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1 FILOSOFIA E CONHECIMENTO Professor Mestre Obertal Xavier Ribeiro Março de 2014 INTRODUÇÃO São diversas as formas de conhecimento humano. O tema "Conhecimento" inclui, mas não está limitado, às descrições, hipóteses, conceitos, teorias, princípios e procedimentos que são úteis ou verdadeiros em toda a trajetória e experiência humana. O ser humano pode utilizar diversas formas de conhecimento para tentar compreender e interagir consigo, com o outro, com a realidade ao seu redor e com o mundo, de uma maneira bastante abrangente. O conhecimento só é perceptível através da existência de três elementos: o sujeito, o objeto e a imagem. Vamos explicitar cada elemento: O sujeito cognoscente, aquele que conhece; o objeto é aquilo que será conhecido e a imagem é quem irá deter o conhecimento, é a interpretação do objeto pelo sujeito. Neste momento, o sujeito apropria-se, de certo modo do objeto. O conhecimento apresenta-se como uma transferência das propriedades do objeto para o sujeito. O conhecimento leva o homem a apropriar-se da realidade e, ao mesmo tempo a penetrar nela, essa posse confere-nos a grande vantagem de nos tornar mais aptos para a ação consciente, para nos relacionarmos com a realidade ao redor. A ignorância tolhe as possibilidades de avanço para melhor, mantém-nos prisioneiros das circunstâncias. O conhecimento tem o poder de transformar a escuridão da realidade em um caminho iluminado pela razão, de tal forma que nos permite agir com certeza, segurança e precisão, com menos riscos e menos perigos. Mas a realidade não se deixa revelar facilmente. Ela é constituída de numerosos níveis e estruturas. De um mesmo objeto podemos obter conhecimento da realidade em diversos e distintos níveis. Em outras palavras, a realidade é tão complexa que o homem, para apropriar- se dela, teve de aceitar diferentes tipos de conhecimento. Vamos destacar nesse texto dentre as principais formas de conhecimento humano, aqueles que se referem à temática da reflexão filosófica na atualidade: o Senso Comum; o Conhecimento do Mito; o Conhecimento Empírico; Conhecimento Religioso; o Conhecimento Teológico; o Conhecimento Filosófico e o Conhecimento Científico e o Conhecimento Tecnológico. 2 Conhecer é comunicar-se, interagir com diferentes perspectivas e modos de compreensão, inovando e modificando a realidade, É uma relação que se estabelece entre sujeito e objeto. 1 O SENSO COMUM É o tipo de conhecimento que aprendemos através da nossa própria vivência com o mundo, também é repassado a nós pelas gerações, pela cultura popular. É o resultado da experiência humana em diversas circunstâncias. É aquele conhecimento que convence a maioria das consciências sem necessariamente passar por questionamentos aprofundados. Senso Comum é o nome dado ao tipo de conhecimento humano que descreve crenças e proposições que uma pessoa acha correta, sem, no entanto obtê-la de um conhecimento da investigação ou do estudo. O senso comum é uma forma de conhecimento informal, espontâneo, adquirido do contato direto com o mundo. Geralmente obtido por tentativa ou erro. No senso comum são realizadas ações que achamos que produzem um resultado eficiente, mas não temos como descrever a cadeia de eventos que levam a este resultado. Esta forma de conhecimento é a primeira do da experiência do ser humano, e acaba sendo utilizada pela grande maioria das pessoas nas atividades mais corriqueiras da vida cotidiana. Porém pelo fato de ser simples e superficial, o senso comum acaba sendo insuficiente, pois é um conhecimento que depende dos sentidos humanos, que são limitados e não podem contemplar a realidade verdadeira das coisas. 2 O CONHECIMENTO DO MITO É necessário deixar bem claro, nesta tentativa de conceituar o mito, que o mesmo não tem aqui a conotação usual de fábula, lenda, invenção, ficção, mas a acepção que lhe atribuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, as impropriamente denominadas culturas primitivas, onde mito é o relato de um acontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante a intervenção de entes sobrenaturais. 3 Em outros termos, mito é o relato de uma história verdadeira, ocorrida nos tempos dos princípios, quando com a interferência de entes sobrenaturais, uma realidade passou a existir, seja uma realidade total, o cosmo, ou tão-somente um fragmento, um monte, uma pedra, uma ilha, uma espécie animal ou vegetal, um comportamento humano. Mito é, pois, a narrativa de uma criação: conta-nos de que modo algo, que não era, começou a ser. De outro lado, o mito é sempre uma representação coletiva, transmitida através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo. Mito é, por conseguinte, a palavra "revelada", o dito. E, desse modo, se o mito pode se exprimir ao nível da linguagem, "ele é, antes de tudo, uma palavra que circunscreve e fixa um acontecimento". "O mito é sentido e vivido antes de ser expresso pela inteligência e formulado pelas explicações. Mito é a palavra, a imagem, o gesto, que circunscreve o acontecimento no coração e na memória do ser humano. Há uma dimensão emotiva, como para uma criança, antes de fixar-se como narrativa". O mito expressa o mundo e a realidade humana, mas cuja essência é efetivamente uma representação coletiva, que chegou até nós através de várias gerações, transmita culturalmente. E, na medida em que pretende explicar o mundo e o homem, isto é, a complexidade do real, o mito não pode ser lógico: ao revés, é ilógico e irracional. Abre-se como uma janela a todos os ventos; presta-se a todas as interpretações. Decifrar o mito é, pois, decifrar-se. O mito não pode, conseqüentemente, ser um objeto, um conceito ou uma idéia: ele é um modo de significação, uma forma. Assim, não se há de definir o mito pelo objeto de sua mensagem, mas pelo modo como a profere, como se expressa. A consciência mítica, embora rejeitada no mundo moderno, ainda está viva e atuante nas civilizações denominadas primitivas. Ele desempenha uma função indispensável, pois exprime, exalta e codifica a crença; salvaguarda e impõe os princípios morais; garante a eficácia do ritual e oferece regras práticas para a orientação do homem. O mito, não é uma explicação destinada a satisfazer a uma curiosidade científica, mas uma narrativa que faz reviver uma realidade primeira, que satisfaz as profundas necessidades religiosas, aspirações morais, a pressões e a imperativos de ordem social e mesmo a exigências práticas. O mito é um ingrediente vital da civilização humana; longe de ser uma fabulação vã, ele é, ao contrário, uma realidade viva, à qual se recorre incessantemente; não é, 4 absolutamente, uma teoria abstrata ou uma fantasia artística, mas uma verdadeira codificação da religião primitiva e da sabedoria prática. 3 CONHECIMENTO EMPÍRICO É uma forma de conhecimento adquirida através de experiências cotidianas, tentativas, erros e acertos. Apresenta-se no modo comum, corrente e espontâneo de conhecer. Necessita de provas e considera-se diante de fatos concretos. Tem uma natureza popular que se adquire no trato direto com as coisas e os seres humanos. As informações são assimiladas por tradição, experiências causais, ingênuas. É caracterizado pela aceitação passiva, sendo mais sujeito ao erro nas deduções e prognósticos. É o saber que preenche nossa vida diária. É do cotidiano e que se possui sem o haver procurado, sem aplicação de método e sem se haver refletido sobre algo. O homem, ciente de suas ações e do seu contexto, apropria-se de experiências próprias e alheias acumuladas no decorrer do tempo, obtendo conclusõessobre a razão de ser das coisas. É, portanto superficial, sensitivo, subjetivo, assistemático e acrítico. 4 O CONHECIMENTO RELIGIOSO É aquele que busca explicar o mundo através do sobrenatural, do místico, do sagrado e do divino. Religião pode ser definida como um conjunto de crenças relacionadas com aquilo que a humanidade considera como metafísico, sobrenatural, divino, sagrado e transcendental, bem como o conjunto de rituais e códigos morais que derivam dessas crenças. O conhecimento religioso implica na crença de verdades obtidas de forma divina ou sobrenatural, e desta forma são geralmente infalíveis e cujas evidências não podem ser comprovadas, sendo geralmente relegadas à fé ou crença pessoal. O conhecimento religioso se baseia em dogmas, dos quais não se pode duvidar, que não podem ser refutados nem submetidas à análise científica. 5 5 CONHECIMENTO TEOLÓGICO Conhecimento adquirido a partir da aceitação de axiomas da fé teológica, é fruto da revelação da divindade, por meio de indivíduos inspirados que apresentam respostas aos mistérios que permeiam a mente humana, pode ser dados da vida futura, da natureza e da existência do absoluto. A incumbência do Teólogo é provar a existência de Deus e que os textos Bíblicos foram escritos mediante inspiração Divina, devendo por isso ser realmente aceitos como verdades absolutas e incontestáveis. 6 CONHECIMENTO FILOSÓFICO É o conhecimento que se baseia no filosofar, na interrogação e na indagação como instrumentos para decifrar elementos imperceptíveis aos sentidos. É uma busca partindo do material para o universal, exige um método racional, diferente do método experimental (científico), levando em conta os diferentes objetos de estudo. Emergente da experiência, suas hipóteses assim como seus postulados, não poderão ser submetidos ao decisivo teste da observação. O objeto de análise da filosofia são idéias, relações conceptuais, exigências lógicas que não são redutíveis a realidades materiais e, por essa razão, não são passíveis de observação sensorial direta ou indireta (por instrumentos), como a que é exigida pelo conhecimento científico. Hoje, os filósofos, além das questões metafísicas tradicionais, formulam novas questões no nível humano, educacional, político, social, ético e existencial. Entre tantas outras apontamos: O conhecimento do senso comum e empírico responde a todas as necessidades humanas. Um mito é aceito por todas as culturas A teologia e as religiões explicam satisfatoriamente e suficientemente a realidade humana na atualidade. A maquina substituirá quase totalmente o homem? A clonagem humana será uma prática aceita universalmente? O conhecimento tecnológico é um benefício para o homem? Quando chegará a vez do combate à fome e à miséria? Etc. É o conhecimento do conhecimento, é metafísico, busca a origem das coisas. 6 Filosofia modernamente é uma disciplina, ou uma área de estudos, que envolve a investigação, a análise, a discussão, a formação e a reflexão de idéias, diante das visões da realidade e de mundo, em uma situação concreta e no desafio do geral e do abrangente. É o conhecimento do que é fundamental para a existência humana. O conhecimento filosófico é aquele que é obtido pelo ato de filosofar, isto é, através de uma análise mental em busca de respostas para certas interrogações. O conhecimento filosófico caracteriza-se pelo fato de abarcar idéias, relações conceituais e raciocínios lógicos que por vezes não podem ser observados, nem mensurados. 7 CONHECIMENTO CIENTÍFICO O conhecimento científico é realizado pela ciência, teoria e experimentação. É provável, mas não nos oferece confiabilidade total, pois esta sempre frente à possibilidade de novas descobertas e da superação. O conhecimento científico vai além da visão empírica, preocupa-se não só com os efeitos, mas principalmente com as causas e leis que o motivaram. Esta nova percepção do conhecimento se deu de forma lenta e gradual, evoluindo de um conceito que era entendido como um sistema de proposições rigorosamente demonstradas e imutáveis, para um processo contínuo de construção, onde não existe o pronto e o definitivo. Envolve é uma busca constante de explicações e soluções e a reavaliação de seus resultados. Este conceito ganhou força a partir do século XVI com Copérnico, Bacon, Galileu, Descartes e outros. No seu conceito teórico, é tratado como um saber ordenado e lógico que possibilita a formação de idéias, num processo complexo de pesquisa, análise e síntese, de maneira que as afirmações que não podem ser comprovadas são descartadas do âmbito da ciência. Este conhecimento é privilégio de especialistas das diversas áreas das ciências. 7 8 CONHECIMENTO TÉCNICO O fundamento básico desse tipo de conhecimento é o saber fazer, a operacionalização. Tem como objeto o domínio do mundo e da natureza. É especializado e específico e se esmera na aplicação de todos os outros saberes que lhe podem ser úteis. Trata-se de um tipo de saber que auxilia o ser humano a agir mundo, levando-os às mais diversas atividades visando à produção técnica da vida, a agilidade, a praticidade. A supervalorização da técnica pode levar a um ativismo que coloca em segundo plano as atividades de pensar e de compreender os "porquês" das coisas, razão pela qual o emprego da tecnologia requer prudência e bom senso. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para compreender filosofia e conhecimento se faz necessário um novo paradigma. A modernidade e pós modernidade coloca em discussão constantemente as diversas e diferentes maneiras de conhecer, que requer uma nova postura filosófica. A todo momento o ser humano busca ter uma noção, informações, ideias claras sobre o que se apresenta aos seus sentidos e a sua razão. O conhecimento é um construir constante que acompanha o ser humano na sua trajetória histórica. É a capacidade de questionar, avaliar parâmetros na história e reconstruir, inovar e intervir. Frente ao processo de exclusão conceber o conhecimento como projeto de cidadania e da emancipação humana. O questionamento sempre foi à alavanca do conhecimento, e usando da metáfora, a alavanca provoca a mudança de posição. Assim o conhecimento faz a mudança de parâmetros. A lógica do questionar leva a uma coerência no sentido de desfazer para inovar. O questionamento é assim passível de ser questionado, quando cria um ambiente desfavorável ao homem e à natureza. Uma abordagem necessária é a relação com a Ética. A relação entre conhecimento e democracia, modernamente, caracteriza-se como uma relação intrínseca. O poder do conhecimento se impõe através de varias formas de dominação: econômica, política, cultural, social etc. A diferença entre pobres e ricos, é determinada pelo fato de se deter ou não conhecimento, já que o acesso à renda define as chances das pessoas e sociedades Cada vez 8 mais, estas chances serão definidas pelo acesso ao conhecimento e seu desdobramentos. Convencionou-se que em liderança política é indispensável nível superior. E no topo da pirâmide social encontramos o conhecimento como o fator diferencial. É inimaginável o progresso técnico que o conhecimento pode nos proporcionar, como é facilmente imaginável o risco da destruição total. Para equalizar esta distorção, o preço maior é a dificuldade de arrumar a felicidade que, parceira da sabedoria e do bom senso é muitas vezes desestabilizada pela soberba do conhecimento. De forma geral podemos dizer que o conhecimento é o distintivo principal do ser humano, é um referencial para situara virtude e os valores como método de análise e intervenção na realidade. Também é ideologia com base científica a serviço da elite e de cientistas, de grupos de interesses políticos e econômicos diversos, quando isenta de valores. E finalmente pode ser a perversidade do ser humano, quando é feito e usado para fins de destruição, de dominação e de alienação. É importante conciliarmos a filosofia e os conhecimentos que possuímos com outras virtudes essenciais para a vida humana, como a sensibilidade popular, bom senso, sabedoria popular, experiência de vida, ética. Segue como ilustração o texto do poema o “O trem de ferro”, ilustrando a capacidade de perceber e conhecer o que esta ao redor, a visão da realidade e do mundo que cerca e atravessa os caminhos do ser humano. O trem de ferro Num trem, em grande disparada, pai e filho corriam. E ambos o que viam? As montanhas, os montes, os horizontes, o matagal cerrado os penedos, os rochedos, os arvoredos... Tudo a correr com a rapidez do vento tresloucado. E o trem, que era em verdade o que corria, parecia estar parado. A criança, o petiz, cheio de espanto, lhe perguntou: "Papai, por que é que tudo ao longe está correndo tanto, e o trem daqui não sai?!" 9 Os passageiros riam, pois sabiam que o petiz se enganava. O trem, que parecia estar imóvel, era de fato o que corria e voava. Dos passageiros todos, um, somente nem de leve sorriu. E então os passageiros riram dele porque ele não riu. E o poeta (era um poeta...) disse, então: "É natural, senhores, a ilusão do petiz iludido. Muitas vezes a nós a mesma coisa já tem acontecido. E vós, ó meus senhores, - os cientistas, os sábios, os doutores - caís no mesmo engano lisonjeiro, pois, afinal, todos nós nos enganamos, quando, todos os dias, exclamamos: - Como é que o tempo passa tão ligeiro!... E nós é que passamos". Catulo da Paixão Cearense, Fábulas e alegorias. Apud FERREIRA, Agostinho. Introdução à Filosofia. São Paulo: FTD, 1996, p.15-16. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: CHAUÍ, M. Primeira filosofia: aspectos da história da filosofia. São Paulo: Brasiliense, 1987 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2004. HUISMAN. Denis. Dicionário dos Filósofos. São Paulo 2004, Martins Fontes. MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. CHUAI, Marilena. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume 1. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
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