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Sexualidade na Escola
 
� 
SUMÁRIO 
APRESENTAÇÃO 
 
Unidade I – Sexo e gênero 
• Masculino e feminino na qualidade da Educação Escolar. 
• Sexo e gênero: da natureza e cultura. 
• A escola entre a Biologia e a Cultura. 
• A influência da psicanálise na discussão sobre a relação entre e 
a repressão sexual da criança. 
 
Unidade II – Sexualidade, isto é, intimidade: redefinindo limites e 
alcances para a escola 
• Freud e o temido sexo dos anjos. 
• Da vontade em saber em Foucault. 
• Até onde vai a escola no que diz respeito à sexualidade. 
• Aprendendo nas cercanias da sexualidade, isto é, da intimidade. 
• A individualidade impedida: Sexualidade no espaço escolar. 
• Sexualidade e desenvolvimento da pessoa: A perspectiva 
Walloniana. 
• Sexualidade e afetividade. 
• Sexualidade e individualidade. 
• A sexualidade nos dois primeiros anos de vida: As primeiras 
manifestações, a importância dos pais e a aquisição das 
identidades sexual e de gênero. 
• Adolescência e conhecimento 
• Sexualidade e escola. 
 
� 
• Saber o sexo? Os problemas da informação sexual e o papel da 
escola. 
• Informação versus informação educativa. 
• As atuações da escola. 
• A mídia e as informações sexuais. 
 
Unidade III – Orientação sexual na escola: os territórios possíveis 
e necessários 
• A orientação sexual: Da escola para vida e vice-versa. 
• Orientação sexual versus sexualidade: Em busca de alguns 
limites. 
• O profissional: A orientação sexual em atos. 
• Os eixos básicos da orientação sexual. 
 
Unidade IV - Projeto de orientação na escola 
• Por que é necessário que a escola trabalhe com a sexualidade? 
• Orientação Sexual e os PCNs. 
• O trabalho com as crianças. 
• O trabalho com os adolescentes. 
• A institucionalização do projeto. 
• Por onde começar? 
 
- REFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
 
 
 
 
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APRESENTAÇÃO 
 
 O tema “Sexualidade” ainda é tratado na escola com muitas reservas. 
Diante da gama de estímulos que vemos hoje na mídia, Internet, música, etc., 
não podemos nós, educadores, fechar os olhos a um item tão importante 
para o desenvolvimento do ser humano. 
 Neste Curso, o leitor encontrará suporte para desenvolver atividades 
relacionadas à sexualidade no espaço escolar, em projeto que inclua 
participação da comunidade escolar e família. 
 Sexualidade e educação: quais os limites e chances concretas de 
conjugação desses dois termos, ou melhor, dessas duas instituições 
humanas fundamentais? De qualquer forma, é certo que a sexualidade 
humana figura como um dos temas mais inquietantes e, quase sempre, mais 
recusados no universo prático do educador. 
Entretanto, cada vez mais a escola tem sido convocada a enfrentar as 
transformações das práticas sexuais contemporâneas, principalmente na 
adolescência, uma vez que seus efeitos se fazem alardear no cotidiano 
escolar. Cabe-nos, então, indagar: como fazê-lo efetivamente, 
ultrapassando os limites dos conhecidos guias de orientação sexual? Enfim, 
qual o papel desejável da escola perante a sexualidade? 
 Para melhor situar o escopo da sexualidade na escola é importante 
contextualizar as diferentes dimensões que a conceitue: biológica, 
psicológica, histórica, cultural, etc. Essa é uma das tarefas deste módulo, 
que se propõe a desdobrar o tema com base no referencial teórico de 
diferentes áreas e orientações. 
 
 
 
 
 
 
� 
UNIDADE I - SEXO E GÊNERO: 
 
MASCULINO E FEMININO NA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO 
ESCOLAR 
 
 Na linguagem corriqueira, própria de nossa vida cotidiana, sexo 
e gênero são muitas vezes utilizados como sinônimos, como palavras 
que se referem às diferenças constitutivas de homens e mulheres, de 
machos e fêmeas. 
A construção do gênero, como categoria de análise da realidade, 
supõe, na sociedade ocidental contemporânea, o seu distanciamento 
do termo sexo. Este passa, então, a associar-se a interpretações 
biológicas, enquanto o gênero procura resgatar o caráter histórico e 
cultural dos diferentes significados masculino e feminino presentes na 
sociedade. 
 
SEXO E GÊNERO: da natureza à cultura 
 
 Existem características que podem ser definidas como 
especificamente masculinas ou femininas nas relações sociais e, 
portanto, nas relações escolares? Cabe indagar se essas 
características são inatas, próprias apenas à natureza biológica de 
homens e mulheres, ou se são socialmente construídas. 
Essas são as principais questões que a discussão sobre a 
relação entre sexo e gênero deve priorizar. 
 Comumente, as diversidades entre homens e mulheres remetem 
à noção de sexo. 
 
� 
Em nossa sociedade encontramos nas mais variadas áreas do 
conhecimento, explicações sobre diferenças entre homens e mulheres 
baseadas nas distinções de sexo, e fundamentadas em características 
físicas e naturais. Faz-se frequentemente uma polarização entre 
homens e mulheres com base em suas condições biológicas. As 
mulheres muitas vezes simbolizam o corpo, a reprodução da espécie, 
a natureza; e os homens representam o social. 
 As decorrências desses pressupostos são muitas. As mulheres 
passam a ser geralmente associadas a atividades como alimentação, 
maternidade, cuidado e educação, enquanto os homens são vistos 
como provedores e relacionados ao uso do poder. Criam-se vários 
estereótipos sobre homens e ao longo da história das sociedades 
ocidentais, especialmente as européias, nem sempre foi assim. 
Nicholson (1994) destaca que até o século XVII, momento em 
que a vida social de homens e mulheres não era enfaticamente 
separada entre a esfera pública (para eles) e a esfera privada (para 
elas), os corpos masculinos e femininos eram descritos a partir de um 
corte vertical no qual as mulheres eram consideradas culturalmente 
inferiores porque menos desenvolvidas e portanto incompletas do 
ponto de vista biológico do que os homens. 
 Assim, apesar de muitas vezes a polaridade que hoje caracteriza 
homens e mulheres ser considerada universal e a-histórica, vemos 
que esse modo de compreensão se amplia somente após o processo 
de industrialização e urbanização, com a consequente separação 
entre a vida doméstica e a vida pública: “O corpo, agora bipolar e 
oposto - um sexo e o outro sexo - testemunha a natureza do indivíduo 
que o abriga”. (Vianna; Lima; 1996). 
 
� 
 Essas mudanças são reforçadas pelas explicações oriundas da 
medicina e das ciências biológicas. É o determinismo biológico que 
passa a justificar a caracterização de mulheres e homens como seres 
qualitativamente distintos. 
 São muitos e qualitativamente variados os usos do termo 
gênero. Procurando superar o determinismo biológico como fator 
explicativo, há aqueles que o utilizam para resgatar a produção 
cultural e histórica das diferenças sexuais, mas que mantêm o sexo, 
isto é, as distinções biológicas como referência explicativa. Outros não 
vêem nenhuma contribuição da biologia para explicar as diferenças e 
semelhanças entre homens e mulheres, fenômeno este considerado 
eminentemente cultural. 
 Com maior ou menor ênfase em suas interpretações, todos 
esses usos do gênero têm em comum a afirmação da construção 
social das distinções sexuais. Procuram elaborar explicações que 
resgatam o caráter social, histórica e culturalmente produzido, de 
conceitos como biologia e natureza, das hierarquias baseadas sobre o 
corpo. Defendem que as relações de gênero se transformam ao longo 
da história e nas diferentes culturas e sociedades. 
 Gênero aqui está sendo usado com essa mesma preocupação, 
ou seja, como um “elemento constitutivo de relações sociais fundadas 
sobre as diferenças percebidas entre os sexos um primeiro modo de 
dar significado às relações de poder”. (Scott,1990). 
 Nesse sentido, gênero é relacional, constitui qualquer aspecto da 
experiência humana e interagecom as demais atividades e relações 
sociais. Podemos então afirmar que a nossa socialização como 
 
	 
homens e mulheres interfere na forma como nós nos relacionamos, 
nas profissões que escolhemos, e na maneira como atuamos. 
 
 A escola, entre a biologia e a cultura 
 Quais comentários se podem fazer a respeito do conhecimento 
da sexualidade humana por meio da psicanálise e sua relação com a 
escola? 
 
 Em primeiro lugar, a escola está filiada a uma tradição iluminista 
que se fundamenta na idéia de que o conhecimento científico tem um 
potencial libertador. No que tange à sexualidade, a escola não é 
herdeira da ars erótica, mas da scientia sexualis. 
 A psicanálise foi, em parte, responsável pelo fato de se levantar, 
na escola, o tabu sobre o sexo e de se dar à criança informações 
sobre a sexualidade, pela afirmação de que a criança tem o direito à 
verdade. 
Entretanto, a informação sobre o sexo destinada à criança, por 
meio dos manuais de educação sexual, se apoia na fisiologia do 
aparelho genital, de forma tal que qualquer criança percebe que um 
livro educativo explica tudo, menos o prazer do exercício da 
sexualidade. 
 Apesar da aparente facilidade com que as idéias de Freud 
parecem ser atualmente aceitas, os meios de comunicação que tratam 
pedagogicamente da sexualidade, sobretudo nesses tempos da AIDS, 
analisam o sexo como coisa biológica, só que, curiosamente, já não 
mais ligado à reprodução, mas à totalitária, paradoxal e angustiante 
obrigação de saúde e prazer. 
 
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 A psicanálise parte da premissa de que há uma contradição no 
comportamento humano, entre a sexualidade e o saber de seu objeto. 
A psicanálise não é assim uma sexologia. Ela se situa nos limites da 
sexologia, porque o que ela ocupa do sexo é aquilo que, de dentro ou 
de fora da própria vida pessoal, não é suficiente para dominar, para 
domesticar: é aquilo que é avesso ao conhecimento. Exatamente o 
efeito, tão conhecido pela educação, do que nas relações humanas, 
resulta diferente de nossas intenções. 
 
A influência da psicanálise na discussão sobre a relação entre a 
educação e a repressão sexual da criança 
 
 Num primeiro momento, sobretudo na década de 60, uma série 
de livros e publicações de inspiração psicanalítica dizia que a 
repressão devia ser combatida. 
Denunciavam não só os castigos, as humilhações, que estavam 
relacionados à manifestação da sexualidade na escola, mas também a 
violência contida na educação quando ela procura proibir alguma coisa 
à criança, antes que ela possa entender o porquê. Isso ia de tolerar 
diferentes manifestações da sexualidade infantil, como erotizar, de 
certa forma, a relação professor-aluno. Insistiam sobre a importância 
do vínculo afetivo que se estabelece (a obrigação de amar o aluno), do 
oportunismo de atender ao interesse da criança, do dever de ensinar 
e, ao mesmo tempo, acolher e compreender suas manifestações 
afetivas. 
 O combate à repressão sexual infantil se estendeu a qualquer 
tipo de repressão. Psicanalistas como Anna Freud mostravam que o 
 
�� 
castigo dos maus hábitos das crianças, como a masturbação, o 
exibicionismo, a voracidade, a agressividade, o erro, era uma maneira 
de matar pardais com canhões. 
Os estragos eram maiores do que os ganhos. Por meio de um 
uso abusivo da psicanálise diziam que a repressão escolar tornava a 
criança tímida, inibida, recalcitrante quanto à escola, incapaz de se 
defender e de aprender autonomamente. Acreditava-se ingenuamente 
que abdicar da repressão era criar as bases da felicidade. 
 Ao apregoar a felicidade como objetivo, por meio da crítica à 
escola no que tinha de repressiva, essa literatura pedagógica de 
inspiração psicanalítica da década de 60 contrariava frontalmente o 
que Freud pensava a respeito. 
 “Tem-se das crianças civilizadas a impressão de que a 
construção dessas barreiras (contra a sexualidade infantil) é um 
produto da educação e, sem dúvida, a educação muito tem a ver com 
elas”. 
 “Pois a sociedade deve assumir como uma das suas mais 
importantes tarefas educativas dosar e restringir a pulsão sexual... e 
sujeitá-la a uma vontade individual que é idêntica à ordem da 
sociedade”. 
 O confronto entre educação e sexualidade tem uma longa 
tradição no pensamento de Freud. Ele chama a atenção para uma 
norma sexual que não leva em conta a individualidade e a 
idiossincrasia de cada um de seus membros, o que torna a moral 
sexual civilizada uma das principais responsáveis pela neurose. 
Mas se aponta os exageros dessa moral e lamenta suas vítimas, 
não espera que a educação possa ser outra coisa que a repressão 
 
�� 
sem tréguas ao preenchimento do desejo humano, porque a 
civilização supõe essa repressão para constituir-se, para estabelecer 
vínculos cada vez mais amplos entre os homens, para a criação das 
produções mais altas da cultura. 
 Vendo nisso um resquício vitoriano na teoria de Freud, o 
pensamento libertário da década de 60 assumiu que o amor e a 
sexualidade eram necessariamente positivos, e a repressão, 
liminarmente destruidora e negativa. Esqueceu-se de que há formas 
destrutivas de amor e que, algumas vezes, a repressão pode ser 
constitutiva. 
 Anos depois, os psicanalistas começaram a criticar pais e 
professores pela falta de limites dados às crianças. As crianças 
estavam se tornando egoístas, mimadas, e essa falta de limites era o 
maior responsável, depois, por uma futura fragilização psíquica, 
tornando irresistível o apelo das drogas ou fazendo jovens 
sucumbirem à frustração – às frustrações que a vida oferece e àquelas 
relativas ao fato de não poderem consumir tudo o que a publicidade 
veicula. 
 A ausência de limites também seria responsável pela falta de 
ética e de respeito mútuos, e, simultaneamente, pela falta de respeito 
por si no que diz respeito ao exercício da sexualidade. 
 É como se todos esses discursos tivessem tirado da escola uma 
coisa que a escola tradicional possuía, com todos os crimes que 
cometeu em nome da repressão: a convicção de que o que fazia tinha 
um significado profundamente enraizado na cultura. Hoje, talvez seja 
impossível recuperar essa certeza. 
 
�� 
 Freud dizia que qualquer coisa que se faça, quando se é 
educador, estará errada. Pois se a escola acolhe demandas sociais 
múltiplas, contraditórias ou impossíveis, forçosamente fracassará. Se 
a sociedade estabelece que a educação é onipotente, condena 
liminarmente os professores à impotência e justifica sua 
irresponsabilidade. Os professores não são capazes de produzir 
futuros adultos felizes na sua vida amorosa; são capazes, no entanto, 
de ensinar alguns conteúdos, dentro da tradição cultural em que a 
escola está enraizada. 
 Se a tradição da cultura escolar é iluminista, ela não é, porém, 
necessariamente caudatária de um mito ou de uma banalidade 
científica. A percepção da sexualidade saudável que é oferecida às 
crianças e jovens, dentro e fora da escola, é restritiva, banalizadora e 
totalitária. 
A própria tradição escolar, pelo fato de estar ligada a uma tradição 
cultural que além de científica é também literária, poética e filosófica, 
pode encontrar o veio pelo qual, no Ocidente, se encontram outras 
percepções acerca da sexualidade. Talvez possa colocar os alunos 
diante da cultura que soube, um dia, o que era a difícil arte de amar. 
 
Orientação sexual na escola 
86% das pessoas são favoráveis à Orientação Sexual nas 
escolas. 
32% dos pais conversam sobre sexo com os filhos. 
50% dos pais nunca falaram sobre sexo com seus filhos. 
Pesquisa do Instituto DataFolha realizada em dez capitais 
brasileiras e divulgada em 27/06/93 constatou que 86% das 5.076 
 
�� 
pessoas ouvidas são favoráveis à inclusão de Orientação Sexual nos 
currículos escolares. 
Apesar de favoráveis, ou por causa disso mesmo, somente32% 
dos pais conversam sobre sexo com seus filhos; 50% nunca chegaram 
a ter esta conversa. 
A pesquisa mostra que as mulheres conversam mais sobre sexo, 
AIDS e drogas com seus filhos do que os homens. Pais e mães têm 
mais facilidade para conversar sobre drogas do que sobre sexo. 
Pais separados conversam mais sobre sexo com seus filhos do 
que pais casados. Isto sugere que o apoio majoritário à Orientação 
Sexual nas escolas (82% entre os que têm filhos), além da aparente 
liberalidade, tem o caráter de transferência para a escola de uma 
responsabilidade que muitos pais não se dispõem ou encontram 
dificuldade em assumir. 
Dentre os praticantes das diversas religiões, os que mais se 
posicionam a favor de se falar sobre todos os assuntos com os filhos 
são os espíritas (70%), seguidos pelos protestantes tradicionais (59%) 
e pelos católicos praticantes (52%). 
Entretanto, mesmo achando que todos os temas devem ser 
abordados, um menor número o faz (47% dos espíritas, 48% dos 
protestantes tradicionais e 31% dos católicos praticantes conversam 
sempre sobre sexo com os filhos). 
Dentre os entrevistados que se posicionaram contra a 
Orientação Sexual nas escolas, a maioria mora no Nordeste, tem mais 
de 41 anos e escolaridade até o 1° grau. Quanto mai or o nível de 
instrução e de renda, mais as opiniões são favoráveis a que se fale de 
todos os temas. 
 
�� 
Entre as pessoas que dispõem de renda familiar superior a dez 
salários mínimos, 92% são favoráveis à Orientação Sexual nas 
escolas. Entre os que têm formação universitária, o apoio chega a 
95%. 
Em maio de 1989, a Editora FTD realizou uma pesquisa 
enviando carta-resposta comercial para 10 mil professores, 
considerados como tendo poder de decisão junto à 
direção/coordenação da escola e junto aos demais professores de 
escolas públicas e particulares, classificadas como ótimas e grandes, 
da Ed. Infantil à 4ª série, nos grandes centros de todo o território 
nacional. 
Foram respondidas 5,5% das cartas, das quais 93,75% do sexo 
feminino, 54,45% vivendo maritalmente, 64,3% com curso superior, 
79% católicos, 91,8% com idades entre 18 e 45 anos. 
Entre os pesquisados, 84,3% acham que não tiveram uma boa 
educação sexual ou a tiveram mais ou menos, contra 13% que se 
declararam satisfeitos. 
Para 42,8%, as pessoas mais procuradas para conversar eram 
amigos e colegas, sendo que somente 6,2% procuravam os pais ou 
orientadores da escola. A grande maioria declarou que não era 
permitido falar de sexo na escola onde estudara, fazendo acompanhar 
a afirmação com frases do tipo: 
“Era tudo pecado,” 
“Não se podia falar de sexo, mas a curiosidade era grande.” 
“Conversava-se nas reuniões de catequese.” 
“Só podia falar de menstruação.” 
“As reuniões eram só para as meninas.” 
 
�� 
“Toda iniciativa era sutilmente cortada.” 
"Havia muito tabu por parte dos professores, era pecaminoso. 
Hoje, as reações mudaram." 
Perguntados se a maioria dos pais se sentiria incomodada pelo 
fato de a escola responder às questões sobre sexualidade, 52,7% 
responderam "não", contra 27% que disseram "sim". Dos 
entrevistados, 55,4% acham importante discutir, explicar e orientar as 
crianças a respeito de sexo, sendo que 38,6% acham importante, mas 
não se sentem em condições de fazê-la por falta de preparo. 75,9% 
acreditam não ter tido formação profissional para lidar com a 
sexualidade das crianças. 
As afirmações são do tipo: 
"Preciso ter mais esclarecimento e didática para responder 
corretamente." "Gostaria de um curso especializado." 
"Não sei o que falar para as crianças quando sou surpreendida por 
perguntas sobre esse assunto." 
 
 
 
O que tem acontecido para que, apesar de todos perceberem a 
sua necessidade, o trabalho de Orientação Sexual seja ainda tão 
incipiente no país? 
A discrepância entre a prática e os desejos da população 
passam por razões diversas na rede pública e particular. 
 
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Tem que existir, primeiro, uma vontade política (por parte dos 
governantes) de assumir programas desse tipo. Isso implica 
reconhecer como prioridade investimentos na área da saúde e 
educação da criança e do adolescente. 
Tanto na rede pública como na particular, existem os tabus e o 
preconceito contra assuntos ligados à sexualidade. Essas reações 
minam, de diferentes maneiras, as possibilidades de implantação 
desse tipo de trabalho. 
Na rede pública, exemplos de resistência aparecem na alegação 
de falta de espaço ou na não-divulgação dos cursos de Orientação 
Sexual para os professores; na rede particular, uma das objeções é o 
receio de os pais dos alunos se posicionarem contra e retirarem as 
crianças das escolas (o que raramente acontece) ou ainda, "tapando o 
sol com a peneira", não querendo investir recursos na formação de 
professores de Orientação Sexual. 
Muitas dessas escolas chamam um médico ou psicólogo para 
uma palestra e acham que está realizado o trabalho de Orientação 
Sexual. 
A reação dos pais, longe de ser resistente, é de querer passar 
essa responsabilidade à escola que, entretanto, não tem como função, 
nem conseguiria, substituir a educação sexual dada pela família. 
Existem, há mais de uma década, experiências significativas em 
escolas públicas e particulares de diversos Estados. Quando essas 
escolas implantaram, de forma pioneira, os seus projetos, a maioria 
dos pais deu seu apoio. Hoje, várias escolas são conhecidas e 
respeitadas também por esse diferencial. 
 
 
�� 
A análise de currículos de Ciências, de 4ª a 8ª série de escolas 
estaduais, municipais e de algumas escolas particulares de São Paulo, 
constatou a presença de temas como reprodução, fecundação, parto, 
características sexuais secundárias do homem e da mulher e sua 
influência nos papéis sociais de cada um, transformações físicas, 
doenças sexualmente transmissíveis e AIDS. 
Entretanto, os currículos variam no detalhamento do que é dado 
e na série em que a informação é oferecida. 
Segundo informação do Ministério da Educação, cada escola 
tem liberdade para desenvolver os conteúdos de Ciências da maneira 
que achar mais adequada. 
O fato de temas relacionados à sexualidade constarem dos 
programas não é garantia de que o assunto será abordado e, menos 
ainda, que o será de forma aberta e participativa. 
A pesquisa da FTD e a nossa experiência fazem supor que um 
grande número dos professores não se sente confortável para falar 
sobre temas da sexualidade, inclusive os de Ciências. 
 A ênfase, na maioria das escolas, é para a informação biológica, 
não oferecendo ao aluno abertura para colocar outros tipos de 
questões sobre sexualidade. 
 Mesmo que se sinta à vontade para desenvolver o tema, o 
professor dificilmente aborda o assunto do ponto de vista que 
interesse aos alunos. O professor deveria estar preparado para 
polemizar, lidar com valores, tabus, preconceitos e informar sobre as 
dúvidas, em vez de simplesmente transmitir conteúdos. Conteúdos 
sobre sexualidade, se não forem relacionados às questões 
vivenciadas por aquela idade, não são incorporados. 
 
�	 
É alvissareiro constatar que muitos currículos já incluem alguns 
temas da sexualidade. Ao mesmo tempo, sabemos que pouquíssimos 
fazem um trabalho adequado na área de Orientação Sexual: seja 
porque os professores não contam com material que lhes propicie 
maior confiança quanto ao que deve ser abordado com cada idade, 
seja por não se sentirem preparados para responder às questões dos 
alunos, seja por não terem um horário especial para desenvolver 
adequadamente esses temas. 
Com o intuito de fazer frente às dificuldades e resistências acima 
citadas, parece-nos pertinente e atual a publicação deste Guia de 
Orientação Sexual, para o qual atribuímos dupla função. 
Por um lado, a função pedagógica e norteadorapara educadores 
e todos aqueles que, direta ou indiretamente, trabalham com crianças 
e adolescentes. 
Por outro, a função política de somar esforços para ampliar a 
discussão e o espaço em defesa do direito de toda criança e 
adolescente a receber Orientação Sexual, visando melhorar a 
qualidade de vida e a saúde dos cidadãos. 
Este Guia de Orientação Sexual também se propõe a fornecer 
subsídios a profissionais de saúde, legisladores, autores de novela, 
jornalistas e outros profissionais da mídia diante de questões tais 
como: 
• Em que idade ou estágio de desenvolvimento deveriam ser 
transmitidas determinadas informações especificas? 
• Tal comentário no rádio, na TV, nas revistas, está de acordo 
com a Ciência? 
• Tal opinião é preconceituoso, é sexista? 
 
�
 
• Como falar sobre AIDS com crianças? 
• Como proteger uma criança de abuso sexual? 
• Que mensagens educativas seriam importantes para 
programas televisivos infantis? 
• Como a novela poderia veicular mensagens preventivas? 
 
 
 
 
Exercícios: 
 
1) Como a sociedade utiliza o termo “sexo” e o termo “gênero” na 
construção 
 social? 
----------------------------------------------------------------------------------------------
----------------------------------------------------------------------------------------------
---------------------------------------------------------------------------------------------- 
2) Comente: Psicanálise e educação sexual. 
----------------------------------------------------------------------------------------------
----------------------------------------------------------------------------------------------
---------------------------------------------------------------------------------------------- 
 
 
 
 
 
 
�� 
UNIDADE II 
 
 SEXUALIDADE: REDEFININDO LIMITES E ALCANCES PARA A 
ESCOLA 
Sexualidade é como um fantasma que ronda as cercanias e os 
interiores da escola e da sala de aula. Não é o único, sabemos disso. 
Mas é, sem dúvida, um daqueles que, quanto mais se busca erradicar, 
mais assombra a cada esquina. E isso, há séculos, ao que indica a 
história. 
 A violência, as drogas, a bebida vêm mostrando seu traçado e 
incomodando há menos tempo, mas com força e colorido muito 
semelhantes. Até porque, diferentemente das questões cruciais do 
ensino brasileiro, como a evasão e a reprovação, sobretudo das 
primeiras séries no ensino público, deixam de ser, como a 
sexualidade, “privilégio” de uma classe social. 
Têm entrado na mira das estratégias de controle, deixando 
igualmente marcas de fracasso nos caminhos de seu combate. Todos, 
temas de complexidade sensível, que, por suas especificidades, 
merecem ser tratados no plano das pesquisas e escrituras, um a cada 
vez. É a hora e a vez de pensarmos a sexualidade. 
 
Freud e o temido sexo dos anjos 
 
 Numa conferência proferida no início do século XX, Freud 
explicava, uma vez mais, que a sexualidade não era como sempre se 
pensou, algo que surgisse na adolescência. As crianças, desde o 
nascimento, apresentavam atividades auto-eróticas que, da sucção à 
 
�� 
masturbação, passando pelo controle das fezes como estímulo à 
mucosa anal, faziam-se acompanhar de fantasias e constituíam assim 
a história amorosa desses supostos anjos. 
 A genitalidade, com a atividade auto-erótica que lhe 
corresponderia (a masturbação), estava sendo considerada por ele 
apenas como uma das formas da sexualidade: aquela que, em 
verdade e dentre todas, mais anunciaria sua qualidade sexual. Teria 
ela início, ainda na primeira infância, numa fase que batizou como 
fálica porque, na imaginação das crianças, os homens e as mulheres 
possuiriam, por natureza, o pênis. 
Na adolescência, o que estaria, então acontecendo? Somente o 
ressurgimento, depois de longos anos de latência (entre 7 e 12 anos, 
aproximadamente), da genitalidade. 
 Dessa e de outras fases, também eróticas, pouco ou nada nos 
lembraríamos com o esforço da consciência, mas, com certeza, 
guardaríamos marcas, mais ou menos indiretas, em nossa vida 
psíquica. 
A repressão, conduzida em grande parte pelas atitudes e 
reações dos pais às manifestações espontâneas de seus filhos, seria 
a causa tanto do esquecimento quanto do reaparecimento distorcido, 
em sonhos, sintomas ou angústias de toda espécie, dessa história do 
desejo sexual. 
Freud tentava provar a propriedade da teoria que, há quase duas 
décadas, parecia ter vindo para incomodar as concepções sobre o 
homem e, especificamente, sobre a criança. Como imaginá-la capaz 
de pensamentos tão impuros? Aos médicos, educadores e pais de 
família Freud pergunta: se, de fato, não acreditassem na sexualidade 
 
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desde a infância, por que haveriam de estar constantemente 
reprimindo as crianças nas escolas, no lar e nas prescrições de 
condutas saudáveis? Além disso, se não nos lembramos de nós, na 
mesma idade, é porque fomos também reprimidos. 
 Apesar de todas as críticas, é inegável que Freud nos põe a 
tratar de forma menos convicta do que vínhamos fazendo, o tema da 
sexualidade. No mínimo, temos de parar e pensar se ele não teria 
razão. 
 
Da Vontade de saber em Foucault 
 
 Se nos incluímos entre os que, reconhecem na teoria de Freud 
as virtudes do pioneirismo sério e rigorosamente consequente a 
respeito da sexualidade, podemos considerar que a repressão tem 
modos de agenciamento social que fazem com que a sexualidade, nas 
malhas dos dispositivos institucionais criados para reprimir, como diria 
Foucault, difunda-se, circule, aconteça. 
 Foulcault em História da Sexualidade (1985) diz que a hipótese 
repressiva não daria conta de explicar os destinos do desejo ou da 
sexualidade. Ele parte da afirmação de que esta última é o sexo no 
discurso. Parte, ainda, da afirmação de que os discursos se produzem 
como dispositivos institucionais. 
 Para melhor entender esses pressupostos, pensemos que, vida 
adentro, fazemos as instituições das quais julgamos apenas participar. 
Ou seja, falamos sempre na qualidade de atores, nos palcos ou 
cenários de práticas ou relações sociais como a família, a escola, o 
trabalho, a profissão, o lazer, a religião e assim por diante. 
 
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 Reconhecemo-nos sujeitos de nossa história na superposição 
ou, melhor, no intrincamento de todos os lugares por nós assumidos e 
aqueles atribuídos a nossos parceiros de jornada. Nascemos filhos, 
numa cultura que reserva à família um determinado estatuto no 
conjunto das instituições sociais de uma época. 
Recebemos um nome e um sobrenome que selam as 
expectativas em torno de nosso vir a ser, sobretudo para os nossos 
pais e parentes mais próximos. A partir daí, choramos, sorrimos, 
brincamos, aprendemos a ler e escrever, constituímos nossos vínculos 
de amizade, nossas inimizades, trabalhamos, ficamos 
desempregados, dormimos sob as pontes ou sob muitas cobertas, 
amamos ou odiamos e assim por diante. 
Em cada uma dessas aventuras, estamos sempre fazendo 
instituições, enquanto respondemos a expectativas mais ou menos 
veladas quanto ao nosso fazer. Tudo isto, com ou sem consciência da 
rede imaginária e simbólica em que nos enredamos. Por ela, com ela 
e nela, falamos e, de longe, indiferenciamos o que 
fazemos/somos/dizemos. 
 A sexualidade não escapa desse agenciamento por dispositivos 
institucionais. Talvez escape mais de alguns do que de outros. Mas, 
sem dúvida, grande parte deles tem suas formas de trazer o sexo para 
o discurso. 
 Segundo Foucault, os dispositivos criados para reprimir a 
sexualidade, acabam por ter efeitos contrários àqueles a que se 
propõem.. 
 
 
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Até onde vai a escola no que diz respeito à sexualidade? 
 
 Estamos usando o termo instituição, com um sentido bastante 
especial e que merece ser explicitado para que certas afirmaçõespossam ser mais bem compreendidas. Estamos definindo as 
instituições como relações ou práticas sociais que tendem a se repetir 
e que enquanto se repetem, legitimam-se. 
Existem, sempre, em nome de um “algo” abstrato, o que 
chamamos de seu objeto. Por exemplo, a medicina pode ser 
considerada, segundo nossa definição, uma instituição e seu objeto, 
pode se dizer, é a saúde. (Guillon,1978) 
 As instituições fazem-se, sempre também, pela ação de seus 
agentes e de sua clientela. De tal forma que não há vida social fora 
das instituições e nem sequer há instituição fora do fazer de seus 
atores. 
 Representamos o que fazemos como tendo de ser assim, como 
não havendo outro modo de fazê-lo, como natural, e não como relativo 
à prática institucional. Exemplo: para nós, professores e educadores, 
para os pais e para as crianças e/ou jovens que fazem a escola como 
sua clientela, parece tão natural que se aprendam os conhecimentos 
básicos da cultura por meio de aulas e disciplinas. 
Consideramos como objeto da instituição-escola: a 
aprendizagem de conhecimentos, por meio da constituição de 
esquemas de pensamento que dêem conta das possibilidades de 
aprender, bem como o desenvolvimento de uma atitude diante do 
conhecimento. 
 
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 É muito comum a escola tentar ampliar seu âmbito de ação dos 
hábitos alimentares ...à conduta sexual até se confundir com toda a 
educação possível da sociedade. Afirmamos que sua estratégia 
poderia ser a de deixar que a sexualidade surja para tomá-la em 
consideração. E não deixaria de ser a instituição que é. Poderia estar 
lidando com mais delicadeza na extensão de suas fronteiras. Como? 
 O ambiente já está dado: as crianças ou adolescentes, como 
alunos, reeditam nas relações ali constituídas suas fantasias, seus 
desejos, conflitos, sua história; reeditam a posição que se vêem 
ocupando vida adentro nas relações entre gerações, gêneros, raças 
e/ou religiões; há um entrecruzamento fértil, circunstancialmente dado, 
desses e de outros vetores. 
Pretender organizar cada um desses planos, direcionando-os 
para um norte, ou melhor, pretender organizá-los em atitudes 
uniformes, conforme as metas de uma educação atitudinal, é, sem 
dúvida, uma tarefa a que a escola se propõe, como não poderia deixar 
de ser, para se fortalecer como instituição social. Mas é exatamente 
nisto que força a barra, que ultrapassa seus limites, anda na 
contramão de uma ética da relação social, e mesmo da intimidade. 
 As iniciativas consideradas mais agressivas e modernas, como 
os grupos de discussão da sexualidade, perseguem este alvo. 
Quando, na verdade, deveria se garantir, nesse aspecto, um papel ou 
lugar menos decisivo e mais sóbrio. Poderia assim, estar agindo no 
território de sua especificidade, como instituição social, e com certeza, 
estaria fazendo muito. O que isto quer dizer? Eis uma situação 
concreta para esclarecimento: 
 
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 Dia desses, foi perguntado a uma criança de terceira série de 
Ensino Fundamental de uma das escolas mais à esquerda do eixo da 
tradição, como é que a professora lidava com o fato de os meninos 
andarem importunando um colega, por seus hábitos de irresistível 
apego aos dengos maternos. A resposta foi: “Ah, se alguém o chama 
de veado, em voz alta, no meio da aula, a professora diz, sem nem 
virar da lousa: “olha a boca...”. O veado, no caso, deve ter estourado 
os limites do respeito para com a atividade em questão (aula de 
gramática), para com a atenção dos colegas a ela, para com as regras 
mínimas de emissão de opinião sobre um colega, para com as 
exposições, e (por que não?) para com os limites de tolerância da 
professora. 
 De fato, é muito mais difícil lidar com situações deste tipo, no fio 
da navalha de sua dimensão social e psicológica, a sangue quente, 
sem estratégias instituídas, sem as certezas das táticas planejadas e, 
portanto, distantes do calor da hora, como os grupos de orientação e 
informação sexual ou oficinas de sexualidade. 
 
Aprendendo nas cercanias da sexualidade, isto é, da intimidade 
 
 Sabemos, por exemplo, que a conquista da língua escrita é 
tarefa árdua para os que frequentam as primeiras séries do Ensino 
Fundamental. Sabemos também, que a língua falada pode ser o guia. 
Marcada pela possibilidade de “livre” expressão do pensamento de um 
narrador, é ocasião de uma produção escrita que deixa seu autor à 
vontade para contar. 
 
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Às vezes com tema determinado (no caso, pelo professor), às 
vezes com tema livre, pode-se pôr o pequeno aprendiz, que domina 
melhor o fluxo da fala do que o da escrita, a falar por escrito. Com 
maior ou menor preocupação com a correção ortográfica, de 
acentuação ou pontuação, conforme o perfil e as exigências da 
criança e aquelas da escola em que estuda, vai contando. De 
preferência, o que lhe vier à cabeça. E o que lhe vem à cabeça, se 
penso conforme prevêem a psicanálise, as teorias sociológicas da 
representação e as teorias sobre instituições, terá sido, 
inevitavelmente, tecido em sua história pessoal, nas diferentes 
relações que foi constituindo com figuras significativas para ela. 
 Ora, disso não se exclui o modo como foi organizando sua 
sexualidade, a intimidade de suas fantasias ou, em outra linguagem, 
suas representações dos vínculos afetivos, suas identificações. No 
modo como constroi sua narração, bem como nos focos temáticos que 
faz, está toda a criança. Claro que não precisa ser interpretada. Basta-
lhe ser possível dizer e estará, sem dúvida, uma vez mais, podendo 
ser. 
 Duas observações cabem aqui. Primeira: todo professor, 
sobretudo das séries iniciais, sabe o quanto as redações de seus 
alunos são, nesse sentido, autodemonstrativas. Segunda: o leitor já 
deve ter percebido que o termo sexualidade, mesmo que tenha 
perdido em precisão pontual, ganhou em abrangência, para não mais 
significar genitalidade ou analidade, e sim, propositadamente, 
confundir-se, nos seus efeitos, com intimidade, desejo, afetividade; 
tudo, com a aquiescência conceitual da psicanálise. 
 
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 Se as narrativas têm, por si, potência expressiva (e 
psicopedagógica, como querem alguns), seu manejo, no entanto, pode 
explorar ou restringir essa potência. 
O confronto com exigências iniciais muito severas, no que diz 
respeito à correção, pode levar a escrituras que restringem também a 
expressividade do texto e do pensamento de seu autor. Mas dentro de 
certos limites de tolerância ao erro e ao estilo, talvez seja a “galinha 
dos ovos de ouro” na aprendizagem ou na recriação do conhecimento 
que a escola faz ou tem como seu objeto, na qualidade de instituição. 
O contato da criança com as ciências da linguagem, da história, 
dos estudos sociais, mais diretamente, ou, mais indiretamente com as 
ciências biológicas e matemáticas, em maior ou menor grau, podem, 
em tal contexto, passar pelo contato com o conjunto de sentidos, com 
a afetividade, a intimidade e, por que não?, com a sexualidade 
daquele que está no lugar de aprendiz. Quer o educador, e mesmo o 
leitor, situação mais interessante? 
 
A individualidade impedida: sexualidade no espaço escolar 
 
 Analisar a relação entre sexualidade e escola é praticamente 
equivalente a articular os pólos de uma antítese. A escola tem-se 
mostrado persistentemente refratária ao impacto do que foi chamado 
por Reich de “revolução sexual”. 
As propostas de educação sexual parecem patinar, não 
conseguindo se impor. Talvez isso reflita o antagonismo essencial 
entre sexualidade e cultura postulado por Freud, ou a incapacidade de 
modernização da instituição educativa. 
 
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A utópica exigência reichiana que atribuía aos adultos não só a 
função de permitir, como também a de proteger o exercício da 
sexualidade infantil e juvenil, entendida como direito fundamental da 
pessoa, quando se concretizou, foi fora do espaço escolar,geralmente 
no interior da família. Dentro da escola, a interdição às manifestações 
do erotismo permanece mais rigorosa do que as que pesam sobre as 
expressões da hostilidade. 
 Qualquer discussão realista sobre o vínculo entre escola e 
sexualidade deve reduzir-se, assim, ao âmbito da orientação sexual, 
isto é, ao aconselhamento possível acerca do destino a dar às pulsões 
genitais emergentes. A resposta, sem dúvida, depende de posições de 
natureza ideológica, mas tem a ver também com a natureza da 
concepção de desenvolvimento humano que se utiliza. 
 Onde a sexualidade assume o lugar de eixo fundamental da 
pessoa, a orientação parece tender para a sua utilização imediata 
assim que ela se torna biologicamente disponível. Obstruí-la adquire o 
caráter de uma violência equivalente à de impedir o exercício de 
qualquer possibilidade nova: andar, falar, pensar. 
 Quando, entretanto, a sexualidade é vista como apenas uma das 
dimensões da pessoa e o desenvolvimento como algo destinado a 
levar à sua expansão e diferenciação máximas, a resposta não é tão 
clara. 
 O que se propõe é examinar o lugar da sexualidade dentro de 
uma perspectiva psicogenética deste tipo: a questão passa a se referir 
às relações entre escola e individualidade em formação. 
 
 
 
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O TRABALHO DE ORIENTAÇÃO SEXUAL: OBJETIVOS E 
VALORES 
 
Sexualidade e Aprendizagem 
 
O cidadão do século XI, de uma grande metrópole, não se 
comporta sexualmente como um cidadão de zona rural do início do 
século. As diferenças vão desde a "corte", o papel do homem e da 
mulher, até as liberdades permitidas no ato sexual. 
A sexualidade é construída, basicamente, a partir das primeiras 
experiências afetivas do bebê com a mãe e com o pai ou com quem 
cuida dele. Seguem-se as relações com família, amigos, e as 
influências do meio cultural. A capacidade da mãe de tocar o filho, 
aconchegá-lo, acolhê-lo psicologicamente, será a base para o 
desenvolvimento da resposta erótica e da capacidade de construir 
vínculos amorosos e do desejo de aprender. 
 
Papel da escola 
Apesar de trabalhos desenvolvidos por Freud, ainda no início do 
século XX, constatarem a existência da sexualidade infantil, da 
curiosidade natural das crianças a respeito de sua origem e das 
dificuldades decorrentes quando elas não conseguem responder a 
essas questões, alguns preconceitos e tabus têm impedido os pais de 
conversarem com seus filhos e as escolas de informarem as crianças. 
Sendo a sexualidade algo que se constroi e aprende, parte 
integrante do desenvolvimento da personalidade, capaz de interferir da 
alfabetização ao desempenho escolar, a escola não pode ignorar essa 
 
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dimensão do ser humano e tem que investir na formação de 
professores para dar conta da tarefa. 
 
Orientação Sexual x Educação Sexual 
 
A Orientação Sexual, quando utilizada na área de educação, 
deriva do conceito pedagógico de Orientação Educacional, definindo-
se como o processo de intervenção sistemática na área da 
sexualidade, realizado principalmente em escolas. 
A Orientação Sexual se propõe a fornecer informações sobre 
sexualidade e a organizar um espaço de reflexões e questionamento 
sobre postura, tabus, crenças e valores a respeito de relacionamentos 
e comportamentos sexuais. 
A Orientação Sexual abrange o desenvolvimento sexual 
compreendido como: saúde reprodutiva, relações interpessoais, 
afetividade, imagem corporal, auto-estima e relações de gênero. 
Enfoca as dimensões fisiológicas, sociológicas, psicológicas e 
espirituais da sexualidade através do desenvolvimento das áreas 
cognitiva, afetiva e comportamental incluindo as habilidades para a 
comunicação eficaz e a tomada responsável de decisões. 
O trabalho pode ser realizado por educador ou outro profissional 
capacitado para uma ação planejada, sistemática e transformadora, 
visando a promoção do bem-estar sexual, a partir de valores baseados 
nos direitos humanos, e relacionamentos de igualdade e respeito entre 
as pessoas. 
 
 
 
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Por todas essas condições, diferencia-se da educação sexual, 
que inclui todo o processo informal pelo qual aprendemos sobre a 
sexualidade ao longo da vida, seja através da família, da religião, da 
comunidade, dos livros ou da mídia. 
O trabalho de Orientação Sexual procura ajudar crianças e 
adolescentes a terem uma visão positiva da sexualidade, a 
desenvolverem uma comunicação clara nas relações interpessoais, a 
elaborarem seus próprios valores a partir de um pensamento crítico, a 
compreenderem o seu comportamento e o do outro e a tomarem 
decisões responsáveis a respeito de sua vida sexual, agora e no 
futuro. 
 
Atração Sexual x Orientação Sexual 
 
No meio médico, jurídico e da sexologia, o termo Orientação 
Sexual é utilizado para denominar a identidade erótica dos cidadãos 
em hetero, homo ou bissexuais. 
Neste Guia, optamos pela expressão atração sexual para tratar 
do desejo sexual, no sentido de evitar a categorização dos indivíduos 
e ampliar a visão da sexualidade. 
Objetivos 
A Tabela n° 1 apresenta os objetivos a serem alcanç ados no 
trabalho de Orientação Sexual: 
 
TABELA N° 1: O objetivo de um trabalho de orientaçã o sexual é 
favorecer o bem-estar sexual dos indivíduos. Este Guia, através 
da discussão dos conceitos fundamentais, favorece condições 
 
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para que o aluno possa: 
 
No desenvolvimento humano: 
Gostar do seu próprio corpo. Desenvolver a auto-estima. 
Buscar maiores informações sobre reprodução, quando necessitar. 
Encarar sem culpa a sexualidade. 
Compreender que a sexualidade faz parte do desenvolvimento 
humano sem, necessariamente, implicar reprodução. 
Relacionar-se com respeito e responsabilidade. 
Reconhecer e respeitar as diferentes formas de atração sexual. 
Exercer os direitos de cidadania nas diferentes manifestações da 
sexualidade. 
 
Nos relacionamentos: 
Identificar e expressar seus sentimentos. Usufruir de intimidade e de 
prazer. 
Defender-se de vínculos nos quais se sinta manipulado ou explorado. 
Escolher, dentre suas possibilidades, modos de vida e de convivência. 
Desenvolver relacionamentos significativos. 
 
Na comunicação: 
Identificar os valores socioculturais e posicionar-se de forma pessoal 
em relação a eles. 
Pensar por si mesmo em situações-problema, avaliando alternativas e 
consequências. 
Buscar informações e ajuda quando necessário. Responsabilizar-se 
por suas decisões. 
 
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Considerar a comunicação como uma forma de expressão nos 
relacionamentos. Ser receptivo às mensagens do outro, ampliando 
sua própria visão de mundo. 
 
No comportamento sexual: 
Usufruir e expressar a própria sexualidade ao longo da vida. 
Viver a sexualidade de forma congruente com os próprios valores. 
Usufruir de fantasias sexuais como fonte de prazer, sem 
necessariamente realizá-las. 
Buscar informações que contribuam para o esclarecimento e o 
desenvolvimento da própria sexualidade. 
Discriminar entre comportamentos sexuais enriquecedores e 
prejudiciais a si e aos outros. 
Reconhecer os próprios limites e desejos sexuais e respeitar os dos 
outros. Ser capaz de tomar decisões e ser responsável por elas ao se 
envolver em relacionamentos sexuais. 
Ser capaz de conversar ou buscar ajuda entre os amigos, familiares, 
na escola, com uma pessoa de sua confiança ou com um profissional 
especializado, nas dúvidas ou dificuldades com a sexualidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Na saúde sexual e reprodutiva: 
Aprender a conhecer o próprio corpo e a cuidar dele. 
Valorizar a saúde do corpo como condição necessária para usufruir de 
prazer sexual. Escolher um método anticoncepcional que considere as 
características pessoais, para poder usá-Ia de forma eficaz. 
Prevenir-se de abusos sexuais. 
Agir de modo consistentecom os próprios valores ao lidar com uma 
gravidez indesejada. 
Buscar acompanhamento médico integral durante a gravidez. 
Evitar contrair ou transmitir doença sexualmente transmissível, 
inclusive o vírus da AIDS. 
Realizar regularmente procedimentos preventivos, tais como: 
papanicolau, auto-exames dos seios e testículos. 
Vencer tabus e preconceitos relacionados à sexualidade. 
Respeitar pessoas com valores sexuais e estilos de vida diferentes 
dos seus. Exercer a cidadania desenvolvendo um posicionamento 
claro nas questões sexuais. 
Avaliar o impacto das comunicações familiares, culturais, da mídia e 
da sociedade nos próprios pensamentos, sentimentos, valores e 
comportamentos relacionados à sexualidade. 
Defender o direito de todas as pessoas obterem informações precisas 
a respeito da sexualidade. 
Evitar comportamentos discriminatórios e intolerantes. 
Rejeitar estereótipos a respeito da sexualidade. 
 
Valores 
Os pressupostos deste Guia de Orientação Sexual são a 
 
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expressão de valores pluralistas relacionados à sexualidade, em 
consonância com os direitos de cidadania de uma sociedade 
democrática. 
Os pressupostos se apoiam nos seguintes valores: 
• Toda pessoa tem dignidade e valor próprio. 
• A sexualidade é parte da vida de todas as pessoas. 
• A sexualidade inclui dimensões biológicas, éticas, espirituais, 
psicológicas e culturais. 
• Os indivíduos expressam sua sexualidade de várias formas. 
O exercício da sexualidade compreende aprender. Os 
indivíduos expressam sua sexualidade de várias formas. O 
exercício da sexualidade compreende aprender o respeito ao 
corpo, aos próprios sentimentos e aos do outro. 
• Numa sociedade pluralista, as pessoas deveriam respeitar a 
diversidade de valores e crenças nela existentes sobre a 
sexualidade. 
• Todas as crianças deveriam ser amadas e cuidadas. 
• Indivíduos e sociedade se beneficiam quando as crianças são 
capazes de conversar sobre sexualidade com seus pais e/ou 
outros adultos confiáveis. 
• Todas as decisões sexuais têm efeitos ou consequências. 
• Todas as pessoas deveriam fazer escolhas sexuais res-
ponsáveis. 
• Explorar a própria sexualidade faz parte da busca do bem-
estar sexual. 
• Relacionamentos sexuais nunca deveriam ser coercitivos ou 
exploradores. 
 
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• Pessoas jovens que têm relacionamentos sexuais precisam 
ter acesso a informações e programas de saúde de 
qualidade. 
 
METODOLOGIA PARA UM TRABALHO DE ORIENTAÇÃO SEXUAL 
 
Quando este texto sobre Metodologia foi escrito para o Guia, 
ainda não haviam sido editados os Parâmetros Curriculares Nacionais 
(PCN) do MEC. 
Nos PCN já está incorporada a Orientação Sexual como tema 
transversal além de indicada a pertinência do espaço específico para a 
temática da sexualidade. 
Os critérios para a eleição dos temas transversais consideraram 
sua urgência social, abrangência nacional, possibilidade de ensino e 
aprendizagem no nível fundamental e para possibilitar aos alunos 
melhor compreensão da realidade e da participação social. Ética, 
Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Trabalho e Consumo 
são os outros temas transversais contemplados nos PCN. 
Os temas transversais devem perpassar todos os conteúdos 
curriculares, sendo trabalhados em todas as disciplinas do ensino 
fundamental. 
A Orientação Sexual nos PCN incorporou ainda a ideia de eixos 
básicos de conteúdo. A saber: Corpo - Matriz da Sexualidade, 
Relações de Gênero e Prevenção das DST/AIDS. 
Esses três eixos devem ser sempre trabalhados em qualquer 
dos temas da sexualidade, tanto ao se debater um tema escolhido 
pelos alunos no espaço específico, quanto ao abordar algum assunto 
 
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relacionado a uma das matérias do currículo. 
O professor precisa ter sempre em mente a necessidade de 
problematizar questões ligadas ao conhecimento do corpo, erótico e 
reprodutivo, que envolve o prazer e a reprodução, às relações de 
gênero e toda sua importância social, sem esquecer de por em 
evidência a prevenção das DST/AIDS, talvez a questão mais urgente 
de nossa temática. 
O trabalho de Orientação Sexual nas escolas implica 
planejamento e ação pedagógicos sistemáticos, o que envolve 
espaço no currículo escolar. 
Não se trata de fenômeno episódico, como uma palestra ou 
uma semana especial de atividades, mas de abrir o canal para o 
debate permanente com crianças e adolescentes acerca das 
questões da sexualidade. 
A contrapartida é o estudo e a preparação contínua dos 
educadores envolvidos na tarefa, com trabalho de supervisão 
sistemática por especialistas ou profissionais com maior experiência 
na área. 
Os pais devem ser informados sobre os pressupostos e objetivos 
do trabalho de Orientação Sexual, o que pode ser feito por meio de 
reuniões, entrevistas ou comunicações por escrito. 
A compreensão dos pais sobre a importância do trabalho com a 
sexualidade infantil e adolescente fortalece o trabalho de Orientação 
Sexual e pode abrir novas perspectivas de diálogo na própria família. 
A Orientação Sexual deve começar quando a criança entra na 
escola e se desenvolver ao longo de toda a seriação escolar. Na Ed. 
Infantil e nas três primeiras séries do Ensino Fundamental, não se 
 
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estrutura com horários específicos, nem se constitui numa matéria. Ela 
atende à demanda natural da criança e depende da capacidade de o 
professor perceber as manifestações da sexualidade infantil, para 
poder lidar adequadamente com elas. 
O trabalho de Orientação Sexual com crianças é integrado às 
atividades diárias em situações como jogos, histórias, exercícios ou 
estudo do meio. 
Enfim, inúmeras situações aparecem, ou podem ser 
aproveitadas, para o trabalho de Orientação Sexual de crianças. A 
experiência mostra, porém, que isso só ocorrerá: 
a) se o professor se sentir tranquilo para abordar a sexualidade; 
b) se o professor estiver em contato permanente com a questão da 
sexualidade, lendo, estudando, debatendo; 
c) se houver respaldo da escola para esse tipo de trabalho - apoio da 
direção, equipe técnica e de colegas. 
Assim, apesar do fato de o trabalho não se estruturar 
formalmente para a criança, há a necessidade de que ele seja 
sistematicamente desenvolvido pelos educadores. 
A quarta série do Ensino fundamental já comporta a estruturação 
do conteúdo de Orientação Sexual. É nessa série que se costuma 
estudar, em ciências, os aparelhos do corpo humano. 
É um bom momento para, ao abordar o aparelho reprodutor, se 
ampliar a discussão para as inúmeras questões ligadas à concepção, 
gravidez, parto, às diferenças entre o corpo do homem e da mulher, às 
mudanças puberais que já estão acontecendo, sobretudo com as 
meninas, e tudo o mais que aparecer na conversa. 
A utilização de materiais concretos (vídeos, ilustrações, bonecos 
 
�� 
etc.) é um bom estimulador para a participação das crianças. O mais 
importante, no entanto, é a disposição interna do professor para ser 
perguntado. Sua maior ou menor disponibilidade será infalivelmente 
captada pelas crianças. Aqui, portanto, ainda não se trata de estruturar 
uma nova matéria, mas já se coloca a questão de planejar algumas 
aulas específicas. 
Da quinta série do Ensino Fundamental até a terceira série do 
segundo grau, impõe-se maior estruturação do trabalho. Não existe 
uma programação prévia a ser seguida; o programa a ser dado 
precisa ser montado com base na livre escolha dos alunos. A partir do 
levantamento de temas, perguntas, dúvidas ou sugestões dos alunos. 
Nada impede que o professor também sugira temas, acrescente 
coisas, desde que elas estejam relacionadas ao interesse dos alunos. 
As informações biológicas devem ser garantidas pelo professor e 
permear as discussões. Sempre que se forme um grupo de alunos 
para a discussão sobre a sexualidade,é importante que se 
estabeleça um contrato, antes de se iniciar o levantamento dos 
temas. 
O contrato é um conjunto de regras estabelecidas pelo grupo 
para reger o seu funcionamento, através das quais se obtém o 
compromisso dos alunos com relação ao bom andamento do 
trabalho. 
É preciso garantir a ética do trabalho, por parte dos alunos e do 
professor. O compromisso do educador deve ser o de manter sigilo e 
respeito por todas as manifestações dos alunos, sem levá-las ao 
conhecimento de outros colegas, pais, diretores ou orientadores, nem 
utilizá-las de nenhuma forma, para avaliar ou punir o aluno. 
 
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 Os alunos também devem se comprometer com o sigilo, 
acatando as diferentes formas de participação. O clima deve ser o 
mais aberto e respeitador possível. Todos precisam se sentir à 
vontade para manifestar suas ideias e opiniões, saber que serão 
ouvidos e respeitados pelos colegas. Assuntos polêmicos e delicados 
costumam propiciar debates acalorados, mas ninguém tem o 
monopólio da verdade nem o direito de fazer "chacota" ou "fofoca" 
com as opiniões alheias. 
A postura do professor é de condutor do debate, propondo 
atividades, levantando questões, problematizando o tema, 
completando com dados e informações que ajudem a reflexão dos 
alunos. 
Pequenos textos ou vídeos que abram a discussão, trabalho 
em subgrupos, assim como exercícios ou jogos, podem ser meios 
de conduzir um programa de Orientação Sexual. 
A dramatização de situações é um recurso particularmente 
interessante para possibilitar a vivência e a reelaboração de 
conceitos, bem como a discussão de tabus e preconceitos. 
Aulas do tipo expositivo cabem, às vezes, na forma de um 
diálogo com os alunos, abrindo novas perspectivas, sistematizando 
a conversa ou lançando novos questionamentos e buscando sempre a 
participação dos alunos. 
O professor pode estimular a realização de pesquisas pelos 
alunos, não só para colher a opinião da comunidade, mas também 
para que sistematizem informações científicas. Técnicas participativas, 
de todos os tipos, são a base dessas discussões. 
Os temas ligados à compreensão do corpo devem ser 
 
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abordados para além das noções de um organismo, evitando a 
fragmentação. 
O corpo humano, como sede de sensações, desejos e emoções, 
a imagem que se tem dele e sua relação com a identidade de gênero, 
precisa ser percebido pelos alunos além de seus aspectos anatômicos 
e fisiológicos. Por isso, sempre procuramos abordar o corpo como um 
todo integrado e vinculado ao psiquismo e à sua construção 
sociocultural. Assim, a partir dessa visão, quando se discutir, por 
exemplo, os órgãos genitais, os alunos terão em mente uma visão 
integrada e não-fragmentada. 
A grande maioria dos temas trata de questões polêmicas, 
envolvendo valores e comportamentos, onde muitas alternativas são 
possíveis, cabem muitas verdades e os conhecimentos disponíveis 
são pontos de partida e não de chegada. 
O que se pretende é que o aluno seja capaz de elaborar res-
postas às suas próprias dúvidas, questionamentos e angústias, a partir 
do debate aberto e democrático de todos os assuntos relacionados à 
sexualidade humana. 
Nos temas polêmicos, não se espera que os alunos cheguem a 
um consenso, mas que ampliem a própria visão acerca do assunto. 
Pensando, discutindo e refletindo regularmente sobre a sexualidade, o 
aluno estará mais bem-preparado para lidar com suas questões 
pessoais, sem precisar tratar diretamente delas em sala de aula. 
Nas discussões sobre Orientação Sexual, os temas são tratados 
em tese, sem a personalização da conversa. Passam pela vivência, 
mas não se tomam depoimentos pessoais, grupos de aconselhamento 
ou terapia. 
 
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Os alunos expressam seus pensamentos, ideias e opiniões a 
respeito dos temas de seu interesse, mais do que sobre seus 
problemas, desejos ou preferências sexuais. Abrir espaço, vivenciar 
situações, trocar ideias, repensar: é isso o que se quer num trabalho 
que certamente, por seu significado para o jovem, tem efeitos 
terapêuticos. Sua estrutura e metodologia, porém, situam-se clara-
mente no campo pedagógico. 
Não cabe ao professor virar conselheiro ou confidente dos 
alunos nem misturar os papéis, tentando fazer psicoterapia ou 
consulta médica na escola. O que pode caber a ele é encaminhar o 
aluno aos serviços ou profissionais especializados, quando isso se 
fizer necessário, e garantir um importante trabalho preventivo, in-
vestindo num processo pedagógico cuidadoso e bem-planejado. 
 
Sexualidade e Afetividade 
 
 Quando refletimos a partir da suposição Walloniana, que tem se 
revelado fecunda, de que o desenvolvimento pessoal resulta de uma 
trama em que se cruzam e se constituem inteligência e afetividade, a 
sexualidade aparece como um componente desta última, e, por 
conseguinte, também penetrada e modificada pela evolução cognitiva. 
 A vida afetiva progride no sentido da incorporação de elementos 
elaborados pela inteligência. Ao amor “epidérmico”, única forma 
possível de manifestação afetiva durante os primeiros anos, vem se 
acrescentar uma forma de amor que poderia ser qualificada de 
“cognitiva”: em algum momento do desenvolvimento humano, amar 
começa a se confundir com conhecer, e é o que garante ao educador 
 
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a possibilidade de exercer o seu ofício, único trabalho no qual o amor 
pelo objeto é uma exigência sine qua non. 
 Condenado a “amar” todos aqueles a quem tiver a pretensão de 
ensinar. 
Ele estaria fadado ao insucesso se o concebesse apenas daquela 
maneira básica, primária, que, sendo por natureza seletiva, implica 
eleger uns e esquecer outros. 
Mas esta forma cognitiva de amor pode ser estendida a todos; 
pode ser colocada como exigência profissional: é possível conhecer a 
todos, saber sobre cada criança os fatos essenciais de sua história de 
vida, das suas condições de vida, do seu projeto de vida. 
 O avanço da inteligência cria exigências cada vez maiores à 
afetividade e, por conseguinte, à sexualidade. As mulheres em seu 
processo de emancipação têm consciência clara desse fato; fazem a 
seus parceiros sexuais exigências de reciprocidade e igualdade de 
direitos e deveres que são da ordem da inteligência e da ética, 
desenvolvendo uma sexualidade profundamente penetrada pela 
racionalidade. Não importa discutir aqui qual o limite dessa 
penetração; é óbvio que ela não se completa, como nunca se 
completa a redução da emocionalidade pela racionalidade. 
 Basta afirmar que a sexualidade não pode ficar, como não fica a 
vida afetiva, em seu conjunto, à margem do desenvolvimento da 
inteligência. 
 Esse é um elemento fundamental para qualquer 
educação/orientação sexual que a escola queria realizar com as 
crianças. É preciso dizer-lhes, lembrar-lhes de que não são feitos 
 
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apenas de libido, que as decisões vitais afetam a pessoa em seu todo, 
e esse todo carrega a inteligência como elemento inerradicável. 
 
Sexualidade e Individualidade 
 
 O desenvolvimento da pessoa não é apenas uma ampliação por 
apropriação: é também uma diferenciação que implica eliminação do 
alheio, do exterior, do “inautêntico”. 
 Seu destino é uma singularidade e uma unicidade que em nada 
se confundem com o isolamento. Realizada na relação interindividual, 
a construção do eu é também a construção do outro; é a sua 
diferenciação recíproca e dialeticamente complementar que permite a 
sua articulação. 
 O ponto de partida da relação eu-outro é a simbiose, estado de 
fusão do eu ainda inexistente num outro também inexistente. Simbiose 
fetal, simbiose alimentar, simbiose afetiva constituem as etapas mais 
arcaicas da pessoa. Um longo e lento processo reduzirá esse estado 
fusional que será periodicamente restabelecido pela sexualidade, 
durante os momentos passionais do enamoramento. 
 A comunicaçãohumana tem, portanto, uma origem e um destino, 
e dois padrões: o contágio afetivo imediato, fusional, empático e a 
refinada articulação possibilitada pelo recorte que dá aos dois pólos a 
nitidez sobre si mesmos. Essa diferenciação é laboriosa, precária, 
dolorida, mas o requinte do produto a que leva resgata o conflito que é 
o seu mecanismo constitutivo. 
 Diferentes momentos do processo darão a ele diferentes 
conteúdos: “isto sou eu, isto não sou eu”; “este é o meu querer”, “isto é 
 
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o que eu penso, isto é o que você pensa”. Recorte corporal, recorte 
afetivo, recorte cognitivo: o mesmo processo, ao se refazer em outro 
plano, leva a batalha interpessoal para novos campos. 
 Quando a puberdade e a exacerbação pessoal que ela provoca 
ocorrem em um ambiente cultural complexo e heterogêneo, o conflito 
se estenderá a todas as áreas do conhecimento sobre as quais se 
torne necessário tomar posição. Um eu religioso, político, ideológico, 
profissional, ético, estético (musical, literário etc.) precisará se 
constituir, e a energia solicitada é tão grande que pode não bastar, 
deixando muitos setores presos ao estado anterior. 
 Um esforço deste faz da puberdade e da adolescência um 
momento central de auto-elaboração. Essa maneira de concebê-las dá 
à experiência sexual precoce um tom de antecipação sobre si mesma. 
Se a “economia sexual”, para usar a expressão reichiana, supõe um 
envolvimento psicossomático, isto é, da pessoa inteira, então será 
preciso esperar por um acabamento mínimo da pessoa para que se 
torne possível a experiência sexual satisfatória. 
 O namoro juvenil parece frequentemente corroborar essa 
hipótese: as longas confidências trocadas, os intermediários que 
parecem cumprir a função de manter os parceiros certa distância 
cautelosa. Mais do que exercer diretamente a sexualidade, parece ser 
função da adolescência nas culturas heterogêneas e complexas, dar 
acabamento ao eu, o que é sinônimo de dar expansão ao eu. Assim, a 
tarefa evolutiva é de ordem afetiva em sentido geral, mais do que 
sexual em sentido restrito. 
 
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 Se isso for verdadeiro, a incumbência adulta principal deve ser 
entendida como uma contribuição para o alargamento da pessoa, que 
se faz, nesse momento, no plano do conhecimento. 
 Eis a escola recolocada em função cognitiva, agora recoberta de 
um sentido novo, e confrontada com a tarefa de ensinar a sujeitos que 
se supõe interessados, acima de tudo, em si mesmos. 
 
A sexualidade nos dois Primeiros Anos de Vida: as Primeiras 
Manifestações, a importância dos Pais e a Aquisição das 
Identidades Sexual e de Gênero 
 
 Atualmente, admite-se que a sexualidade se manifesta desde o 
início da vida e se desenvolve juntamente com o desenvolvimento 
geral do indivíduo. 
 Desde a concepção, o embrião sofre uma diferenciação genética 
(que divide os indivíduos em (XX e XY), proporcionando uma 
diferenciação gonádica (o desenvolvimento dos ovários nos 
indivíduos XX e dos testículos nos indivíduos XY) e caracteriza o 
somático feminino e masculino definindo os genitais internos e 
externos, assim como os ditos caracteres sexuais secundários dos 
indivíduos (no decorrer do desenvolvimento) (Canella e Nowak, 1997). 
 De acordo com alguns autores, as manifestações sexuais 
iniciam-se antes do nascimento. Ereções penianas já foram captadas 
por exames de ultra-som, contudo, após o nascimento, é comum 
observar estas manifestações sexuais reflexas em meninos. 
 Portanto, do ponto de vista fisiológico, os tecidos e as fibras 
nervosas do pênis e da vagina estão suficientemente formados para 
 
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que, desde o primeiro ano de vida, possam ocorrer ereções do pênis e 
lubrificações vaginais, de maneira espontânea ou como posta à 
estimulação tátil (na troca de fraldas ou no banho)(Lopez e Fuertes, 
1992). 
 Estes autores também afirmam, que desde o nascimento, existe 
a capacidade de sentir o prazer. Porém, neste momento, todas estas 
características sexuais infantis ainda não são reações aprendidas, 
mas parte de uma herança biológica (Kaplan,1983). 
 Estas primeiras manifestações sexuais ocorrem juntamente com 
uma importante fase da sexualidade infantil que reside nos primeiros 
contatos do recém-nascido com o seu novo mundo. Esta experiência é 
decorrente da convivência com os pais, que serão os primeiros 
mediadores dessa nova realidade, especialmente a mãe. Segundo 
Gherpelli, Buralli e Rosenburg, a família é em primeira instância, o 
elemento formador da criança. Os pais, desde muito cedo, se 
encarregam da responsabilidade de educar sexualmente seus filhos, 
de maneira informal, passando seus valores culturais e suas crenças, 
no trato do dia a dia com a criança. 
 É nesta fase inicial espontânea, onde ocorre a intimidade entre 
pais e filhos, através de carinhos, abraços e afagos. Essa ligação 
física, entre o bebê e seus pais, começa com o nascimento e estende-
se através da amamentação, do trocar, do vestir, dar banho, entre 
outros. Segundo Masters e Johnson, a criança que for privada destes 
estreitos laços físicos e afetivos durante a infância, poderá vir a ter 
dificuldades de relações íntimas, e especulativamente, em se 
relacionar de modo despreocupado com sua própria sexualidade. 
 
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 As respostas dos pais frente aos precoces sentimentos sexuais 
do bebê são variados. Muitas vezes o ato da amamentação causa 
excitabilidade no menino pela intensa estimulação neurológica, bem 
como, a sensação de estar aninhado e sentindo o calor do corpo da 
mãe. Esta combinação, envia ao cérebro mensagens que são 
interpretadas como sensações de prazer e ativam os reflexos sexuais. 
A reação dos pais a estas manifestações pode soar como um alarme 
diante de uma possível anormalidade. Estes tipos de sentimentos 
podem também ocorrer com outros sinais de ativação sexual reflexa 
como no trocar fralda, passar talco, dar banho e nas brincadeiras. 
 Um dos problemas do não reconhecimento destas questões 
sexuais infantis consiste na perspectiva adulta sobre estes fatos. 
Como salienta Martinson, “a criança é pequena demais para ter 
consciência do encontro, de modo que não se pode dizer que foi 
despertado um erotismo sócio-cultural”. É importante perceber que as 
atividades sexuais infantis podem basear-se em motivações muito 
diferentes das dos adultos. Existe clara diferença motivacional entre 
adultos e crianças. 
 “Os estímulos externos que para o adulto tem um significado 
erótico não são objetos de atração sexual durante a infância, ou, pelo 
menos, não são de modo tão claro e consistente. Na infância, a 
atração por outras pessoas é antes uma atração afetiva do que sexual. 
O desejo e a atração especificamente sexuais só ocorrem na infância 
de modo muito confuso. Os estímulos táteis sobre o próprio corpo são 
os que têm maior poder evocador de respostas fisiológicas sexuais” 
(López e Fuerets, 1992). 
 
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 Além desta perspectiva adulta sobre a sexualidade infantil, por 
sentimentos de culpa advindos da moral ou por preceitos religiosos, 
algumas mães chegam a rechaçar os importantes primeiros contatos 
constitutivos dos filhos, por achar estar praticando incesto ou algo 
deste tipo. 
 Segundo Masters e Johson (1988), alguns pais já encaram o 
desenvolvimento da sexualidade de seus filhos de maneira mais 
objetiva e com maior aprovação. Por vários motivos, alguns outros 
pais sentem desconforto diante de qualquer forma de interesse ou 
comportamento sexual por parte dos filhos. Preocupam-se que haja 
anormalidade, ou não sabem como lidar com o fato, ou tem conflitos 
sexuais internos próprios. 
 Independente do modo de agir dos pais em relação à 
sexualidade das crianças, a família em sua versão tradicional, 
desenvolve as funções de impor a própria autoridade, controlando a 
sexualidade dos filhos e apresentando-se como modelo ideal de 
comportamento sexual. Na verdade,não existe muita escolha por 
parte da criança, já que ela depende deste sistema para se humanizar. 
 Retornando ao bebê, com o desenvolvimento e a maturação do 
sistema nervoso central, e com a gradual aquisição da coordenação 
motora, a criança se lança, à descoberta do seu corpo e dos prazeres 
que este lhe proporciona. 
 Assim que um bebê, seja menino ou menina, consegue controlar 
suas mãos, vai procurar os órgãos genitais. Ele aprende a fazer isso, 
já como foi dito, porque estes órgãos estão diretamente ligados ao 
centro de prazer no cérebro. 
 
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 No terceiro ou quarto mês de vida, a estimulação genital é 
acompanhada por sorrisos e murmúrios, e com um ano de idade, é 
comum observar a brincadeira com os órgãos genitais quando a 
criança está sem roupa ou tomando banho. 
 Segundo Vitiello e Conceição (1995), terminado o processo de 
controle dos esfíncteres, a criança conclui a fase de conhecimento do 
seu corpo e das descobertas por ele proporcionado. 
 
Adolescência e Conhecimento 
 
Para ensinar adolescentes é preciso transformar o conhecimento 
em caso pessoal, fazer o que se propõe chamar de “subjetivação do 
conhecimento”. E muitas vias se abrem na busca de realização desse 
propósito. A primeira e mais óbvia é a criação de uma vinculação 
interpessoal entre professores e alunos, suscetível de contaminar o 
conteúdo que aqueles representam. 
A diferenciação ainda inacabada nessa fase entre sujeito e objeto 
justifica a suposição de que um elo positivo com o professor de 
matemática por exemplo, tende a criar uma disposição positiva em 
relação à matemática, e assim por diante. Realizar a tarefa surge, 
então, como forma de presentear alguém amado. 
 Outra possibilidade, provavelmente a que tem sido mais 
explorada, aponta para a busca de vinculação entre o conteúdo 
proposto e a vida cotidiana do aprendiz. É uma forma de 
“personalização” do ensino que implicitamente admite como correta a 
 
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concepção de Ortega y Gasset (1983) de que conhecer algo é saber o 
que tem a ver “comigo”, com aquele que conhece. 
 Um procedimento que poderia ser chamado de histórico-
psicológico é uma outra possibilidade. A partir da constatação de que 
todas as leis e princípios científicos que se apresentam agora como 
abstratos e impessoais foram o resultado da descoberta pessoal de 
alguém, de algum cientista específico, trata-se de um ensino que 
apresente os problemas como questões que se colocaram em algum 
momento para alguém e resultaram em um insight; induzindo a 
identificação do aprendiz com o investigador, poderia levá-lo a 
acompanhar e reconstruir como sua descoberta. 
 O problema da puberdade e da adolescência inicial não é 
estritamente o de dar destino às pulsões biológicas: é o de definir uma 
individualidade que se constrói, nesse momento, por expansão cultural 
e exige, por isso, um enorme investimento nessa direção, um grande 
esforço. 
 
Sexualidade e Escola 
 
 As duas vias, empírica e teórica, levam à conclusão de que a 
escola é o espaço da não-sexualidade. Não apenas nela vigora, 
explícita ou implicitamente, a interdição a qualquer manifestação da 
sexualidade, como também dela emanam, inevitavelmente, 
recomendações tendentes ao adiamento do seu exercício. 
 A ambígua educação sexual que ainda não conseguiu, nem 
sequer em nível de informação, introduzir-se generalizadamente no 
 
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espaço escolar, hesita ainda mais em assumir um caráter de 
verdadeira “orientação sexual”. 
 Tanto Wallon quanto Erikson nos encaminham à conclusão de 
que o problema maior da adolescência é o da construção da própria 
individualidade, quadro geral no qual se inscreve a sexualidade. 
 Por outro lado, a observação do cotidiano escolar indica que a 
instituição escolar entre nós, de maneira geral, é tão hostil às 
manifestações da individualidade quanto às da sexualidade. 
 Isso ocorre desde os anos em que se constituem as bases do eu 
até os anos pubertários e juvenis em que ele se amplia e fortalece. 
As instituições de educação infantil, creches e pré-escolas 
adotam, com frequência, procedimentos despersonalizadores que 
fazem lembrar os das instituições totais descritas por Goffman (1969): 
uniformes, filas, horários impessoais para realizar todas as atividades, 
ausência ou indução de objetos pessoais, a mediação permanente do 
adulto que distribui, sempre de maneira impessoal, material lúdico e 
de trabalho. Espaços vazios, impessoais, neutros: ainda é essa a 
paisagem dominante. 
 A escola mantém o aspecto de platéia de cinema, com todas as 
carteiras voltadas para o cenário da ação do professor: o pressuposto 
é que a classe é o lugar onde todos fazem sempre a mesma coisa, 
durante o mesmo tempo. A possibilidade de diferentes atividades 
ocorrendo simultaneamente, em um mesmo espaço, parece assustar 
os educadores. 
 Se entendermos que a função da escola é construir 
individualidades (identidades), e é dessa maneira indireta que dará 
 
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sua contribuição ao amadurecimento da sexualidade juvenil, uma 
enorme transformação precisa ser realizada no seu interior. 
 Intimidade é ainda um componente inteiramente ausente na 
concepção de escola. Toda ela está concebida em torno da situação 
pública da sala de aula, como se a idéia de “social” se confundisse 
com a de “coletivo”, e a dualidade escapasse daquela noção. Os 
horários de permanência dos professores supõem sempre reuniões 
pedagógicas de planejamento, mas que excluem sempre a 
possibilidade de encontros interindividuais. E, no entanto, é fácil 
constatar que muitas das dificuldades do cotidiano escolar, quer de 
ensino, quer disciplinares, não se resolvem no espaço coletivo, 
exigindo um tratamento privado. 
 Provavelmente, um dos maiores talentos necessários para lidar 
com adolescentes é a capacidade de ouvi-los, de entrevistá-los 
empaticamente. Quando isso acontece, fluem opiniões 
surpreendentes, sugerindo que a imagem do “adolescente superficial” 
é, ela própria, uma visão superficial. 
 Na intimidade, gera-se a cumplicidade, forjam-se alianças. 
Inexplicavelmente, ela se mantém circunscrita à sala de orientação 
psicológica. 
 Parece utópico a ideia de uma escola que reservasse uma parte 
do tempo à livre utilização dos equipamentos: biblioteca, ludoteca, 
quadras, filmoteca, laboratórios. Lazer e escola parecem tão 
incompatíveis como sexualidade e escola. 
Se utilizarmos uma concepção da psicogênese, como a Walloniana, 
que supõe a reciprocidade da construção das duas dimensões 
(afetividade, em que se insere a sexualidade, e inteligência), então 
 
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será necessário concluir que a melhor contribuição da escola consiste 
no exercício competente da sua própria função, que é cognitiva. 
Cabe-lhe realizar o adequado manejo das condições afetivas do 
desenvolvimento das inteligências, assim como dar lugar, no plano 
das relações interpessoais, para o exercício das possibilidades novas. 
Afinal a “utopia sexual, supõe não apenas condições históricas e 
sociais, mas também um desenvolvimento pessoal avançado”. 
 
Saber o Sexo? 
 
Os problemas da informação sexual e o papel da escola 
 
 No final do século XX, as informações sobre a sexualidade 
correm (à) solta entre os jovens por meio de vários veículos entre eles 
a escola. 
 Há muito tempo a escola veicula as informações biológicas sobre 
a sexualidade. Na disciplina ciências ou biologia, um dos objetivos é o 
de o aluno conhecer a anatomia e a fisiologia do corpo humano. 
O aparelho reprodutor é apresentado pela primeira vez para as 
crianças que chegam a cursar a terceira série do Ensino Fundamental. 
Nesse momento, o tema aparece na grade curricular como conteúdo 
mínimo e obrigatório a ser abordado. 
 Dentro da disciplina biologia, o aparelho reprodutor vai sendo 
apresentado cada vez com um número maior de informações e grau 
de complexidade, de talmodo que, ao terminar o Ensino Médio, o 
jovem deveria estar dominando quase perfeitamente o funcionamento 
 
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desse aparelho. Apesar do que imaginam e afirmam muitos, não é o 
que acontece. Os jovens têm a ilusão que sabem. 
 Por quê? Por acaso algum aluno que completa a quarta série do 
Ensino Fundamental tem alguma dúvida a respeito do resultado de 
uma operação matemática simples qualquer? Ninguém esquece que 
2+2 =4. Depois de aprendida, essa informação é incorporada pelo 
estudante, que vai usá-la em atividades do seu cotidiano. Mas o que 
acontece com as informações preciosas para a vida prática dos 
jovens, sobre o corpo, no que diz respeito à sexualidade? 
 Consideremos os principais elementos que participam dessa 
transmissão: o professor, o aluno, a linguagem que medeia essa 
relação e o local onde esses ensinamentos ocorrem, a escola. 
 Em primeiro lugar, devemos lembrar que muitos professores, 
mesmo sem perceber, já ficam incomodados em transmitir esse tipo 
de conteúdo para seus alunos. Não é difícil que, na apresentação dos 
aparelhos constitutivos do corpo humano, o reprodutor seja o último da 
sequência, o que significa que o professor pode terminar o ano letivo 
sem cumprir a tarefa. 
 Mas por que tal dificuldade? Começa pelas reações dos alunos 
ao assistirem a tais aulas: sorrisinhos maliciosos, piadinhas, 
burburinho geral, perguntas. Perguntas indiscretas que ultrapassam o 
saber da biologia. O professor de biologia passa poucas e boas ao 
tentar ministrar com tranquilidade essas aulas. Além disso, ele mesmo 
tem sua própria concepção, convicções e valores sobre a vida sexual, 
incluindo-se aí a moral e os preconceitos. 
 Em segundo lugar, temos os alunos com sua vida interna, suas 
convicções, curiosidades, seus anseios, medos e desejos sobre a vida 
 
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sexual, entre eles alguns percebidos, compreendidos, e outros nem 
tanto. E isso faz com que cada informação que lhes é transmitida 
passe por um processo de transformação antes de ser incorporada, 
para ser compreendida e utilizada como conhecimento efetivo. 
 Em terceiro, temos a linguagem que, sempre, além de expressar 
um pensamento, veicula também um estilo: o de quem fala. 
Raramente o estilo muito particular de quem ouve é considerado. 
Finalmente, temos a escola com seu corpo de regras e normas sobre 
as condutas sexuais, que se constituem em uma proposta nem 
sempre clara (ao contrário, muitas vezes contraditória) de educação 
sexual. 
 Combinados todos esses ingredientes podemos ter uma salada 
que pode acabar provocando um terrível mal-estar e um grande 
engano: o de que quaisquer informações sobre a sexualidade que são 
veiculadas na escola têm valor educativo. 
 
Informação versus informação educativa 
 
 Em tempos de AIDS e do crescimento da gravidez precoce, 
levada ou não a termo, em tempos em que os jovens iniciam muito 
cedo a prática sexual, pais e educadores preocupam-se em municiar 
os adolescentes, o mais cedo possível, do maior número de 
informações que, eles imaginam e julgam, devam ser devidamente 
utilizadas por eles pela vida afora. 
 Muitas escolas, conscientes de sua responsabilidade social e/ou 
pressionadas pelos pais, estão procurando colocar em prática a 
 
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chamada “orientação sexual”. E os jovens, a cada dia que passa, mais 
informações recebem sobre o assunto. 
 E o que fazem com elas? Por que esta geração, que é, talvez, a 
que mais dados tem sobre o corpo, o aparelho genital e o seu 
funcionamento, abriu um espaço enorme entre o saber e o agir? O 
índice de natalidade entre jovens de 14 a 19 anos cresceu nos últimos 
vinte anos, e esse é apenas um dos indicadores da distância que 
existe entre o acesso às informações e a utilização delas. 
 A primeira questão que se levanta a partir desses dados é que a 
forma como estão sendo veiculadas essas informações está fazendo 
com que elas sejam inócuas, irrelevantes, esquecidas, deturpadas ou, 
pior, nefastas. 
 O que diferencia uma informação de uma informação educativa? 
Simples: o reconhecimento do interlocutor a quem se dirige a 
informação. 
 Quem é esse adolescente, afinal, que precisa ter os 
conhecimentos necessários a respeito da sexualidade e usá-los? Em 
primeiro lugar, é uma pessoa que passa pela maturação sexual 
fisiológica e que, portanto, sofre uma mudança radical, se bem que 
lenta, em seu corpo, o qual se torna um desconhecido para ele 
mesmo. 
 Em segundo lugar, alguém que está submetido a vários tipos de 
excitações sexuais, tanto internas quanto externas: as do meio em que 
vive, as orgânicas, e as psicológicas, de seu mundo interno. 
 Em terceiro, uma pessoa que, no trajeto de um caminho que é 
travessia, se esforça para não viver apenas respondendo aos anseios 
dos pais e adultos que o rodeiam, o que ganha o nome de “conflitos de 
 
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gerações”. E, mais importante, uma pessoa que quer falar, que quer 
viver e que, muitas vezes, não se dá conta do quanto ainda terá de 
vida pela frente. 
 Então, como dar a qualidade educativa às informações sobre a 
sexualidade dirigidas a essas pessoas considerando essas 
características e outras ainda, como a classe social e econômica, o 
meio cultural, familiar e regional? A prática saudável da sexualidade 
supõe a conjunção de vários fatores: o funcionamento do corpo, os 
valores sociais, éticos e morais do meio social em que vive a pessoa, 
as leis culturais e a estrutura psíquica. 
Assim, as informações puramente orgânicas, adquiridas nas 
aulas de biologia, por exemplo, dizem sempre respeito ao corpo de um 
sujeito teórico, objeto de estudo das ciências, que não vive, não tem 
história, não deseja, não fala, não sofre, nem vive a angústia de 
crescer. Jamais serão utilizadas pelos jovens em sua vida sexual 
concreta. 
As informações sobre a sexualidade só serão educativas quando 
tiverem o endereço postado corretamente. E com o remetente 
identificado e devidamente qualificado. 
 
As atuações da escola 
 
 Não há dúvida alguma de que a escola desempenha uma função 
na educação sexual de seus alunos. O grande problema é que os 
seus representantes diretos entre os jovens, os professores, nem 
sempre se dão conta disso em suas ações individuais e/ou coletivas. 
 
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 Como toda instituição, a escola tem seu corpo de regras, quase 
nunca explícitas e compartilhadas por todos os seus representantes, a 
respeito dos comportamentos dos alunos que expressam a 
sexualidade. Como o assunto é incômodo, complexo e não faz parte 
do conteúdo obrigatório, raramente é discutido pelo grupo dos 
educadores. Mas o que se verifica, no dia-a-dia, é que os alunos o 
tornam obrigatório em sala de aula. 
 Respondendo a essa demanda, cada professor faz o que pode. 
E o resultado é que, em geral, cada um age de acordo com sua 
experiência pessoal e disponibilidade, norteado, geralmente por 
informações colhidas em breves cursos, palestras ou leituras 
realizadas por interesse próprio, e a sempre presente boa intenção. 
 Esse tipo de atitude pode ter ressonância zero entre os alunos, 
dependendo do tipo de relação que eles tenham com o professor. Mas 
isso não é o pior: pode funcionar como um verdadeiro ato terrorista na 
tentativa, ingênua muitas vezes, de limitar algumas ações da vida 
sexual consideradas perigosas para os adolescentes. 
 Para ilustrar, observe a resposta de uma professora a uma 
adolescente de 14 anos, que lhe perguntou o que era aborto. “É o 
assassinato de um filho”, foi a resposta pronta e apaixonada da 
professora. Na sua compreensão, essa resposta poderia auxiliar a 
garota a usar algum método anticoncepcional seguro quando 
praticasse o sexo; duplo engano: primeiro, o da crença de que a 
informação sexual moralizante possa inibir algum tipo de ação, e, 
segundo, o de creditar à jovem estudante uma conclusão que era 
ansiada pela professora mas não contida na perguntada aluna. 
 
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Qual a resposta correta? Com toda a objetividade possível, o aborto é 
a interrupção da gravidez. Apenas isso. Mas a pergunta poderia 
significar um pedido não ouvido pelo adulto, de estabelecer um diálogo 
a respeito do assunto. A resposta da professora teve um efeito: o de 
calar a boca de quem queria falar. 
 Algumas escolas, já atentas ao problema, se esforçam em 
encontrar serviços de orientação sexual com profissionais preparados 
para tal. Mas, quase sempre essas atuações alcançam um grau de 
êxito que aos poucos vai se diluindo e se perdendo no tempo, por não 
se constituir em um processo. Os profissionais da área sabem que 
apenas um trabalho que tenha continuidade pode ter resultados 
efetivos. 
 O trabalho do dia-a-dia na escola é realizado pelos professores, 
que mantêm com os alunos uma relação de grande proximidade. São 
eles, portanto, os profissionais que poderão contribuir efetivamente 
para que seus alunos tenham uma visão positiva e responsável da 
sexualidade. 
 
O papel da Escola 
 
Existe nas escolas um estereótipo que o professor de biologia é 
o mais indicado para as demandas dos alunos com as questões da 
sexualidade. 
É compreensível que quem trabalha com o aparelho reprodutor, 
com o corpo, seja alvo de perguntas indiscretas dos alunos, mas nem 
sempre esses profissionais têm disponibilidade ou querem realizar 
essas tarefas. Se o professor tem disponibilidade, sua área de 
 
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conhecimento pouco importa. Se ele pode estabelecer uma relação de 
confiança com os alunos sem criar cumplicidades; se ele consegue 
suspender seu juízo de valor quando conversa com os jovens; se ele é 
capaz de ouvir antes de falar, sempre mantendo a posição de 
assimetria com os alunos, requisito indispensável para que a angústia 
do jovem se expresse, os conhecimentos necessários para o bom 
exercício do trabalho serão adquiridos com facilidade. 
Os alunos trazem de casa valores, conceitos e preconceitos que 
estão colocando em xeque e, claro, solicitando sutilmente que os 
professores os auxiliem a ter condições de provocar choques. 
Para tanto, a parceria da escola com os pais é fundamental para 
que os esclarecimentos possam fluir, sem provocar grandes conflitos. 
Nem todos os pais conseguem ver que seus filhos cresceram e que já 
podem e querem saber de “certas coisas”. 
A escola pode, e deve, auxiliar os pais a deixar de praticar a 
política do avestruz. Parceria nem sempre significa concordância, o 
que não deve impedir o desenvolvimento do trabalho, desde que a 
escola saiba entender a angústia dos pais e suportá-la, sem criar 
impedimentos a partir disso. 
A escola deve reconhecer que cada família tem seus valores que 
são transmitidos para os filhos. Não cabe à escola competir com a 
família nem ocupar o seu lugar. Ela deve ter o seu papel claramente 
diferenciado e definido. Mesmo cumprindo o seu papel com 
responsabilidade e competência, a escola tem seus limites no trabalho 
de informar os alunos e auxiliá-los a terem seus próprios valores na 
vida sexual, sabendo respeitá-los com coerência. 
 
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Um deles é o de o aluno falar e ouvir em grupo. Ele precisa, 
inclusive aprender a respeitar esse limite, a saber preservar sua 
intimidade, formulando suas dúvidas e questionando conteúdos sem 
se expor, sem colocar sua privacidade em risco. E é nesse limite que 
termina a possibilidade de trabalho na escola. 
Mas isso não significa que professores, orientadores, pais e 
alunos não possam contar com outros veículos auxiliares para 
complementar a formação dos alunos sobre a sexualidade. 
 
A mídia e as informações sexuais 
 
 Sexo vende isso todo mundo sabe. O adolescente quer ler, quer 
saber, conversar a respeito, perguntar, trocar idéias sobre tudo que diz 
respeito a sexo. O mercado de publicações relacionadas a sexo 
cresce a cada dia. Mas é preciso saber o que há de aproveitável nisso. 
 É preciso rigor científico, preparo profissional e formação pessoal 
para falar com adolescentes sobre sexo. 
É preciso também utilizar uma linguagem dirigida ao jovem. Não 
se trata de falar ou escrever em linguagem coloquial ou em usar gírias. 
É preciso que o estilo lhes seja íntimo, para que possam ouvir, sem 
deixar a posição de adulto e entrar com eles em um jogo de sedução. 
 Todos sabem o quanto os jovens são cruéis e irônicos nas 
brincadeiras entre si, o quanto são criativos e inesperados em suas 
respostas. Pois esse é o estilo particular deles. E de acordo com esse 
estilo, acima de tudo prazeroso, que eles podem dizer muitas de suas 
verdades e ouvir outras tantas. 
 
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A linguagem aprendida quando criança é o modelo dos pais e adultos 
que, hoje, os adolescentes tentam abandonar como marca de um 
corte. 
Ao entrar na adolescência, o jovem perde o corpo infantil, a 
segurança e a proteção dos pais, mesmo que ilusórias, e inicia o 
contato com a dura realidade: a impossibilidade de ser completo. 
Essa completude nunca existiu na verdade, mas sempre foi imaginada 
na infância, tendo como protagonista complementar principal a mãe. 
 Essa mãe foi quem iniciou a criança no mundo das relações, 
pouco a pouco mediada pela linguagem. Pois essa linguagem, na 
adolescência, é rejeitada por representar tudo o que o jovem não mais 
pode ter. 
Rejeitar que o jovem se expresse em sua linguagem é negar 
uma de suas primeiras tentativas de experimentação na entrada nesse 
mundo diferente, misterioso, excitante e, ao mesmo tempo, perigoso e 
ameaçador da sexualidade adulta. 
O sexo para os jovens, tem caráter de prazer e sacanagem. E 
para que eles possam, realmente ouvir o que precisam, refletir, 
repensar, questionar o que pensam, o que falam e, o que fazem, é 
preciso que isso seja considerado. 
De nada adianta veicular as informações sobre o funcionamento 
do corpo desvinculado do prazer e da sacanagem, pois desse modo o 
jovem continuará do mesmo jeito que estava quando começou a 
leitura. 
É preciso ouvir o que ele pergunta. Nem sempre o jovem entende o 
que se passa com ele e sua sexualidade. Não é preciso compreendê-
lo e sua sexualidade para poder acompanhá-lo em seu caminho. 
 
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 O que precisamos é permitir que ele mesmo se compreenda. 
Para isso, é necessário ouvir nas entrelinhas o que ele quer dizer. As 
melhores respostas às suas indagações são as que, além de passar 
as informações necessárias, vão levar o jovem de volta a si mesmo. 
 O receio de ser indelicado, grosseiro ou vulgar ao tratar as 
questões da sexualidade com os jovens pode acabar reprimindo o que 
estava quase por vir à tona. 
 A maioria das publicações na mídia sobre a vida sexual conta 
com um ponto de partida: as perguntas dos leitores, que chegam aos 
montes. O que significa esse fato? Por que os jovens, mesmo 
privilegiados, que têm pais esclarecidos, acesso a escolas preparadas 
para realizar esse trabalho, leituras e outros recursos mais, insistem 
em dúvidas e demandam respostas? 
 A oportunidade de se reconhecer na mídia, ter sua dúvida 
respeitada, comentada, esclarecida, ser objeto de alguma brincadeira 
e, ao mesmo tempo, ter sua identidade preservada com o uso de 
algum recurso que permite o anonimato são algumas das pistas. 
O jovem reconhece suas palavras e suas dúvidas, sabe que é 
ele e ao mesmo tempo, que ninguém mais sabe. Ele se identifica com 
os problemas, as dúvidas e, especialmente, com a oportunidade de 
contar um fragmento de sua história para muitos desconhecidos. São 
principalmente esses motivos que concorrem para que o que é lido 
possa ser aproveitado como material e absorvido. 
Muitos professores, mesmo que intuitivamente, perceberam o 
valor dessas publicações e as usam com seus alunos como ponto de 
partida de um trabalho a ser realizado por um grupo de jovens 
 
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identificados. E cada um deles sabe que aquela carta, com aquelahistória, bem poderia ser a dele. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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UNIDADE III - ORIENTAÇÃO SEXUAL NA ESCOLA: OS 
TERRITÓRIOS POSSÍVEIS E NECESSÁRIOS 
 
Em todo o mundo, a introdução de educação sexual nas escolas 
se deu através de motivos que iam do combate à masturbação, 
reprodução humana, prevenção de doenças, etc. 
No Brasil não foi diferente, a história da educação sexual tem 
sido marcada por avanços e recuos e por diferentes formas de 
veiculação. Em 1995, o MEC coordenou a elaboração dos 
“Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental”. 
Essa proposta inclui a orientação sexual como um dos “temas 
transversais” a serem abordados no Ensino Fundamental, de forma 
articulada com as disciplinas e outros temas como: ética, saúde, meio 
ambiente e pluralidade cultural. 
 
A orientação sexual: da escola para a vida e vice-versa 
 
 Em sua origem, a educação sexual se caracteriza pelo aspecto 
informativo, biologizante e repressivo às manifestações da 
sexualidade. Em certos períodos teve como objetivo controle da 
natalidade, e, mais recentemente, tem visado associar a idéia do 
prazer à sexualidade. 
 E hoje, como essas questões se colocam? Por que trabalhar 
com educação sexual na escola? E qual concepção adotar? 
 A educação sexual ocorre, na verdade, desde o nascimento. É 
predominantemente no espaço familiar, da intimidade, que são 
transmitidas à criança as primeiras noções e valores associados à 
 
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sexualidade, em geral não explicitamente. O comportamento dos pais 
entre si, na relação com os filhos, no tipo de recomendações, nas 
expressões, gestos e proibições que estabelecem, tudo isso transmite 
os valores que a criança incorpora. 
O fato de a família possuir valores conservadores, liberais ou 
progressistas, professar alguma crença religiosa ou não, e a forma 
como o faz, determina em grande parte a educação das crianças. 
Há ainda a influência de muitas outras fontes: pessoas 
significativas do círculo extrafamiliar, livros, produção artístico-cultural 
e ainda, nos dias de hoje, assumindo um grande espaço, a mídia e a 
escola. 
A televisão veicula novelas, filmes e propagandas intensamente 
erotizadas, revistas e jornais, não raras vezes, estampam material 
fotográfico aludindo à sexualidade. Isso gera excitação e incremento 
na ansiedade relacionada às curiosidades e fantasias sexuais da 
criança. 
 Por outro lado, programas jornalísticos e científicos, campanhas 
de prevenção à AIDS veiculadas na TV enfocam a sexualidade 
dirigindo informações a um público adulto. As crianças também os 
assistem, mas não podem compreender por completo o significado 
dessas mensagens, construindo, por vezes, conceitos e explicações 
errôneas sobre a sexualidade. A mídia atua de forma marcante na 
construção da sexualidade das crianças. 
 A escola também se constitui num importante agente nesse 
campo. Não é apenas nas portas de banheiros, muros, e carteiras que 
se inscreve a sexualidade no espaço escolar. Ela invade por completo 
essa “praia”. As atitudes dos alunos no convívio escolar, o 
 
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comportamento entre eles, as brincadeiras e paródias inventadas e 
repetidas, tudo isso transpira sexualidade. Ao não reconhecer essas 
múltiplas manifestações, é como se a escola realizasse o pedido, 
impossível de ser atendido, de que os alunos deixem sua sexualidade 
fora dela. 
 No cotidiano escolar, quando se proíbe (ou inibe) certas 
manifestações, quando se intervém junto a um aluno que “se 
excedeu”, ou quando se convoca os pais para uma conversa 
reservada, em todas essas situações a escola está produzindo certos 
valores morais, mais ou menos rígidos, dependendo do profissional 
que protagoniza uma dada situação. E é exatamente por reconhecer o 
importante papel da escola na construção dos aspectos concernentes 
à sexualidade que se fundamenta a proposta de que a escola realize a 
denominada orientação sexual. 
 O conceito de orientação aqui adotado é similar ao modelo 
padagógico de não-diretividade, ou seja, a problematização das 
questões trazidas pelos alunos. Trata-se, de um processo de 
intervenção planejado, intencional e sistemático, que inclui o 
esclarecimento das dúvidas, o questionamento das posições 
estanques e a ressignificação das informações e valores incorporados 
e vivenciados no decorrer da vida de cada criança ou jovem. 
 Uma vez que, querendo ou não, a escola interfere na construção 
da sexualidade de cada aluno, a proposta é a de que a escola reflita 
sobre seu papel, e ao abordar esse tema o faça de forma consciente e 
profissional. 
 Há ainda outro aspecto envolvido na importante relação entre 
escola e sexualidade: o desejo de saber. Sabemos que o aprendizado, 
 
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de uma forma geral, está subordinado às primeiras curiosidades 
infantis. 
A não satisfação das curiosidades da criança sobre a 
sexualidade gera tensão e ansiedade na medida em que se 
constituem em questões significativas para cada sujeito e em núcleos 
importantes que impulsionam o desejo de saber ao longo da vida. A 
paixão pelo aprender pode articular-se com o prazer que também é 
vivido no âmbito da sexualidade. A sexualidade, assim como a 
inteligência, será construída a partir das características singulares e de 
sua articulação com o meio e a cultura. 
 Como decorrência, devemos delimitar a atuação do educador, 
situando, portanto, a escola num patamar diferente da família. Coloca-
se também a necessidade de formação específica aos educadores e a 
eleição de princípios norteadores da proposta de orientação sexual. 
 O trabalho de orientação sexual desenvolvido pela escola deve 
diferenciar-se, pois, da abordagem assistemática realizada pela 
família, principalmente no que diz respeito à transmissão dos valores 
morais indissociáveis à sexualidade. 
Se por um lado, os pais exercem legitimamente seu papel ao 
transmitirem seus valores particulares aos filhos, por outro lado, o 
papel da escola é o de ampliar esse conhecimento em direção à 
diversidade de valores existentes na sociedade, para que o aluno 
possa, ao discuti-los, opinar sobre o que lhe foi ou é apresentado. Por 
meio da reflexão poderá, então, encontrar um ponto de auto-
referência, o que possibilitará o desenvolvimento de atitudes coerentes 
com os valores que ele próprio elegeu como seus. 
 
 
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Orientação sexual versus Sexualidade: em busca de 
alguns limites 
 
 A orientação sexual proposta fundamenta-se numa concepção 
pluralista da sexualidade, ou seja, no reconhecimento da 
multiplicidade de comportamentos sexuais e de valores a eles 
associados. 
 Independentemente de sua potencialidade reprodutiva, a 
sexualidade relaciona-se, antes de mais nada, com a busca do prazer, 
necessidade fundamental dos seres humanos. Fruto da cultura, ela se 
expressa com singularidade em cada sujeito. 
 A vivência da sexualidade é estruturante da trajetória pessoal e 
constitui-se na complexa combinação de muitos elementos de cunho 
subjetivo e da relação com o outro. Isso ocorre desde o nascimento, a 
partir da sexuação e da erotização do corpo. Inclui fatores de natureza 
bastante distintas: do aprendizado, da descoberta e da invenção. 
À ordem do aprendizado, especificamente, que é aquela mais 
afeita ao domínio escolar, pertencem temáticas como conhecimento 
do corpo humano e seu funcionamento, a reflexão sobre a diversidade 
de valores existentes na sociedade, o estudo e análise das relações 
de gênero ao longo da história, informações sobre doenças 
sexualmente transmissíveis (a AIDS em particular), sobre formas de 
prevenção etc. 
 Nos trabalhos relativos à orientação, a distinção dos diferentes 
níveis da vivência da sexualidade (o aprendizado, a descoberta e a 
invenção) nos auxilia a delimitar o âmbito de atuação e a concepção 
da orientaçãosexual, pois ela deve claramente se restringir à ordem 
 
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do que pode ser aprendido, não devendo ser invasiva à intimidade de 
cada um ou tentando normatizar e/ou moralizar comportamentos. São 
infinitas as possibilidades de descoberta e invenção na sexualidade ao 
longo da vida, potencialidade esta típica da esfera privada de cada 
sujeito. 
 A orientação sexual na escola deve se dar em âmbito coletivo, 
não tendo portanto caráter de aconselhamento individual ou 
psicoterapêutico. Deve também promover informações e discussões 
acerca das diferentes temáticas considerando a sexualidade em suas 
dimensões biológica, psíquica e sociocultural, articulando-se a um 
projeto educativo que exerça uma ação integradora das experiências 
vividas pelo aluno e que inclua a sexualidade como algo ligado à vida, 
à saúde e ao bem-estar de cada criança ou jovem. 
Faz -se necessária a adoção de princípios norteadores do 
trabalho, condizentes com uma educação voltada para a cidadania 
numa sociedade democrática, priorizando o reconhecimento do 
aspecto saudável da busca do prazer, o respeito a si próprio e ao 
outro, bem como o respeito à diversidade de valores, crenças e 
comportamentos relativos à sexualidade, desde que seja garantida a 
dignidade do ser humano. 
 Outro dado importante é o de que a orientação sexual deve se 
adequar à faixa etária dos alunos, isto é, às suas necessidades e 
capacidades cognitivas particulares. 
De modo geral, da educação infantil até a quarta série do Ensino 
Fundamental, o trabalho ocorre de forma integrada às disciplinas, e 
por vezes, abrindo espaço na programação para abordar um conteúdo 
específico. A partir da quinta série, já se faz necessário um espaço 
 
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específico, pela oferta de hora-aula semanal, incluída na grade horária 
ou não. O ponto de partida é sempre dado pelas questões trazidas 
pelos alunos, às vezes clara e diretamente, às vezes de forma 
encoberta, via brincadeiras e atitudes entre eles. 
 
O profissional: a orientação sexual em ato 
 
 Muitas escolas, reconhecendo a importância do tema, convocam 
psicólogos para uma conversa ou palestra com os alunos. A eficácia 
de tal intervenção é limitada na medida em que não há continuidade e 
conhecimento do contexto particular da instituição. Na verdade, são os 
profissionais da própria escola (professores ou orientadores), na 
qualidade de adultos significativos para os alunos, que se constituem 
em interlocutores confiáveis para as questões da sexualidade. 
 O trabalho em orientação sexual deve ser iniciado com 
profissional que se sentir disponível para tal, requisito necessário, mas 
não suficiente. 
Não há necessidade de habilitação desse profissional na área 
biológica, uma vez que o fundamental é a postura do professor, sua 
capacidade de reconhecer como legítimas as questões dos alunos, 
acolhendo-as com respeito. É claro que serão necessários 
conhecimentos de anatomia do corpo humano, mas nada tão profundo 
e detalhado que não possa ser assimilado por um professor de outra 
área por meio de estudo e/ou pesquisa. 
 O fundamental para a preparação do profissional da educação 
em orientação sexual é a sua formação em temas afins à sexualidade. 
O educador interessado deve entrar em contato com as diversas 
 
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abordagens, assim como ter acesso a um espaço grupal de 
supervisão do trabalho realizado. Esse espaço deve ser sistemático 
para que seja possível acompanhar as dificuldades ao longo do 
percurso. Cursos apenas teóricos não abarcam as questões que 
surgem nas aulas com as crianças e jovens. O grupo de supervisão 
constitui-se num espaço de reflexão de valores e preconceitos dos 
próprios educadores - o que é imprescindível para que não haja 
imposição de valores pessoais ou julgamentos moralistas no trabalho 
com os alunos. 
 
Os eixos básicos da orientação sexual 
 
 Em primeiro lugar, é fundamental que o programa de orientação 
sexual se construa a partir das questões e dúvidas trazidas pelos 
alunos. 
 Há, no entanto, três eixos estruturantes do trabalho, divididos 
apenas para efeito didático, pois são, na verdade, intimamente 
relacionados entre si e constituem as dimensões que se colocam na 
abordagem de qualquer conteúdo escolhido. São eles: 
 
1. O corpo humano; 
2. As relações de gênero; 
3. A prevenção às doenças sexualmente transmissíveis e à AIDS. 
 
 A abordagem do tema parte da noção de corpo integrado, 
conjunto uno de sistemas interligados, que deve ser conhecido em 
seus aspectos biológico e erótico. Devem também ser abordadas as 
 
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emoções, sentimentos, imagem corporal, sensações de prazer e 
desprazer, as transformações desse corpo ao longo da vida, os 
cuidados necessários para a promoção da saúde e a ação dos 
métodos contraceptivos. Dessa forma, os aspectos biológicos devem 
ser circunstanciados num corpo que pulsa e sente. 
Quanto às relações de gênero, é fundamental a compreensão do 
tema para sua inclusão no trabalho de orientação sexual. Esse 
conceito diz respeito ao conjunto das representações sociais e 
culturais, construídas a partir da diferença biológica dos sexos. 
Cabe, então, avaliar criticamente a diferenciação entre os sexos 
como oriunda da “natureza”. Se o sexo diz respeito ao atributo 
anatômico, no âmbito do gênero tomamos o desenvolvimento das 
noções de masculino e feminino como construção social. 
Historicamente têm havido privilégios concedidos aos homens e ainda 
persistem muitas discriminações relacionadas ao gênero. 
Trata-se , então, de trabalhar-se com base na equidade dos 
gêneros, possibilitando um reposicionamento de cada um em relação 
aos papéis preestabelecidos para cada um dos sexos. Não se trata de 
eliminar as diferenças, mas sim de favorecer sua vivência a partir da 
singularidade de cada sujeito. Essa questão se reflete na sexualidade 
e nos relacionamentos a dois, devendo, também ser objeto de reflexão 
no trabalho de orientação sexual. 
 Coerentemente com a proposta de desvincular a sexualidade 
dos tabus e preconceitos, na discussão das doenças sexualmente 
transmissíveis/AIDS, o enfoque deve ser o da promoção de condutas 
preventivas. Esse ponto é imperativo no trabalho, uma vez que 
numerosas pesquisas sobre o assunto têm mostrado a necessidade 
 
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da prevenção entre os adolescentes, mostrando também que só a 
informação não basta. 
Reconhecem-se como mais eficazes na prevenção da AIDS as 
ações educativas continuadas que oferecem possibilidades de 
elaboração das informações recebidas e explicitação dos obstáculos 
emocionais e culturais que impedem a adoção de condutas 
preventivas. 
Dado o tempo de permanência dos jovens na escola e as 
oportunidades de despertar para o relacionamento amoroso, a escola 
constitui-se em local privilegiado para a abordagem da prevenção de 
doenças sexualmente transmissíveis. Devem também ser discutidos 
os preconceitos ligados à AIDS, que atingem os portadores de HIV e 
os doentes de AIDS. 
 A orientação sexual, ao proporcionar maior consciência de si e 
do outro e reconhecer como lícito o direito ao prazer, propicia às 
crianças e jovens melhores condições de buscar sua própria felicidade 
e exercer a cidadania de forma mais qualificada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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UNIDADE IV 
 PROJETO DE ORIENTAÇÃO SEXUAL NA ESCOLA 
 
 A sexualidade está presente na vida de todos nós, desde que 
nascemos até morrermos, e a educação sexual acontece 
constantemente, de uma forma ou de outra. 
 Recebemos o tempo todo informações e uma carga de idéias e 
de preconceitos a respeito da sexualidade. Sempre fomos educados 
sexualmente, ainda que não pareça. E quando não falamos sobre 
sexo também estamos educando. Estamos dizendo que sexo é uma 
coisa proibida, que não se fala abertamente, que não é um assunto 
que caiba à escola. Estamos reprimindoou omitindo, mas de alguma 
forma, estamos educando as pessoas sexualmente. 
 Educação sexual todos tivemos e continuamos a ter sempre. 
Quando vamos a um bar tomar um chope, conversar e contar piada, 
estamos passando e recebendo informações e valores a respeito da 
sexualidade. O mesmo ocorre quando vamos a uma festa, ao cinema 
ou até quando fazemos alguma leitura relacionada ao tema. 
 A escola, às vezes, nega-se a discutir essa questão por 
incapacidade ou por dificuldade de lidar com o assunto. Por isso, a 
sexualidade não está na escola? Ela está sim, só que fica à margem 
do que a escola faz. Ou seja, ela se expressa no intervalo, entre as 
aulas, na hora do recreio, nos bilhetinhos, nas conversas paralelas 
durante as aulas, nas reações dos alunos diante do que está 
acontecendo enquanto se estuda Matemática, História, Português ou 
Geografia... 
 
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A sexualidade está lá na escola. Se a escola se omite, se não 
trabalha o assunto, está deixando que essa sexualidade continue a ser 
tratada só informalmente, pelo que acontece em casa, na rua, pelo 
que se recebe da mídia. 
 Estabelece-se que a sexualidade é função da família. Em 
primeiro lugar, a família não costuma ter o domínio da questão para 
lidar adequadamente com ela. Segundo, não tem o controle dos 
meios, dos aportes de informação e estímulos que vêm de todos os 
lados. Diante disso, o que estamos fazendo quando nos omitimos ou 
quando a escola fica fora da questão da sexualidade? 
Estamos deixando o jovem na dependência de fontes informais, 
de pessoas que ele encontra ao longo da vida, dos amigos que terá, 
das coisas que ler e assistir e da família que tem. 
O jovem pode até ter uma família adequada e receptiva, que seja 
capaz de prover um diálogo. Pode até encontrar pessoas 
interessantes entre seus colegas e adultos que possam ajudá-lo a 
responder às ansiedades e lacunas de informação, debatendo a 
sexualidade. Mas há de se convir que isso é improvável. É raro 
encontrarmos esse espaço de informação de maneira informal. É por 
isso que acreditamos ser muito importante que a escola possa 
trabalhar sistematicamente a questão da sexualidade. Isto não 
compete só à família. 
O seu papel será sempre primordial em relação à educação 
sexual dos filhos. Os modelos de sexualidade e formas de ser homem 
e de ser mulher aprendem-se na relação com os pais, desde pequeno. 
É na primeira infância que se moldam esses modelos. O convívio 
 
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social vai sempre reforçando ou modificando essa perspectiva e essa 
estrutura que a gente adquiriu muito cedo. 
 Portanto, é importante perceber que a família tem um papel 
primordial, essencial, na educação de seus filhos. Mas se a escola não 
participar, vai deixar o jovem muito à mercê de experiências que 
provavelmente não vão dar conta dos medos, das ansiedades, das 
dúvidas e dos questionamentos que vão se desenvolvendo ao longo 
da vida. 
 Para diferenciar o trabalho pedagógico sistemático da escola 
desse processo informal, utilizamos a denominação “orientação 
sexual”. É apenas uma questão de estabelecer diferenças de espaço e 
abordagem, descomplicar. A expressão acaba sendo mais clara para 
designar que se trata de trabalho sistematizado, de caráter educativo. 
 
Mas o que entendemos por sexualidade? 
 
 Pelo conceito da Organização Mundial de Saúde, emitido em 
1975: 
 
 “A sexualidade forma parte integral da personalidade de cada 
um. É uma necessidade básica e um aspecto do ser humano que não 
pode ser separado dos outros aspectos da vida. 
Sexualidade não é sinônimo de coito e não se limita à presença 
ou não do orgasmo. 
Sexualidade é muito mais do que isso, é a energia que motiva a 
encontrar o amor, o contato e a intimidade e se expressa na forma de 
sentir, na forma de as pessoas tocarem e serem tocadas. 
 
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 A sexualidade influencia pensamentos, sentimentos, ações e 
interações e tanto a saúde física como a mental. Se a saúde é um 
direito humano fundamental, a saúde sexual também deveria ser 
considerada como um direito humano básico.” 
 
Por que é necessário que a escola trabalhe com a 
sexualidade? 
 
 Antes de mais nada, porque ela não pode fugir da 
responsabilidade. A escola é um lugar onde se está discutindo 
conhecimento, onde se está produzindo diálogo e reflexão. É, 
portanto, um espaço privilegiado para discutir a sexualidade com 
crianças e adolescentes. 
Na medida em que a escola se nega ou não consegue se 
capacitar para dar conta dessa responsabilidade, ela reforça a idéia de 
que a sexualidade não faz parte do conhecimento humano. Ela 
transmite a informação de que a sexualidade é mesmo para se 
aprender na rua, como alguma coisa suja e informal, aprendida de 
qualquer jeito. 
 Estamos passando uma informação muito clara quando nos 
negamos a discutir a sexualidade. Estamos negando que 
compreender a sexualidade faça parte do conhecimento humano. Se 
reservarmos espaços específicos para aprender Matemática, 
Português, História ou Ciências e não reservarmos espaço para 
discutir questões que estão afetando diretamente a vida do jovem, 
como a sexualidade, as drogas, além do próprio desenvolvimento da 
 
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adolescência, estamos dando um status diferente às informações 
discutidas na escola. 
Estamos dizendo que é muito importante aprender a fazer 
cálculos, mas não é importante ter domínio sobre seu próprio corpo e 
sobre sua vida sexual, sobre sua saúde sexual. 
 Para que a sexualidade passe a ser tratada seriamente e seja 
entendida e debatida pelo jovem, ela deve fazer parte da estrutura que 
a escola tem hoje. Porque se o assunto permanecer à margem, se 
ficar em momentos eventuais, não tem maior significado na vida dos 
alunos, nem dá conta das suas necessidades. 
 É evidente que esse trabalho pode ser feito também na área da 
saúde, em associações, clubes, igrejas. Mas a escola é um espaço 
onde as crianças e os adolescentes convivem por mais tempo. Então, 
é o melhor lugar para que esse trabalho aconteça de forma regular. 
Porque também é importante continuar discutindo a sexualidade, não 
só pelas dificuldades históricas que todos conhecemos (repressão, 
censura, discriminações de gênero, preconceitos), mas porque ainda 
hoje a desinformação é muito grande. 
Acho que nunca se falou tanto em sexo como atualmente. Nunca 
se mostrou, pelo menos no Brasil, tanta coisa a respeito de sexo, mas 
não existe espaço para reflexão. Há muito estímulo, muita excitação, 
mas pouca ou nenhuma reflexão. O que acontece com as crianças e 
adolescentes é que eles não conseguem se situar nesse emaranhado 
de coisas e ficam respondendo àquela sexualidade “sacana”, àquela 
coisa consumista. 
 A sexualidade que é passada pelos meios de comunicação é 
consumo, é excitação, atrai e estimula crianças e adolescentes. Os 
 
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índices de audiência de programas televisivos perversos, onde sexo é 
escancarado, mostram isso. Os jovens, e mesmo as crianças são 
platéia garantida. 
 Mas o que recebem com isso? Muito estímulo e nenhuma 
reflexão. O que a escola tem que fazer? Provocar essa reflexão e o 
espírito crítico naquilo que é consumido pelas crianças e pelos jovens. 
Por incrível que pareça, ainda existe muita desinformação, muita coisa 
não se sabe a respeito do corpo, da contracepção, das doenças 
sexualmente transmissíveis, da AIDS etc., apesar de toda essa 
estimulação. É importante ajudar a decodificar as mensagens dos 
meios de comunicação por meio de uma visão crítica. 
 Também é importante que o trabalho da escola ajude a refletir e 
a debater valores, porque esses valores não são passados só pela 
família, mas por todos esses outros meios, e geralmente não são 
explicitados. 
O ideal seria que a família sempre conseguisse explicitar no que 
ela acredita e por que ela acredita. Com certeza, os outros meios não 
o fazem. Quando a genteri de uma piada francamente machista ou 
preconceituosa em relação aos homossexuais, por exemplo, não 
estão explicitados os valores presentes nessa risada. Mas os valores 
estão sendo passados, estão sendo consumidos tanto por quem conta 
quanto por quem ouve a piada. 
Na escola, até podemos falar das piadas, para ver o que há por 
trás delas, discutir quais são os valores envolvidos. Também 
precisamos ajudar a superar os tabus, os medos e os preconceitos. 
Não é fácil, é complexo e exige um trabalho continuado. 
 
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 O que a escola quer, além de evitar problemas como a questão 
da gravidez não planejada na adolescência e a prevenção de 
doenças, é promover a saúde e esclarecer o direito ao prazer. 
A grande mudança que um trabalho de orientação sexual na 
escola traz é poder discutir a questão do prazer. As aulas de Ciências 
e Biologia sempre discutiram o corpo humano, mas de uma forma 
completamente assexuada, por meio de cortes laterais que mostram 
os órgãos. Ali não se discute a excitação, o desejo. Aquelas gravuras 
não representam um corpo que tenha a ver com a criança e com o 
jovem. O jovem não vê nelas o seu corpo nem nada do que sente. O 
que ele sente é desejo, é uma coisa que não consegue controlar 
direito. 
 É fundamental que a escola possa ajudar na formação da 
identidade e possibilitar um desenvolvimento mais harmonioso, porque 
todo mundo sabe que a sexualidade é fator essencial na questão da 
identidade: o “ser menino” ou o “ser menina”, o que é ser homem ou 
ser mulher, os comportamentos e ações de cada gênero. 
Essas são as primeiras questões que aparecem para as crianças 
na escola e têm a ver com essa identidade básica, com a formação de 
sua personalidade. É importante trabalhar com um conceito amplo de 
relações de gênero, que mostre que há infinitas formas de ser homem 
e de ser mulher. E de expressar isso. 
 Devemos, portanto, ter essas discussões o tempo todo na 
escola, acolher esses questionamentos, essas ansiedades e ajudar 
crianças e jovens a se desenvolver de forma mais equilibrada e com 
menos angústia. 
 
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A orientação sexual na escola contribui para isso. Também tem 
ajudado a abrir canais de participação e de comunicação, na medida 
em que usa metodologia participativa, estimula o jovem a pensar e a 
dizer o que pensa. Isso acaba fazendo com que ele seja um pouco 
mais ouvido na escola, que conquiste novos canais e também 
frequentemente que leve o assunto para casa e reabra, às vezes, 
canais que ficaram emperrados na comunicação familiar. Além disso, 
ele também pode levar questionamentos para casa. Porque é evidente 
que, muitas vezes, existem diferenças na visão da escola e na da 
família. E é importante que essas diferenças existam, porque à família 
cabe direcionar o que é certo, o que é errado, quais são os valores em 
que acredita. A escola faz um outro papel, que é o de ampliar a 
conversa e colocar tudo em discussão. 
 
A Orientação Sexual e os PCNs 
 
 A orientação sexual na escola, junto com outros temas propostos 
nos Parâmetros Curriculares Nacionais do MEC, ajuda na formação da 
cidadania, que hoje é eixo fundamental de preocupação da escola. A 
orientação sexual na escola pode ser concebida como uma 
intervenção pedagógica que favorece a reflexão sobre a sexualidade, 
problematizando os temas polêmicos, favorecendo ampla liberdade de 
expressão em ambiente acolhedor, que visa a promover bem-estar 
sexual, vínculos mais significativos (a partir da relação professor-
aluno), ampliando a cidadania. 
 A problematização de temas polêmicos é a grande dificuldade: 
como conversar na escola sobre homossexualidade, aborto, 
 
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prostituição, pornografia, abuso sexual? São questões muito 
complicadas e polêmicas, porque comportam muitas verdades. O 
papel da escola na orientação sexual é poder apresentar diferentes 
visões e colocar valores em discussão. Não é fácil. É por isso que é 
muito importante que a sexualidade esteja incluída nos temas 
transversais dos Parâmetros Curriculares. 
 A questão da orientação sexual está muito além de saber por 
onde caminha o esparmatozóide, como ele se encontra com o óvulo, 
como se dá a divisão celular. Mas discutir o que está envolvido no 
aborto, na homossexualidade. 
 A orientação sexual está concebida como um tema transversal 
ao longo do Ensino Fundamental e possui um espaço específico 
também. É necessário que haja trabalho planejado e sistematizado 
para todos os alunos da escola, e não apenas para alguns que se 
interessem. Não é conversar de vez em quando, quando o assunto 
entra na roda. Tem de haver uma continuidade de trabalho, que essa 
conversa aconteça regularmente, com aulas semanais, por exemplo. 
 Há aqueles que acreditam que trazer um médico, um psicólogo, um 
especialista, resolve a questão. 
Ou, então, se diz: “Uma palestra é pouco, vamos fazer a 
Semana da AIDS, a Semana da Sexualidade”. Faz aquela Semana e 
fica só nisso! Não se pode limitar a informação, porque é importante 
produzir o debate, a reflexão. A informação é necessária, mas não é 
suficiente. Deve existir um canal aberto permanente para o debate. 
É preciso que haja um processo ininterrupto, que não fique na 
eventualidade. Por melhor ou mais elaborado que seja, um processo 
eventual não atinge os objetivos da orientação sexual, porque há 
 
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questões que ocorrem para a criança pequena, outras ocorrem na 4ª 
série, na 5ª, na 7ª, na 1ª série do Ensino Médio ou na 3ª. 
Às vezes, os próprios professores alegam já ter discutido um 
assunto que é colocado em discussão novamente pelos alunos. Na 
verdade, não se trata de um mesmo assunto, porque a fase em que a 
criança está mudou e as necessidades são outras. Por exemplo, é 
importante discutir métodos anticoncepcionais na 6ª série, e essa 
informação tem caráter preventivo. Mas quando chegar ao Ensino 
Médio o aluno vai ter interesse em voltar a discutir esse tema, agora 
sob outra ótica, porque ele já está tendo uma vivência do assunto. Os 
assuntos voltam, e os alunos dizem: “ O que a gente aprendeu há três, 
quatro anos, agora é importante conversar de outro jeito”. Mudou o 
momento. É o processo que vai garantir alguma mudança. 
 
O trabalho com as crianças 
 
 O trabalho de orientação sexual da 1ª à 4ª série do Ensino 
Fundamental deve ser transversalizado, com base na observação e na 
demanda das crianças. Dispensa o espaço específico, porque o 
professor ou a professora trabalha todos os temas da escola, há uma 
só professora por classe. Assim, não há então razão para se separar 
um determinado horário para orientação sexual. 
Tanto melhor se é a mesma pessoa que está atenta e 
acompanhando aquela classe, que ela perceba de que é que as 
crianças estão precisando para dar conta da necessidade daquele 
momento. Isso pode acontecer das formas mais naturais possíveis. 
 
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Num jogo, numa brincadeira, num exercício que não tem nada a ver 
com o assunto. 
Se a professora estiver preparada, é capaz de aproveitar o 
momento. Um exemplo concreto que aconteceu numa turma de 3ª 
série: a professora buscava peças do vestuário que começassem com 
a letra “C”, perguntando quais as peças do vestuário que começavam 
com ela. Uma criança falou: “camisinha”. Camisinha é peça do 
vestuário? Estamos falando de Português, não é? Não dá para “fazer 
de conta” que não houve aquela colocação. E se a criança está se 
lembrando da camisinha é porque está presente para ela, ela tem 
alguma dúvida, quer falar algo.. Então é o momento para se discutir o 
que é uma camisinha, para que serve, onde se coloca, e aí o grupo 
pode decidir se é uma peça do vestuário ou não. Faz-se orientação 
sexual quando age assim. 
 Em outra situação, uma professora trabalhando com montagem 
de sílabas do alfabeto inteiro, pediu que as crianças montassem 
palavras a partir dessas sílabas. Elachegou ao “XO” e um menininho 
montou a palavra “xoxota”. Certinho, ele usou a sílaba “XO” duas 
vezes até. Só que a professora vai dizer o quê? Essa palavra está 
certa? Está errada e ponto? Ou vai discutir o que ele quis dizer? Por 
que ele escolheu essa palavra? Que tipo de palavra é essa? É uma 
palavra que se pode por em qualquer texto? É um palavrão? É 
importante discutir isso até para a língua portuguesa. Mas, sem 
dúvida, ele está transmitindo alguma coisa e a professora precisa 
estar preparada para lidar com isso. Geralmente os professores não 
estão preparados para lidar com situações como essas e muito menos 
com masturbação em sala de aula. 
 
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Quem é professor do Ensino Fundamental sabe que criança 
pequena muitas vezes se masturba em plena sala de aula. Em geral 
os professores fogem do assunto, dão um jeito de a criança fazer algo, 
ir ao quadro, buscar qualquer coisa e fingem que não viram. Mas a 
criança sabe que foi vista e o professor não conseguiu falar do 
assunto, não conseguiu lidar com aquilo. É preciso abordar a criança, 
conversar com ela, investigar o que sente, esclarecer sobre o que é 
intimidade, mostrar que tudo tem sua hora e seu lugar. Esse tipo de 
atuação, que não é um processo planejado e sistematizado, pode ser 
bem difícil. 
Os professores precisam receber capacitação e supervisão para 
dar conta dessa demanda, porque não é só quando o professor 
resolve contar uma história que ela preparou em casa que se vai falar 
da reprodução, do parto, do bebê. As crianças manifestam questões 
sexuais o tempo inteiro. É preciso perceber e aprender a lidar com 
elas. A orientação sexual supõe uma sistematização do trabalho com 
educadores. 
 
O trabalho com Adolescentes 
 
 Da 5ª à 8ª série, do Ensino Fundamental, e no Ensino Médio, 
devemos também ter a transversalização, que é a incorporação nas 
diferentes áreas tradicionais de estudo de temáticas da sexualidade 
que tenham a ver com essas áreas. 
A ideia não é parar a aula de Geografia e dizer: “Hoje vamos 
falar de um tema de sexualidade”. Mas é, discutir a incidência da AIDS 
 
	
 
nas áreas rurais e urbanas, de diferentes pontos do mundo, porque ela 
é maior em uma determinada região do que em outra. Isso faz parte 
da matéria de Geografia, não é algo de fora, o tema entra 
naturalmente. Questões amorosas estão na base da literatura. 
O corpo humano é matéria de estudo da Biologia. As relações de 
gênero são marcantes em todos os períodos históricos. Os 
preconceitos também. A sexualidade está em tudo. 
 A transversalidade não dispensa a existência de um espaço 
específico para trabalhar com a sexualidade, que começa com um 
levantamento do interesse dos alunos, criando-se um projeto. Procura-
se obter deles aquilo que querem saber e discutir. 
Não é uma aula de pergunta e resposta, em que se levantam 
vinte perguntas e se responde uma a uma, porque isso não vai dar 
uma noção integrada do tema. É preciso juntar todas as questões e 
elaborar os temas, buscando itens que são comuns aos diversos 
grupos. Não é uma matéria a que se atribui nota e a atitude do aluno é 
avaliada para efeito de aprovação. 
A ação pedagógica supõe um contrato de trabalho onde temos 
que conversar sobre o que é aquele espaço, como é que funciona 
para garantir sigilo, respeito ao outro, respeito às diferenças e 
oportunidade de participação de todos. Levantam-se as metas, os 
temas. As aulas são participativas, dando vez e voz ao aluno, 
problematizando e construindo o conhecimento em grupo, com 
técnicas ativas. 
É importante selecionar material didático que abra a discussão e 
ajude a levantar questões, possibilitando a reflexão. O material é para 
 
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abrir o debate, como um vídeo, um texto, um jogo, bonecos ou 
dramatização. A metodologia participativa é a essência do trabalho. 
 
 
A institucionalização do projeto 
 
 O processo de orientação sexual na escola integra o projeto 
pedagógico, não é algo que um professor faça sozinho, tem que ser 
discutido pela equipe, exige planejamento e estudo contínuos, com 
supervisão, porque implantar o trabalho é difícil sem apoio técnico aos 
educadores. 
 A orientação sexual precisa de apoio institucional declarado da 
escola, comunicação e debates nos diferentes setores do 
estabelecimento de ensino, bem como participação de pais e mães no 
processo. Eles devem ser envolvidos, informados do que está sendo 
feito, não para que se faça do jeito que eles querem, mas para que 
conheçam, colaborem e apóiem a escola. 
O que precisamos, é dizer que não vamos tomar o lugar dos 
pais, que é fundamental. Eles têm muito o que fazer. Muitas vezes, ao 
saberem que a escola está fazendo esse trabalho, ficam aliviados, 
pois resolve o problema deles de falar sobre um assunto tão delicado. 
Temos que esclarecer que não é assim que a coisa funciona. Escola e 
família têm papéis diferentes e complementares. Uma não substitui a 
outra. 
 Há famílias que se preocupam com o fato de que essas aulas 
possam estimular um despertar sexual “precoce”. Está subentendida a 
 
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idéia de que a ignorância sobre sexo possa frear o desejo sexual ou 
suas manifestações. Todos sabemos que não é assim. 
A ignorância não protege ninguém de nada. Ao contrário, torna a 
pessoa mais vulnerável às situações, por não saber lidar 
adequadamente com elas. Quaisquer que sejam os temas escolhidos 
pelos alunos ou que estejam presentes nas diferentes matérias, os 
eixos básicos do trabalho envolvem o corpo erótico e reprodutivo, 
matriz da sexualidade, um corpo que tem sensações, que sente 
prazer, desejo. 
As relações de gênero, que são muito importantes, visam à 
equidade de direitos entre homens e mulheres e a prevenção das DST 
e AIDS, assunto indispensável e urgente nos tempos atuais. Esses 
eixos têm que estar sempre presentes na discussão da sexualidade na 
escola. 
 Claro que a orientação sexual na escola não é garantia de que 
não vá ocorrer gravidez na adolescência, quando não planejada ou 
indesejada. Muitas vezes, a gravidez é uma fantasia da menina de que 
vai poder segurar o namorado. Ou é uma coisa de buscar na gravidez, 
e no fato de ser mãe, um papel social, respeito, um lugar social que a 
menina não tinha. Há muitas questões envolvidas. Não é simples. 
O trabalho não é diretivo. Não se pode dizer: “Você não vai 
engravidar”, mas se pode dizer: “Pense no que significa engravidar, no 
que significa uma doença. Pense no seu direito ao prazer”. O mesmo 
vale para o uso da camisinha. As aulas ajudam muito a se 
conscientizar do problema, a encarar as resistências, as dificuldades e 
riscos, a superar preconceitos, mas não podem garantir que o 
 
	� 
comportamento aconteça. Ou mesmo que uma alternativa mais 
conservadora, como seria a abstinência, se instale em seu lugar. 
 
Atividades sobre o texto lido: 
1) Qual a orientação expressa nos PCNs, sobre o trabalho com a 
sexualidade na escola? 
Por onde começar? 
 
 Para quem vai empreender agora essa viagem desafiadora e 
apaixonante que é a Orientação sexual na escola, é preciso saber por 
onde começar. 
 É bom começar lendo os Parâmetros curriculares Nacionais do 
MEC (indicação 9). O tema transversal Orientação Sexual ( um volume 
para a 1ª a 4ª séries e outro, para 5ª a 8ª séries) apresenta de forma 
estruturada os fundamentos para esta ação nas escolas. 
O GTPOS publicou dois livros importantes sobre o tema: o Guia 
de Orientação Sexual (indicação 28) e o Sexo se aprende na escola 
(indicação 27) O Guia é um instrumento indispensável para o 
planejamento e execução das aulas de Orientação sexual. Nele está 
organizado todo o conteúdo do trabalho com sexualidade em 
conceitos e tópicos, divididos por faixas etárias ( de 5 a 8 anos, de 9 a 
12 anos, de 12 a 15 anos e de 15 a 18 anos). 
 “Sexo se aprende na escola”- trata da orientação sexual para 
adolescentes, abordando como se dá o processo e relatando o 
projeto desenvolvido na rede municipal de ensino da cidade de São 
Paulo, de 1989 a 1992. Além disso, discute seis temas polêmicos, 
 
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incluindo sugestões práticas de como trabalhá-los em sala de aula 
(corpo, gênero, homossexualidade, aborto, AIDS, a primeira vez). 
O livro da Marta Suplicy Papai, mamãe e eu (indicação 57) trata 
muito bem da sexualidade infantil, tanto na escola como na família. E 
ainda traz pranchas para o trabalho com as crianças. 
Há também um bom material para adolescentes, também da Marta 
Suplicy (58). 
 Porém, não é só a leitura que importa para a formação do 
educador em orientação sexual. A arte é fundamental. Ir ao cinema, 
ver filmes de diferentes partes do mundo, principalmente os que 
abordam questões de relacionamento, sexualidade, gênero, 
diversidades. 
 Permitir que a imagem penetre, emocione, embeleze, encante, 
faça pensar. Ir ao teatro, concertos, dança, exposições de artes 
plásticas, tudo isso amplia enormemente o imaginário e os horizontes 
e nos faz entender o desejo, a juventude, a vida... 
Não dá para ocupar todo o tempo trabalhando, executando 
tarefas, cumprindo obrigações. Empobrece e nos distancia das 
crianças e dos jovens com quem trabalhamos, além de nos distanciar 
de nós mesmos e do mundo real. 
Tem educador que acha que a questão se resolve quando se 
encontram textos, vídeos, dinâmicas para trabalhar o tema. Não é 
assim. Se a questão da sexualidade não for objeto de elaboração 
pessoal e reflexão não é possível obter uma postura genuína de 
abertura para discussões mais consistentes com os alunos. 
 É preciso poder olhar para dentro de si mesmo, se entender, se 
encontrar, lutar contra as idéias preconcebidas, as idiossincrasias. É 
 
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utopia querer um educador pleno? Se não tivermos utopia, jamais 
chegaremos a lugar algum. O que consola é que é possível fazer 
muito enquanto a gente se constrói. Se fôssemos esperar estar 
prontos para agir, nada seria feito, principalmente na área da 
orientação sexual. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
1. AQUINO, Júlio Groppa. (Org). Sexualidade na escola. Alternativas - 
Teóricas e Práticas. São Paulo: Summus, 1997. 
 
2. EGYPTO, Antônio Carlos (org.). Orientação sexual na escola: um 
projeto apaixonante. São Paulo: Cortez, 2003. 
 
3. NEDEFF, Cristiano Carvalho. Contribuições da sexologia sobre a 
sexualidade infantil nos dois primeiros anos de vida: uma revisão 
bibliográfica. 
 
4. Enguita, M.F. (1989) A face oculta da escola. Porto Alegre: Artes 
Médicas. 
 
5. Lourau,R.(1990)Em: Altoé, S. Infâncias perdidas. Rio de 
Janeiro:Xenon,pp.9 –10 
 
6. O prazer e o pensar, vols 1e 2. São Paulo: Gente, 1999. 
 
7. Guia de orientação sexual – Diretrizes e metodologia. São Paulo: 
Casa do Psicólogo, 1994. 
 
8. Sexo para adolescentes – Orientação para educadores. São Paulo: 
FTD,1988

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