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Teoria da História Aula 08 Os direitos desta obra foram cedidos à Universidade Nove de Julho Este material é parte integrante da disciplina, oferecida pela UNINOVE. O acesso às atividades, conteúdos multimídia e interativo, encontros virtuais, fóruns de discussão e a comunicação com o professor devem ser feitos diretamente no ambiente virtual de aprendizagem UNINOVE. Uso consciente do papel. Cause boa impressão, imprima menos. Aula 08: O cristianismo e seu conceito de história Objetivo: Entender as concepções de história resultantes do surgimento e da propagação do cristianismo no mundo antigo. O nascimento do cristianismo O surgimento do cristianismo (ideias e instituições) teve um impacto muito importante no mundo antigo. Porém, isso não foi imediato: realizou-se uma lenta construção histórica, do século I ao século V, que levaria a igreja cristã à posição de religiosidade oficial do Império Romano, por decreto de Teodósio, no ano 380 da chamada Era Cristã. A igreja cristã encontrou suas origens na Palestina, no contexto da Judeia dominada pelo Império Romano. A figura de Jesus de Nazaré (século I), conhecido também como o Cristo (ou seja, ―ungido‖), suas palavras e atos interpretados e gravados por seus seguidores são os elementos centrais ligados ao surgimento da igreja. Jesus não fundou propriamente uma instituição religiosa, mas compôs um grupo de seguidores, chamados pela igreja de ―apóstolos‖ (que quer dizer ―enviados‖). A mensagem de Jesus, que conhecemos pelos registros do Novo Testamento, de fato instituiu uma nova religiosidade em parte baseada nas tradições judaicas da Bíblia1, particularmente da parte que ficou conhecida posteriormente como Velho Testamento, porém também inovava em aspectos teológicos e cerimoniais, o que levou seus contemporâneos a inicialmente imaginar que se tratava de mais uma seita judaica. A pregação do Cristo incomodou as autoridades judaicas a ponto de levá-las a tramar seu aprisionamento sob a acusação de conspirar contra o imperador romano. Preso e condenado, foi crucificado conforme a tradição punitiva romana. Os seguidores principais do Cristo, rodeados de fiéis convertidos ao seu evangelho2, constituíram em Jerusalém uma primeira comunidade cristã de religiosos, liderada pelo apóstolo Pedro, um rústico pescador da Galileia. Tais seguidores afirmavam ter o seu mentor ressuscitado três dias após sua execução. As ideias dos apóstolos sobre a história Estabelecidos em Jerusalém, os primeiros cristãos estavam confusos sobre suas próprias ideias, que não conseguiam diferenciar de imediato da religiosidade judaica. Sob o comando de Pedro, confiavam no retorno iminente do Cristo à terra — que chamavam de ―parusia‖3 — e no início de um tempo de salvação. Sua confiança era tanta no cumprimento rápido desse evento que iam se desfazendo dos seus bens para aguardar a volta do Cristo, entendido como o filho de Deus e salvador do mundo. Isso está relatado no livro do Novo Testamento, que se denomina ―Atos dos Apóstolos‖, produzido pelo primeiro historiador cristão, o médico e evangelista Lucas. Fechados em suas concepções judaizantes, os cristãos de Jerusalém viam a mensagem do Cristo como algo reservado ao usufruto dos herdeiros de Israel. Parte deles esperava o julgamento divino e a realização do ―Reino de Deus‖, que poria fim ao tempo de sofrimento terreno e inauguraria um tempo eterno de felicidade. Mas havia também quem esperasse o fim do domínio romano e a condução dos judeus à condição de nação privilegiada entre todos os povos. O não cumprimento das expectativas imediatas da ―parusia‖ e a aparição de outro líder de grande importância (o apóstolo Paulo de Tarso, um culto judeu convertido ao cristianismo, que se tornaria a sua maior figura) deram à pregação cristã contornos quase que definitivos. Paulo entendia a história como marcada irresistivelmente pela vontade divina. O tempo do Cristo e da pregação da igreja constituía-se no período da graça, ou seja, da oportunidade de salvação estendida a todos os povos da terra. Essa é a razão pela qual o cristianismo se tornou, em termos teológicos, a primeira religião, de fato, global, tendo Paulo de Tarso empreendido viagens evangelizadoras nas quais ia constituindo pequenas comunidades cristãs em diferentes cidades da Ásia Menor e da Europa mediterrânea. Para os cristãos do século I, portanto, a história era o tempo da ação divina em busca da salvação da humanidade. Deus, criador e consumador da história, em última instância seria o responsável pela condução dos homens, encaminhando-os por meio do Cristo para seu ponto alto, para o final dos tempos. A responsabilidade pela história seria de Deus, e não dos homens, estes constituídos em expectadores da ação divina. Ideias certamente muito diferentes das que norteavam os historiadores greco-romanos, estes últimos empenhados em seu propósito de mostrar a ação dos homens como definidoras dos caminhos da história. Os pais da Igreja e a acomodação do pensamento histórico cristão A chegada do século II e o desenvolvimento do processo de institucionalização do cristianismo trouxeram consigo novos problemas e algumas acomodações para os cristãos. Outrora combatentes do pensamento helênico e da cultura filosófica greco-romana, os chamados ―pais da igreja‖ (os bispos, teólogos e líderes que conduziam os cristãos e pastoreavam as comunidades de fiéis espalhadas pelo Império Romano) foram se tornando, pouco a pouco, homens que dialogavam com seu próprio tempo. É o caso de Eusébio de Cesareia, bispo importante que viveu na segunda parte do século III e nas primeiras décadas do século IV. Ele buscou compor uma cronologia que harmonizasse os relatos bíblicos e as expectativas do cristianismo a crônicas e feitos de monarcas do mundo antigo. Para ele, o tempo de salvação deveria ser aguardado em função do cumprimento das profecias e da observação meticulosa dos fatos históricos. As palavras bíblicas passaram a ser observadas cada vez mais por seu lado profético4, levando os cristãos a desenvolverem uma escatologia5 voltada à percepção do tempo de definição da história. O reconhecimento do cristianismo católico, no século V, como religião oficial, constituiu-se em tentativa romana de aproveitar a presença cristã, nos diferentes pontos do Império, pondo-a a serviço do Estado romano; este último, já fragilizado, acabou por confirmar no espírito dos cristãos suas esperanças escatológicas de aproximação do fim da história. Santo Agostinho e a queda de Roma O bispo católico da cidade africana de Hipona, Agostinho (354–430 d. C.), foi canonizado6 pela Igreja Católica Romana e é tido como referência da religião. Sua importância como teólogo cristão e filósofo antigo é inegável. No que toca à história e sua compreensão, Santo Agostinho tornou-se o grande intérprete da história entre os cristãos antigos. Em seus dias de episcopado, assistiu à paulatina derrocada do Império Romano do Ocidente e plasmou em sua obra Cidade de Deus aquilo que seria uma espécie de visão definitiva da teologia em relação à história humana. Para Agostinho, os cristãos não deveriam temer a falência do Império e a ascensão dos povos vistos como pagãos ao palco da história. Os planos de Deus, não teriam mudado. Era preciso perceber como a ―cidade de Deus‖, entendida enquanto a ação e a presença divina na terra através da Igreja, sobreporia, gradualmente, a ―cidade dos homens‖— esta, pecadora e desprezível. Os propósitos de Deus seriam cumpridos e a história seria finalizada, com a participação fiel e esperançosa dos cristãos. Conclusão Começamos esta aula nos referindo ao impacto da mensagem cristã na história, a ponto de marcar o mundo, particularmente a cultura ocidental, com suas formas de ver a realidade humana e a história. Embora tais marcas tenham se notabilizado pela formação de toda uma cultura, é evidente que, do ponto de vista teórico, tal compreensão cristã afastou, por vários séculos, em particular, nos tempos da Antiguidade e da Idade Média, certa tradição historiográfica de reconhecimento do protagonismo do homem na história. A compreensão cristã da história reforçou uma visão de sociedade marcada pela hierarquização social e política, bem como facilitou a dominação dos senhores feudais sobre os camponeses e demais excluídos no universo medieval. Saiba mais Bíblia1: livro sagrado dos judeus e dos cristãos. No caso da Bíblia cristã, compõe-se de duas partes, o Velho Testamento, que é exatamente a parcela judaica dessa tradição, e o Novo Testamento, que é a seção onde estão registrados os ensinos de Jesus e dos apóstolos. A Bíblia conheceu um longo processo de formação, constituindo-se em um livro composto de diferentes tradições e de muitos autores. Evangelho2: palavra grega que significa ―boa notícia‖ ou ―boa nova‖. Era como os seguidores do Cristo designavam a sua mensagem em uma referência geral aos seus ensinos salvacionistas. Parusia3: palavra aramaica que significa ―retorno‖. Era usada entre os cristãos antigos para se referirem à esperada volta triunfal de Jesus Cristo ao mundo. Profético4: a profecia é um tipo de literatura antiga (costumeira entre os judeus e adotada pelos cristãos), que antecipa o fim dos tempos por meio do descortino de fatos do presente. Profético é um termo que indica aquilo que tem relação com esse tipo de literatura ou discurso religioso. Escatologia5: doutrina bíblica que trata das questões finais da história e da consumação dos tempos segundo a vontade divina. Canonizado6: palavra que se refere a alguém que se tornou um santo reconhecido pela Igreja Católica Romana. O processo de canonização demanda, no interior da Igreja, a busca de provas que demonstrem a condição espiritual superior daquele a quem se busca santificar. REFERÊNCIAS DANIÉLOU, J.; MARROU, H. (Org.). Nova História da Igreja. Dos primórdios a São Gregório Magno. Petrópolis: Vozes, 1984. FONTANA, J. História: análise do passado e projeto social. Bauru: EDUSC, 1998.
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