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UNIGRANRIO Curso de Graduação em Direito Direito dos Contratos (EDI 282) Profa. Carla F. Gonçalves 1 UNIDADE 1 - Dos Contratos em Geral Princípios fundamentais dos contratos Princípios são proposições dotadas de um considerável grau de normatividade, que acabam por informar todo o sistema jurídico e lhe asseguram validade. CONTRATOS NA CONCEPÇÃO TRADICIONAL OU CLÁSSICA A teoria contratual tradicional está embasada nos seguintes princípios: AUTONOMIA DA VONTADE SUPREMACIA DA ORDEM PÚBLICA OBRIGATORIEDADE DAS CONVENÇÕES (intangibilidade do conteúdo do contrato) Estes são considerados os pilares da teoria clássica ou tradicional do contrato, imantada dos ideais do liberalismo individualista do século XIX. Reação contra as interferências e limitações impostas pelo Estado durante toda a Idade Média. Onipotência do cidadão na administração e disponibilidade de todos os bens. Ampla liberdade de contratar sem interferência do Estado. O contrato era representação da liberdade (livre manifestação de vontade) e por isso intangível. O Código Civil de 1916 consagrou o modelo clássico de contrato. O princípio da autonomia da vontade O princípio da autonomia da vontade está intimamente ligado à liberdade contratual, ou seja, o poder que têm os indivíduos de regularem seus próprios interesses, por acordo de vontades, da maneira que melhor lhes convier, suscitando os efeitos reconhecidos pelo ordenamento jurídico. Tradicionalmente, a autonomia da vontade, fundada no princípio da igualdade dos contratantes, estaria apenas limitada pela ordem pública e pelos bons costumes. Abrange o princípio da liberdade de contratar ou não contratar, segundo o qual ninguém está obrigado a ligar-se contratualmente, só o fazendo se assim lhe convier; princípio da liberdade de estabelecer o conteúdo do contrato garantindo que o poder de auto-regência dos interesses e da livre discussão das condições contratuais abrange inclusive a escolha do tipo de contrato; princípio da liberdade de escolher o outro contratante, pois ninguém é obrigado a contratar com quem não desejar, embora, em algumas hipóteses possa-se vislumbrar restrições a este princípio por exemplo no caso de empresas concessionárias de serviços públicos que não podem recusar-se a contratar, não possuindo, pois, liberdade de escolha da contraparte. O princípio da supremacia da ordem pública Segundo o princípio da supremacia da ordem pública o interesse da sociedade deve prevalecer sobre o interesse individual. Historicamente, esse princípio limitador da liberdade contratual pautava-se nos conceitos de ordem pública e bons costumes. O princípio da obrigatoriedade de convenção As partes ficam vinculadas ao cumprimento das obrigações convencionadas, sob pena da imposição de sanções previstas para o caso de inadimplemento, resultando na execução patrimonial do devedor. Pacta sunt servanda. Funda-se na regra de que o contrato faz lei entre as partes, desde que estipulado validamente e com observância dos requisitos legais e denota uma função de UNIGRANRIO Curso de Graduação em Direito Direito dos Contratos (EDI 282) Profa. Carla F. Gonçalves 2 segurança do comércio jurídico que se transformaria em caos se os contratantes pudessem não cumprir a palavra empenhada. E ainda: Consensualismo Conforme o princípio do consensualismo, para a geração do contrato válido, basta o simples acordo de duas ou mais vontades, dispensando-se quaisquer formalidades. Relatividade dos Efeitos do Contrato O princípio da relatividade dos efeitos do negócio jurídico determina que o contrato, resultando da manifestação de vontade dos contraentes, que livremente se obrigam, surte efeitos apenas entre as partes que nele intervieram, não aproveitando nem prejudicando terceiros. Coerente com o modelo clássico de contrato, visto exclusivamente como instrumento de satisfação das necessidades individuais. CONTRATOS DE CONCEPÇÃO MODERNA E SOCIAL (NOVOS PRINCÍPIOS) A Constituição Federal consagrou como basilar o preceito da dignidade da pessoa humana a fim de concretizar o compromisso assumido de construir uma sociedade livre, justa e solidária. Art. 1º, III e IV; art. 3º; art. 170 O Direito dos Contratos deve voltar-se à promoção da dignidade da pessoa humana e da solidariedade, justificando-se amplamente a interferência do Estado no âmbito da economia do contrato, regulamentando-o, a fim de garantir a concretização dos valores constitucionais eleitos como fundamentais, realizando a justiça social e ao mesmo tempo promovendo o desenvolvimento e estabilidade econômica. DIRIGISMO CONTRATUAL é o movimento de interferência estatal para condução do contrato a fim de garantir a igualdade substancial das partes, impedindo que os fracos se submetam aos fortes e salvaguardando o predomínio do interesse social sobre o individual. O dirigismo contratual é operado por meio da edição e aplicação de leis de ordem pública que limitam a liberdade contratual em prol do interesse coletivo e também por meio da intervenção judicial para revisão das cláusulas desproporcionais ou abusivas que atentam contra a justiça. O contrato deve ser concluído e executado de forma socialmente responsável, com o fim de garantir o justo equilíbrio contratual. Instrumento de satisfação de interesses individuais e instrumento destinado à realização de uma finalidade social. O Código Civil é o novo paradigma para todo o direito privado. Revalorização do interesse público e humanização das relações jurídicas. a tutela externa do crédito”.(Enunciado da Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos do Conselho da Justiça Federal). FUNÇÃO SOCIAL A função social do contrato assegura a livre circulação de bens e serviços, a produção de riquezas e a realização de trocas, sempre de forma a favorecer o progresso social, evitando o abuso do poder econômico e a relação desigual entre os co-contratantes. Visa a promover e garantir a igualdade material das partes e a coibir ajustes que atentem contra os interesses coletivos. Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. UNIGRANRIO Curso de Graduação em Direito Direito dos Contratos (EDI 282) Profa. Carla F. Gonçalves 3 A função social do contrato impõe aos contraentes que cooperem entre si para que o negócio seja útil como meio de produção e circulação de riquezas, não só para as próprias partes, mas para toda a coletividade. Os contratantes devem, portanto, abster-se da prática de condutas que ameacem a finalidade maior do direito dos contratos, que é o bem comum. O princípio da função social do contrato deve repousar na harmonia entre a autonomia privada e as exigências do bem comum. Parágrafo único do art. 2.035 (Das Disposições Finais e Transitórias) - “Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.” Tratando-se de norma de ordem pública deve ser aplicada de ofício pelo juiz, independentemente de requerimento ou alusão das partes. Em muitas situações a relação contratual pode prejudicar direitos sociais de pessoas estranhas àquela avença, e que, por essa razão, têm o direito de nela interferir. O princípio da função social do contrato atenuou de modo sensível o princípio da relatividade dos efeitos do contrato, admitindo a ingerência na relação obrigacional de terceiros estranhos à convenção. Isso,sempre que vislumbrar-se lesão a interesses sociais decorrentes do ajuste negocial. “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONTRATUAL Distinção entre boa-fé subjetiva e boa-fé objetiva A boa-fé subjetiva, também denominada boa-fé crença, ocorre quando a pessoa ignora que esteja lesando direito de outrem por acreditar ser titular de um direito que só existe na aparência, mas que na realidade não tem. É o contrário de má-fé. Ex – São exemplos de boa-fé subjetiva as hipóteses de casamento putativo, aquisição da propriedade alheia mediante usucapião (ordinário). Está agindo de boa-fé subjetiva o sujeito que, justificadamente (concepção ética), ignora o caráter ilícito do seu ato. A boa-fé objetiva, boa-fé lealdade ou boa-fé confiança, vincula-se, a um modelo de conduta objetivo (padrão de conduta não definido pelo direito), socialmente recomendado, de correção, lisura, honestidade e consideração para com as expectativas geradas, para que não se frustre a confiança legítima das partes envolvidas na relação obrigacional. Dever imposto às partes de agirem de acordo com determinados padrões de conduta que, socialmente, são definidos como corretos e justos. O princípio da boa-fé objetiva guarda estreita ligação com o princípio da justiça contratual e visa, primordialmente, tutelar as legítimas expectativas das partes contratantes. Dentro do âmbito da relação contratual, atende ao princípio da boa-fé o contraente que age de acordo com a economia e finalidade do contrato, cooperando para a conservação do equilíbrio contratual. A ausência de boa - fé objetiva nem sempre significa má-fé. Na análise da boa-fé objetiva é irrelevante a convicção da parte. Afere-se a manifestação objetivamente. Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Alcance da Boa-fé objetiva - Tríplice função da boa-fé objetiva UNIGRANRIO Curso de Graduação em Direito Direito dos Contratos (EDI 282) Profa. Carla F. Gonçalves 4 1. Função interpretativa – segundo a função interpretativa, os contratos devem ser interpretados de acordo com a boa-fé. Apresenta-se em duas vertentes: a) os contratos devem ser interpretados de acordo com seu sentido objetivo, salvo quando o declaratário conheça a vontade real do declarante, ou quando devesse conhecê-la, se agisse com razoável diligência; b) se o próprio sentido objetivo suscita dúvidas, deve-se preferir o significado que a boa-fé aponte como mais adequado. Refere-se ao caso de ter o contrato cláusulas ambíguas. O art. 112 do Código Civil que consubstancia a função interpretativa da boa-fé. Art. 112 - Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. 2. Função integrativa - A função integrativa da boa-fé estabelece que na relação contratual, os direitos e deveres das partes não se restringem, apenas, à concreção da prestação estipulada no contrato. A boa-fé impõe a observância de muitos outros deveres de conduta, que se tornam evidentes a partir de uma análise da relação obrigacional sob uma perspectiva sistêmica. Dever de esclarecimento - incumbe às partes o dever de informarem-se mutuamente de todos os aspectos atinentes ao vínculo contratual, de todas as ocorrências que com ele tenham relação e de todos os efeitos de dele possam advir. Dolo negativo – Art. 147 do Código Civil: invalidação do negócio jurídico, acrescida de perdas e danos. Configura dolo a reticência, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de circunstâncias atinentes ao negócio, essenciais para a outra. Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra pane haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado. Dever de lealdade - Esse dever consiste em facilitar a tarefa do outro contratante em adimplir a obrigação. Dever de cuidado ou proteção - Por força do dever de proteção, as partes devem agir, durante a relação contratual, de modo a evitar danos mútuos, pessoais e patrimoniais. Em outras palavras, esse dever atua no sentido de evitar danos a integridade pessoal das partes e do seu patrimônio. 3 - Função de controle – A função de controle da boa-fé tem como finalidade esclarecer como as partes podem exercer os direitos que a cada uma competem no âmbito da relação jurídica obrigacional. Enfatiza deveres de agir com moderação no exercício dos direitos que cada parte tem contra a outra, evitando que a conduta de um dos co-contratantes possa dificultar ou impedir o alcance do resultado pretendido pelo outro e da própria finalidade da relação contratual. A função de controle da boa-fé – abuso de direito.
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