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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS - CCJ Curso de Direito INOVAÇÕES NO SISTEMA DE JUSTIÇA PARA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS FAMILIARES: MEDIAÇÃO E CONSTELAÇÃO FAMILIAR WALLYDA GUERREIRO SALES Matr. 1222597 Fortaleza – CE Novembro, 2017 WALLYDA GUERREIRO SALES INOVAÇÕES NO SISTEMA DE JUSTIÇA PARA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS FAMILIARES: MEDIAÇÃO E CONSTELAÇÃO FAMILIAR Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação de conteúdo da Professora Mônica Carvalho Vasconcelos e orientação metodológica do Professor José Cauby de Medeiros Freire. Fortaleza – Ceará 2017 WALLYDA GUERREIRO SALES INOVAÇÕES NO SISTEMA DE JUSTIÇA PARA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS FAMILIARES: MEDIAÇÃO E CONSTELAÇÃO FAMILIAR Monografia apresentada à banca examinadora e à Coordenação do Curso de Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade de Fortaleza, adequada e aprovada para suprir exigência parcial inerente à obtenção do grau de bacharel em Direito, em conformidade com os normativos do MEC, regulamentada pela Res. N.º R 028/99 da Universidade de Fortaleza. Fortaleza (CE), 11 de dezembro de 2017. Mônica Carvalho Vasconcelos, Drª. Professora orientadora da Universidade de Fortaleza Juliana Vasconcelos de Alcântara, Ms. Professora examinadora da Universidade de Fortaleza Grijalba Miranda Linhares, Ms. Professor examinador da Universidade de Fortaleza José Cauby de Medeiros Freire, Ms. Professor Orientador de Metodologia Núbia Maria Garcia Bastos, Ms. Supervisora de Monografia do CCJ Coordenação do Curso de Direito AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por renovar minha fé e forças a cada amanhecer. À professora Mônica Carvalho Vasconcelos, pela orientação de excelência indispensável à realização deste estudo. Ao professor Cauby de Medeiros Freire, pela orientação competente para a correta apresentação metodológica deste trabalho. Aos demais mestres da casa e aos amigos conquistados ao longo do curso, pelo companheirismo e conhecimentos transmitidos em sala de aula. À minha família pelo amor, apoio e ânimo nos momentos difíceis e pelo incentivo para a conclusão deste estudo. Cada nova ideia que nos penetra irá desorganizar nosso sistema de pensar e derrubá-lo como a um castelo de cartas. Reconstituí-lo é avançar! Flávio Gikovate RESUMO A complexidade das relações familiares gera inúmeros atritos que, por vezes, exigem intervenção judicial para ser solucionados. Nesse sentido, surgiu a eclosão do fenômeno da judicialização das relações familiares. De modo a reduzir as tensões familiares, o ordenamento jurídico pátrio, sob a ótica do Código de Processo Civil vigente, impõe a mediação judicial como mecanismo de solução pacífica dos conflitos. Assim, o Poder Judiciário pretende empoderar as partes, ensinando que a cultura do diálogo é o melhor caminho, tanto para solucionar quanto para prevenir lides comuns às rotinas familiares. O objetivo deste estudo é demonstrar como o Poder Judiciário e a legislação vigente vêm incentivando a solução pacífica dos conflitos decorrentes das relações familiares. A metodologia utilizada foi investigativa e bibliográfica, com fulcro na doutrina e na jurisprudência sobre o tema. Nesse passo, serão explorados aspectos pontuais, observando o critério temporal. Isso significa que, inicialmente, será abordada a mediação familiar. Em seguida, ter-se-á o estudo da resolução de conflitos dessa natureza de forma litigiosa. E, encerrando o estudo, tem-se a análise da técnica da constelação familiar sistêmica como mecanismo de incentivo à reflexão das relações familiares e a oportunidade das partes se tornarem protagonistas da solução de seus conflitos. Por fim, conclui-se que a forma que o processo civil moderno trata as ações relacionadas à seara familiar é correta, justa e apresenta maior chance de êxito quanto ao encerramento prematuro de conflitos. Palavras-chave: Conflito. Família. Justiça. SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................................................... 10 1 DA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS LITIGIOSOS PELO PROCEDIMENTO COMUM NO PROCESSO CIVIL...................................................................................... 12 1.1 Dos princípios mais relevantes para o procedimento comum................................... 13 1.2 Distinções entre processo e procedimento................................................................ 14 1.3 Da contestação.......................................................................................................... 17 1.4 Da audiência una de instrução e julgamento, sentença e coisa julgada.................... 18 2 MEDIAÇÃO FAMILIAR................................................................................................. 22 2.1 Conceito de mediação e sua valoração no CPC vigente........................................... 22 2.2 Aspectos Jurídicos e Sociais da Mediação................................................................ 25 2.3 Avanços sobre a Mediação no ordenamento jurídico brasileiro............................... 26 2.4 A mediação como mecanismo eficaz para a reestruturação das relações familiares e celeridade processual.................................................................................................... 28 3 DISSOLUÇÃO DE LITÍGIOS A LUZ DA TÉCNICA DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR SISTÊMICA.................................................................................................... 31 3.1 A inserção da técnica de constelação familiar no Poder Judiciário.......................... 31 3.2 Comentários a técnica da constelação familiar......................................................... 32 3.3 A incidência da constelação sistêmica em processos das demais áreas jurídicas..... 35 3.4 Dos benefícios da técnica de constelação familiar e a prevenção da procrastinação processual........................................................................................................................ 35 3.5 Da utilização da técnica de constelação familiar para incentivar a celeridade processual e solucionar os conflitos reais e aparentes..................................................... 37 3.6 Comentários a oficina da parentalidade no Poder Judiciário do Ceará..................... 38 3.6.1 A importância da mediação familiar para disseminar cultura do diálogo.........................................................................................................................39 3.6.2 Da oficina da parentalidade................................................................................ 39 CONCLUSÃO..................................................................................................................... 41 REFERÊNCIAS................................................................................................................... 43 10 INTRODUÇÃO O presente estudo tem por objetivo analisar as técnicas modernas de resolução de conflitos familiares em âmbito judicial. Como é de domínio público, a ausência de celeridade processual provoca a continuidade dos conflitos judiciais no tempo e esse tipo de situação é passível de desestruturar relações familiares que, segundo a Constituição Federal de 1988, merecem especial proteção do Estado. Na realidade, a convivência familiar apresenta um contexto extremamente complexo em que se destacam componentes sentimentais importantes, como o amor, a confiança, a cumplicidade e o respeito. Nesse mesmo nicho, também é possível o cultivo de sentimentos ambivalentes, como o ciúme, a raiva, a inveja, a avareza e os interesses patrimoniais, fazendo eclodir conflitos. Para a maioria das pessoas, o núcleo familiar representa um ambiente de aconchego desde o momento de seu nascimento, por isso é tão importante preservar essa instituição. Nesse sentido, a família se firmou como instituição basilar do Estado, logo sua preservação deve ser tratada com prioridade. Lamentavelmente, os conflitos desabrocham rotineiramente entre parentes e, por vezes, terminam levados para a apreciação do Poder Judiciário, potencializando o fenômeno social da judicialização de relações familiares. É oportuno afirmar que inserir em âmbito judicial práticas alternativas de soluções de conflito não retira dos magistrados o dever de conhecer e julgar a matéria levada ao seu conhecimento, mas se perfaz como um convite às partes para alterar suas posturas bélicas, fazendo prevalecer uma cultura de conversa pacífica. O diálogo faz com as partes se compreendam e passem a construir juntas, porém com a intervenção de um terceiro, soluções mais eficazes para o problema em análise. O objetivo geral do estudo é analisar as formas alternativas de solução de conflitos familiares perante o Poder Judiciário. Os objetivos específicos são: explicar o procedimento comum, a mediação familiar e a técnica de constelação familiar. 11 A metodologia utilizada foi bibliográfica e investigativa, com pesquisas em doutrinas, jurisprudências e palestras públicas sobre a matéria. De modo a esclarecer as nuances jurídicas relacionadas à resolução de conflitos familiares em âmbito judicial, o presente estudo foi dividido em três capítulos. O primeiro capítulo apresenta a resolução de conflitos litigiosos por meio da adoção do procedimento comum. O segundo capítulo inicia o estudo tratando da mediação familiar, posto que, em momento anterior à instrução do feito, é concedido às partes a oportunidade para acordarem o fim do conflito sem que haja decisão judicial imparcial que reconheça direitos e imponha deveres. Nesse sentido, serão alvos de comentários os aspectos jurídicos e sociais da mediação e seus avanços no ordenamento jurídico pátrio, explicando como este instituto jurídico tem sido útil para reestruturar as relações familiares e conceder celeridade processual. Caso as partes não conseguiram chegar a um consenso para a resolução do conflito, ter-se-á a intervenção do magistrado. Será explicado o procedimento comum, como é dada a oportunidade do exercício do contraditório, o saneamento do processo e a audiência una de instrução e julgamento e seus efeitos. Encerrando a pesquisa, tem-se uma explicação sobre a dissolução dos litígios a partir do uso da técnica da constelação familiar. Esse método se perfaz como um convite às partes, para que reflitam acerca do litígio por todos os prismas possíveis. Assim, compreendendo as motivações e as razões de cada um para o estabelecimento do conflito, as partes passam a criar soluções. Em razão dessa técnica ainda não ter sido adotada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, a matéria foi tratada a partir da oficina da parentalidade, que logra muito êxito em relação à solução de conflitos familiares de forma amistosa. A mediação familiar é um tema em evidência na seara jurídica moderna. Em razão disso, tratar sobre esse assunto se torna um desafio para os estudiosos da ciência jurídica. O presente estudo não tem a pretensão de esgotar a matéria, pretendendo apenas disponibilizar ideias e contribuir com futuras pesquisas sobre o tema. 12 1 DA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS FAMILIARES LITIGIOSOS PELO PROCEDIMENTO COMUM NO PROCESSO CIVIL O presente capítulo aborda o procedimento comum no processo civil moderno relacionado aos processos de família, isto é, a continuidade do feito na hipótese em que restar inviabilizada a possibilidade de acordo entre as partes durante a audiência de mediação familiar. Os primeiros 12 (doze) artigos do Código de Processo Civil (CPC) regulamentam as normas fundamentais do processo civil. Isso significa que o legislador ordinário demonstrou preocupação em fazer com que a interpretação dessas normas fosse realizada em conformidade com os valores expressados no bojo da Constituição Federal de 1988. Observe- se: “Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código”. Em termos constitucionais, a tutela da família tem previsão expressa no caput do artigo 226: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Assim, resta entendido que as normas do ordenamento civil têm por finalidade promover o bem-estar das famílias; entretanto, por vezes, esse objetivo se torna um desafio muito complexo. A nova tônica do processo civil, de modo a proteger a família, passou a incentivar os meios adequados para a solução dos conflitos, como se perfaz a mediação. Veja-se o que preleciona o artigo 3º do CPC: Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. Depois de superada a fase de mediação familiar, nos casos em que a conciliação for inviabilizada, faz-se necessário dar continuidade ao processamento litigioso da lide, atendendo a todos os atos decorrentes do devido processo legal. A citação das partes é uma 13 fase considerada suprida, uma vez que a presença na audiência de mediação serve para demonstrar que todos os partícipes tenham ciência da existência do processo. 1.1 Dos princípios mais relevantes para o procedimento comum O presente tópico tem por objetivo abordar as providências preliminares e o exercício do contraditório nos processos de família, nos moldes do CPC vigente. Nesse sentido, aos processos envolvendo matérias de direito de família serão oportunizados o direito de defesa, por meio do exercício do contraditório, e a participação em audiência de instrução e julgamento, onde será possível produzir provas testemunhais. No termo de mediação, além de constar a ausência de êxito na tentativa de acordo entre as partes, restará consignada a abertura de prazo para que a parte promovida apresente contestação. Superada a fase demediação, o processo de família será encaminhado à vara competente e terá continuidade por meio de apresentação de contestação aos fatos alegados na exordial, com posterior marcação de audiência. O contraditório representa a soma de informações com a reação; em assim sendo, a parte será informada que existe uma demanda processual contra si e que poderá tomar as providências cabíveis para promover a defesa de seus interesses. É comum que as partes não consigam lograr êxito em acordos relacionados a valores cobrados em pensão alimentícia ou exercício do direito de convivência com a prole. Nesse tipo de demanda, o magistrado observará os gastos mensais necessários à subsistência da prole, a possibilidade financeira do alimentante e a idade dos filhos para estabelecer os momentos de convivência por meio de visitação, entre outras providências que se façam necessárias. O magistrado poderá decidir esses temas de forma imediata sem observar o contraditório, principalmente em relação aos alimentos, devido à imediatidade dessa verba. Contudo, o CPC vigente garante que o contraditório detém poder real de influência sobre as decisões do juiz, por isso não deve se limitar a significar ser mera garantia de que a parte será ouvida e terá chance de se manifestar. O contraditório se perfaz como uma garantia de que os argumentos da peça inicial e da defesa serão apreciados e valorados pelo magistrado no momento do julgamento. Essa providencia garante que os argumentos apresentados pelas partes serão importantes para a feitura do ato decisório. Note-se o que dita os incisos do §1º do artigo 489 do CPC: 14 Art. 489. São elementos essenciais da sentença: [...] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. [...] Destarte, a decisão judicial somente será considerada fundamentada se o magistrado enfrentar todas as alegações e teses de defesa apresentadas pelas partes no curso do processo. O magistrado poderá refutar as alegações das partes, desde que fundamente seu posicionamento no corpo da sentença. Em relação ao estabelecimento de guarda, a preferência é do genitor que dispuser de mais tempo para conviver com os filhos. Entretanto, as crianças maiores de 7 (sete) anos e os adolescentes podem ser ouvidos em juízo para auxiliar o livre convencimento do magistrado no momento de estabelecer quem permanecerá com a guarda. 1.2 Distinções entre processo e procedimento Os termos processo e procedimento têm conceitos e finalidades distintas. O processo é o instrumento pelo qual o Estado endireita a lide, ou seja, compõe o conflito de interesse e determina sua solução. Assim, as partes provocam o Poder Judiciário e o Estado deve dispor de meios para solucionar o conflito instaurando um processo. Para o doutrinador Ovídio Baptista (2009, p. 62): “o termo processo significa caminhar”. Seguindo o raciocínio desse autor, pode ser afirmado que o processo é o caminho e os procedimentos são as rotas a serem traçadas durante o percurso. Para Câmara (2017, p. 33): O processo é o instrumento pelo qual a Democracia é exercida e, em um Estado Democrático de Direito, todo e qualquer ato estatal de poder (e não só os estatais, mas aqui apenas estes são objeto de consideração) deve ser construído através de processos, sob pena de não ter legitimidade democrática e, por conseguinte, ser incompatível com o Estado Constitucional. O processo é mecanismo de exercício do poder democrático estatal, e é através dele que são construídos os atos jurisdicionais. Assim, após o exame do processo, impende examinar a jurisdição, uma das funções 15 estatais. Por fim, dada a inércia característica da jurisdição, é preciso examinar a ação, fenômeno que permite provocar sua atuação. Demandar significa buscar proteção jurisdicional. E o ato por meio do qual se instrumentaliza a demanda é a petição inicial. As ações que tratam sobre lides familiares, assim como as demais demandas civis, devem seguir os procedimentos estabelecidos no CPC. Dessa forma, os conflitos passíveis de se refletirem de forma negativa na vida de seus membros serão solucionados de forma justa. O artigo 694 do CPC determina que, nas ações de família, devem ser empreendidos todos os esforços possíveis para haver composição entre as partes. Leia-se: Art. 694. Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação. Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar. Nesses casos, a decisão de mérito é imparcial, porém, a qualquer tempo, as partes podem compor uma solução. Para os processos de família, a melhor solução é a construída com a participação das partes. Dessa forma, em muitos casos, os mediadores conseguem restaurar o respeito e proporcionar uma relação amistosa entre os conflitantes. De tal modo, o Poder Judiciário deve prezar pela resolução consensual do conflito, surgindo para o juiz o dever de auxiliar as partes antes de proferir decisão de mérito. Na obra de Cunha (2016, p. 745): Assim, todos os esforços do Poder Judiciário deverão se dirigir para a resolução consensual do conflito, surgindo o dever do juiz dispor de auxílio de profissionais habilitados das mais diversas áreas (como a assistência social e a psicologia) para a realização da mediação e conciliação. O processo civil familiar deve guiar-se por esse princípio, tanto que é facultado às partes requererem ao juiz que determine a suspensão do processo enquanto se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar, já que há no horizonte aceno ou possibilidade de consenso entre os envolvidos. E mais: para além da obrigatoriedade da presença dos advogados das partes nas audiências de conciliação ou mediação (art. 693, § 4°), poderá haver mais de uma sessão de conciliação ou mediação, não se aplicando o disposto no art. 334, § 2°. Na hipótese das partes aceitarem sugestões de tentativas de conciliação com o auxílio de profissionais das áreas da psicologia e assistência sociais, é possível que haja a suspensão do feito. O artigo 695 traz o procedimento a ser adotado após o juiz receber a peça inicial da demanda: Art. 695. Recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação,observado o disposto no art. 694. 16 § 1º O mandado de citação conterá apenas os dados necessários à audiência e deverá estar desacompanhado de cópia da petição inicial, assegurado ao réu o direito de examinar seu conteúdo a qualquertempo. § 2º A citação ocorrerá com antecedência mínima de 15 (quinze) dias da data designada para a audiência. § 3º A citação será feita na pessoa do réu. § 4º Na audiência, as partes deverão estar acompanhadas de seus advogados ou de defensores públicos. A audiência de mediação é o primeiro momento prático da demanda. Para evitar que a parte demandada falte ao ato, o mandado de citação deve conter apenas informações necessárias ao comparecimento do evento. Portanto, o mandado de citação será entregue desacompanhado da petição inicial. Sobre o incentivo a autocomposição, Donizetti, (2017, p. 519) explica que: A idéia de fomentar a autocomposição é louvável, especialmente quando se dá a oportunidade para que um terceiro (psicólogo, assistente, pedagogo etc.), nomeado pelo juiz, intervenha no feito com o objetivo de buscar compreender os aspectos emocionais de cada indivíduo e da dinâmica familiar, com vistas a encontrar a solução que melhor atenda as peculiaridades do caso concreto. A citação apontada deve ser realizada com, no mínimo, 15 (quinze) dias de antecedência da data designada para a audiência de mediação. A citação deve ser feita sempre na pessoa do réu, como forma de garantir seu conhecimento sobre a existência do feito. A audiência de mediação não precisa ser uma, pois, nos termos do artigo 696, será possível sua divisão: “Art. 696. A audiência de mediação e conciliação poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito”. A divisão da audiência tem por finalidade levar às partes a reflexão sobre os benefícios de um acordo e possíveis prejuízos advindos de uma decisão de mérito. Nesse sentido, o ambiente de discussão entre as partes não sofrerá limitação e entre ambas será inserida a cultura do diálogo. Todavia, o tempo destinado às tentativas de conciliação das partes deverá observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, porque todos têm o direito ao transcurso processual célere. O artigo 697 do CPC ordena que, passadas as tentativas infrutíferas de conciliação, as ações de família devam seguir o procedimento comum: “Art. 697. Não realizado o acordo, passarão a incidir, a partir de então, as normas do procedimento comum, observado o artigo 335”. Nesse sentido, os tópicos a seguir serão dedicados a explicar o devido processo legal das ações de família, nos moldes do procedimento comum. 17 1.3 Da contestação Sendo a petição inicial considerada apta, será iniciado o processamento do feito e praticado os atos primários de citação para a sessão de mediação familiar. É importante afirmar que a citação não obriga a contestação no prazo de 15 (quinze) dias. O prazo de defesa será marcado após a sessão de mediação, caso as partes não acordem sobre o conflito. A contestação é a oportunidade concedida ao réu para a apresentação de toda a matéria de defesa. Este ato deverá ser fundado no princípio da eventualidade ou concentração, nos termos do artigo 336 do CPC: “Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir”. O direito de contestar se faz presente em todas as demandas, inclusive nas de natureza jurídica familiar. O réu poderá exercer duas modalidades de defesa: a defesa de mérito ou a defesa de caráter processual. A defesa de mérito se refere ao pedido do autor e pode ser direta e indireta. Na defesa de mérito direta, o réu poderá negar o fato que constitui o direito do autor. A título de ilustração, pode ser apontada a tese de negativa de paternidade para contestar um pedido de alimentos gravídicos. A defesa de mérito indireta ocorrerá quando o réu não refutar a pretensão autoral, mas apresentar fato novo modificativo, impeditivo ou extintivo do direito do autor da ação. Essa matéria tem ligação direta com o ônus da prova, matéria alvo de regulamentação pelo artigo 373 do CPC. Considerando a dispensa de contestação na audiência de mediação, tem-se um efeito importante, a saber, a ausência do réu não implicará na aplicação dos efeitos da revelia. Entretanto, se a falta for da parte autora, será aplicada uma sanção pecuniária de até 2% (dois por cento) do valor atribuído à causa ou de seu proveito econômico, em razão do ato ser considerado atentatório à dignidade da justiça, salvo para os beneficiários da gratuidade judiciária ou assistidos pela defensoria pública. A revelia é a rebeldia do réu que não apresenta sua contestação em prazo hábil. Por isso, o réu sofre dois efeitos, a saber, o material e a presunção de veracidade dos fatos. Entretanto, a revelia não garante vitória ao autor da ação, uma vez que os fatos presumidos verdadeiros não garantem o reconhecimento imediato do direito pretendido. Deste modo, mesmo que o réu seja revel, o autor poderá sair derrotado da ação. 18 O fato de ser revel não retira do réu a possibilidade de demandar em face do autor numa ação de reconvenção. A título de ilustração, é possível mencionar o réu que não compareceu ao laboratório para a feitura de exame de DNA com o objetivo de comprovar a paternidade. Nesse caso, o grau de parentesco se torna presumido e recaem sobre o réu todas as obrigações civis decorrentes do exercício do poder familiar. Contudo, caso as partes realizem o exame de DNA em outra oportunidade e o resultado seja negativo, o réu poderá adentrar com nova demanda judicial para regularizar sua situação de não ter para si obrigações civis com pessoa com a qual não guarda grau de parentesco biológico. 1.4 Da audiência una de instrução e julgamento, sentença e coisa julgada Tendo em vista a aplicação do procedimento comum nos processos de família determinada pelo 697 do CPC, é importante tratar da audiência uma de instrução e julgamento que ocorre nas hipóteses em que a mediação não lograr êxito. Na decisão saneadora, se entender necessário, o juiz deverá fixar o prazo comum de 10 (dez) dias para que cada uma das partes apresente o número de até 10 (dez) testemunhas. Caso haja a audiência de saneamento por cooperação, as partes devem apresentar o rol de testemunhas na oportunidade dessa audiência. A audiência de instrução e julgamento é um ato processual complexo que detém várias finalidades, pois se tem a instrução processual com especial atenção para a colheita de provas orais e o próprio julgamento. Nesse momento, o juiz desempenha suas atividades instrutórias e de decisão. As testemunhas podem atestar a existência de relacionamento amoroso entre os genitores de uma criança que pleiteia o reconhecimento de paternidade, por exemplo. A audiência de instrução e julgamento é pública, ressalvadas as restrições legais, e sua instrumentalidade está prevista nos artigos 358 a artigo 368 do CPC. Como o presente estudo é direcionado a matérias envolvendo direito de família, tal regra não prevalece, salvo se contar com a anuência das partes e de seus representantes jurídicos. Nesse caso, poderá prevalecer o segredo de justiça ou a preservação da intimidade das partes. Durante o curso dessa audiência, o juiz exercerá o poder de polícia administrativo, uma vez que poderá limitar a liberdade das partes em nome do interesse público. É possível que o juiz mande se retirar da sala aqueles que venham a ferir o decoro da audiência, que estimulem a participação mais ativa do representante do Ministério Público ou das partes etc. 19 Em que pese tenha consciência de que a primeira tentativa de mediação foi frustrada, ao inaugurar a audiência de instrução e julgamento,como pressuposto de validade do processo, o juiz deve renovar a tentativa de composição amigável. Após a frustração da renovação da tentativa conciliatória, caso haja necessidade de produção de prova pericial, a primeira oitiva a ser realizada será a dos assistentes técnicos ou peritos que devam prestar esclarecimentos sobre o laudo pericial. Em seguida, se for requerido pelas partes, será iniciada a oitiva do autor e do réu, que são os depoimentos pessoais das partes. Essas oitivas não são testemunhais, porque não existe o compromisso de dizer a verdade sobre pena de prisão. A oitiva do autor e do réu é realizada em busca de confissões, visto que esses atores podem trazer ao processo informações importantes ou contradições. Ao final da instrução, serão ouvidas as testemunhas, que devem adotar um comportamento imparcial e não torcer por nenhuma das partes. É válido rememorar que o falso testemunho poderá acarretar a sanção de prisão. Os advogados podem fazer as perguntas diretamente às testemunhas. O juiz poderá conceder às partes a oportunidade de debates orais, pelo prazo de 20 (vinte) minutos prorrogáveis por mais 10 (dez), antes de sentenciar o processo. Encerrada a colheita da prova oral, passa-se à fase de julgamento. O juiz poderá julgar imediatamente o feito ou fazê-lo no prazo de 30 (trinta) dias, nos termos do artigo 366 do CPC: “Encerrado o debate ou oferecidas as razões finais, o juiz proferirá sentença em audiência ou no prazo de 30 (trinta) dias”. Em geral, o prazo de 30 (trinta) dias para a realização do julgamento decorre do nível de complexidade da causa. O juiz também poderá converter os debates orais em memoriais escritos no prazo de 15 (quinze) dias. A intimação das testemunhas para a audiência compete ao advogado por aviso de recebimento tempestivo a ser juntado nos autos do processo, mas, se a testemunha não comparecer, poderá ser intimada pelo Poder Judiciário, inclusive com comparecimento coercitivo. Levar as testemunhas para a audiência independente de intimação não desobriga o advogado a promover o arrolamento de seus nomes no processo. Essa medida concede condição para que outra parte verifique a possível impugnação às testemunhas apresentadas por motivações de incapacidade, impedimento, suspeição etc. As testemunhas impugnadas podem ser oitivadas na condição de informante, pois não serão juramentadas e não constituirão prova muito valorada, em razão de não terem o 20 compromisso de falar a verdade e nem correm risco de prisão. A audiência de instrução e julgamento é uma, mas o juiz poderá suspender se houver necessidade em certas situações, como a falta do perito ou de alguma testemunha importante. Observe-se: Art. 365. A audiência é una e contínua, podendo ser excepcional e justificadamente cindida na ausência de perito ou de testemunha, desde que haja concordância das partes. Parágrafo único. Diante da impossibilidade de realização da instrução, do debate e do julgamento no mesmo dia, o juiz marcará seu prosseguimento para a data mais próxima possível, em pauta preferencial. O encerramento da audiência culmina com o dever de julgar o feito, ou seja, na feitura da sentença fundamentada entre os artigos 485 a 495 do CPC. Sentença é o ato que encerra a parte cognitiva do processo, o qual culminará na sua resolução sem julgamento de mérito ou iniciar seu cumprimento, como demonstra o §1º do artigo 203 do CPC: Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. § 1º Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. O artigo 485 trabalha a sentença sem a resolução do mérito, para tanto elenca 10 (dez) hipóteses: Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: I - indeferir a petição inicial; II - o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes; III - por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias; IV - verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V - reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada; VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual; VII - acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência; VIII - homologar a desistência da ação; IX - em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e X - nos demais casos prescritos neste Código. [...] A desistência da ação prevista no inciso VIII, durante o processo de conhecimento e após a contestação do réu, somente será possível com a anuência deste. O autor poderá tentar extinguir o feito por falta da prática de diligências por mais de 30 (trinta) dias, ou seja, pelo abandono. 21 Para evitar essa manobra processual, a súmula nº 240 do Superior Tribunal de Justiça ordena que: “A extinção do processo, com tal fundamento, não pode fazer-se de ofício. Necessidade de requerimento da parte contrária”. Nesse sentido, tem-se o §5º do artigo 485: “A desistência da ação pode ser apresentada até a sentença”. A sentença condenatória, se não houver o seu cumprimento voluntário essa decisão não extingue o processo, mas apenas inicia a fase de execução. A resolução de mérito é determinada no artigo 487 do CPC, que segue mencionado: Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção; II - decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição; III - homologar: a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção; b) a transação; c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção. Parágrafo único. Ressalvada a hipótese do §1º do art. 332, a prescrição e a decadência não serão reconhecidas sem que antes seja dada às partes oportunidade de manifestar-se. Na lição de Cunha (2017, p. 557): “Há uma classificação mais clássica que divide os pressupostos processuais em pressupostos processuais subjetivos e pressupostos processuais objetivos”. Os elementos da sentença continuam a ser o relatório, a motivação e o dispositivo. A questão prejudicial decidida no curso do processo também faz coisa julgada, gerando efeito de imutabilidade da sentença, nos termos do artigo 503 do CPC, que ampliou seus limites objetivos. Em relação à ação de alimentos, é preciso que seja consignado que a ausência do cumprimento da obrigação pelo alimentante poderá ensejar a execução a qualquer tempo, com todas as limitações civis exaradas em lei, com destaque para penhora online, negativação do nome do devedor e prisão civil. 22 2 MEDIAÇÃO FAMILIAR O presente capítulo tem por objetivo apresentar os aspectos jurídicos e sociais mais relevantes da adoção da mediação para solucionar os conflitos de natureza familiar. Hodiernamente, deve ser reconhecido que o Código de Processo Civil vigente e a Lei deMediação – Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, atendem ao que propõe a norma de proteção da família, adotando a técnica de construção pacífica dos conflitos entre pessoas que guardam parentesco entre si (biológico ou afinidade), de forma célere. Lavor (2015, p. 05) esclarece que a mediação familiar traz a harmonia necessária às relações familiares. Veja-se: A morosidade processual se tornou um problema crônico no Poder Judiciário. Dessa forma, faz-se imperioso inovar o sistema de administração da justiça, conclamando a sociedade para o exercício do dever cívico da democracia participativa. Nesse ínterim, ganham maior relevância as alternativas de pacificação de conflitos em detrimento da processualística anacrônica de litigância. As alterações legislativas atuais, referenciadas no novo Código de Processo Civil e na recente Lei n. 13.140/2015 (Lei da Mediação), demonstram que é preciso inovar a cultura da civilização ocidental que, apesar de muito falante, revela uma comunicação precária que pode ser equiparada a uma música composta por muito barulho e pouca melodia. Destarte, a conciliação e a mediação promovem a harmonia necessária ao deslinde dos conflitos, significando, portanto, que um bom diálogo é a expressão da arte, da comunicação, da reflexão e da orquestração da mais lídima e célere justiça. Nesse contexto, os tópicos abordados são: aspectos jurídicos e sociais da mediação; avanços sobre a mediação no ordenamento jurídico brasileiro; a mediação como mecanismo eficaz para a reestruturação das relações familiares e celeridade processual; o conceito de mediação e sua valoração no CPC vigente. 2.1 Conceito de mediação O conceito de mediação está determinado no artigo 1º da Lei nº 13.140/2015, que esclarece como deve ser procedida a autocomposição em relação à solução célere dos litígios. Note-se: Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. 23 Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. Os princípios que norteiam a sessão de mediação estão prelecionados no artigo 2º do mesmo diploma legal, quais sejam: “I - imparcialidade do mediador; II - isonomia entre as partes; III - oralidade; IV - informalidade; V - autonomia da vontade das partes; VI - busca do consenso; VII - confidencialidade; VIII - boa-fé”. Destarte, a mediação é um mecanismo adequado de solução de conflitos, mas seu conceito não é tão sucinto. Na obra de Assumpção (2017, p. 63), tem-se um amplo conceito de mediação, demonstrando que nessa modalidade de solução de lides devam ser preservados os interesses e as condições de cumprimento de eventual acordo entre as partes envolvidas. Leia-se: A mediação é forma alternativa de solução de conflitos fundada no exercício da vontade das partes, o que é o suficiente para ser considerada espécie de forma consensual do conflito, mas não deve ser confundida com a autocomposição. Há ao menos três razões que indicam aconselhável distinguir essas duas espécies de solução consensual dos conflitos. A solução advinda da mediação, nos termos do parágrafo 3º do artigo 165 do CPC, deve trazer benefício às partes que compõem a lide. Para tanto, deve esclarecer direitos, deveres e consequências do descumprimento das obrigações. Observe-se: Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição. [...] § 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos. Em suma, o mediador deverá conceder às partes um tratamento respeitável e condizente com as diretrizes do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Sobre isso, Mendes (2017, p. 243) revela que: Respeita-se a dignidade da pessoa quando o indivíduo é tratado como sujeito com valor intrínseco, posto acima de todas as coisas criadas e em patamar de igualdade de direitos com os seus semelhantes. Há o desrespeito ao princípio, quando a pessoa é reduzida à singela condição de objeto, apenas como meio para a satisfação de algum interesse imediato. 24 A mediação deve transcorrer sem imposições, mas com o incentivo à composição amigável, principalmente na área familiar. O mediador deve atuar preferencialmente onde exista vínculo anterior entre as partes, ou seja, em relações continuadas, como se perfaz a filiação constituída entre pessoas que estão encerrando laços conjugais em razão de ações de divórcio ou dissolução de união estável. Em sua obra sobre mediação familiar, Sales (2005, p. 57) esclarece o que pode ser entendido por relações continuadas: “São relações que, por envolverem sentimentos de amor, ódio, raiva ou afeto, por envolverem filhos e todas as responsabilidades morais advindas da existência de filhos, continuam no tempo – relações continuadas”. As demandas familiares mereceram especial atenção dos mediadores, que podem fazer uso de trabalhos de profissionais de outras áreas, como explicado por Donizetti (2017, p. 1069): A presença de profissionais de outras áreas do conhecimento, como psicólogos e assistentes sociais, é de suma importância para a orientação das partes na busca pela solução mais adequada ao caso concreto, considerando não apenas os aspectos jurídicos do fato, mas também os reflexos sociais e psicológicos que poderão ser gerados, por exemplo, pela ruptura na estrutura familiar. A ideia de fomentar a autocomposição é louvável, especialmente quando se dá a oportunidade para que um terceiro (psicólogo, assistente, pedagogo etc.), nomeado pelo juiz, intervenha no feito com o objetivo de buscar compreender os aspectos emocionais de cada indivíduo e da dinâmica familiar, com vistas a encontrar a solução que melhor atenda as peculiaridades do caso concreto. A mediação na seara familiar se impõe como uma etapa obrigatória e traz reflexos no âmbito processual, uma vez que, caso as partes não consigam chegar a uma composição, a ação seguirá os trâmites normais e as intimações para contestação e futura audiência poderão ser realizadas de imediato e pessoalmente junto às partes. Essa é uma forma de tornar o processamento do feito mais rápido. Em relação à apresentação da contestação, a parte promovida disporá do prazo de 15 (quinze) dias, na forma prevista no inciso I do artigo 335 do CPC. A audiência de mediação poderá ser fracionada em tantas sessões quantas forem necessárias para a resolução do conflito. O que mais importa nesse tipo de causa é a recomposição das relações familiares, se possível for e se esse for o interesse das partes. Depois de apresentadas generalidades relativas à mediação na seara familiar, se faz necessário iniciar o estudo processual da matéria. 25 Destarte, o capítulo a seguir tem por escopo demonstrar a mediação familiar na prática. Para tanto, serão alvos de estudos temas como: a citação pessoal das partes que não lograram êxito na feitura de acordo; a intervenção do Ministério Público; foro competente para o processamento da ação; teoria dos conflitos - problemáticasde natureza aparente e real com o aprofundamento do estudo sobre direito de convivência entre genitor e filhos, verba alimentar e alienação parental; entre outros pertinentes à matéria. 2.2 Aspectos Jurídicos e Sociais da Mediação Inicialmente, a mediação foi considerada um ‘meio alternativo de solução de conflitos’. No entanto, no presente, tal nomenclatura sofreu mutação e passou a ser chamada de ‘método adequado de solução de conflitos’. Na realidade, a população brasileira passou a fazer uso da justiça para resolver os problemas corriqueiros que poderiam ser solucionados por meio de uma breve conversa. A judicialização das relações convivenciais é uma postura adotada desde a década de 80 (oitenta), momento em que a censura e a castração de direitos do regime ditatorial foram vencidas e cederam espaços para liberdade, igualdade, solidariedade e dignidade, que se fincaram como base da Constituição Federal de 1988 e como ideários maiores do Estado Democrático de Direito moderno. O resultado da judicialização exacerbada foi a instauração da problemática morosidade processual, tema alvo de regulamentação no bojo da Emenda Constitucional nº 45/2004, popularmente conhecida como ‘reforma do Poder Judiciário’. A referida norma constitucional inseriu no rol dos direitos fundamentais os ditames do inciso LXXVIII, in verbis: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. A inserção da mediação familiar é explicada nas lições de Montenegro Filho, (2016, p. 633): Perder a oportunidade de estender o tratamento legislativo às demais ações seria o mesmo que ignorar as intenções do legislador infraconstitucional, que, de modo geral, priorizou a conciliação e a mediação, a razoável duração do processo, o contraditório e a ampla defesa e vários outros princípios e balizas fundamentais do novo sistema, com a intenção maior de que o conflito de interesses seja resolvido em espaço de tempo coerente com as expectativas dos sujeitos da lide, e, além disso, de forma qualificada Dessa forma, a desjudicialização das relações sociais se impõe como uma diretriz adequada à solução dos processos levados ao conhecimento do Poder Judiciário. A mediação insere na sociedade a cultura do diálogo. As partes são ouvidas, tratadas com respeito, o 26 mediador convida os envolvidos no litígio à reflexão e os apóia na construção coletiva de uma solução para o problema, de modo que as partes demonstrem satisfação e, principalmente, condições de cumprir com os termos acordados. 2.3 Avanços sobre a Mediação no ordenamento jurídico brasileiro Nos últimos anos, no Brasil, pode ser constatado um esforço conjugado do Poder Judiciário e do Poder Legislativo no intuito de promover a solução adequada dos conflitos e disseminar a sensação de justiça entre a população. Inicialmente, pode ser mencionada a Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010, emitida pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ; em sequência, tem-se a Lei nº 13.140/2015 (mediação) e o CPC atual; todas as normas incentivando e regulamentado a mediação. No que pertine à eficácia da lei, Nader (2014, p. 267): Na vida do Direito a sucessão das leis é ato de rotina. Cada estatuto legal tem seu papel na história. Surge como fórmula adequada a atender às exigências de uma época. Para isto combina os princípios modernos da Ciência do Direito com os valores que a sociedade consagra. O conjunto normativo é preparado de acordo com o modelo fático; em consonância com a problemática social que se desenrola. Em relação à resolução administrativa e a legislação em comento, Theodoro Junior (2017, p. 19) assevera que: Lei superveniente ao novo Código regulamentou em caráter geral a mediação, tanto quando praticada em juízo como por meio extrajudicial, de modo a incentivar esse importante instrumento de resolução consensual de conflitos (Lei nº 13.140, de 26.06.2015). A valorização do papel da mediação e da conciliação dentro da atividade jurisdicional se faz presente de maneira mais expressiva no Novo Código de Processo Civil, que, além de prevê-las como instrumentos de pacificação do litígio, cuida de incluir nos quadros dos órgãos auxiliares da justiça servidores especializados para o desempenho dessa função especial e até mesmo de disciplinar a forma de sua atuação em juízo. (arts. 165 a 175). A Resolução nº 125/2011 pretendeu criar uma política nacional de tratamento adequado para solucionar os conflitos judiciais. Tal emissão decorre de fatores como maior eficiência operacional para o acesso à justiça, aperfeiçoamento de mecanismos consensuais de mediação e conciliação, redução de litígios e de considerável carga processual, incentivo ao diálogo e à desjudicialização de relações sociais, entre outros. Veja-se: Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade. Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, nos termos do art. 334 do Novo Código de Processo Civil combinado com o art. 27 da Lei de Mediação, antes da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de 27 controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão. O trabalho de implementação da Política Judiciária Nacional para a prestação de serviços judiciais de qualidade, além da disseminação da cultura de pacificação das relações sociais, contou com a centralização de estruturas judiciárias, treinamento de servidores e acompanhamento do CNJ via estatística. No presente, o CNJ continua prestando auxílio aos tribunais no que toca à organização de serviços e treinamento de profissionais para a promoção da mediação, em parceria com áreas afins ao direito, como se perfaz a psicologia jurídica. Dessa forma, no capítulo de encerramento da pesquisa será alvo de comentários a oficina da parentalidade, que é um trabalho feito a partir das emoções dos membros de uma família por meio de assistência psicológica. Esse método adequado de solução de conflitos conjugado com a constelação familiar vem reestruturando relações e reconfigurando a família, nos termos do artigo 227 da redação constitucional. Embora existam legislações para regular especificamente a mediação familiar, o CNJ continua a criar programas de incentivos à autocomposição de litígios, com a participação de entidades públicas e privadas que funcionam em parceria com as universidades e instituições de ensino jurídico. A atuação de mediadores e conciliadores é norteada por um Código de Ética criado pelo CNJ, que tem por fim assegurar a pacificação dos litígios, de forma a respeitar princípios, como os delineados no caput do artigo 1º, que segue mencionado: Artigo 1º - São princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores e mediadores judiciais: confidencialidade, competência, imparcialidade, neutralidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes. §1º. Confidencialidade – Dever de manter sigilo sobre todas as informações obtidas na sessão, salvo autorização expressa das partes, violação à ordem pública ou às leis vigentes, não podendo ser testemunha do caso, nem atuar como advogado dos envolvidos, em qualquer hipótese; §2º. Competência – Dever de possuir qualificação que o habilite à atuação judicial, com capacitação na forma desta Resolução, observada a reciclagem periódica obrigatória para formação continuada; §3º. Imparcialidade – Dever de agir comausência de favoritismo, preferência ou preconceito, assegurando que valores e conceitos pessoais não interfiram no resultado do trabalho, compreendendo a realidade dos envolvidos no conflito e jamais aceitando qualquer espécie de favor ou presente; §4º. Neutralidade – Dever de manter equidistância das partes, respeitando seus pontos de vista, com atribuição de igual valor a cada um deles; §5º. Independência e autonomia - Dever de atuar com liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa, sendo permitido recusar, suspender ou interromper a sessão se ausentes as condições necessárias para seu bom desenvolvimento, tampouco havendo obrigação de redigir acordo ilegal ou inexequível; §6º. Respeito à ordem pública e às leis vigentes – Dever de velar para que eventual acordo entre os envolvidos não viole a ordem pública, nem contrarie as leis vigentes. 28 A mediação deve seguir regras procedimentais. Assim, as partes têm direito à informação, autonomia da vontade, ausência de obrigação de resultado, desvinculação da profissão de origem e teste de realidade. Caso as partes não demonstrem interesse em realizar acordo, o processo deverá ser submetido à apreciação do magistrado para o cumprimento das formalidades processuais e julgamento, uma vez que o ordenamento jurídico abriga o princípio da inafastabilidade da jurisdição sob a égide da norma constitucional descrita no inciso XXXV do artigo 5º: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Essa norma se fez presente logo nos primeiros regramentos do CPC vigente. Leia-se: Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. O princípio da inafastabilidade da jurisdição afirma o controle judicial e do direito de acesso à justiça por parte dos cidadãos. Considerando esse imperativo, Moraes (2017, p. 158 – 159) leciona que: “O Poder Judiciário, no exercício de sua jurisdição, deverá aplicar o direito ao caso concreto”. O princípio da inafastabilidade da jurisdição é bem explicado por Lenza (2015, p. 1699 – 1700): O princípio da inafastabilidade da jurisdição é também nominado direito de ação, ou princípio do livre acesso ao Judiciário, ou, como assinalou Pontes de Miranda, princípio da ubiquidade da Justiça. [...] As expressões “lesão” e “ameaça a direito” garantem o livre acesso ao judiciário para postular tanto a tutela jurisdicional preventiva como a repressiva. Na lição de Mazza (2016, p. 85), pode ser visto que: “O Poder Judiciário detém o monopólio da função jurisdicional”. De tal modo, mesmo que não haja acordo na sessão de mediação, o processo será julgado e as partes receberão uma resposta do Poder Judiciário. 2.4 A mediação como mecanismo eficaz para a reestruturação das relações familiares e celeridade processual A mediação busca promover a reconstrução de laços de afeto ou, ao menos, de respeitabilidade entre as partes. Em muitos casos, as partes de um processo familiar serão compostas por um ex-casal detentor de prole. Nesses casos, os ressentimentos derivados da frustração do relacionamento concorrem para impedir a adoção de tratamento cordial entre as partes. 29 Essa situação se reflete de forma negativa na vida dos filhos, que passam a sofrer com a privação do direito de conviver com o genitor afastado do lar e até casos de alienação parental. A título de exemplo, é possível mencionar as ações de divórcio que extinguem as relações conjugais sem necessidade de causa específica, decorrente de simples manifestação de vontade de um ou dos dois cônjuges. (GAGLIANO, 2013). Nesses casos, as dores emocionais sentidas pela parte inconformada com o fim do relacionamento, que é o conflito real, por vezes, inviabilizam a feitura de acordo quanto à definição de guarda, horário de visitação e valor de pensão alimentícia, criando conflitos meramente aparentes. Nesse sentido, a inviabilidade de um acordo entre as partes é consequência decorrente dos conflitos reais esmiuçados e solucionados no momento da sessão de mediação. As partes deverão ser conscientizadas de que, embora a relação matrimonial tenha chegado ao fim, a relação filial permanecerá e deverá ser respeitada, por significar um direito da personalidade inerente à prole. Os direitos da personalidade garantem a tutela humana em relação a tudo que lhe seja próprio, salvo questões patrimoniais. Do mesmo modo, a personalidade abriga direitos, a exemplo da vida, nome, honra, imagem, intelecto, afeto decorrente da relação filial, dentre outros. Em similar pensamento, Gagliano (2013, p. 128) leciona que: A personalidade jurídica tem por base a personalidade psíquica, somente no sentido de que, se essa última não se poderia o homem ter elevado até a concepção da primeira. Mas os conceitos jurídicos e psicológicos não se confundem. Certamente o indivíduo vê na sua personalidade jurídica a projeção de sua personalidade psíquica, ou, antes, um outro campo em que ela se afirma, dilatando-se ou adquirindo novas qualidades. Todavia, na personalidade jurídica intervém um elemento, a ordem jurídica, do qual ela depende essencialmente, do qual recebe a existência, a forma, a extensão e a força viva. Assim, a personalidade jurídica é mais do que um processo superior da atividade psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de pôr em movimento o aparelho jurídico, e que, portanto, é modelada pela ordem jurídica. A preservação da relação filial é essencial para o desenvolvimento positivo do caráter e da personalidade de crianças e de adolescentes, uma vez que os pais são os primeiros modelos de educação que os filhos têm acesso. Desta feita, a preservação do vínculo filial é um bem inafastável da personalidade humana. Em relação à importância dos vínculos afetivos, Trindade (2010, p. 181) explica que: O estabelecimento de vínculos afetivos é substancial à condição humana e se constitui num requisito essencial ao desenvolvimento. O direito da criança e do adolescente considera os vínculos familiares uma condição da convivência. Não basta sobreviver: a criança possui o direito de participar de uma rede afetiva onde 30 possa crescer e desenvolver-se de forma plena, tendo, ao seu redor, todos os meios e instrumentos necessários a um crescimento natural. Superada a relevância da mediação para restaurar as relações familiares, é preciso que seja destacada sua segunda maior benesse, que é a considerável redução do número de ações para o processamento perante o magistrado, que ficará disponível para analisar casos de maior complexidade. A mediação promove a celeridade processual, tem custo reduzido, incentiva o desenvolvimento do comprometimento e da responsabilidade das partes e faz com que as partes saiam do Poder Judiciário satisfeitos com a solução imediata de seu problema. Dessa maneira, pode ser reconhecido que a mediação é um mecanismo processual eficaz para a promoção da paz social. Inúmeros são os benefícios advindos da mediação familiar, pois, além da redução das demandas, tem-se a solução advinda do protagonismo das partes que adotam uma postura colaborativa e não competitiva que facilita a continuidade dessas relações.31 3 DISSOLUÇÃO DE LITÍGIOS À LUZ DA TÉCNICA DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR SISTÊMICA O capítulo que ora tem início objetiva demonstrar a terceira forma de dissolução de conflitos familiares, a saber, a constelação sistêmica. Os conhecimentos narrados a seguir são frutos de reflexões sobre palestras jurídicas atuais e pesquisas bibliográficas coletadas sobre o tema, disponíveis em meio eletrônico e físico, com destaque para as entrevistas concedidas pelo magistrado baiano Sami Storch, pioneiro da técnica no Brasil. É relevante destacar que o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará ainda não adota essa técnica, mas desenvolve atividades com objetivo similar, qual seja, oficina da parentalidade, que também será explica ao longo deste capítulo. É importante ressaltar que, embora tenham os mesmos objetivos, a técnica da oficina de parentalidade não é semelhante à técnica da constelação familiar sistêmica. 3.1 A inserção da técnica de constelação familiar no Poder Judiciário A técnica da constelação familiar foi inaugurada no Brasil no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia na Vara de Família de titularidade do magistrado Sami Storch. O referido profissional tem como formação primária a área da psicoterapia humana. Por essa razão, ao estudar as técnicas de dissolução de conflitos familiares idealizada por Bert Hellinger, passou a adotar esse sistema durante as audiências. Bert Hellinger se destaca em seu país de origem, Alemanha, como um dos maiores nomes da psicoterapia europeia. O magistrado baiano buscou inspirações na obra do alemão Bert Hellinger para inserir nas audiências realizadas na vara de sua titularidade técnicas terapêuticas que incentivam as partes a refletirem sobre as problemáticas que provocam a desordem familiar. As partes são convidadas a participar de oficinas envolvendo atores que encenaram sua história de vida familiar demonstrando as expectativas e ações de cada parte e os motivos que ensejaram a lide processual. O magistrado, em palestra pública digital, explicou que são as leis sistêmicas naturais que regem os relacionamentos humanos. Essas forças atuam independente da vontade ou do 32 conhecimento das pessoas, provocam dores emocionais, podem eclodir em forma de violência, depressão e levar a situações extremas, como suicídio. É preciso conscientizar os seres humanos sobre a importância de iniciar o cultivo da tolerância nos lares e educar suas emoções. Na perspectiva defendida pelo magistrado apontado, não é racional a existência de um compêndio de leis para organizar uma sociedade que não cultiva a disciplina do respeito ao próximo dentro dos próprios lares. O direito sistêmico aplica a lei de forma racional respeitando e valorando as dores emocionais das partes e as convida para criar a solução do conflito. Nesse sentido, além de solucionar a lide tem-se a reconstrução de laços de afeto e respeito entre as partes. Essa é grande diferença entre a aplicabilidade das regras sistêmicas e a aplicação da lei formal. (STORCH, online, 2017). O êxito da aplicação das técnicas da constelação sistêmica chamou a atenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pois, na vara da família titularizada pelo magistrado apontado, as demandas processual foram solucionadas com acordo em 100% (cem por cento) dos casos. (CNJ, online, 2017). Dessa forma, a solução pleiteada pelo jurisdicionado é concedida de forma célere e a baixo custo. Por essas razões, o CNJ se interessou em inserir tal prática nos demais Tribunais de Justiça do País. (STORCH, online, 2017). 3.2 A técnica da constelação familiar Em que pese o vocábulo constelação denotar a ideia de aglomeração de estrelas, o sentido jurídico desse termo não guarda significado similar. Na verdade, esse método é desenvolvido por profissionais de arte que representam as histórias familiares conflituosas por meio de teatros, podendo ser desenvolvido também com o uso de ventríloquos. A encenação do conflito possibilita às partes observarem o próprio comportamento em relação ao outro litigante. Por vezes, nesses momentos, são notados comportamentos marcados pela belicosidade, pressão psicológica, abusividade emocional e financeira, entre outros. Entender a si é o início da solução dos problemas familiares levados ao conhecimento do Poder Judiciário. O autoconhecimento faz o indivíduo se identificar com seus erros e acertos, atos justos e injustos e identificar comportamentos danosos à relação familiar. Conscientes de seu papel no seio familiar e ensinadas a lidar com as próprias frustrações, as partes passam a aceitar o apoio do terceiro mediador para solucionar os conflitos que desagregam o clã. 33 Lecionando sobre a matéria, Manné (2008, p. 12) explica que a constelação familiar sistêmica auxilia as partes a entenderem melhor os relacionamentos familiares: As constelações familiares são a ocasião certa para cada um enriquecer sua experiência de vida e de relacionamentos, num plano muito profundo. O papel do representante e o do espectador nos permitem aprofundar essa experiência de vida com a mesma intensidade que o cliente. Aliás, os clientes que vêm apenas para fazer sua própria constelação passam ao largo de grande parte dos benefícios desse trabalho. Os papéis de representante e de espectador aguçam a nossa capacidade de integração tanto quanto a do cliente. A experiência do campo de energia permite adquirir competências relacionais e habilidades para viver bem o dia-a-dia. A técnica da constelação sistêmica de Bert Hellinger é bem explicada na obra de Schneider (2017, p. 11): O que há de extraordinário nas constelações familiares é primeiramente o próprio método. É singular e fascinante observar, quando um cliente coloca em cena pessoas estranhas para representar seus familiares em suas relações recíprocas, como essas pessoas, sem prévias informações, vivenciam sentimentos e usam palavras semelhantes às deles e, eventualmente, até mesmo reproduzem os seus sintomas. Quando os representantes são instados a expressar em movimentos o que sentem, eles frequentemente exprimem uma dinâmica da alma que revela destinos ocultos, que o próprio cliente desconhecia. Algumas vezes, o que os representantes sentiram só fica claro para o cliente depois que ele se informa com sua família. Mesmo quando os representantes não estão totalmente presentes, quando estão envolvidos com seus próprios problemas ou, por consideração, não ousam exprimir adequadamente o que sentem em seus papéis, podemos geralmente confiar neles. A surpresa do cliente, seus gestos de confirmação, o saber interior, o alívio e a abertura liberadora para modificações, o seu assentimento e, finalmente, os efeitos produzidos no cliente e em sua família são, em última análise, critérios para comprovar que os representantes sentiram corretamente. No momento em que se realizam as sessões de constelação familiar, os profissionais participantes relatam que percebem a fluência entre a encenação e a vida pela emoção externada pelas partes. Fortalecidas emocionalmente por meio de técnicas de autodescobrimento, as partes tendem a se perdoar e reviver os motivos que levaram à criação da afinidade que as uniu no passado. É comum que casais desistam de ações de divórcio ou superem as diferenças marcadas pelos conflitos aparentes e solucionem rapidamente questões como definição de guarda, valor de pensão alimentícia, direito de convivência, entre outros atritos que ensejaram a propositura de ações judiciais. O autodescobrimento e o enfrentamento da verdade de que os terceiros não são capazes de atender suas expectativas individuais, faz com que a parte cesse o sentimento de frustração em relação ao seuoponente processual (STORCH, online, 2017). O fortalecimento emocional 34 ensina o indivíduo a conceder mais valor a si, mas não atinge a margem do egoísmo limitando-se apenas à resolução do conflito. Um indivíduo apto a lidar com as emoções, após ter enfrentado a técnica da constelação familiar, é incentivado a superar sentimentos inferiores como: mágoa, vitimização, raiva, frustração, desrespeito, desprezo, descaso, constrangimentos morais etc. O enfrentamento das frustrações emocionais conduz os litigantes a aceitar a reconfiguração dos laços familiares. A solução dos problemas judiciais resta apenas como uma consequência da técnica de constelação sistema utilizada durante as audiências de mediação familiar. Ademais, a reconstrução dos laços de afeto e respeito traz benefícios ao Poder Judiciário, pois previne demandas. As partes antes litigantes aderem à cultura do diálogo e passam a solucionar eventuais problemas conversando entre si. Desta feita, o Poder Judiciário deixa de receber demandas relacionadas à alienação parental, definição de guarda, direito de visitação etc. Uma vez empoderadas, as partes dispensam a presença de um terceiro para intervir na solução de seus problemas. Sobre o tema, Battello (2008, p. 100) explica a reconstrução da comunicação entre as pessoas: Não mais se pode compreender a comunicação como simples conexão ou troca de informações, mas necessariamente é preciso ver nela uma atividade vinculadora entre duas instâncias vivas. [...] Os corpos são exímios geradores de vínculos quando auscultam e deixam-se auscultar por outros, porque só eles preenchem os espaços de falta de outros corpos. [...] Se a informação busca a certeza como parâmetro, o vínculo aposta na probabilidade. Assim, a comunicação que brota dos corpos nunca será determinística, pois outros corpos estarão sempre entremeados em uma ambiência gerada por corpos com histórias e sonhos, faltas e oferecimentos distintos. A técnica de constelação familiar reorganiza a posição de cada indivíduo em conformidade com a reconfiguração familiar apresentada. Na obra de Hellinger (2001, p. 04), pode ser lido que a constelação familiar trata: “dos destinos humanos e da possibilidade de transformá-los”. Os mediadores conscientizam as partes da importância do esforço comum para a solução da lide. A identificação da origem do conflito é um passo crucial para prover sua solução. O terceiro envolvido, o mediador e demais profissionais que encenam o conflito tem por finalidade incentivar as pessoas a solucionares seus conflitos internos e externos, além de educá-las para a prevenção de novas lides. 35 A não utilização da técnica em apreço traz como consequência o baixo índice de acordo, pois as partes continuam a cultivar em si sentimentos ausentes de nobreza como a mágoa, a vaidade e o egoísmo. É oportuno ressaltar que para as partes é mais cômodo esconder as reais causas do conflito que enfrentar seus medos, tristeza e até reviver momentos em que se sentiram humilhadas. A constelação sistêmica é uma técnica que desarma as partes de seus sentimentos negativos e conflituosos, fazendo prevalecer a harmonia e a paz familiar. Os conflitos que envolvem parentes merecem maior atenção do Poder Judiciário, pois o caput do artigo 226 da redação constitucional atual assevera que: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Assim, preservar os laços familiares se impõe como um compromisso do Poder Judiciário. 3.3 A incidência da constelação sistêmica em processos das demais áreas jurídicas A constelação familiar é uma técnica terapêutica que obtém um considerável número de acordos nas ações de família; todavia, sua incidência pode ser estendida às demais áreas do direito, tais como: Varas da Infância e da Juventude e Varas Criminais. Nos processos penais, a constelação familiar é utilizada para que sejam esclarecidas as motivações que levaram o réu a desenvolver padrões de violência ou que levaram a vítima a se submeter a relacionamentos emocionalmente abusivos, como nos casos de violência doméstica e familiar. A constelação familiar ensina a mulher a se liberar da procura por relacionamento de padrão abusivo, pode ser que os profissionais investiguem suas experiências passadas para ensiná-la a livrar-se desse tipo de situação no futuro (STORCH, online, 2017). 3.4 Dos benefícios da técnica de constelação familiar e a prevenção da procrastinação processual As partes submetidas às técnicas terapêuticas se tornam mais afáveis, situação que possibilita um comportamento mais tranquilo e a feitura de acordos no momento da audiência de conciliação. Em momento anterior à audiência, as partes são submetidas a oficinas que incluem palestras, encenações teatrais dos conflitos familiares e até meditações. Essas sessões servem para fazer as partes presentes identificarem a vivência desses conflitos em seus relacionamentos (STORCH, online, 2017). As sensações experimentadas pelas partes 36 submetidas à técnica de constelação familiar são descritas de forma pormenorizada por Bassoi (2016, p. 04). Leia-se: Os órgãos sensoriais estão basicamente situados desde a cabeça até os pés, tanto nas regiões externas do corpo como nas regiões internas. Os órgãos terminais atuam como estações de transformação de impulsos em respostas aos estímulos originados tanto no ambiente externo como no próprio corpo. Independentemente de que o estímulo original consista em uma série de luzes ou ondas sonoras, ou em reações químicas, os órgãos sensoriais transformam aquilo que é percebido em impulsos que são apropriados para a transformação interna dentro do organismo. O essencial é que todo tecido vivo tenha possibilidade de responder ao impacto de estímulos específicos. A natureza da capacidade de resposta está determinada, em parte, pelo tipo de estímulo que é percebido e, em parte, pela natureza dos tecidos reativos, órgãos e sistemas de órgãos. Para uma maior economia e eficácia, o estímulo percebido na superfície do corpo ou dentro do organismo é transformado de tal forma que pode ser transmitido apropriadamente e, assim mesmo, os impulsos originados no cérebro e outros centros reguladores são transformados em várias etapas antes de alcançar o órgão efetor ou, ainda mais remotamente, os órgãos sensoriais de outra pessoa. Nossos órgãos efetores, os músculos lisos e estriados do corpo, reagem aos estímulos originados no próprio organismo. A irritabilidade dos músculos se contraem quando são estimulados, o que pode dar origem a atividades dos membros para mover o corpo no espaço, permitir a entrada de ar na traquéia e emitir sons ou realizar movimentos dos tratos intestinais ou do sistema circulatório. Quando as atividades de um órgão ou do organismo todo são percebidas, por si mesmo ou pelos outros, constituem atos comunicativos que esperam ser interpretados. Os centros mais elevados do sistema nervoso e talvez certas glândulas avaliem as mensagens originadas nos órgãos individuais, e a pessoa pode responder automaticamente, muitas vezes sem nem mesmo ter tomado consciência da transmissão. São conhecidas por reflexos as respostas automáticas, se o circuito, com exceção do estímulo, estiver totalmente localizado dentro de um organismo. Em geral, as partes que compõem uma lide levam ao conhecimento do Poder Judiciário relações amorosas mal resolvidas ou conflitos de interesse decorrentes da divisão de bens sucessórios, que, caso houvesse um diálogo tranquilo, poderiam ser solucionados sem intervenção judicial. A belicosidade advém do conflito de interesses; por isso, a técnica da constelação familiar libera o fluxo do amor. Caso
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