Buscar

POVO TRADICIONAL POMERANO UM DIÁLOGO SOBRE INTERCULTURALIDADE

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

POVO TRADICIONAL POMERANO: UM DIÁLOGO SOBRE 
INTERCULTURALIDADE 
 
Erineu FOERSTE/UFES(*) 
 
RESUMO: O trabalho discute cultura e educação do povo tradicional pomerano (Decreto 
6.040/2007). Coloca em questionamento principalmente a falta de políticas públicas na 
oferta de ensino bilíngue em comunidades tradicionais pomeranas. Abordagens sócio-
históricas (Fichtner et al: 2013) fundamentam praxis de análise da problemática em 
questão na perspectiva das chamadas políticas afirmativas em comunidades de Vila 
Pavão, Pancas, Laranja da Terra, Santa Maria de Jetibá e Domingos Martins no Estado 
do Espírito Santo, Brasil. Apresenta alguns resultados de investigações desenvolvidas até 
o momento a respeito do Programa de Educação Pomerana – PROEPO. Finaliza 
destacando a importância da inclusão dos povos tradicionais na agenda de pesquisa das 
universidades. Já se observam alguns impactos na valorização da identidade do 
tradicional pomerano em face às discussões de cultura e interculturalidade. 
 
Palavras-chave: Pomeranos;Povos tradicionais; Educação intercultural. 
 
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
Os primeiros pomeranos ao chegar no Brasil há 150 anos atrás desembarcaram no Porto 
de Vitória no Estado do Espírito Santo na Região Sudeste do Brasil e ajudaram a fundar 
a cidade de Santa Leopoldina em meio às montanhas, acerca de 50 Km do litoral. Aos 
poucos migraram para outras regiões do Estado, onde hoje vivem em municípios como 
Santa Maria de Jetibá, Laranja da Terra, Pancas, Vila Pavão entre outros. Este povo 
tradicional (BRASIL: 2007) (1) produz sua existência material e simbólica na sua relação 
com o mundo do trabalho, principalmente a partir da agricultura familiar agroecológica 
(Merler et al.: 2012). 
Os pomeranos, juntamente com outros povos tradicionais (indígenas, quilombolas, 
ribeirinhos etc.) fazem história não apenas sob as condições que lhes são dadas, como 
dizia Marx, mas nas contradições da sociedade de classes, conforme Fornet-Bitancourt 
(2001), colocando-a sempre em questão nas lutas coletivas por direitos sociais. Como o 
povo tradicional pomerano produz práticas sociais e políticas interculturais? 
Constituindo sua humanidade, ao mesmo tempo em que humanizam o mundo pela práxis, 
os trabalhadores em geral e os povos tradicionais de modo especial produzem culturas 
como forma de resistência ao projeto hegemônico de desenvolvimento e de educação do 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03445
capitalismo (Fichtner et al: 2013; Merler et al: 2013). Partindo desses pressupostos, este 
trabalho objetiva analisar, compreender e dar visibilidade a aspectos do patrimônio 
material e imaterial do povo tradicional pomerano. Aqui daremos ênfase às práticas 
políticas e pedagógicas que têm sido produzidas como ação coletiva para superar 
injustiças sociais e processos de exclusão cultural, especificamente no que se refere às 
comunidades pomeranas no Estado do Espírito Santo, Brasil. 
 
POVO POMERANO TRADICIONAL 
 
Nossas investigações emergem dos trabalhos desenvolvidos no Grupo de Pesquisa 
(CNPq) Culturas, parcerias e educação do campo do Programa de Pós-Graduação em 
Educação - PPGE do Centro de Educação - CE da Universidade Federal do Espírito Santo 
– UFES. Estabelecem-se interlocuções com a produção acadêmica acumulada sobre a 
questão pomerana no Brasil, em especial com o trabalho de mestrado de Adriana Vieira 
Guedes Hartwig, intitulado Professores (as) pomeranos (as): um estudo de caso sobre o 
Programa de Educação Escola Pomerana – PROEPO no município de Santa Maria de 
Jetibá/ES (Hartwig: 2011). Os debates identificam-se com a perspectiva teórico-prática 
de que é na luta pela redistribuição e pelo reconhecimento, conforme Semeraro (2006 e 
2009), que os oprimidos produzem praxis sociais e culturais alternativas de emancipação 
humana. 
No geral essas pesquisas apontam para reivindicações dos pomeranos, articulados com 
outros povos tradicionais, por direitos sociais como luta intercultural (Fornet-Betancourt: 
2001). O povo pomerano no Brasil (BRASIL: 2007) organiza-se internamente de forma 
crescente nos últimos decênios e é reconhecido publicamentepara fortalecer lutas 
coletivas pelos direitos sociais com povos indígenas (Tupinikim e Guarani), quilombolas, 
assentados de reforma agrária, caiçaras, ribeirinhos, pescadores, ciganos etc. Inscreve-se 
assim, no contexto de lutas históricas dos povos tradicionais e outras comunidades do 
campo (agricultores familiares em geral, trabalhadores rurais vinculados ao Movimento 
Sem Terra – MST, ao Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA etc.) como 
protagonismo na conquista de políticas afirmativas de inclusão social. 
Os povos europeus da imigração tardia (esses povos não estão alinhados ao projeto 
predatório de colonização promovido pelas coroas portuguesa e espanhola) chegaram ao 
Brasil no final da primeira metade do século XIX. No Estado do Espírito Santo os 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03446
primeiros imigrantes alemães vieram a partir de 1847 (2). As primeiras Comunidades 
Pomeranas começaram a se constituir nas montanhas espírito-santenses em 1859. 
A imigração fez parte do processo acelerado de transformações sociais que ocorreram no 
Brasil na segunda metade do século XIX e início do século XX. A ascensão das ideias 
republicanas, em substituição ao Brasil Império, com transformações políticas, sociais e 
culturais, teve impacto direto na população de imigrantes germânicos assentados em 
diversos Estados da Região Sudeste e Sul do país. (3) 
Especificamente no que se refere à educação escolar, o período inicial do século XX 
caracteriza-se pela forte influência do Projeto Escolanovista, criado por John Dewey, 
sobretudo através da Escola de Chicago. Este ideário norte-americano serve de base para 
incremento do projeto educacional nacionalista brasileiro de Getúlio Vargas. Isso 
significa, concretamente, a construção de estratégias pedagógicas e políticas para 
fortalecer a identidade nacional. 
A passagem do Brasil Colônia à consolidação da República é acompanhada de mudanças 
desde a reconstrução arquitetônica das cidades às esferas administrativas do estado 
brasileiro. No bojo das transformações por que passava o Brasil naquele período, vale 
destacar as reformas educacionais da era do Presidente Getúlio Vargas (4), com atenção 
à Reforma Educacional Francisco Campos (1931) e a Reforma Gustavo Capanema 
(1942), que são orientadas ideologicamente pelo discurso modernista e dão sustentação 
aos projetos de nacionalização do estado brasileiro, na lógica do Estado ditatorial. A 
educação, nessa perspectiva, ocupa papel fundamental na propaganda nacionalista. 
Segundo Nagle (1974), o movimento do otimismo pedagógico atribui à educação a tarefa 
redentora e unificadora do estado brasileiro; também favorece as medidas de 
nacionalização das escolas comunitárias, a proibição do ensino da língua e cultura alemãs 
em escolas das comunidades de imigrantes situadas grosso modo no Rio Grande do sul, 
Santa Catarina e Espírito Santo e a institucionalização da escola primária como 
“democratizadora” do acesso à formação dos trabalhadores. Também, na esteira da 
discussão nacionalista ganha força o movimento do ruralismo pedagógico, que defendia 
maior equidade na relação campo e cidade, para justificar formas de cobrança tributária. 
Este movimento suscita olhar do poder central da união sobre as escolas campesinas de 
comunidades de imigrantes para incremento da nacionalização dos projetos de educação 
locais como estratégia fundamental à unificação do Estado nacional e como campo de 
disseminação ideológica das concepçõeshegemônicas do “Estado Novo”. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03447
Conforme discussões da época, a imigração representava um mal necessário. Segundo 
Menucci (1934) a presença de imigrantes apresentou-se, sobretudo na primeira metade 
do século XX, como um problema que explicitava a dialética do progresso e da 
civilização. O estrangeiro foi considerado peça chave, ao mesmo tempo em que era 
tomado como indesejável. Para fazer frente ao problema, medidas foram tomadas como 
a obrigatoriedade do domínio da língua portuguesa, sobretudo pelas crianças em idade 
escolar. 
À revelia desse processo de nacionalização, em cujo movimento a educação foi afetada 
de forma muito especial, o povo tradicional pomerano (BRASIL: 2007) manteve suas 
culturas e identidades. A língua pomerana constitui uma das dimensões articuladoras, 
para reconhecimento dos pomeranos atualmente no cenário das lutas coletivas por direitos 
sociais. Ela é patrimônio cultural de um povo tradicional brasileiro. 
Hoje há cerca de 300 mil pomeranos no Brasil (5). No Estado do Espírito Santo estima-
se uma população de 120 a 150 mil pomeranos, conforme levantamentos preliminares 
realizados por Jacob (2012), apresentados no quadro (6). 
Representantes dos municípios de Santa Maria de Jetibá, Domingos Martins, Laranja da 
Terra, Vila Pavão e Pancas no Estado do Espírito Santo – Brasil articularam esforços 
interinstitucionais e estabeleceram parcerias (Foerste: 2005) para elaboração do Projeto 
de Educação Escolar Pomerana - PROEPO que visa valorizar e fortalecer a cultura e 
língua pomeranas. 
 
EDUCAÇÃO POMERANA NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO: UM DIÁLOGO 
 
O ano de 2003 é um marco importante nesse processo, quando foi implementado o 
PROEPO. Surgiu a partir da preocupação de lideranças comunitárias articuladas a alguns 
dirigentes municipais, por um lado, a partir de avaliações que apontam situações 
concretas em que parte das gerações mais novas das comunidades pomeranas não se 
interessam mais em falar pomerano em contexto familiar e público. De outro lado, pais, 
mães, membros das comunidades (igreja, lideranças da sociedade civil), professores, 
pesquisadores, etc. manifestam há muito tempo preocupação com o fracasso escolar de 
crianças de origem pomerana, principalmente nas séries iniciais, pelo fato de dominarem 
o pomerano como língua materna e não falarem a língua portuguesa ao ingressarem na 
escola. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03448
Dentre as dificuldades mais preocupantes em relação à escolarização desses estudantes, 
as pesquisas de Mian (1993), Weber (1998), Siller (1999), Ramlow (2004) e Hartwig 
(2011) destacam: a) alto índice de reprovação; b) currículo desvinculado do contexto 
social; c) contratação de professores que não falam pomerano; d) gestores educacionais e 
equipe pedagógica que desconhecem a realidade local campesina e promovem 
fechamento de escolas locais (Merler et al: 2013; Foerste et al: 2013); e) subestimação 
da capacidade de aprendizagem das crianças pomeranas; f) exclusão dos alunos das 
práticas escolares por não serem compreendidos em sua língua nem compreender a língua 
portuguesa; g) reprodução do mito de que os pomeranos são tímidos. 
A criança de origem pomerana, ao ingressar na escola de Ensino Fundamental, é 
incumbida de duas tarefas simultâneas: aprender outra língua e atender aos objetivos do 
período de alfabetização (1º ao 2º anos do Ensino Fundamental, para desenvolver 
habilidades de leitura e produção de textos escritos na língua oficial (Língua Portuguesa), 
muitas vezes isso é feito em detrimento da língua materna (Língua Pomerana) (7). 
Estudiosos do campo da educação, vinculados a diferentes linhas de pesquisa no 
Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE da Universidade Federal do Espírito 
Santo – UFES(8) na produção de dissertações de mestrado e teses de doutorado, 
aprofundaram pesquisas em comunidades pomeranas (Mian: 1993; Weber: 1998; Siller: 
1999; Ramlow: 2004; Delboni: 2006; Hartwig: 2011; Cosmo: 2014). Denunciam os 
ataques à alteridade e às especificidades do povo pomerano e sinalizam para a importância 
e a necessidade de reflexões, com implementação de políticas públicas que superem 
problemas que entravam a escolarização dos pomeranos. 
As práticas escolares desconsideram a cultura e a língua pomerana. Existem relatos de 
professoras que são orientadas a proibir que as crianças façam uso da língua materna 
pomerana durante os períodos escolares regulares, sob a alegação de que a função da 
escola é ensinar a ler e escrever na língua oficial. Este processo remete ao período de 
nacionalização instituído no Brasil, sobretudo no período da Segunda Guerra Mundial. 
O fato de muitas crianças falarem o pomerano como língua materna ao ingressarem na 
escola é apontado por muitos professores e gestores educacionais como causa de fracasso 
escolar em contextos sociais com presença do povo tradicional pomerano. As pesquisas 
colocam em evidência os impactos desse quadro. As crianças de descendência pomerana 
de modo geral, destacadamente as que ainda vivem com seus familiares em comunidades 
tradicionais, sentem-se na escola e são vistas pelos profissionais do ensino, no dizer de 
muitos pais, como estranhos fora do ninho ou estrangeiros na própria comunidade 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03449
tradicional, onde a absoluta maioria da população fala o pomerano no dia-a-dia. As 
dificuldades de se comunicar em português geram extremo constrangimento (confundido 
muitas vezes com timidez) para essas crianças e respectivas comunidades, impedindo-
lhes de participar de forma espontânea e ativa da vida da escola, tornando a prática 
pedagógica cheia de significados culturais (Mclaren: 1997) ainda pouco estudado 
academicamente. Mesmo quando solicitadas a falar em sua língua ou em português, 
preferem ficar silenciosas. Presenciamos em nossas pesquisas, relatos de crianças que têm 
medo de fazer perguntas referentes aos conhecimentos escolares por causa da dificuldade 
de comunicação na Língua Portuguesa. Elas têm “medo” de falar errado. O recreio é, não 
raras vezes, o momento em que as crianças se sentem livres no contexto escolar para 
conversarem em pomerano, longe do controle da equipe pedagógica. 
Narrativas das famílias de crianças de origem pomerana explicitam sentimento de tristeza 
face ao fato dos filhos resistirem de forma crescente para falar a língua materna (o 
pomerano) de forma crescente também em casa, depois de ingressarem na escola. Ao 
mesmo tempo há aqueles que se sentem culpados por não ensinarem a língua pomerana 
aos filhos; chegam a confessar que agindo assim, podem proteger as gerações mais novas 
de enfrentar as mesmas dificuldades pelas quais passaram no período da escolarização, 
decorrentes de sofrimentos relacionados ao preconceito e exclusão vividos na própria 
pele. 
As pesquisas de Siller (1998), desenvolvidas no contexto da Educação Infantil em Santa 
Maria de Jetibá, demonstraram o desejo das famílias em ver uma escola que incentiva a 
valorização da cultura e da língua pomeranas. Há relatos de pais dizendo que as crianças 
deveriam aprender os saberes da escola por meio das duas línguas, português e pomerano; 
outras sugeriram duas professoras: uma professora para falar pomerano e outra para falar 
português. O bilingüismo foi apresentado como proposta de trabalho pela maioria das 
famílias entrevistadas. 
Porém, foi só a partir de fevereiro de 2005 que o PROEPO consolidou-se. Por iniciativa 
de novos administradores de Santa Maria de Jetibá, o debate foi retomado junto com os 
demais municípiosenvolvidos e resultou na contratação do etnolinguista Ismael 
Tressmann como assessor de educação pomerana, responsável de ministrar curso de 
formação em serviço para os professores dos cinco municípios que adotaram um 
programa específico de educação nas comunidades pomerana. Objetivou-se instituir o 
bilinguismo nas escolas a partir de ações do poder público local. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03450
A adesão dos professores nesse projeto vem sendo crescente, porém sempre de forma 
voluntária. Para participar do PROEPO exige-se que o professor seja falante da língua 
pomerana, uma vez que um dos objetivos é também promover o ensino da escrita do 
pomerano. Utiliza-se como material de apoio um dicionário pomerano/português 
elaborado pelo assessor do PROEPO e publicado em parceria com a Secretaria de Estado 
de Educação do Espírito Santo - SEDU (Tressmann: 2006a). Em 2007, o projeto foi 
transformado em programa por se acreditar que esse seria um trabalho permanente e 
consistente. 
A criação deste programa concretizou-se através de parcerias interinstitucionais, 
fortalecendo formas antigas de organização social nas comunidades tradicionais 
pomeranas e práticas culturais diversas. Referem-se a práticas comunitárias identificadas 
entre os pomeranos já na época da imigração, mantendo-se até os dias atuais. O 
sentimento coletivo pode ser observado em narrativas de memórias. Ainda hoje, como 
nos primeiros tempos de formação das comunidades locais, quando esse povo tradicional 
se organizava em mutirões para realizar festas comunitárias, religiosas e casamentos, 
construção de casas, abertura de estradas, etc. As pesquisas de Ismael Tressmann 
recuperam narrativas populares, contadas de geração em geração; registram-se receitas 
da culinária pomerana (sopa de pêssego, sopa de frango com aipim, pão de banana etc.), 
tradições do casamento pomerano (Tressmann: 2006b). 
Filmes e documentários (9) sobre a cultura pomerana retratam eventos comunitários e em 
contextos familiares de um povo tradicional, alegre, participativo, solidário e interessado 
no trabalho coletivo. Os pomeranos, independente da faixa etária ou do gênero de cada 
pessoa, participam ativamente da organização do processo produtivo na da agricultura 
familiar agroecológica, integram-se aos momentos em que promovem trabalho coletivo 
para construir pontes, estradas, casas, organizar festas comunitárias, casamentos etc. até 
os dias atuais. O trabalho em mutirão é referência para o cultivo de uma forma tradicional 
peculiar do modo de se viver em comunidade. É uma tradição trazida da antiga Pomerânia 
e aqui, no contato e diálogo com outras culturas de povos tradicionais em seus respectivos 
territórios (indígenas, quilombolas, caiçaras, extrativistas, pescadores etc.), ressignifica-
se e abre possibilidades de produzir outras culturas, apesar de manter muitos dos traços 
originais dos tempos ancestrais dessas práticas. 
Este encontro de culturas produz modos de se viver que podem ser definidos como 
práticas interculturais. Para Fornet-Betancourt (2001) a interculturalidade caracteriza 
como alternativa de lutas coletivas produzidas em contextos específicos por sujeitos 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03451
excluídos, quando se articulam para a conquista de direitos sociais. Os grupos se 
organizam e passam a lutar por condições dignas de vida para todos (educação, saúde, 
moradia, direito à terra etc.). Para Gramsci (1978), conforme dicute Semeraro (2006 e 
2009), os sujeitos no mundo capitalista, considerada a correlação de forças entre os que 
detêm o processo produtivo (classe dirigente) e aqueles que vendem sua força de trabalho 
(os trabalhadores), produzem formas de ideologias que garantem a hegemonia daqueles 
que estão no comando. A interculturalidade é compreendida como alternativa de 
resistência dos povos tradicionais face ao projeto de desenvolvimento e de progresso do 
capital, que se institui a partir do agronegócio, do latifúndio, da industrialização etc. Paulo 
Freire (1970 e 1996) e Bakhtin (1991) falam-nos das práticas culturais como 
possibilidades de diálogo entre sujeitos que articulam esforços coletivos e desse modo 
produzem libertação de dominados e dominadores. Segundo Semeraro (Op. cit.) a 
emancipação humana pressupõe crítica ao capital internacional e ruptura com as 
desigualdades sociais por ele produzidas. Interculturalidade, portanto, é luta por direitos 
sociais dos oprimidos, como forma de resistência ao projeto hegemônico de progresso da 
elite. Por isso se define essencialmente como diálogo libertador, pelo qual opressor e 
oprimido se emancipam e superam as desigualdades sociais. 
Assim podemos dizer que o povo pomerano produz interculturalidade ao fortalecer lutas 
coletivas juntamente com outros povos tradicionais, o que se traduz, por exemplo, nas 
agendas específicas deste grupo social (e o PROEPO é uma causa apoiada pelos coletivos 
dos pomeranos) e/ou nas pautas discutidas e encaminhadas na Comissão Nacional dos 
Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto 6040/2007). São práticas de resistência e 
por isso mesmo também ações articuladas de libertação. A conquista de direitos sociais 
pelos excluídos é, portanto, mola propulsora da interculturalidade no cenário da América 
Latina. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Os indivíduos do povo pomerano por muito tempo se consideraram e foram chamados 
pelos outros como alemães. Havia, porém, muito preconceito em relação à cultura 
pomerana, considerada inferior aos costumes dos alemães (Tressmann: 2005; Thum: 
2009; Bahia: 2011; Siller: 1999). Hoje se produzem reconhecimentos acadêmicos com 
pesquisas sobre a cultura e língua pomeranas. Uma das formas de dominação de um povo 
sobre outro se dá pela imposição da língua, a exemplo do que ocorreu e continua muito 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03452
presente no Brasil em relação aos povos indígenas. Esse é o modo eficaz, apesar de se 
constituir um processo lento, de um grupo dominante impor sua cultura a outro grupo não 
hegemônico. De certa maneira, a nacionalização do ensino no Brasil cumpriu este papel 
em relação aos povos de cultura germânica no século passado. 
No ano de 1530, a Reforma Luterana é introduzida na Pomerânia (Röelke, 1996), assim, 
a língua alemã foi imposta e estabelecida nas igrejas, escolas e repartições públicas da 
Pomerânia. Depois da imigração do pomeranos, os pastores luteranos enviados para as 
comunidades realizavam os cultos nas igrejas e ministravam aulas nas primeiras escolas 
também na língua alemã. Durante a Segunda Guerra Mundial, com a nacionalização do 
ensino, a política de Getúlio Vargas instituiu a proibição da língua alemã, tornando 
obrigatório somente o uso nas comunidades e nas escolas da Língua Portuguesa. 
Porém, mesmo à margem do projeto cultural hegemônico no país, os praticantes da língua 
pomerana falada, por inúmeras vezes, optaram por estratégias de transgressão ideológica 
e recusa à opressão das classes dominantes. Assim mantiveram sua língua materna em 
diferentes contextos sociais, longe do controle do poder oficial (lar, trabalho na lavoura, 
mutirões, festas comunitárias, casamentos etc.). A resistência dos pomeranos indica uma 
postura de luta pelos direitos sociais na perspectiva das práticas iterculturais, da mesma 
forma que outros povos tradicionais o fizeram e continuam fazendo no cenário brasileiro 
e da América Latina. Hoje os pomeranos se fortalecem no contato mais direto com outros 
povos tradicionais, como, entre outros, os indígenas e quilombolas, ribeirinhos, o que 
coloca para a universidade o desafiode aprofundamento de estudos na perspectiva 
intercultural, no esforço de se interpretar aspectos da língua e culturas do povo tradicional 
pomerano no Brasil. 
 
REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS 
 
BAHIA, Joana. O tiro da bruxa; identidade, magia e religião na imigração alemã. 
Rio de Janeiro: Gramond/FAPERJ, 2011. 
BRASIL. Decreto Federal nº 6.040 de 07 de fevereiro de 2007. Disponível: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6040.htm Acesso 
em 25 de julho de 2013. 
COSMO, Marciane. Ser pomerana: história que desvelam a memória, a experiência 
e os sentidos de ser professora. Vitória: PPGE/UFES (dissertação de mestrado), 2014. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03453
DELBONE, J. H. B. A Educação Intercultural: um estudo de caso sobre o Projeto de 
Educação Escolar Pomerana (PROEPO). Curso de Especialização Lato Sensu 
“infância e Educação Inclusiva”. Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, 
Vitória. 2005. 
FICHTNER, Bernd et al. Cultura, dialética e hegemonia: pesquisas em educação. 
Vitória: EDUFES, 2013. 
FOERSTE, Erineu. Parceria na formação de professores. São Paulo: Cortez, 2005. 
______. Língua e diversidade In.: Anais do III POMMER BR. Pomerode/SC: Secretaria 
Municipal de Educação de Pomerode/UFES/UFRG. 2013 
FOERSTE, Erineu et al. Educação do campo: saberes e práticas. Vitória: EDUFES, 
2013. 
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança – Um reencontro com a Pedagogia do 
Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1992. 
HARTWIG, Adriana Vieira Guedes. Professores (as) pomeranos (as): um estudo de 
caso sobre o Programa de Educação Escola Pomerana – PROEPO no município de 
Santa Maria de Jetibá/ES. Vitória: PPGE/UFES (dissertação de mestrado), 2011. 
JACOB, Jorge Küster. Bate-paus. Documentário Revelandobrasis, 2005 
______. População pomerana no Estado do Espírito Santo – Brasil. Vila Pavão – ES: 
Secretaria Municiapl de Cultura, 2012. 
KRÜGER, Vanildo. "Pomeranos, a Trajetória de Um Povo". Filme. Santa Maria de 
Jetibá, ES, 2009. Disponível em: www.youtube.com 
MERLER, Alberto et al. Educação do campo: Diálogos interculturais em terras 
capixabas. Vitória: EDUFES, 2013. 
MIAN, Bernadete Gomes. Educação de filhos de imigrantes alemães no Espírito 
Santo: um processo pouco explorado. Dissertação (Mestrado em Educação) – 
Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 1993. 
NAGLE, J. Educação e sociedade na Primeira República. São Paulo: E.P.U. –Editora 
Pedagógica e Universitária Ltda, 1974. 
RAMLOW, Leonardo. Conflitos no processo de ensino-aprendizagem escolar de 
crianças de origem pomerana: diagnóstico e perspectiva. Dissertação (Mestrado em 
Educação) – Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2004. 
RÖELKE, Helmar Reinhard. Descobrindo raízes: aspectos geográficos e culturais da 
Pomerânia. Vitória: UFES. Secretaria de Produção e Difusão Cultural, 1996. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03454
SÁ, Ricardo e FOERSTE, Erineu. A estrada silvestre. Documentário. Vitória – ES, 
2010. 
SEMERARO, Giovanni. Gramsci e os novos embates da filosofia da práxis. 
Aparecida/SP: Ideias e Letras, 2006. 
______. Libertação e hegemonia; realizar a América Latina pelos movimentos 
populares. Aparecida/SP: Ideias e Letras, 2009. 
SILLER, Rosali Rauta. A constituição da subjetividade no cotidiano da Educação 
Infantil. Dissertação, (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Espírito Santo, 
Vitória, 1999. 
THUM, Carmo. Educação, história e memória: silêncios e reinvenções pomeranas na 
Serra dos Tapes. São Leopoldo: UNISINOS (tese de doutorado em educação), 2009. 
______. Ethos pomerano. In.: Anais do III POMMER BR. Pomerode/SC: Secretaria 
Municipal de Educação de Pomerode/UFES/UFRG. 2013 
TRESSMANN, Ismael. Da sala de estar à sala de baile - Estudos etnolinguisticos de 
comunidades camponesas pomeranas do estado do Espírito Santo. 2005. Dissertação 
(Doutorado em Estudos Lingüísticos) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de 
Janeiro, 2005. 
______. Língua e diversidade. In.: Anais do III POMMER BR. Pomerode/SC: 
Secretaria Municipal de Educação de Pomerode/UFES/UFRG. 2013 
TRESSMANN, Ismael; DALEPRANE, Luzia Fiorotti; KUSTER, Síntia Bausen. O 
programa de Educação Escolar Pomerana. II Congresso Consad de Gestão Pública: 
Painel 54: Inovações em programas educacionais, 2008. Disponível em: 
www.seplag.rs.gov.br/download.asp?nomeArq=Painel_54_Sintia...pdf. Acesso em 15 23 
de dezembro de 2009. 
WEBER, Merklein Gerlinde. A escolarização entre descendentes pomeranos em 
Domingos Martins. 1998.Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal 
do Espírito Santo, Vitória, 1998. 
 
NOTAS: 
 
(*)Professor Associado da Universidade Federal do Espírito Santo. 
(1) O Decreto Federal nº 6.040 de 07 de fevereiro de 2007 institui a Política Nacional de 
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Foi criada uma 
comissão nacional de povos tradicionais em que os pomeranos têm assento. 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03455
(2) A primeira colônia de imigrantes germânicos estabelece-se em Santa Isabel, 
Domingos Martins no Estado do Espírito Santo. 
 (3) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fonte: Acervo Família Foerste; Autor Emílio Schultz (Pancas); Data 1942. 
(4) A assim chamada Era Getúlio Vargas da história do governo brasileiro inicia-se em 
1930 com a eleição democrática do caudilho legado pelo Estado do Rio Grande do Sul e 
termina com o seu suicídio em 1945. 
(5) O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE não incluiu ainda no censo 
nacional questões específicas sobre o povo pomerano, a exemplo do que já vem sendo 
feito oficialmete no caso dos indígenas e quilombolas 
(6) População Pomerana do Estado do Espírito Santo - Brasil - estimado 
 
MUNICÍPIOS 
 
POPULAÇÃO (IBGE\2010) 
 
PERCENTUAL 
 
ESTIMATIVA 
POMERANOS 
1 - Santa Maria de Jetibá 34.774 80% 27.819 
2 - Laranja da Terra 10.826 70% 7.578 
3 - Vila Pavão 8.672 60% 5.203 
4 - Domingos Martins 31.847 60% 19.108 
5 - Pancas 21.548 40% 8.619 
6 - Afonso Cláudio 31.091 60% 18.654 
7 - Baixo Guandú 29.081 40% 11.632 
8 – Itaguaçu 14.134 40% 5.653 
9 – Itarana 10.881 50% 5.440 
10 - Vila Valério 21.823 30% 6.546 
11 - São Gabriel da Palha 31.859 10% 3.186 
12 – Colatina 111.788 5% 5.589 
13 - Marechal Floriano 14.262 30% 4.278 
14 - outros Municípios 16.000 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03456
Quadro: População Pomerana do Estado do Espírito Santo - Brasil (dados aproximados) 
(7) Sobre o conceito de língua pomerana consultar: Tressmann (2005) e Tressmann et al 
(2009). 
(8) Consultar as homepage: www.ufes.br e www.ppge.ufes.br 
(9) Ver filmes e documentários sobre os pomeranos: Jacob (2005) – Bate-paus; 
Krüger (2009) – A trajetória de um povo; Sá e Foerste (2010) – A estrada silvestre; entre 
outros. 
TOTAL 145.309 
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 3
03457

Outros materiais