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DIREITO CONSTITUCIONAL II CADERNO Ingrid Grandini Professor: Thiago Bastos Baseado nas transcrições do noturno 2016.1 I. Dignidade da Pessoa Humana O estudo dos direitos fundamentais em espécie deve se iniciar a partir do instituto da dignidade da pessoa humana. Embora ela esteja no art. 1º e seja um fundamento da República, e não seja expressamente citado no rol do art 5º, o instituto é o elo entre todos os direitos fundamentais ali elencados. Mais que isso: é o ponto de partida para a que um direito externo Título II possa ser considerado direito fundamental. É da dignidade da pessoa humana, portanto, que partem os direitos fundamentais. Para além de um instituto jurídico, a dignidade da pessoa humana é considerado um valor de feições kantianas que influencia os direitos mais básicos da sociedade. Sob a ótica kantiana, o homem é um fim e m si, ou seja, jamais poderá ser instrumento para alcançar uma outra finalidade. É em razão da importância central que a dignidade que se incorpora ao texto constitucional, ganhando materialidade através dos direitos fundamentais, a partir das Constituições de Weimer e do México, mas sobretudo após da segunda guerra mundial – período de ascensão do pós-positivismo, onde o direito se reaproxima da moral, ou período da “virada kantiana”, onde os princípios de direito ganham força normativa. Transcendendo da esfera política para a esfera jurídica, da dignidade humana derivou o instituto do mínimo existencial, elencado pela professora Ana Paula de Barcellos como 4 parâmetros: educação básica, saúde básica, acesso ao judiciário e assistência aos desamparados. E, assim, considerando que esses elementos seriam “o mínimo” essencial à dignidade humana, passam de princípios abstratos ao viés de regras, exigindo aplicação imediata, portanto. Para Barroso, os princípios terão três efeitos: 1) Eficácia positiva: dentro dos princípios é possível encontrar regras, comandos explícitos que o Estado deve cumprir e, se não cumprem, o judiciário deve controlar. (ex. a materialização de direitos) 2) Efeito negativo: o princípio consegue limitar o direito, barrar certas ações estatais ou de particulares. O princípio vale nas relações horizontais, verticais; nas relações públicas e privadas. (ex. Ellwanger – liberdade de expressão vs. discurso de ódio) 3) Eficácia interpretativa: os direitos fundamentais irradiam por todos os documentos políticos e são parâmetros de interpretação de todo o ordenamento jurídico. A diginidade da pessoa humana é, então, além do mais, balizador interpretativo do ordenamento jurídico, costurando os direitos fundamentais e, quando da colisão destes, sendo o parâmetro de ponderação. De igual modo, é a lente pela qual serão identificados outros direitos fundamentais externos ao Título II da Constituição e, com isso, determinando alguns limites materiais do poder de reforma constitucional. Desse modo, podemos afirmar que a dignidade da pessoa humana é a “costura” de todo o sistema de direitos e garantias fundamentais, dado seu alto poder de irradiação. O primeiro ponto sobre a dignidade da pessoa humana considera, como vimos, que o homem é um fim em si, e, com isso, proteger a dignidade humana é garantir a sua inviolabilidade. John Rawls: “Cada pessoa tem uma inviolabilidade fundamentada na justiça que nem mesmo uma sociedade inteira pode sobrepujar”, é a ideia de que o homem é um fim em si mesmo (Kant), ele não é um objeto, você não pode instrumentalizar. ● Autonomia: que dá a ideia de que o indivíduo tem o direito de viver de acordo com as suas escolhas -- sendo isso algo existencial. Com isso, ainda que o Estado possa intervir em algumas escolhas individuais que afetem a convivência e o bem-estar coletivos (usar capacete ou cinto de segurança, por exemplo), não deve fazê-lo naquelas de caráter existencial individual (aspectos de identidade, profissionais etc). A autonomia consiste, portanto, em ter a capacidade de realizar as escolhas existenciais, que vão condicionar o modo como se vai viver. A autonomia, entretanto, é diferida e dependente do nível de capacidade individual, ou seja, se é relativamente incapaz as escolhas podem ser relativamente restritas, se é absolutamente incapaz, ainda mais restrita. Assim, vai-se graduando a autonomia em razão da capacidade de escolhas. Autores 1. Kant 2. Barroso: de que você tem que ser maior e capaz para manifestar de forma clara, específica e decisiva que você não quer, você prefere morrer do que receber uma transfusão de sangue, por exemplo. Exemplo 1: Aborto X Autonomia da Mulher Exemplo 2: Maconha para fins medicinais ● Mínimo Existencial: condições materiais básicas de vida, ou aquilo que Ana Paula de Barcellos se refere. Segundo a autora, para que um ser humano viva de forma digna é preciso a efetividade de alguns direitos, sobretudo o acesso à educação básica, à saúde básica, à assistência aos desamparados e acesso à justiça, caso algum direito seja violado. Sem acesso ao judiciário, não se vive de forma digna, não se podendo exigir do Estado a efetivação dos direitos. Importa destacar que esses elementos não são o mínimo de direitos, mas um núcleo básico dentro de dignidade da pessoa humana, não sendo um rol taxativo, mas exemplificativos (temos também as liberdades clássicas), de onde sem eles se estaria abaixo do nível mínimo de dignidade humana. Nesse sentido, o mínimo existencial, o núcleo da dignidade da pessoa humana tem um viés de regra, que deve ser efetivado, se configurando em direito subjetivo do cidadão, portanto. o Saúde Básica: não é aquela que evita a dor e a morte. O mínimo encontrado na Constituição é: pré-natal, saneamento básico e campanhas de vacinação. O ideal é que se expanda essa linha de dignidade com políticas públicas e leis. o Educação Básica: é o mínimo de educação que se vai ter para um indivíduo ser considerado digno. Na época da tese: até o ensino fundamental e ensino médio como norma programática. Pós EC 2009, ensino médio como obrigatório a partir de 2016. o Assistência aos desamparados: alimentação, vestimenta e moradia. Políticas públicas que efetivem esses direitos como: Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Vale Social, Aluguel Social. o Acesso ao Judiciário: eu preciso ter acesso ao judiciário para garantir que aqueles que são os mais frágeis da sociedade consigam respaldo do judiciário para que o seu mínimo seja efetivado e assegurado Embora a proteção ao mínimo existencial e ainda que ao cidadão seja garantida a busca de sua efetivação inclusive por meio do sistema judiciário, esse mínimo deve se constituir do que seja possível universalizar. Nesse sentido, não caberia constranger o Estado a matricular um aluno, por exemplo, em uma determinada escola de elite em razão de eventual falta de vagas na escola pública. Para efetivar esse direito, então, o Estado buscaria viabilizar a matrícula em uma escola de nívelcompatível com as escolas públicas. Ou, em outras palavras, o mínimo é aquilo que o Estado conseguiria universalizar, ainda que não houvesse uma política pública. ● Dignidade como Reconhecimento: Para a vida digna, deve ser garantida ao indivíduo a possibilidade de autorrealização, através da promoção de condições que garantam o exercício da autonomia através da igualdade material. Com isso, busca-se que a não estigmatização que conferem e limitam os papeis sociais em razão de atributos sociais ou de identidade individuais (gênero, etnia, classe social etc), ou seja, busca-se desnaturalizar ideias de simetria, de esteriótipos. O Estado não pode permitir que a estimatização ocorra nas instituições estatais. O Estado não vai ter como interferir em certos comportamentos sociais em prol de uma utopia, sob pena de se criar uma distopia. ➢ a DPF 132, que promoveu a união homoafetiva: não foi feita apenas para estender direitos patrimoniais a pessoas do mesmo sexo que resolvem constituir família é reconhecer que pessoas do mesmo sexo podem constituir núcleo familiar Exemplo 3: o negro que não poderia ser astrofísico Exemplo 4: o estudante da UERJ que foi confundido, PELA PM, com assaltante por ser negro ● Viés metodológico da DHP : busca evitar a banalização do instituto. A partir do art. 5º, já no caput, podemos perceber o tripé básico, essencial, de valores: igualdade, vida e liberdade. Eu não posso banalizar a dignidade da pessoa humana, porque se tudo for dignidade da pessoa humana, nada é dignidade da pessoa humana. II. Os direitos fundamentais em espécie de fato Quando a gente fala no artigo 5, caput, três valores essenciais: igualdade, vida e liberdade, ou seja, é um tripé básico do artigo 5. a) Igualdade A igualdade, no direito, surge no contexto do iluminismo, em sua dimensão formal. Na época, o que se buscava era o tratamento isonômico entre a nobreza e a burguesia, a ruptura com os privilégios estamentais, o fim de uma discriminação jurídica injustificável . A evolução histórica, entretanto, demonstrou a insuficiência da igualdade formal, dado às evidentes desigualdades sociais. A igualdade formal consiste, genericamente, portanto, no tratamento igual. Ocorre, porém que, eventualmente, ao tratar de maneira igual indivíduos em condições de desigualdade, reforça-se a desigualdade. Assim, eventualmente, é necessário um tratamento desigual que busque recolocar os indivíduos em patamar de igualdade. Em outras palavras, a igualdade material justifica determinados tratamentos desiguais com o propósito de reequilibrar a condição de igualdade (discriminação positiva). "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade". Quando eu trato alguém de modo igual, eu não levo em conta critérios para diferenciar o fato de nós podermos estar em patamares diferenciados. Quando eu trato alguém como um igual eu aloco critérios para que possamos reaproximar os patamares, aparar as arestas que nos distanciam. Autores: Sarmento, Ingo e Gilmar Mendes - discurso de igualdade formal não se efetivou. É importante esclarecer que a busca por igualdade material não está restrita aos aspectos econômicos, mas também e talvez até principalmente, às práticas sociais, culturais e simbólicas, as quais também, notadamente, afetam a dimensão de acesso econômico. Embora nem o Estado, nem o Direito sejam capazes de impor um determinado pensamento de igualdade aos sujeitos, considerando isso ser algo de natureza íntima e subjetiva, eles têm a capacidade de propor soluções de fortalecimento àqueles públicos mais vulneráveis, com o propósito de fortalecê-los, evitando ou minimizando os estigmas e as perseguições. Exemplo 5: o nome social, as políticas públicas de cotas etc. A igualdade material será perseguida pelo Estado através de políticas públicas e da prestação de serviços, principalmente de saúde e educação (do mínimo existencial). Na busca pela efetivação dos objetivos e fundamentos da República, o Estado se vale, dentre outras coisas, do federalismo fiscal. Assim, a isonomia poderá ser violada, por exemplo, na tributação diferenciada em razão da renda ou da exteriorização de riqueza, no acesso a programas de redistribuição de renda para famílias de baixa renda etc. Autor: Heleno Torres - federalismo fiscal é um meio pelo qual o Estado efetiva e garante a persecução dos objetivos e fundamentos da República. Cota não é sinônimo de ação afirmativa. As ações afirmativas se valem de critérios para promover a discriminação positiva , utilizando elementos que se mostram razoável para promover o reequilíbrio social. Contudo, sempre que vigorar um tratamento diferenciado, deve-se “acender” a luz vermelha, com o cuidado que tal política pública, buscando inclusão, não acabe por gerar discriminação indireta. Exemplo 6: em razão da EC nº 20, que previa um teto de beneficio previdenciário, atingindo também o salário-maternidade. A consequência imprevista foi a maior dificuldade enfrentada por mulheres em razão da discriminação enfrentada no mercado de trabalho. Ao estabelecer o teto previdenciário, que buscava limitar o gasto previdenciário, fez com que as empresas se vissem obrigadas a complementar o salário das funcionárias em licença maternidade, ao mesmo tempo em que teriam de arcar com os custos de substituição do posto de trabalho. A elevação do custo da mão de obra potencialmente tornou-se desencorajadora, afastando o interesse pela contratação de mulheres que pudessem se afastar em razão da maternidade. ➢ O STF, em relação a isso, disse que vale o teto, mas se excepciona o salário maternidade Exemplo 7: medida que exigiu a apresentação de título de eleitor e identidade para votar. Embora a norma não visasse essa finalidade, o que ocorreu foi que majoritariamente pessoas mais esclarecidas renovaram seus títulos eleitorais, o mesmo não ocorrendo com pessoas com menos instrução. Assim, o que se observou foi que classes sociais mais favorecidas votaram e pessoas de classes menos favorecidas seriam impedidas de votar, configurando discriminação indireta. Em ambos os casos, a norma, que se pretendia neutra, foi promotora de discriminação indireta. Exemplo 8: Lei dos Entorpecentes o objetivo era ser mais liberal à política de drogas, diferenciar quem era o traficante e quem era o usuário. Porém, o efeito concreto foi que começou a gerar um tratamento diferenciado e comoçou a estigmatizar um grupo já estigmatizado, uma vez que o negro era tido como o traficante e o branco, usuário. Igualdade não significa não discriminação. Muitas vezes a igualdade exige discriminação. O critério utilizado para discriminação deve se mostrar razoável para a finalidade pretendida. Critérios justos e necessários são válidos para tratamento diferenciado quando a finalidade da discriminação justifique. Assim, as ações afirmativas são exemplos de políticas de discriminação positiva que objetivam reequilibrargrupos em condições iniciais de desigualdade. Assim, utilizamos um critério não típico (atípico) para diferenciar os direitos. A ideia de ação afirmativa busca resguardar integrantes de grupos historicamente subordinados e vulneráveis. Assim, é legítimo o uso de um critério “não típico” para discriminar. Nem toda medida de promoção de igualdade substancial é política de ação afirmativa. a.1) Ações afirmativas: Utilização de critério atípico para diferenciar os direitos, buscando resguardar integrantes de grupos historicamente subordinados e vulneráveis. Autores: STF compensação histórica. Michel J. Sandel – caso Cheryl Hopwood “Os críticos alegam que os beneficiados não são necessariamente aqueles que sofreram, e os que acabam pagando pela compensação raramente são os responsáveis pelos erros que foram cometidos. (...)Se a questão for ajudar as pessoas em desvantagens, argumentam os críticos, que a ação afirmativa deveria basear-se na classe social, não na raça. Se o critério racial tiver como objetivo compensar a injustiça histórica da escravidão e da segregação, qual seria o motivo para que se impusesse o ônus a pessoas como Hopwood, que não tiveram participação nesse processo de injustiça? A resposta a essa objeção permeia o difícil conceito de responsabilidade coletiva. Temos a responsabilidade moral de corrigir erros cometidos por uma geração anterior à nossa”. - Surgiram na Índia para romper com o sistema de castas e fomentar a mobilidade social. Porém, ganhou mais força nos Estados Unidos. O STF defende que devem haver ações afirmativas porque você pega a audiência pública, você tem estudos que comprovam que você negro pra chegar num patamar parecido com o do branco, vai precisar de 5, 6, 7 gerações, e isso são centenas de anos. O Estado não pode ficar omisso em relação a isso, porque quando se trata de direitos fundamentais, ele tem um dever de agir, ele tem um dever de proteger e principalmente ele tem um dever sob a ótica da igualdade material de efetivar direitos e garantias e diminuir o gap que existe entre eles ● Fundamentos das ações afirmativas: 1. Igualdade material: melhora as condições de pessoas em situação de vulnerabilidade 2. Compensação: viés de justiça compensatória/reparatória 3. Pluralismo: o âmbito acadêmico tem que ser plural 4. Reconhecimento: quebra de estereótipos culturalmente criados, propicia alteração de significados culturais. Às vezes é possível conciliar para que dois direitos sejam coordenados. Exemplo 9: É o caso dos indivíduos de crença adventista, que cuja prática religiosa impede a participação, por exemplo, no ENEM. Visando contornar tal condição, os seguidores ficam reclusos em ambiente de prova até o horário determinado, quando então realizam a mesma prova que os demais candidatos. Assim, o princípio da isonomia é ajustado, conciliado, mantendo a prova com o mesmo grau de dificuldade para ambos os grupos. Exemplo 10: Outro exemplo de conciliação que busca respeitar a cultura do indivíduo é visto no STF. Naquela corte a presença vestido de terno é uma ordem, e, sem ele, um cidadão comum é impedido de entrar. Ocorre, porém, que para ternos são elementos culturais estranhos aos índios. Assim, esses grupos se valem de outras vestimentas solenes para frequentar o espaço da Corte Constitucional. b) Direito à Vida: A vida é um dos valores presentes no caput do art. 5º. O direito à vida não pode ser considerado uma liberdade, uma vez que é indisponível e não absoluto. Não é permitido ao indivíduo deliberar sobre o seu direito à vida. Se assim fosse, poderia escolher viver ou morrer – o que o Estado não permite. Ainda que desejasse e pudesse invocar sua autonomia, o Estado buscará manter o indivíduo vivo, mesmo contra sua vontade. É nesse sentido que são criminalizados aqueles que induzem, instigam ou colaboram para o suicídio. Assim, o direito à vida não é uma liberdade. Uma vez que todo ser humano é dotado de dignidade, que é intrínseca, inerente a ele, a vida é um direito indisponível. Ainda que se possa questionar o processo sócio-histórico de construção do instituto “pessoa” no Direito, considerando as múltiplas formas de escravidão que o mundo observou, o alijamento das mulheres e muitas outras naturezas de segregação, a proteção à vida teve importância durante toda a história da humanidade (Ingo Sarlet) e apareceu expressamente na Declaração de Virgínia, de 1776 e, (Barroso:) após a Segunda Guerra, tornou-se uma constante nos textos constitucionais ao redor do globo – holocausto. ➢ Brasil: direito à vida de forma expressa na Constituição de 1946 Maioria dos doutrinadores: a vida é um direito fundamental basilar, básico, e a partir dele você tem todos os demais. ● Status Positivo: O Estado tem o dever de agir para garantir a vida. ● Status Negativo: O Estado não pode atentar contra à vida. ● Dimensão subjetiva: à vida, portanto, demanda uma abstenção do Estado de atentar contra ela ao mesmo tempo em que tem o dever de mobilizar recursos para protege-la (prestação). ● Dimensão objetiva a vida como um valor, um bem jurídico que deve ser objetivamente reconhecido e protegido. É dever do Estado deve assegurar o direito à vida. Estado tem dever de proteção específico em face de detentos, por exemplo, que embora tenham o seu direito à liberdade restringido, não perderam o direito à vida. b.1) Concepção Jurídica de vida: ● Teoria Natalista defende que a vida se inicia com o nascimento e a Teoria Conceptista, com a fecundação. A concepção jurídica de vida é alvo de muitos debates, fazendo com que o Direito recorra a outras ciências para determinar seus marcos. Um momento exemplar desses debates no Brasil se deu durante a ADPF 45 que analisou o direito à interrupção da gravidez em caso de fetos anencéfalos. Após intensas discussões e a realização de audiência pública por 4 dias com a participação de mais de 20 instituições e cientistas, a decisão se deu no sentido de que não deve ser considerado como aborto a interrupção terapêutica induzida da gravidez de um feto anencéfalo. ➢ ADIN do anencefálico: “não permitir que a mulher aborte, impõe que ela carregue um caixão em seu útero”. Porque ela vai parir algo que não tem vida. E isso para a mulher é uma pressão psicológica absurda. Importa ao Direito determinar o começo e o final da vida de modo a poder graduar a sua proteção jurídica. Assim, é relevante identificar o seu início para localizar a partir de quando, a partir de que momento, se inicia a proteção jurídica que o ordenamento vai conferir de forma integral àquela vida. Quanto ao término as divergências são menores, sendo pacífico que a morte cerebral seria o seu limite. O começo, entretanto, comporta posições doutrinárias que variam entre a concepção e o nascimento. Esclareça-se que o direito à vida e o direito à vida digna são não se confundem, ainda que tenham relação bem próxima. A vida existe ainda que não esteja presenteo mínimo existencial, que deverá ser protegido pela ação estatal, de modo que a vida seja exercida de forma digna, propiciando bem-estar da sociedade. Vida digna é, então, uma qualificação da vida, que toma por base a ideia de mínimo existencial, em uma concepção minimamente satisfatória de ordem moral, psíquica e social. Diferente disso, o direto à vida é um direito fundamental que se liga aos marcos de início e fim, desconsiderando, na concepção abstrata de direito, a sua qualidade. A vida digna, por sua vez, impõe um agir do Estado e da sociedade em questões sociais e isso é muito mais do que um direito somente à vida. Ainda que não se possa ter uma vida digna sem o direito à liberdade de expressão assegurada, por exemplo, não há que se falar em ausência, ou lesão à vida, em razão de eventual ameaça àquele direito. A titularidade do direito à vida é universal ainda que o caput do art. 5ª apenas garanta, textualmente, “aos brasileiros e estrangeiros residentes no País”, isso abrange a proteção de todas as formas de vidas e de pessoas, embora não conceitue, nem delimite os marcos temporais da vida. Contudo, há grande arbítrio da jurisprudência e da legislação quanto às proteções à vida, sendo, no caso de embriões e fetos, relativizada e gradativa conforme se aproxima do nascimento. Não existe, portanto, proteção integral entre os períodos de concepção e do nascimento. A proteção jurídica desde a concepção é diferida no tempo. Autores: Sarmento e Ingo - proteção a vida, com relação a aborto, não é linear. Não é 100% desde o momento da concepção até o nascimento, mas sim gradual. Chega a um ponto em que ela se torna linear, que é no nascimento . Não se pode tratar da mesma forma um feto de até três meses com um bebê que já nasceu ou com um feto in vitro. Exemplo 11 – Sarmento: clinica de fertilização que pega fogo. Ainda que a vida seja protegida pelo ordenamento jurídico e, genericamente, não possa ser relativizada, o STF, na ADIN 3510 que questionava o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas científicas, se posicionou favorável à essa possibilidade, a partir do entendimento que a realização das pesquisas seria importante para o avanço da ciência e para a possibilidade descobertas médicas . De igual modo, embora a prática do aborto seja criminalizada no Brasil, a legislação penal aponta que não será punido o aborto em casos de gravidez resultante de estupro ou onde haja risco à vida da gestante. Nota-se, portanto, que a proteção à vida é relativizada no período entre a concepção e o nascimento, sobretudo a partir na ausência de consenso sobre o momento inicial da vida. Além dos exemplos de relativização citados, merece destaque a ADPF 54 que analisou o direito à interrupção da gravidez em caso de fetos anencéfalos, suscitando questionamentos quanto isso ser ou não, em verdade, prática de eugenia. Cabe questionar, então, qual seria o limite da autonomia da mulher e qual seria. Autor: Paulo Boreto - a vida se inicia com a fecundação e cessa com a morte. Pessoa jurídica não tem direito à vida, mas o fato de ela não ter direito a vida não significa que ela pode ser extinta de maneira arbitrária. A pessoa jurídica tem direitos fundamentais, mas não tem acesso a todos os direitos fundamentais. Ainda assim, não se pode descumprir a norma e extinguir de maneira arbitrária. EUA: o aborto pode ser realizado até o 3º mês por decisão da mulher e até o 6º se autorizado pelo Estado. c) Direito às Liberdades: Liberdade deve ser entendida no plural: liberdades. O caput do art. 5º remete à ideia geral de liberdade, contudo o texto constitucional irá referir a diversos tipos de liberdades, liberdade de expressão, de associação, de culto. A ideia geral de liberdade transmite, portanto, uma ideia de valor, que vai tutelar e reforçar as outras liberdades presentes nos incisos. Além disso, funcionará como uma cláusula de abertura, estendendo a garantia constitucional a outros dispositivos do ordenamento. Autor: Ingo Sarlet - direito geral à liberdade fortalece a ideia de que o ser humano tem liberdade a um direito ao livre desenvolvimento da personalidade, da autonomia, da dignidade Dentre todas as modalidades, a liberdade de expressão é o principal valor, um valor essencial da democracia, uma vez que é a partir dela que a democracia se concretiza. A disputa de narrativas. O Estado Democrático de Direito prevê, entretanto, limites à liberdade. O próprio Estado é limitado em sua atuação pelo princípio da legalidade, de onde somente pode agir se em razão de lei, impedindo, com isso, o arbítrio estatal. Desse modo, a liberdade estatal é restrita aos limites legais. Em sentido oposto, a liberdade dos indivíduos é ampla, mas também pode ser limitada em razão de lei. Ou seja, ao indivíduo, é permitido fazer tudo o que a lei não impede; enquanto ao Estado, somente é permitido o que a lei autoriza. Eventualmente uma lei pode ameaçar a liberdade, entretanto leis que ameaçam direitos fundamentais podem ser apreciadas pelo Tribunal Constitucional. c.1) Liberdade de Expressão: A liberdade de expressão é tão cara ao texto constitucional que é referida em nos incisos IV, V, VI, IX, XIV do art. 5º. Além destes, o Capítulo V do Título VIII , tratando de comunicação social, estabelece no art. 220 que não sofrerá qualquer tipo de restrição, sob qualquer forma, a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação. O passado de ausência de democracia fez com o que o constituinte inserisse na nossa Constituição vários dispositivos com vistas a protegê-la. Inúmeras liberdades derivam da liberdade de expressão, como a liberdade religiosa, a liberdade de manifestação . A relevância da liberdade de expressão reside nesta ser o meio de obtenção da verdade e, para tanto, é essencial a pluralidade de narrativas. Sem a pluralidade de narrativas, sem a liberdade de expressão, a democracia de torna fragilizada e comprometida. A liberdade de expressão assegura a deliberação plural sobre assuntos públicos por meio de acesso à informação e por referenciais diferenciados sobre esses temas . A proteção jurídica da liberdade de expressão se dá por 3 motivos básicos, que vão justificar o porquê de a liberdade ser tão importante: democracia, busca da verdade e dignidade da pessoa humana. A) Democracia: 1. Sem liberdade de expressão não há contraditório, não há pluralidade de pensamentos e narrativas; 2. A liberdade de expressão permite o accoutability, o controle social sobre o Estado. 3. Segundo Justice Brandeis, “o melhor desinfetante é a luz do sol”, ou seja, nada é melhor do que jogar luzes sobre um assunto, permitindo que as pessoas olhem, compreendam, debatam e cheguem à sua própria verdade. 4. A liberdade de expressão é o principal mecanismo de que se pode valer o indivíduo para influenciar a formação da opinião públicaé a liberdade de expressão. B) Busca pela verdade: 1. Stuart Mill: “somente é possível saber se uma ideia é boa ou rum por meio do debate”. O debate público fomenta a discussão sobre um tema e passamos a ter argumentos que sustentam posição sobre um determinado tema. Nesse sentido, proibir ou punir pessoas que trazem ideias acaba sendo “perigoso”, podendo gerar duas consequências: a. Quem vai decidir o que pode ser debatido? b. Tira do debate o espaço público que deveria ter. Ainda nesse aspecto, Mill defende que impedir o debate de algo (mesmo que flagrantemente equivocado) enfraquece aquilo que é correto. “As ideias certas deixam de viver nos corações das pessoas e se enferrujam”. Por quê? Porque é o debate que fomenta e mantém a chama acesa daquilo que se julga correto. Um debate constante deixa os argumentos sempre mais afiados e adequados a novas realidades. Há reflexão constante. 2. A verdade é um conceito metafísico e relativo, porém, a noção de liberdade geral é um valor. Assim, o cenário de pluralismo propicia o avanço do pensamento, o desenvolvimento da sociedade e da ciência. C) Direito essencial para a Dignidade da Pessoa Humana 1. A liberdade de expressão garante o desenvolvimento da personalidade e a realização existencial . O ser humano é um ser que se comunica, que influencia e é influenciado em seu pensamento. A convivência humana parte da manifestação do pensamento. 2. A identidade do Homem se forma a partir do contato com o outro. 3. Qualquer intervenção que determine as formas de pensamento e ideias atenta contra a dignidade da pessoa humana. A sociedade como um todo se beneficia da liberdade de expressão. 4. A realização das potencialidades do ser pressupõe sua liberdade de se conduzir e é inerente à vida digna. A abrangência proteção à liberdade de expressão contempla toda e qualquer conduta que objetive exprimir algo, sejam atos ou discursos. Genericamente, todas as formas de expressão são protegidas: gestual, sinal, movimento, representação artística, imagem, som etc. Embora a liberdade de expressão seja cara à democracia e grandemente protegida, sejam as praticadas sob a forma de ato ou sob as formas de discurso, ela não será protegida quando tem em seu núcleo a prática de violência ou de ódio. Assim, discursos que gerem ou busquem o ódio, não serão protegidos como formas de liberdade de expressão, do mesmo modo que a prática de atos de violência não são protegidos. Os atos e discursos de liberdade de expressão não podem reverberar em ódio. Exemplo 12: caso Ellwanger e o livro antissemita e atentado terrorista Em regra, não há impedimento preventivo à liberdade de expressão. Assim, é descabida a censura prévia, mas cessada a expressão, pode-se recorrer ao poder judiciário, buscando reparações (direito de resposta, indenizações, ações penais etc). A regra geral é que o abuso à liberdade de expressão gere indenização a posteriori. Salvo fundamentos substanciais ou de violação à intimidade, eventualmente pode o judiciário determinar alguma limitação à priori, mas genericamente isso se dá à posteriori. Tanto a pessoa jurídica quanto o indivíduo têm a liberdade de expressão protegidos, logo, ambos são titulares. A liberdade de expressão é exercida em face do Estado . E, ainda que os direitos fundamentais incidam sobre as relações privadas, há que ser ter cautela de modo a não se ofender (asfixiar) a autonomia. Exemplo 13: não pode o jornalista determinar a pauta de acordo com o seu pensamento e contrário à linha editorial do jornal, pois isso seria obstáculo à criação de uma linha editorial do veículo. Já houve tentativa de lei eleitoral que impedia o uso do humor para criticar candidatos em período de eleição . O STF, reforçando a liberdade de expressão como pilar da democracia, apontou que em período eleitoral a liberdade de expressão deve ser mais exaltada, declarando sua inconstitucionalidade. Os direitos fundamentais não são, em regra, absolutos, podendo sofrer limitações. Logo, a liberdade de expressão também possui limites. Embora a liberdade de expressão seja bastante defendida, a Constituição veda o anonimato, assegurando o direito de resposta e garantindo o direito à indenização pelos danos morais e materiais causados pelo exercício da liberdade de expressão. Destaque-se que a comunicação não pode ser usada para distorcer a verdade e a Constituição Federal não protege a informação falsa. O sigilo da fonte não se confunde com a o anonimato. O direito de resposta se vale do contraditório no processo público de comunicação, fortalecendo a democracia. A censura não se confunde com controle da mídia. Censura: não deixa eu me manifestar (Ex: Proibição da novela Roque Santeiro em 1975); Controle da mídia: não permitir que um grupo monopolize os meios de informação. Classificação indicativa não é censura. ● Limitações à liberdade expressão: a. Em regra, as limitações são à posteriori b. Vedação ao anonimato c. Direito de resposta d. Direito à indenização por danos morais e materiais em razão de abuso e. Direito não protege a informação falsa, nem distorcida f. Flavia Sanna, doutoranda da UERJ: se sua liberdade de expressão na internet ofender alguém, você pagará por ela. d) Liberdade Religiosa A liberdade religiosa está explicitamente prevista nos incisos VI, VII e VIII, do art. 5º, além do art. 150, VI, b, que protege a imunidade tributária dos templos religiosos . A liberdade religiosa se compõe de 3 dimensões: liberdade de crença, liberdade de culto e laicidade do Estado. ● liberdade de crença protege que o indivíduo possa professar qualquer fé, não ter nenhuma, ou mesmo mudar de religião – no Estado Islâmico isso não é possível. A Constituição Federal fala em “crença” e “consciência”, uma vez que não compete ao direito determinar o que é ou não é religião. Juiz Eugênio Rosa de Araújo, da 27ª Vara Federal do Rio, disse que os vídeos do YT não poderiam ser tirados do ar porque religiões afro-brasileiras não são religiões. Ele foi extremamente rechaçado pela opinião pública, pois não compete a ele dizer o que é e o que não é religião. MPF disse: “olha só, Candomblé é religião, e eu não preciso seguir matriz ocidental, é oralidade. Assim como você tem inúmeras religiões que antigamente eram orais. Eu não preciso ter um livro sagrado para dizer que é ou não religião. E pior, não compete a você dizer o que é ou o que não é religião”. ● liberdade de culto visa garantir que as cerimônias possam ser realizadas livremente, tanto em ambiente público quanto em ambiente privado. A liberdade de culto não permite, entretanto, que sejam realizados sacrifícios humanos. Qualquer limitação à liberdade religiosa deve ser ponderada diante do princípio da dignidade da pessoa humana, em razão dela fazer parte da dimensão existencial do individuo. Sacrifício de animal pode, desde que não se faça de forma cruel. estado do Rio Grande do Sul criou uma lei dizendo que eravedado o sacrifício de animais que não fosse destinado ao consumo humano. Mas a lei previa a seguinte exceção: eu isento o sacrifício que seja feito com fim religioso por religiões afro-brasileiras. impugnado no TJ do Rio Grande do Sul: não pode matar, ainda que seja para fins religiosos, porque é cruel e o Estado manda vedar o tratamento cruel ou animal. Então, não pode sacrificar. STF, jurisprudência e doutrina: é uma hipocrisia absurda, porque o bife que a gente come é um boi que alguém matou para você comer. Qual a diferença de você matar para suprir suas necessidades físicas e eu matar para suprir a minha necessidade espiritual? Nenhuma A liberdade de expressão tem íntima relação com a lógica da igualdade/liberdade religiosa. É preciso assegurar que não haja discriminação para que se possa exercê-la. Do mesmo modo, amparado na liberdade religiosa, não se pode obrigar um indivíduo a realizar juramentos com a mão sobre a bíblia, nem o Estado pode condicionar a posse em determinado cargo à religião X ou Y. No sentido do estado laico, é igualmente questionável a existência de crucifixos em repartições públicas, tribunais etc. Ainda em vista de que os direitos fundamentais se afastam conforme se aproximam as relações privadas, a liberdade religiosa, em perspectiva de eficácia horizontal, observa os casos concretos em sua aplicação. Inadequada a postura do banco que obrigava seus funcionários a utilizar camiseta religiosa durante o Círio de Nazaré, considerando que a profissão de fé em nada se relaciona à atividade bancária. Por outro lado, é razoável a escolha de uma babá que professe a mesma fé da família, considerando que a educação e o cuidado são atividades em que a transmissão de valores e cultura se dá intensamente. Exemplos 13: Círio de Nazaré (funcionária do banco), Hotel em Salvador (realocação da funcionária), Chefe de cozinha com barba, guarda montada do Canadá Por fim, a laicidade do Estado orienta à neutralidade do Estado. Laicidade não é sinônimo de Estado ateu, uma vez que ser ateu é uma posição religiosa. O Estado laico, ao contrário, não tem posição acerca da religião, se mantendo neutro. A laicidade é uma garantia institucional da liberdade religiosa, uma vez que quando o Estado endossa uma religião, isso oferece um risco a todas as demais crenças. O Brasil é um país onde a tradição católica é muito presente. Nesse sentido, há forte resistência, por exemplo, à retirada de crucifixos de repartições públicas, tribunais etc. Se espera da laicidade a separação entre Estado e religião, no que diz respeito às ações institucionais. O Estado não deve se confundir com uma determinada crença religiosa, em detrimento das demais. A separação entre Estado e religião é simbólica, ou seja, o Estado não deve fomentar a religião por meio de seus símbolos. Contudo, ainda que o Estado não deva subvencionar nenhuma instituição religiosa, ele pode estabelecer parcerias para ações de interesse social, como é o caso dos hospitais Santa Casa e ProUni para PUC e Mackenzie. e) Liberdade de Locomoção A liberdade de locomoção consiste no ir e vir sem embaraço ou restrição, englobando pessoas e bens. Não é possível a existência restrições internas às fronteiras nacionais , podendo qualquer cidadão livremente circular pelo País. O destinatário ativo da liberdade de locomoção é o indivíduo, a pessoa natural, uma vez que não é um direito fundamental aplicável às pessoas jurídicas por sua natureza. Em regra, o sujeito passivo é o Estado, a quem deve ser o garantidor desse direito. Contudo, eventualmente particulares também podem ser atingido como sujeitos passivos do exercício de liberdade de locomoção. Não pode, legalmente, um particular obstar outro particular, no exercício da liberdade de locomoção. Há muita controvérsia nesse sentido quando o assunto é debatido em relação ao direito de greve e eventuais bloqueios causados por piquetes, entretanto, em regra, a liberdade de locomoção estará protegida mesmo nesses casos. A liberdade de locomoção encontra seus limites na propriedade privada, uma vez que ninguém pode adentrar uma área particular, uma casa, por exemplo, sem o consentimento do dono, alegando direito de ir e vir. Outra limitação que pode ocorrer à liberdade de locomoção se dá em tempos de guerra, uma vez que na condição de guerra declarada, admitindo o estado de sítio, a liberdade de locomoção pode ser substancialmente restringida. f) Liberdade de Reunião É outra liberdade que tem grande intimidade com a liberdade de expressão. Assim, se a liberdade de expressão poderia ser realizada individualmente, de maneira assemelhada, a liberdade de reunião poderia ser entendida como uma manifestação coletiva de expressão. f.1) Elementos: a. Elemento subjetivo: agrupamento de pessoas b. Elemento formal: significa a atuação coordenada, organizada previamente c. Elemento temporal : as reuniões têm caráter transitório, com início e final d. Elemento objetivo: não se admite o uso de armas e. Elemento espacial : local determinado, ainda que seja transitório. O agrupamentos de pessoas pode se deslocar, se previamente organizado É intrínseco ao direito de reunião o atingimento de um fim comum, seja ele político, artístico, religioso etc. O direito de reunião não admite o cometimento de violência, onde todos ou a maioria dos participantes agem com violência, colocando em perigo pessoas ou bens. É importante ressaltar que o direito de reunião, regularmente exercido, prevê a comunicação prévia às autoridades , não na condição de autorização, mas que possam ser asseguradas as condições de manutenção da paz. Não podem duas reuniões serem marcadas para o mesmo local e oportunidade, sob risco de conflito entre seus participantes. Igualmente não é permitida a participação de grupos se manifestando em sentido oposto no mesmo ambiente, porque, de igual modo, haverá um conflito em potencial – o que é indesejável sob a ótica da manutenção da paz. A liberdade de reunião encontra seus limites na impossibilidade de 2 grupos opostos exercerem o direito ao mesmo tempo, considerando o risco potencial de conflito entre os participantes. Busca-se que uma manifestação não impeça que outra ocorra, prevalecendo aquela que tiver sido marcada primeiro. O ato de manifestação deve ser comunicado previamente às autoridades, que devem buscar garantir as condições de manutenção da paz. A comunicação prévia não é prévia autorização, uma vez que não compete ao Estado admitir ou autorizar manifestações. A comunicação prévia possibilita que o Estado atue de forma coordenada, mobilize recursos e mantenha as condições de ordem e paz, de modo ao exercício legítimo da liberdade de manifestação (e de expressão). Contudo, caso a manifestação se converta em ações ilícitas, o Estado deve agir para controlar, em razão da segurança pública. O direito à manifestação não deve conflitar como direito à liberdade de locomoção e, nesse sentido, é dever do Estado coordenar para que ambas as liberdades sejam asseguradas. A ausência de comunicação prévia não obsta o exercício do direito. Contudo, caso não haja comunicação prévia, em sendo realizada a reunião, eventualmente poderá haver punição penal e/ou administrativa em face de seus organizadores em razão de ocorrências ou danos durante a realização da manifestação. III. DIREITO SOCIAIS Os direitos sociais, como direitos fundamentais, surgem como demanda a partir a insuficiência do modelo liberal burguês em prover bem estar social. Desse modo, estes direitos, de segunda dimensão, demandam prestações positivas do Estado para sua efetivação. Os diretos sociais estão consignados no título II da CF, então não há dúvidas quanto ao seu caráter fundamental. Haveria a possibilidade de outros direitos fundamentais fora do Título II, ao que se deve analisar a relevância e a essencialidade do referido direito para daí se extrair o seu caráter fundamental. Gina Pompeu aponta que os Direitos Sociais são eminentemente políticos na sua origem, porém após a sua criação, passam a ter força jurídica, haja vista a sua previsão constitucional na qualidade de garantias fundamentais. Os direitos sociais são fundamentais e ganharam intenso destaque no período do pós-guerra . O Estado redistribuía direitos, melhorando a vida em sociedade, quebrando o ciclo de miserabilidade, sobretudo as prestações de saúde e educação. A principal consequência jurídica da afirmação dos direitos sociais como fundamentais é a sua aplicação imediata (eficácia jurídica) e a classificação como cláusula pétrea. Logo, direito sociais devem ser dotados de aplicabilidade direta. A efetivação de direitos sociais se dão por meio do Poder Legislativo e do Poder Executivo, de modo originário (se extraindo direto da Constituição) ou de modo derivado (que tem fundamento na Constituição, mas que não se extrai de forma direta). Exemplificando, podemos citar os benefícios previdenciários como direitos sociais originários, enquanto programas de redistribuição de renda ou financiamento estudantil seriam direitos sociais derivados. Compete ao Poder Executivo determinar o conteúdo dos direitos sociais e fixar políticas públicas dentro das opções econômicas disponíveis (reserva do possível). Destaque-se que, embora direitos sociais sejam tipicamente positivos, eventualmente apresentam face negativa, por exemplo, impedindo que o Estado ou o particular penhorem bem de família, face o direito social de moradia. Do mesmo modo, tanto o direito de greve quanto o direito à liberdade de associação sindical, enquanto direitos sociais, não podem ser restringidos pelo Estado. A máxima aplicabilidade das normas constitucionais promove, como revés, um excesso de judicialização dos direitos sociais. É muito mais fácil a judicialização de direitos de sociais do que dos direitos de primeira dimensão. O Estado Social, capaz de prestar positivamente, de efetivar, direitos sociais, depende de um Estado Fiscal, considerando que isso implica em custos elevados e as receitas públicas são finitas. Deve-se observar que as políticas públicas devem ser universalizáveis dentro dos limites de possibilidade do Estado. Levando isso em conta, duas posições doutrinárias se destacam: Novais defende que os Direitos Sociais são universais e todo cidadão pode exercê-los Vieira de Andrade argumenta que somente devem ser titulares das prestações positivas estatais aqueles que deles necessitarem. Ou, em outras palavras, a prestação de serviço público de saúde poderia ser gratuita para aqueles cidadãos que não pudessem pagar e, ao mesmo tempo, contraprestacional para aqueles de maior renda. A reserva do possível implica na prestação condizente com os recursos disponíveis, uma vez que os recursos estatais são limitados. Assim, tanto o mínimo existencial quanto a reserva do possível devem ser observados como parâmetros importantes das políticas públicas sociais. A efetivação dos direitos sociais é coordenada entre os três poderes, entretanto é o Poder Executivo quem realiza as ações diretas de concretização, licitando, construindo escolas, etc. O Poder Judiciário, nesse contexto, tem papel coadjuvante, não sendo o protagonista. Contudo, o que observamos é que, em face das grandes dificuldades do exercício de alguns direitos sociais, recorre-se ao judiciário objetivando fazer com que o Estado efetive o direito – o que parece dar algum protagonismo ao Poder Judiciário. IV. DIREITO À EDUCAÇÃO O direito à educação está previsto no art. 6º da Constituição, além do art. 205. O direito à educação é de todos, não se restringindo às crianças e aos adolescentes. Por todos, entenda-se pessoas com deficiência, adultos, idosos, estrangeiros ainda que em situação irregular etc. O direito à educação é dever do Estado e da família, expressando claramente sua eficácia horizontal. A educação não busca somente preparação do indivíduo para o mercado de trabalho, mas tem íntima relação com a dignidade da pessoa humana, promovendo a sua autonomia e permitindo a realização plena das potencialidades do ser humano. A educação é, pois, libertadora e empoderadora, permitindo o livre desenvolvimento da personalidade. A participação na vida pública é potencializada com a educação, possibilitando o exercício da cidadania. A associação entre cidadania e educação é, inclusive, associada na Constituição Federal. Notadamente quanto maior é o nível educacional, maior é o engajamento e a capacidade de participação social. A educação tem dimensões prestacionais e negativas. Além de viabilizar meios para a efetivação do direito, o Estado não pode cercear o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas. Assim, o Estado pode e deve fiscalizar as escolas, tanto como pode e deve estabelecer um currículo mínimo, entretanto não pode impor um modelo educacional em detrimento de outro. Além disso, a liberdade de cátedra tem íntima relação com o art. 206 e com a liberdade de expressão, porém é limitada ao que é cientificamente comprovado. A Suprema Corte dos EUA mexeu com isso e disse não pode ensinar criacionismo em aula de biologia, porque permitir que algo que é cientificamente comprovado como errado seria como ensinar em matemática 2+2=4. A educação está positivada no art. 208 da Constituição Federal e a EC nº 59/09 estendeu ao ensino médio o direito subjetivo que, anteriormente, abarcava apenas o ensino fundamental. A EC previu a implantação progressiva até 2016, de acordo com o Plano Nacional de Educação e, com isso, o princípio passou a regra, tornando direito subjetivo. Sarmento: O Brasil promoveu uma intensa mudança a partir de 1988, temos quase todas as crianças na escola. Agora falta fazer uma revolução na qualidade. O inciso III do art. 208 busca promover a educação inclusiva, ao direcionar pessoas com alguma deficiência à rede regular de ensino, onde o contato social com as diferenças contribuipara o desenvolvimento e a cidadania das crianças. A existência de creches, prevista no inciso IV, assegura a igualdade de gêneros, ao permitir melhores condições de trabalho por mulheres. O art. 7º assegura políticas afirmativas para universidades. As políticas de ações afirmativas impõem discriminação positiva, de viés igualitário. Apesar dessas previsões, o ensino superior não é direito subjetivo, diferente do ensino básico (pré-escola, ensino primário e ensino médio). Ainda que seja direito fundamental, que seja investimento estratégico e que seja fundamental para o desenvolvimento da nação, o ensino superior não é subjetivo. O VII sustenta que o direito à educação não se dá penas com a sala de aula, demandando prestações de outras naturezas para que esse direito seja efetivado. Com isso, a disponibilização de transporte, de saúde e alimentação são fundamentais para o pleno aprendizado. De igual modo, a distância da escola é um obstáculo para a frequência, devendo estar em uma proximidade que permita o acesso. Os gastos em educação são vinculados a receitas e despesas por meio de mínimo de gastos, que é de 18%. O orçamento é autorizativo, significando que o Poder Executivo pode ou não gastar. Eventuais investimentos abaixo do patamar de 18% autorizariam a intervenção federal no estado, ou estadual no município. V. DIREITO À SAÚDE O direito à saúde está previsto no art. 6º, bem como no art. 196. Assim como a educação, o modelo constitucional se pauta pelo acesso universal (acesso a todos). É integral, uma vez que abrange todas as formas de proteção à saúde, desde a prevenção até o tratamento. Tendo em vista que os custos de prestação de saúde são muito elevados, prover o direito à saúde envolve impactos interfederativos, demandando repasses de recursos entre os entes federados. Mais uma vez nota-se a importância do Estado Fiscal para viabilizar um acesso universal à saúde de forma pulverizada e que abranja todo o País. Sarmento, por saúde não se entende apenas todo e qualquer tratamento ou meio para diminuir dor e morte, mas também a prevenção. Aqui nos remetemos ao mínimo existencial. Acesso à saúde não é somente curar a doença, mas também prevenir. A saúde, sendo direito fundamental, é exigível perante o Poder Judiciário. Ocorre que a hiperjudicialização é prejudicial ao próprio bem-estar, uma vez que o acesso ao judiciário não é universal, como vemos; além disso, recurso de saúde que são direcionados para cumprir decisões judiciais pode-se estar criando um modelo elitista de saúde. A maioria das sentenças não envolve a obtenção de medicamentos que já estejam previstos nas normas e protocolos do SUS. O texto constitucional, embora assegure o acesso universal ao Sistema Único de Saúde, a sua gratuidade não é especificada . Atualmente é a lei do SUS que prevê a gratuidade, sendo um grande debate doutrinário a possibilidade ou não de cobrança. De um lado, há posições que entendem que, partindo da intepretação constitucional e da possibilidade de alteração das normas infraconstitucionais, seria possível a alteração legislativa estabelecendo cobrança pelos serviços prestados pelo SUS. Por outro lado, invocando o princípio da vedação ao retrocesso, outros doutrinadores defendem que seria uma violação ao princípio o estabelecimento de pagamentos pela ação estatal que é gratuita, restringindo o acesso ao direito. O Sarmento : Saúde é universal, integral, mas não tem que ser necessariamente gratuita. Se você for no artigo da Educação, ele vai dizer que o ensino é gratuito; ele expressamente diz que é gratuito. Saúde não pode ser todo e qualquer tratamento ou meio que diminua dor e morte”. a doutrina sempre diz que “Juiz, quando for dar uma decisão em caso concreto para um indivíduo, é necessário perguntar a si mesmo: isso que estou fornecendo é universalizável? Ou seja, é possível conseguir isso para todos que pleitearem judicialmente?” se sim, então deve mandar o Estado fornecer, mas se a reposta for negativa é preciso se autoconter. VI. Mínimo existencial vs. Reserva do Possível ● mínimo existencial assegura a efetividade mais básica dos direitos fundamentais , impedindo assim as omissões e as insuficiências. Ingo Sarlet, a gratuidade do serviço de saúde demanda grande atenção em relação ao tema da saúde como direito social. Aqueles que têm condições de arcar com o plano privado não poderiam se valer da rede pública sem qualquer limite ou condição. a gratuidade deveria ser repensada para fins de uma distribuição mais equitativa das responsabilidades e encargos. “o simples argumento de que quem contribui (impostos) já está a pagar pelo acesso à saúde pública não pode vingar no contexto de uma sociedade que é acentuadamente desigual, em que a maioria da população se encontra na faixa isenta de imposto sobre a renda”. E aí ele termina: “ao contrário do que defende parcela da doutrina, a universalidade dos serviços de saúde não traz como corolário inexorável a gratuidade das prestações materiais para toda e qualquer pessoa assim como a integralidade do atendimento não significa que qualquer pretensão tenha que ser satisfeita em termos ótimos”.” ● reserva do possível consiste na ideia de que as prestações sociais estatais devem ser de tal forma que possam ser universalizáveis, extensiveis a todos, senão a muitos outros cidadãos. Em sendo o Estado a própria sociedade, há que se ter um juízo de razoabilidade de modo que as prestações possam ser suportadas pela coletividade sem prejuízo da própria coletividade. Assim, por exemplo, ao ser demandado à prover serviços de saúde ou educação, o Estado não pode ser obrigado a fazê-lo além de suas possibilidades, ou de modo a comprometer os recursos a prover os mesmos serviços aos demais cidadãos, que teriam, assim seus direitos ameaçados. Nelson Saldanha e o Scaff dizem: Estado Social tem íntima relação com Estado Fiscal. Ou seja, eu não presto serviço se eu não tiver dinheiro. Ingo: “não é um limite imanente, como tentam associar, dos direitos fundamentais” ou seja, ele vai estar olhando para os dois âmbitos dos direitos fundamentais, sejam aqueles de maior carga negativa, sejam os de maior carga positiva, de primeira dimensão, segunda dimensão. Gina Pompeu concorda com o Vieira de Andrade É possível alegar reserva do possível, porém não de forma banalizada. Comprove-se a falta efetiva de recursos indispensáveis e se o dinheiro disponível já tenha sido usado de forma mais eficiente possível Pompeu e Ingo: a ideia de uma moralidade e eficiência, elas vão impor uma melhor gestão dos recursos públicos. ● princípio da vedação ao retrocesso busca impedir que o legislador remova direitos previamente conquistados no período de bem estar social. O valor que o princípio busca proteger é o da retirada de direitos conquistados pela sociedade, principalmente os de natureza social, comumente ameaçados em períodos derecessão econômica, ou em períodos em que ao Estado demandado o contingenciamento de gastos. Muitas vezes, ao se ver na necessidade de reduzir despesas, a sociedade é confrontada com escolhas trágicas e que culminam na redução de gastos sociais. Este princípio, então busca evitaro arbítrio do legislador e do executivo e tem por fim brecar planos políticos que enfraqueçam direitos fundamentais. O princípio da vedação ao retrocesso e a ideia de reserva do possível estarão em polarização quando a sociedade demanda mais do que as possibilidades que o Estado tem de realizar políticas públicas, sobretudo as de ordem social. Assim, uma vez que o Estado Social é viabilizado pelo Estado Fiscal, se faz necessária a ponderação entre ambos e, por vezes, ajustes na estrutura tributária e de prestações sociais, de modo a obter maior contribuição dos cidadãos mais abastados e atender aqueles mais vulneráveis, além da maior observação estatal aos princípios da moralidade e da eficiência na administração pública, alocando melhor os recursos. Importante notar que a vedação ao retrocesso não impede a modificação ou a flexibilização da política pública, porém nesses casos as alterações não podem ser de tal ordem que descaracterizem o próprio direito.
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