uma quantidade para fixar a conduta de tráfico ou porte de drogas. O juiz deverá analisar a quantidade, se esta quantidade é caracterizadora da prática de conduta de usuário ou de traficante. b) Ao local e às condições em que se desenvolveu a ação: querendo o legislador mais uma vez dizer que o juiz deverá analisar o local em que o usuário foi surpreendido, bem como a maneira de sua prisão. Se um indivíduo é pego saindo de um ponto de venda de drogas portando quatro papelotes de cocaína, tal conduta pode indicar que ele estava ali para aaquisição da droga. Agora, se o indivíduo é pego fazendo ponto em local de venda de droga, portando quatro papelotes de cocaína e mantendo consigo grande quantidade de dinheiro (geralmente notas de pequeno valor – R$ 10,00), tal conduta pode significar que está ali para o comércio de drogas e não uso. O grau de pureza da droga é irrelevante para fins de dosimetria da pena. De acordo com a Lei nº 11.343/2006, preponderam apenas a natureza e a quantidade da droga apreendida para o cálculo da dosimetria da pena. STF. 2ª Turma. HC 132909/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/3/2016 (Info 818). O juiz, ao condenar o réu por tráfico de drogas, no momento da dosimetria da pena, poderá aumentar a pena-base (1ª fase) utilizando como argumento a natureza e a quantidade do entorpecente? SIM. A natureza e quantidade da droga são fatores preponderantes no momento da dosimetria da pena, conforme previsto expressamente no art. 42 da Lei n. 11.343/2006. E o grau de pureza da droga? Pode ser utilizado como argumento para aumentar ou diminuir a reprimenda? NÃO. No caso concreto julgado, a defesa pediu ao juiz que realizasse exame pericial para aferir o grau de pureza da droga, tendo sido indeferido pelo magistrado. Diante da negativa, a defesa alegou que houve nulidade, pedido que foi rejeitado pelo STF, que entendeu ser desnecessário determinar a pureza do entorpecente. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 27 c) Circunstâncias sociais e pessoais do agente: d) Conduta e antecedentes do agente: o juiz analisará a conduta do indivíduo quando de sua prisão. Deverá o juiz verificar qual o seu comportamento, se ele efetivamente praticava atos que indicavam o a compra de droga para uso ou não. Também deverá ser analisado os antecedentes do autor, ou seja, verificar se tal indivíduo já possui condutas relativas ao porte de entorpecente ou do tráfico, fatos que podem indicar a conduta praticada no momento. Tais situações devem ser analisadas pelo juiz de uma maneira conjunta. 4. Consumação e tentativa Consuma-se o crime com as condutas descritas no tipo penal, ou seja, quando o indivíduo adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trouxer consigo drogas para consumo pessoal. Já no § 1º a consumação ocorre quando houver a semeadura, cultivo ou colheita de drogas. As condutas de guardar, ter em depósito, transportar, trazer consigo e o próprio cultivo e a colheita, são consideradas condutas permanentes. O réu não tem o dever de demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada apenas para consumo próprio. Cabe à acusação comprovar os elementos do tipo penal, ou seja, que a droga apreendida era destinada ao tráfico. Ao Estado-acusador incumbe demonstrar a configuração do tráfico, que não ocorre pelo simples fato dos réus terem comprado e estarem na posse de entorpecente. Em suma, se a pessoa é encontrada com drogas, cabe ao Ministério Público comprovar que o entorpecente era destinado ao tráfico. Não fazendo esta prova, prevalece a versão do réu de que a droga era para consumo próprio. STF. 1ª Turma. HC 107448/MG, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 18.6.2013. É legítima a fixação de regime inicial semiaberto, tendo em conta a quantidade e a natureza do entorpecente, na hipótese em que ao condenado por tráfico de entorpecentes tenha sido aplicada pena inferior a 4 anos de reclusão. A valoração negativa da quantidade e da natureza da droga representa fator suficiente para a fixação de regime inicial mais gravoso. STF. 2ª Turma. HC 133308/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 29/3/2016 (Info 819). DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 28 Em relação à tentativa, a doutrina e a jurisprudência dividem-se quanto à sua possibilidade. Alguns entendem possível outros não. A opinião que nos parece mais convincente é a de Damásio de Jesus que admite a tentativa apenas nas espécies de “adquirir” e “semear”. 5. Penas Para o crime de “Porte de Drogas”, previsto no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 o legislador trouxe como penas: 1) advertência sobre os efeitos da droga; 2) prestação de serviços à comunidade; 3) medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. Tais medidas são consideradas como penas levando-se em conta o disposto no próprio artigo 27 quando este estabelece que “As penas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente”. (grifo nosso) Luiz Flávio Gomes entende de forma diversa. Segundo este, “por força da Lei de Introdução ao Código Penal (art. 1º), "Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente" (cf. Lei de Introdução ao Código Penal brasileiro − Dec.-Lei 3.914/41, art. 1º). Diz Luiz Flávio: “Ora, se legalmente (no Brasil) "crime" é a infração penal punida com reclusão ou detenção (quer isolada ou cumulativa ou alternativamente com multa), não há dúvida que a posse de droga para consumo pessoal (com a nova lei) deixou de ser "crime" porque as sanções impostas para essa conduta (advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos - art. 28) não conduzem a nenhum tipo de prisão”. Por outro lado, a maioria dos doutrinadores, entendem que não houve a descriminalização. Houve apenas a diminuição da carga punitiva. Assim, a posse de drogas ainda seria considerada como crime. Teríamos três novas modalidades de pena: advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 29 Em relação a essas novas medidas temos que a prestação de serviços à comunidade e a medida educativa têm prazo máximo de 05 (cinco) meses e, em caso de reincidência serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses (artigo 28, §§ 3º e 4º). A prestação de serviços à comunidade será aplicada em entidades educacionais, assistenciais, hospitais, preferencialmente de prevenção e recuperação de usuários (artigo 28, § 5º). O próprio artigo 27 estabelece que as penas previstas podem ser aplicadas isoladamente ou cumulativamente. Portanto, o juiz poderá aplicar as três penas descritas nos incisos do artigo 28 (advertência, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo). Pergunta: E se o usuário se recusar ao cumprimento das medidas educativas (penas)? Se o usuário se recusar ao cumprimento das medidas (educativas do caput) o juiz poderá submetê-lo (§6º do artigo 28): a) à admoestação verbal; b) multa. Difícil é entender o que o legislador quis dizer com “admoestação verbal”. O artigo 28, I já falou em advertência. Seriam a mesma coisa? Acreditamos que não. Assim, se o usuário descumprir as medidas impostas o juiz deverá admoestá-lo. Seria dar-lhe uma “bronca”? Não foi claro o legislador. Guilherme de Souza Nucci esclarece que na advertência, o juiz se concentra a alertar o acusado a respeito dos efeitos das drogas. Na admoestação verbal cuida o magistrado de avisar, com firmeza de que ele não vem cumprindo a pena aplicada. Estará, então, sujeito à sanção pecuniária, caso assim continue a agir. A multa será de 40 a 100 dias-multa, com valor de 1/30 (um trinta avos) até 03 vezes o valor do maior salário mínimo. 6. Prescrição e Competência Prescrição no crime de porte de entorpecente: o artigo 30 da Lei trata da prescrição quanto à imposição e execuçãodas penas previstas no artigo 28. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 30 Segundo a lei, a prescrição ocorrerá em 02 (dois) anos, observando-se o disposto no artigo 107 e seguintes do C.P. O Juizado Especial Criminal será o juízo competente para a análise e julgamento do caso, exceto se houver concurso com os crimes previstos nos artigos 33 a 37 da Lei. Neste caso a competência será da Justiça Comum. 7. Questão controvertida ► Poderia o usuário ser preso em flagrante delito? Outra polêmica surgiu nessa hipótese. A própria lei veda a prisão em flagrante delito do usuário de drogas no artigo 48, § 2º da Lei. Diante de tal proibição, quando o agente policial se deparar com um usuário de drogas, não poderá prendê-lo? Deverá simplesmente deixá-lo ali? Como conciliar tal situação? Devemos observar que a questão deve ser resolvida de maneira processual. A prisão em flagrante delito se desdobra em quatro atos: cessação da prática criminosa; condução do criminoso à presença da autoridade policial; lavratura do auto de prisão em flagrante delito e; recolhimento do autor do crime à prisão. Assim, na hipótese de usuário de drogas, admite-se tão somente as duas primeiras etapas (cessação do crime e condução à presença da autoridade policial). As duas etapas restantes (lavratura do auto de prisão e recolhimento) é que foram vedadas pela lei. Deve ser elaborado o Termo Circunstanciado de Ocorrência Policial e liberado. Admitindo-se a aplicação da Lei nº 9.099/95, quando do encaminhamento do Termo Circunstanciado o Ministério Público poderá transacionar e sugerir a aplicação das três novas penas, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente. III- DOS CRIMES RELACIONADOS AO TRÁFICO DE DROGAS “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.” DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 31 Este dispositivo é popularmente conhecido como tráfico de drogas. Trata-se de crime comum, de mera conduta, de perigo abstrato e de ação múltipla que se configura por meio de vários verbos. A condutas de tráfico não se esgotam no caput do artigo 33, mas também estão previstas no § 1º que cuida das figuras equiparadas ao tráfico. 1. Objetividade Jurídica e objeto material O bem jurídico protegido é a saúde pública. A incolumidade pública. Para a existência do delito não há necessidade de ocorrência do dano. É crime de perigo abstrato ou presumido. Tutela-se não só a saúde pública como também a vida, a saúde pessoal e a família. Há, portanto, mais de um bem jurídico tutelado pela lei. Objeto material ou objeto da ação são as drogas, cujo conceito já vimos: substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Cumpre observar que se alguém pratica uma das condutas do tipo penal tendo por objeto substância que pensa ser droga, mas, por engano, não é, haverá crime impossível ou crime putativo. Igualmente, não haverá crime se a substância não for provida do princípio ativo que a classificar como proibida. Exemplo: A posse de sementes de maconha não constitui fato típico, porque elas não têm o princípio ativo, não produzem dependência física ou psíquica. 2. Sujeitos do delito Sujeito ativo é qualquer pessoa, imputável, que pratique uma das condutas previstas. Não se trata de crime próprio é crime comum. Somente a conduta “prescrever” exige uma qualidade especial do agente (médico ou dentista) e, portanto, nesse caso, trata-se de crime próprio. Importante citar aqui a Súmula 492 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no que se refere ao ato infracional análogo ao tráfico de drogas: O ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida sócio-educativa de internação do adolescente. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 32 Sujeito passivo é a coletividade que se vê exposta a perigo pela prática de uma das condutas típicas. • O artigo admite coautoria? Sem dúvida, em todas as figuras. Mesmo a posse ou a guarda podem ensejar a participação. Ex. O indivíduo A entrega dinheiro a B para que este adquira entorpecente de um terceiro. B é preso em flagrante antes da entrega do entorpecente a A; este, é co-autor do delito de posse do tóxico praticado por B. Observe-se ainda que o artigo não possui elemento subjetivo do tipo ou dolo específico. O dolo específico aparece apenas no art. 28 quando estabelece “para consumo pessoal”. Qualquer outra finalidade do agente determina a incidência do art. 33, inclusive, a distribuição gratuita. O STF já se posicionou nesse sentido quanto à distribuição gratuita. A única exceção ocorre na hipótese do oferecimento para amigo e consumo conjunto, prevista no § 3º, do artigo 33. Não podemos ainda confundir o dispositivo em comento com o previsto no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que tipifica como crime a conduta de venda, fornecimento ou entrega a criança ou adolescente, de produtos que possam causar dependência física ou psíquica. A norma do ECA é subsidiária, só será aplicada se não se tratar de drogas. Se a substância entregue ao adolescente, por exemplo, for maconha, o crime será o do artigo 33 da Lei. 2.3.Conduta Típica São 18 (dezoito) os verbos do caput que exprimem as formas de conduta punível e que são os núcleos do tipo, algumas permanentes, como guardar, ter em depósito, trazer consigo e expor à venda, e as demais instantâneas. É, portanto, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. “Importar” é fazer entrar no território nacional. Consuma-se delito quando transpostas as fronteiras do país ou ingressando o entorpecente nos limites do mar territorial e espaço aéreo. “Exportar” é ato inverso, fazer sair dos limites territoriais brasileiros. DIREITO PENAL – LEGISLAÇÃO ESPECIAL 33 “Remeter” significa enviar para alguém ou algum lugar, encaminhar. A remessa através da internet configura essa conduta. A consumação nesse caso ocorre quando o sujeito recebe a droga; caso contrário, haverá tentativa. “Preparar” significa compor, obter por meio de composição, colocar apta a servir. “Produzir” é dar origem a droga ilícita, criar, seja em pequena, seja em grande escala. Distingue-se de “preparar” porque este verbo pressupõe a existência de componentes que são postos em circunstâncias a servir de entorpecente. “Fabricar” é produzir mediante meio mecânico industrial, produzir em fábrica. “Adquirir” significa obter, ter incorporado ao seu patrimônio. Adquirir é ação delituosa instantânea. “Vender” é alienar mediante contraprestação. A permuta é uma dupla venda e, portanto, está incluída no “vender”. “Expor à venda” é mostrar a eventuais compradores. É exibir para a venda. “Oferecer” significa ofertar, apresentar para ser aceito. “Ter em depósito” é reter a coisa a sua disposição em local fixo e “guardar” é a retenção em nome de outra pessoa. “Transportar” é conduzir de um local para outro, em nome pessoal ou de terceiro. “Trazer consigo” é uma variante de transportar, consistente em transportar pessoalmente,
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