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Dois_Modelos_de_Homem

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DOIS MODELOS DE HOMEM
	Dois modelos ou imagens de homem foram propostos e discutidos igualmente, por filósofos e psicólogos, durante muitos anos. Um simpósio realizado na Universidade Rice em 1964 apontou claramente a divisão na psicologia teórica e filosófica contemporânea. O principal tópico do simpósio foi o conflito entre fenomenologia e comportamentalismo. Comunicações e trabalhos apresentados ao simpósio, referiam-se especificamente a dois modelos distintos de homem e à orientação científica particular associada a cada modelo.
	As declarações seguintes descreverão o que parece ser central nesse continuado conflito.
	A orientação comportamentalista considera o homem um organismo passivo, governado por estímulos fornecidos pelo ambiente externo. O homem pode ser manipulado, isto é, seu comportamento pode ser controlado, através de adequado controle de estímulos ambientais. Além disso, as leis que governam o homem são primordialmente iguais às leis universais que governam todos os fenômenos naturais. Portanto, o método científico, tal como desenvolvido pelas ciências físicas, é também apropriado para o estudo do organismo humano.
	A orientação fenomenológica considera o homem a fonte de todos os atos. O homem é essencialmente livre para fazer escolhas em cada situação. O ponto focal dessa liberdade é a consciência humana. Comportamento é, assim, apenas a expressão observável e a conseqüência de um mundo de ser interno, essencialmente privado. Portanto, só uma ciência do homem que comece com experiência, tal como é imediatamente dada nesse mundo de ser, pode ser adequada ao estudo do organismo humano.
	Por vários anos, psicólogos interessaram-se por ambos os aspectos do homem, suas ações e sua autopercepção. É claro que talvez, em realidade, não tenha sido útil para a compreensão do homem considerar esses dois modelos ou orientações como sendo, de fato, mutuamente exclusivos. Por que devemos necessariamente escolher de uma vez por todas entre eles? Talvez o homem possa muitas vezes ser descrito significativamente em termos de seu comportamento e, em outras vezes ou em outros contextos, possa ser descrito mais significativamente em termos de sua consciência (autopercepção). Comportamento pode ser mais acessível a investigações tradicionalmente científicas, mas uma investigação sistemática de consciência poderia fornecer um conhecimento mais significativo do homem. 
	Assim, parece razoável que o homem possa ser descrito em termos, quer de seu comportamento, que de sua autopercepção, quer de ambos. Entretanto, assim fazendo, as conclusões a respeito do homem permanecerão aparentemente contraditórias ou, pelo menos, paradoxais. Refletirão inevitavelmente uma das duas orientações metodológicas. E, realmente, os dois modelos de homem ainda continuarão incorporando diversos pontos de vista contrastantes.
	Considerando-se esses pontos de vista sob a forma das questões inter-relacionais abaixo.
	Por exemplo, o homem é previsível ou é essencialmente imprevisível? Predição e controle são com freqüência considerados como a prova final de validade de qualquer teoria científica determinada que esteja sendo proposta. A própria teoria é na realidade uma explicação das causas suficientes e determinantes do fenômeno em estudo. Determinismo, que por definição nega a liberdade humana, está assim inevitavelmente associado ao tradicional objetivo científico de predição. Mas continua a haver falhas notáveis na tentativa de predizer o comportamento humano; pelo menos uma questão crucial que surge é se causas suficientes para comportamento poderão ser realmente conhecidas algum dia, quer pelo observador, quer pelo próprio paciente. 
	Assim, a questão a respeito da possibilidade de predição é, em si mesma, contingente de outras questões. O homem vive em um mundo objetivo? E ele é nesse mundo simplesmente um transmissor de informação? Ou o homem vive em um mundo subjetivo no qual se torna um efetivo gerador de algo novo? O mundo objetivo, pode-se declarar, é uma entidade mensurável, completamente racional e digna de confiança. Pode-se concordar em que fatos e dados são o que são, e significam informação adicional verificável. O homem age neste mundo tão simplesmente quanto um elemento adicional, isto é, um elemento vivo que tem a capacidade de transmitir informação, mas não de alterá-la. Um indivíduo existe como uma máquina complexa. De fato, inteligência como tal, é apenas aquilo que é introduzido no sistema humano. Assim, por padrões objetivos, a inteligência humana pode ser medida e controlada, e o comportamento, refletindo àquela entrada, pode ser predito. 
	Aparentemente, porém, o homem vive também em um mundo subjetivo. Este é um mundo privado de sentimentos, emoções e percepções. Com base nesse mundo privado o homem tem a capacidade de transmitir, mas tem igualmente a capacidade mais alta de gerar informação nova. Pode fazer perguntas que antes nunca foram feitas. Pode tomar decisões quanto a linhas de ação, que antes nunca foram cogitadas ou previstas. Pode mesmo definir como valiosa alguma coisa que não leva em conta sua aptidão para fazê-lo – tal como modelo de homem transmissor de informação, que é, naturalmente, aceitável para a maioria dos cientistas comportamentalistas. As ações do homem podem ser orientadas por conhecimento científico, mas podem também ser vistas como fundamentalmente determinadas por uma experiência interna de escolha e avaliação. Jaspers (1967) escreveu: “Uma ciência empírica não pode ensinar a alguém o que deve fazer, mas apenas o que pode fazer para atingir seu fim por meios estáveis”.
	Dentro deste mundo subjetivo, o indivíduo existe unicamente. Isto é, de um ponto de vista fenomenológico, cada homem é único. Nas ciências do comportamento são desenvolvidas leis que destinam a justificar classes inteiras de fenômenos sociais. O comportamento de um homem é predizível precisamente porque se conforma com tais leis. Deste ponto de vista objetivo, um homem é igual a outros homens. Descrições de homem ou explicações de seu comportamento podem ser representadas muito significativamente em termos absolutos, isto é, em termos livres de restrição ou limitação. Mas, em sentido contrário, se cada homem é considerado único, descrições ou explicações de seu comportamento devem ser representadas em termos relativos. Isto é, não são possíveis leis gerais de comportamento, pois tudo seria dependente de alguma outra coisa. De fato, deste ponto de vista, a própria unicidade da existência de cada homem impede qualquer certeza sobre absolutamente tudo.
	Relacionada com essas questões a respeito da existência do homem no mundo, seja como objeto, seja como sujeito, está a questão: O homem pode ser melhor compreendido através de análise ou de síntese? Características humanas podem ser investigadas independentemente umas das outras ou devem ser estudadas como um todo? Nas ciências do comportamento, assim como nas ciências naturais, resultados úteis podem muitas vezes ser produzidos investigando-se uma característica singular independentemente de outras características. Por outro lado, tal abordagem não envolve o perigo de ignorar a importância de interações e interdependências de muitas variáveis que operam em qualquer situação? A estratégia mais eficiente para o investigador talvez fosse mover-se de um lado para outro, entre análise e síntese. 
	Em todas essas questões, estamos essencialmente perguntando se o homem é ou não, verdadeiramente cognoscível em termos científicos ou se, atualmente, ele pode conhecer a respeito de si mesmo. Esta questão final é básica para todo o estudo do homem. Se o homem existe como fato conhecível, então ele constitui uma realidade objetiva. Se não, então ele existe como uma potencialidade, isto é, representa possibilidade e não realidade. Maslow (1961) expressou o ponto de vista da potencialidade humana: “Acho justo dizer que jamais será completa uma teoria de psicologia que não incorpore centralmente o conceito de que o homem tem seu futurodentro de si, dinamicamente ativo no momento presente”. No entanto, existem muitos indícios apoiando a idéia de que o homem é cientificamente conhecível. E esses indícios estão aumentando rapidamente como resultado tanto de experiências de laboratório quanto de estudos de campo. Portanto, talvez só se possa concluir, por mais paradoxalmente que seja que, embora o homem seja cientificamente conhecível, é também conhecível no sentido de que ele provavelmente muda e evolui cada vez que adquire novo conhecimento a seu próprio respeito. 
	Existem, portanto, dois modelos de homem, possíveis e tradicionalmente opostos. A aceitação quer do modelo fenomenológico, quer do modelo comportamentalista, com a exclusão do outro, pode ter importantes implicações nos mundos cotidianos de nossas vidas pessoais e profissionais. Este não é apenas um debate em andamento, pelo gosto de promover exercício acadêmico. A escolha de um ou de outro poderia influenciar grandemente numerosas atividades humanas em áreas como educação, política, teologia e atuação de pais ou mães. 
	Quer isto dizer, porém, que uma escolha deva necessariamente e finalmente ser feita. De fato, parece haver verdade em ambos os pontos de vista sobre o homem. Mas parece ser importante que um indivíduo interessado em trabalhar com pessoas, esteja pelo menos familiarizado com esses pontos de vista e seja sensível aos paradoxos envolvidos. É propósito deste livro facilitar tais processos nos capítulos seguintes. O desenvolvimento histórico desses dois modelos de homem será traçado e sua posição contemporânea será examinada com alguma minúcia. 
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
MILHOLLAN, Frank e FORISHA, Bill E. Skinner X Rogers: maneiras contrastantes de encarar a educação. São Paulo: Summus, 1978 (capítulo 1, pág. 17). 
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