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Direito Internacional Público e Privado santo graal vitaminado

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Direito Internacional Público e Privado
Sumário
Ponto 1.a. Desenvolvimento histórico do Direito Internacional. Terminologia. A sociedade internacional e suas características. Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais. Princípios que regem as relações internacionais do Brasil. 4
Ponto 1.b. Fontes do Direito Internacional Público. Costume Internacional. Princípios Gerais. Jurisprudência e Doutrina. Atos Unilaterais. Decisões de Organizações Internacionais. Jus Cogens. Obrigações erga omnes. Soft Law. 6
Ponto 1.c. Graves violações às Convenções de Genebra e crimes de guerra. Imprescritibilidade. Competência para processar e Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha. 8
Ponto 2.a. Direito Internacional Privado. Evolução histórica. Conflito de leis e espécies de normas. 12
Ponto 2.b. Organização Internacional. Características. Evolução. Espécies e finalidades. Regime jurídico. Santa Sé. Prerrogativas e imunidades no Brasil 13
Ponto 2.c. Desaparecimento forçado como crime internacional. Crime de ius cogens. Normativa internacional. Imprescritibilidade. 18
Ponto 3.a. Espaços Globais Comuns. Princípios. Patrimônio Comum da Humanidade. Alto Mar. Fundos Marinhos. Antártica. Ártico. Espaço Sideral. 21
Ponto 3.b. Direito tributário internacional. Conceito. O fenômeno da bitributação. Acordos de bitributação. 28
Ponto 3.c. Princípio uti possidetis. Descobrimento e ocupação como critérios de aquisição territorial. 29
Ponto 4.a. Estados. Autodeterminação dos Povos. Reconhecimento do Estado e Governo. Direitos e Deveres. Território: aquisição e perda. Faixa de Fronteira. Rios Internacionais e Regimes Fluviais. Domínio Aéreo. 32
Ponto 4.b. Tratados Internacionais. Reservas. Vícios de Consentimento. Entrada em vigor. Interpretação. Registro e Publicidade. Efeitos sobre Terceiros. Modalidades de Extinção. 36
Ponto 4.c: Interpretação e aplicação do direito estrangeiro. Prova do Direito Estrangeiro. Ordem Pública e exceções à aplicação do direito estrangeiro 40
Ponto 5.a. Estrangeiros. Entrada, permanência e saída regular. Direitos do Estrangeiro. Saída compulsória: deportação, expulsão 41
Ponto 5.b. Imunidades. Imunidade pessoal e real. Imunidade cognitiva e executória. Imunidade diplomática e imunidade consular. Imunidade de Estados. Imunidade de ex-chefes de Estado. Regime de tropas estacionadas por força de tratado. 43
Ponto 5.c. Uso da força no direito internacional: proibição (art. 2, para. 4, da Carta da ONU), direito de autodefesa ou de legítima defesa (art. 51 da Carta da ONU). Papel do Conselho de Segurança da ONU na garantia da paz e da segurança internacional. 45
Ponto 6.a. Nacionalidade. Originária. Derivada. Apatridia. Polipatria. Perda da nacionalidade. Estatuto da igualdade: portugueses. Nacionais de países do Mercado Comum do Sul (Mercosul). 47
Ponto 6.b. Soberania estatal. Conceito. Tipos: soberania interna e soberania externa. Princípio da igualdade soberana dos Estados. 51
Ponto 6.c: Sucessão de Estados. Direitos e Deveres. Tratados e patrimônio 53
Ponto 7.a. Tratados internacionais. Classificação. Terminologia. Negociação e competência negocial. Formas de expressão do consentimento. Conflito entre trados com as demais fontes. 56
Ponto 7.b.Asilo. Refúgio. Regime Jurídico. Princípio do non-refoulement. Papel dos órgãos internos. A proteção ao brasileiro no exterior. 59
Ponto 7.c. Responsabilidade internacional do Estado. Obrigações primárias e obrigações secundárias. Atribuição de atos a Estados. Reparação: restituição, indenização e satisfação. Obrigação de interrupção de ato ilícito continuado. Obrigação de não-repetição de ato ilícito. Obrigação de perseguir ilícitos penais internacionais 65
Ponto 8.a. Solução pacífica de controvérsias: conceito, natureza e origem. Paradigma da Carta da ONU na solução pacífica de controvérsias: funções do Conselho de Segurança, da Assembleia-Geral, da Corte Internacional de Justiça. Arbitragem internacional e gestão diplomática. 68
Ponto 8.b. Crimes contra a humanidade ou de lesa humanidade: definição, natureza consuetudinária, imprescritibilidade. Elementos dos crimes contra a humanidade: ataque à população civil, extensão, sistematicidade, elemento político. 72
Ponto 8.c. Processo de formação e incorporação dos tratados internacionais. Hierarquia. Acordo Executivo. 78
Ponto 9.a. Crimes internacionais: conceito e classificação. Dever de perseguir e pretensão punitiva da comunidade internacional. 83
Ponto 9.b. Auxílio direto e juízo de mérito. Competência da Justiça Federal e atribuições do Ministério Público Federal. Distinção da cooperação policial. Meios de auxílio: videoconferência, quebra de sigilo, interceptação telefônica. Partilha de ativos ("asset sharing"). 89
Ponto 9.c. Organização das Nações Unidas. Desenvolvimento e principais órgãos. Corte Internacional de Justiça. Organizações regionais das Américas. 91
Ponto 10.a. Direito Internacional Penal e Direito Penal Internacional: divergências e convergências. Implementação direta e indireta do Direito Internacional Penal. 98
Ponto 10.b. Relação do Direito Internacional e o Direito Interno. Correntes doutrinárias. Como o Direito Interno vê o Direito Internacional. Como o Direito Internacional vê o Direito Interno. A Constituição brasileira e o Direito Internacional. 99
Ponto 10.c. Conflitos internacionais e conflitos não-internacionais. Art. 3º comum às quatro Convenções de Genebra. Condições para a aplicação do Protocolo II de 1977. Convergências entre as garantias mínimas aplicáveis a conflitos não-internacionais e o regime de derrogações excepcionais do art. 27 da Convenção Americana de Direitos Humanos e do art. 4º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. 101
Ponto 11.a. Tribunais internacionais ad hoc e tribunais mistos. Princípio da primazia da jurisdição penal internacional e suas mitigações. Dever de cooperar com os tribunais internacionais. 103
Ponto 11.b. Desapropriação e seus reflexos no direito internacional. Proteção de nacionais desapropriados por Estado estrangeiro. Indenização devida. 106
Ponto 11.c. Responsabilidade não-penal de indivíduos no direito internacional por sua participação em graves violações de direitos humanos. 107
Ponto 12.a: Direito internacional humanitário. Ius in bello e ius ad bellum: convergências e divergências. Direito de Genebra e Direito da Haia. Princípio da distinção. Princípio da proteção. Princípio da necessidade militar. Princípio da proporcionalidade. 108
Ponto 12.b: Extradição. Entrega. Execução de Sentenças Cíveis e Criminais. Transferência de presos. 111
Ponto 12.c: Tortura como crime internacional. Definição do art. 1º da Convenção da ONU contra a Tortura de 1984 e definição do art. 2º da Convenção Interamericana contra a Tortura: convergências e divergências. 114
Ponto 13.a. Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Natureza jurídica. Acordo de sede e imunidades. Finalidades e funções de acordo com as Convenções de Genebra de 1949 e com os Protocolos I e II de 1977. 116
Ponto 13.b. Indivíduo no Direito Internacional. Subjetividade jurídica controvertida. Responsabilidade individual penal derivada do Direito Internacional. 118
Ponto 13.c: Redes internacionais de cooperação judiciária e entre ministérios públicos. Cooperação formal e informal. A Iber-Rede. A Associação Ibero-Americana de Ministérios Públicos. A Reunião Especializada de Ministérios Públicos do Mercosul. 122
PONTO 14.a: Guerra contra o terror. Conceito de terrorismo. Atos de terror. “Combatentes ilegais”. Repressão internacional ao financiamento de atividades terroristas. 124
Ponto 14.b: Assistência Jurídica Mútua. Convenções Bilaterais e Multilaterais. 128
Ponto 14.c: Tribunal Penal Internacional: jurisdição ratione personae, ratione loci e ratione temporis. Princípio da complementaridade. Poderes do Conselho de Segurança da ONU sobre a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. 129
Ponto 15.a: Cooperação Jurídica Internacional. Evolução e fundamentos. Via diplomática. Via Autoridade
Central. Via do contato direto e cooperação internacional entre Ministérios Públicos. 131
Ponto 15.b: Direito de autotutela: sanções, sanções “inteligentes”, contra-medidas e represálias. 134
Ponto 15.c: Responsabilidade internacional objetiva. Responsabilidade penal do Estado: conceito e controvérsias. Relação entre responsabilidade internacional do Estado e responsabilidade internacional penal do indivíduo. Julgar. 135
Ponto 16.a. Dívidas estatais e garantia de credores no direito internacional. Doutrina Drago. Cláusula Calvo. Cláusula de estabilização 137
Ponto 16.b.  Princípio da especialidade e dupla incriminação como condição de assistência jurídica em matéria penal. Exceção de crime político. 139
Ponto 16.c: Prisão preventiva para fins de deportação, expulsão e extradição. Competência e pressupostos. 141
Ponto17.a. Limites à aplicação do direito estrangeiro no Brasil. Ordem pública. Moral e bons costumes. Garantias fundamentais. 143
Ponto 17.b. Princípios da fixação da Jurisdição internacional. Territorialidade e extraterritorialidade. Jurisdição universal: conceito, limites e controvérsias. 145
Ponto 17.c. Repressão internacional ao trabalho e comércio escravo: histórico, base normativa e trabalho escravo contemporâneo. 149
Ponto18 a. Direito Internacional do Meio Ambiente. Princípios. Poluição Atmosférica. Poluição Marinha. Recursos marinhos vivos. Biodiversidade, fauna e flora. 152
Ponto 18 b. Carta rogatória: juízo delibatório, medidas cautelares com contraditório diferido, atos executórios e atos não-executórios. 155
Ponto 18 c. Domínio marítimo. Mar Territorial. Zona Contígua. Plataforma Continental. Zona Econômica Exclusiva. Ilhas costeiras e oceânicas. Navios e aeronaves no Direito Internacional. 158
Ponto 19.a: Comunicabilidade do estado civil. Homologação de sentença de divórcio. 162
Ponto 19.b: Prestação de alimentos no estrangeiro. Convenção de Nova York de 1956. Atribuições do Ministério Público Federal como autoridade central. 163
Ponto 19.c: Povos indígenas e comunidades tradicionais em face do Direito Internacional. Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.  Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007. 167
Ponto 20.a. Efeitos civis do sequestro de crianças. Competência da Justiça Federal. Atribuições do Ministério Público Federal e da Advocacia Geral da União. Autoridade Administrativa Central. 171
Ponto 20.b. Genocídio como crime internacional: conceito, natureza e incorporação no ordenamento jurídico brasileiro. Competência para seu processo e julgamento. 173
Ponto 20.c: Direito da Integração Regional. Tipologia. Organização Internacional Supranacional. Mercado Comum do Sul. Evolução. Características. Estrutura. Principais atos institutivos. Relação com o Direito brasileiro. 174
Ponto 1.a. Desenvolvimento histórico do Direito Internacional. Terminologia. A sociedade internacional e suas características. Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais. Princípios que regem as relações internacionais do Brasil.
Principais obras consultadas: Resumo do Grupo do 26º CPR; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 4ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, Malcolm N. Direito Internacional, 2010. Martins Editora.
Legislação básica: CRFB/88, art. 4º.
Desenvolvimento histórico do Direito Internacional: O Direito Internacional nasceu como ramo autônomo do Direito público na Europa do Século XVIII, com o Tratado de Westfalia (1648), que pôs fim à Guerra dos 30 anos. Hugo Grotius contribuiu para a sua autonomização.
O DIP está dividido em basicamente duas fases: na Fase clássica (1648-1918), marcada pelo Direito à Guerra (Jus ad bellum) e à colonização, o DIP se preocupa basicamente com o estudo das relações entre os Estados; na Fase moderna ou contemporânea (a partir do fim da Segunda Guerra Mundial), o seu enfoque passa a ser a proteção internacional da pessoa humana – começam a aparecer limitações ao poder soberano dos Estados; o uso da força no cenário internacional passa a ser regulado; a colonização é vedada; e a exaltação do Direito de Guerra (Jus in bello – Direito de Haia) e do Direito Humanitário (Direito de Genebra). Ocorre a especialização do DIP em ramos (ambiental, trabalho, etc.), proliferam-se as Organizações Internacionais e o indivíduo passa a ser considerado sujeito de Direito Internacional.
Terminologia: A terminologia “Direito Internacional” foi criada em 1780, por Jeremy Bentham, para distinguir o direito que cuida das relações entre os Estados do Direito Nacional e do Direito Municipal. A complementação “Direito Internacional Público” surgiu mais tarde na França, para diferenciar o DIP do DIPriv. Outros termos utilizados são “Direito das Gentes” ou “jus gentium”.
A Sociedade internacional e suas características: Sociedade internacional é o “conjunto de vínculos entre diversas pessoas e entidades interdependentes entre si, que coexistem por diversos motivos e que estabelecem relações que reclamam a devida disciplina” (PORTELA:2012, p. 44-45). A vontade (racional) é o elemento decisivo para a aproximação dos seus membros.
Suas características são a universalidade (abrange no mundo inteiro, embora o nível de integração varie bastante), a heterogeneidade (os atores que a compõem apresentam mudanças significativas dos pontos de vista social, econômico, político, educacional, etc.), a descentralização (não há um governo central) e a cooperação (corolário da descentralização, importa na ausência de subordinação entre os seus atores). Parte da doutrina defende ser a sociedade internacional interestatal, mas há críticas a esse entendimento a partir do reconhecimento das organizações internacionais como sujeitos de Direito Internacional e com a crescente participação direta das ONGs, dos indivíduos e de outros agentes no cenário internacional.
Sociedade Internacional não se confunde com comunidade internacional – esta se fundamenta em vínculos espontâneos e de caráter subjetivo (culturais, históricos, linguísticos, religiosos, etc.) e se caracteriza de ausência de dominação, pela cumplicidade e pela identificação entre seus membros. A vontade (racional) não constitui elemento decisivo.
Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais: o conceito de soberania foi primeiramente desenvolvido pelo filósofo francês Jean Bodin. Classicamente, designa “o poder de declarar, em última instância, a validade do direito dentro de um certo território” (AMARAL JÚNIOR:2008 , p.99). Atualmente, entende-se soberania como o alcance de patamares de desenvolvimento econômico e social que garanta a um Estado a plena independência das suas decisões políticas, sem a necessidade de auxílios internacionais. Nesse sentido, soberania é um dos elementos constitutivos do Estado, possuindo um aspecto interno (supremacia dentro de um determinado território) e um aspecto internacional (igualdade formal entre os Estados na sociedade internacional e independência do ente estatal frente a outros Estados).
O Direito, seja o natural ou o positivo, atua nas relações internacionais como instrumento de respeito, cortesia, cooperação, relação que sustentam a horizontalidade e a igualdade jurídica entre os Estados componentes da ordem internacional. Os “Estados precisam do Direito para buscar atingir certos objetivos, que vão desde o bem-estar econômico até a promoção de uma ideologia, passando pela segurança ou pela simples sobrevivência” (SHAW:2010, 38). O Direito Internacional é uma cultura no sentido mais amplo do termo, na medida em que constitui um método de comunicação de pretensões, expectativas e previsões, além de fornecer uma estrutura que permite a avaliação e a priorização dessas demandas (SHAW:2010, 54).
Princípios que regem as relações internacionais do Brasil: estão previstos no art. 4º da CRFB/88, sendo eles: I. independência
nacional; II. prevalência dos direitos humanos; III. autodeterminação dos povos; IV. não intervenção; V. igualdade entre os Estados; VI. defesa da paz; VII. solução pacífica dos conflitos; VIII. repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX. Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; e X. concessão de asilo político. Além disso, “a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações” (art. 4º, parágrafo único).
Ponto 1.b. Fontes do Direito Internacional Público. Costume Internacional. Princípios Gerais. Jurisprudência e Doutrina. Atos Unilaterais. Decisões de Organizações Internacionais. Jus Cogens. Obrigações erga omnes. Soft Law.
Principais obras consultadas: Resumo do Grupo do 26º CPR; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 4ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, Malcolm N. Direito Internacional, 2010. Editora Martins Editora; RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional por Violação de Direitos Humanos, 1ª ed. Editora Renovar, 2004.
Legislação básica: Estatuto da Corte Internacional de Justiça; Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.
Fontes do DIP: as fontes materiais do DIP são os fatos que demonstram a necessidade e a importância da formulação de preceitos jurídicos internacionais, com vistas a regular determinadas situações (Ex.: Segunda Guerra Mundial, o aquecimento global, etc.).
As fontes formais são o modo de revelação e exteriorização das normas jurídicas e dos valores que ela pretende tutelar. O art. 38 (1) do Estatuto da CIJ traz um rol exemplificativo das principais fontes formais do Direito Internacional. O referido diploma elencou os tratados, os costumes e os princípios gerais do Direito como fontes, e fez referência à jurisprudência internacional e à doutrina como “meios auxiliares na determinação de direito”. Há quem classifique as 3 primeiras como fontes primárias, e as duas últimas como fontes secundárias do DIP.
No entanto, a doutrina majoritária entende que não há hierarquia entre as fontes do DIP.
Costume Internacional: resulta de uma prática geral aceita como sendo o direito. A parte que o invoca deve provar sua existência.
Compõe-se de dois elementos: (a) a prática reiterada de determinados atos (elemento material ou objetivo), que deve ser justa e estar de acordo com o Direito Internacional; e (b) a “opinio juris”, ou seja, a convicção da justiça e da obrigatoriedade jurídica dos atos praticados (elemento subjetivo) – a mera reiteração de atos sem a convicção da sua obrigatoriedade não caracteriza um costume internacional.
A generalidade não se confunde com a unanimidade, bastando que um grupo amplo e representativo reconheça a sua obrigatoriedade. Também não é sinônimo de universalidade, pois há costumes regionais e até mesmo empregados exclusivamente em relações bilaterais.
O costume extingue-se pelo desuso (perda de um dos dois elementos acima descritos), pelo aparecimento de um novo costume que substitua outro anterior, ou por sua substituição por tratado internacional que incorpore as normas costumeiras (“Codificação do Direito Internacional”).
Princípios Gerais: originários do direito interno dos Estados, ascenderam para o Direito Internacional. Foram previstos no art. 38 para preencher as lacunas do sistema e evitar o non liquet (função interpretativa). Ex. boa fé, pacta sunt servanda, coisa julgada e direito adquirido. Para SHAW (2010, 86), a equidade é um princípio aplicável para a resolução de conflitos.
Jurisprudência e Doutrina: segundo o Estatuto da CIJ, são meios auxiliares na determinação do direito.
A Jurisprudência é formada pelo conjunto de decisões reiteradas das Cortes Internacionais (CIJ, CIDH, TPI) em um mesmo sentido. Segundo SHAW (2010, p. 87), “o grau de respeito conferido à Corte [CIJ] e às suas decisões faz com que suas opiniões sejam vitais para o crescimento e o cada vez mais amplo conhecimento do direito internacional”. A decisão da CIJ só será obrigatória para as partes litigantes e a respeito do caso em questão (art. 59, do estatuto da CIJ).
A Doutrina, como fonte auxiliar, tem como principal função “contribuir para a interpretação e aplicação da norma internacional, bem como para a formulação de novos princípios e regras jurídicas” (PORTELA:2012, 82). Tem que ser de produzida por juristas internacionalistas, que publicam textos internacionalmente e que sejam mundialmente reconhecidos. Ex. Hugo Grotius.
Atos Unilaterais: podem produzir importantes consequências jurídicas na seara internacional, independente da aceitação ou do envolvimento de outros entes estatais. Ex.: ratificação de tratados (gera obrigações na esfera internacional), protesto, notificação, renúncia, denúncia, reconhecimento, promessa, ruptura das relações diplomáticas.
Decisões de Organizações Internacionais: Podem ser internas (aplicáveis apenas ao funcionamento da organização) ou externas (voltados a tutelar direitos e obrigações de outros sujeitos de Direito Internacional). Podem ser cogentes (vinculam os sujeitos de Direito Internacional – Ex.: resoluções do CSONU) ou facultativas (não possuem força jurídica, são cumpridas voluntariamente pelos Estados por força moral ou política – “Power of shame” - Ex.: decisões do AGONU, OMS, OMC, OIT, etc.).
Jus Cogens: são normas aceites e reconhecidas pela comunidade internacional dos Estados no seu todo como norma cuja derrogação não é permitida e que só pode ser modificada por uma nova norma de direito internacional geral com a mesma natureza (art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados – CVDT). Noutros termos, é um conjunto de preceitos que resguarda os mais importantes e valiosos interesses da sociedade internacional, como expressão de uma convicção, aceita em todas as partes do globo e que alcança profunda consciência de todas as nações, satisfazendo o superior interesse da comunidade internacional como um todo, como os fundamentos de uma sociedade internacional, sem os quais a inteira estrutura se romperia. Ex. vedação de tortura, de genocídio, de escravidão e de discriminação racial. Em virtude disso, caracteriza-se pela sua imperatividade e constitui restrição direta da soberania estatal.
A norma de jus cogens tem efeito erga omnes e o poder de derrogar tratado anterior ao seu surgimento (art. 64 da CVDT). Por sua vez, é nulo todo o tratado que, no momento da sua conclusão, seja incompatível com o jus cogens (art. 53 da CVDT).
Obrigações Erga Omnes: são aquelas que criam deveres a serem observados por toda a comunidade de Estados. Essas obrigações foram conceituadas, em obiter dictum na sentença do caso Barcelona Traction (CIJ, 1972), como aquelas em que “tendo em vista a importância dos direitos em causa, todos os Estados podem ser considerados como tendo um interesse jurídico em que esses direitos sejam protegidos”. A CIJ já entendeu, em parecer consultivo, que o dever de respeitar o direito à autodeterminação dos povos é uma obrigação erga omnes.
Há uma nítida relação entre o jus cogens e as obrigações erga omnes, de modo que toda norma daquela categoria gera uma obrigação erga omnes. Segundo RAMOS, a obrigação erga omnes nasce da valoração da obrigação primária, gerando como consequência o dever de respeito por todos os Estados (2004, 340). Sua inobservância gera uma obrigação secundária, que é a legitimidade de todos os Estados da sociedade internacional de buscar a reparação pela violação perpetrada (RAMOS, 2004: 342).
Soft Law: instituto novo e de contornos ainda imprecisos, são regras cujo valor normativo seria limitado, seja porque os instrumentos que as contêm não seriam juridicamente obrigatórios, seja porque as disposições em causa, ainda que contidas num instrumento constringente, não criariam obrigações de direito positivo
ou criariam obrigações pouco constringentes. São normas não-imperativas, não-vinculantes, que não têm sanção correspondente.
A sanção pelo seu descumprimento é o embaraço internacional (Power of shame ou Power of embarrassment) e para serem cumpridas dependem da vontade dos Estados. Ex.: acordos de cavalheiros (gentlemen’s agreements), atas de reuniões internacionais, códigos de condutas, resoluções não-vinculantes de organismos internacionais (como a Declaração Universal dos Direitos Humanos).
Ponto 1.c. Graves violações às Convenções de Genebra e crimes de guerra. Imprescritibilidade. Competência para processar e Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha.
Principais obras consultadas: Resumo do Grupo do 26º CPR; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 4ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, Malcolm N. Direito Internacional, 2010. Editora Martins Editora; RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional por Violação de Direitos Humanos, 1ª ed. Editora Renovar, 2004.
Legislação básica: Estatuto da Corte Internacional de Justiça; Estatuto de Roma (Tribunal Penal Internacional); Convenções sobre a Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais de 1899 e 1907 (Conferências de Haia); Convenção relativa ao Tratamento de Prisioneiros de Guerra (III Convenção de Genebra de 1949); Convenção relativa à Proteção dos Civis em Tempo de Guerra (IV Convenção de Genebra de 1949); Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra relativo à Proteção das Vítimas de Conflitos Armados Internacionais e Não-Internacionais (Protocolos I e II, de 1977); Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade (Convenção de Nova York de 1968); Estatutos do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (http://www.icrc.org/por/resources/documents/misc/icrc-statutes-080503.htm).
Leituras complementares: Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos e Enfermos dos Exércitos em Campanha (I Convenção de Genebra de 1949); Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos, Enfermos e Náufragos das Forças Armadas no Mar (II Convenção de Genebra de 1949); Projeto de Lei nº 4.038/2008; Relatório do XV Encontro Nacional de Procuradoras e Procuradores dos Direitos do Cidadão (2009).
Graves violações às Convenções de Genebra: Crimes de guerra são atos ilícitos cometidos contra as normas do Direito de Guerra (Jus in bello - Direito de Haia) e do Direito Humanitário (Direito de Genebra) – que, juntos, formam um único sistema complexo: o Direito Humanitário Internacional – CIJ (SHAW, 2010).
As leis de guerra foram sistematizadas nas Convenções sobre a Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais (Conferências de Haia) de 1899 e 1907, nas quais foram adotadas várias convenções que tratavam da guerra terrestre e marítima. Após, vieram as quatro Convenções de Genebra de 1949 (“Convenções da Cruz Vermelha”), todas promulgadas pelo Brasil pelo Decreto nº 42.121/1957:
Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos e Enfermos dos Exércitos em Campanha (I Convenção);
Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos, Enfermos e Náufragos das Forças Armadas no Mar (II Convenção);
Convenção relativa ao Tratamento de Prisioneiros de Guerra (III Convenção); e
Convenção relativa à Proteção dos Civis em Tempo de Guerra (IV Convenção).
Em virtude do aumento do número de guerras revolucionárias de libertação nacional e civis após a Segunda Guerra mundial, as Convenções de Genebra foram atualizadas pelo Protocolo Adicional às Convenções de Genebra relativo à Proteção das Vítimas de Conflitos Armados Internacionais (Protocolo I) e Não-Internacionais (Protocolo II), ambos de 1977 e promulgados no Brasil pelo Decreto nº 849/1993.
A III Convenção (prisioneiros de guerra) considera violações: mutilação física, experiência médica ou científica de qualquer natureza que não seja justificada pelo tratamento médico do prisioneiro referido e no seu interesse, atos de violência ou intimidação, insultos, exposição à curiosidade pública e medidas de represália (arts. 13 e 14). Prisioneiros de guerra, após capturados, devem ser levados a locais nos quais não estejam expostos a perigos das zonas de combate, nem devem ser usados para tornar áreas imunes a operações militares (art. 23).
O conceito de civil, para fins de proteção pela IV Convenção, é dado por exclusão (basicamente, é qualquer indivíduo não-combatente – art. 50 do Protocolo I/1977). Em caso de dúvida, qualquer pessoa deve ser considerada civil. População e bens civis não podem ser alvo de ataque, sendo proibidos atos ou ameaças com objetivo de disseminar terror, ataques indiscriminados (atingem tanto objetivos militares quanto civis - arts. 51 e 57 do Protocolo I).
O direito das partes de escolher os meios de guerra não é ilimitado (art. 22, Conferência de Haia/1907), sendo proibido o uso de armas, projéteis ou materiais destinados a causar sofrimento desnecessário (art. 23). As violações e os crimes de guerra podem ocorrer em conflitos armados internos (o art. 3º, comum a todas as quatro Convenções de Genebra, fornece, para os conflitos armados não-internacionais no território de uma das partes, garantias mínimas para proteção dos que não tomaram parte nas hostilidades, bem como enfermos e feridos). Com o Protocolo II/1977, o citado artigo passou a ser aplicado a todos os conflitos armados não-internacionais no território de Estado-parte entre suas forças armadas e forças armadas dissidentes/grupos armados organizados (SHAW: 2010).
Crimes de guerra: o art. 6º do Acordo de Londres/1945 (que criou o Tribunal de Nuremberg) tipificou crimes de guerra, assim como o art. 3º do Estatuto do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (Resolução CSONU nº 827).
Segundo Bassiouni, os crimes de guerra consistem em categoria que envolve 71 instrumentos relevantes datados de 1854-1998, muitos dos quais corporificam, codificam ou evidenciam o direito internacional costumeiro – cuja regulação de conflitos armados também se aplica. A maioria de tais instrumentos foi delineada com clareza e especificidade suficientes, o que evidenciam suas características penais. Bassiouni menciona que as quatro Convenções de Genebra de 1949 e seus dois Protocolos adicionais são as codificações mais abrangentes e com as características penais mais específicas e aponta que se trata de jus cogens.
Atualmente, os crimes de guerra se encontram definidos no art. 8º do Estatuto de Roma (Tribunal Penal Internacional). Integra a definição de tais crimes a circunstância especial de serem parte integrante de um plano ou de uma política ou de uma prática em larga escala (art. 8.1).
Imprescritibilidade: Nem o Estatuto de Nuremberg/Tóquio, nem a Convenção sobre o Genocídio de 1948, nem as quatro Convenções de Genebra/1949 a preveem expressamente. Apesar disso, o Tribunal da Ex-Iugoslávia (Caso Furundzija) afirmou que “a natureza imperativa da proibição da tortura produz a imprescritibilidade desta infração, acrescentando que os crimes de competência da Corte não são prescritíveis” (estende o campo de aplicação da imprescritibilidade às violações graves das Convenções de Genebra de 1949, à infração das leis e costumes da guerra, ao genocídio e aos crimes contra a humanidade).
Apesar de a Assembleia Geral da ONU ter elaborado a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade (Convenção de Nova York, 1968), esta não obteve muitas ratificações, sendo criticada pela aplicação aos crimes cometidos antes de sua entrada em vigor (art. 1º); por outro lado, a Convenção Europeia sobre a Imprescritibilidade (Estrasburgo, 1974), que não previa a sua retroatividade, também só foi ratificada pelos Países Baixos/Romênia – o que evidencia a então falta de consenso sobre o tema.
OBS: por razões técnico-jurídicas brasileiras, o Brasil não ratificou a Convenção de Nova
York! Entretanto, tramita na Câmara dos Deputados (janeiro/2012) o Projeto de Lei nº 4.038/2008, que estabelece, entre outras coisas, a imprescritibilidade dos crimes de guerra.
O Estatuto de Roma (TPI) adotou a imprescritibilidade expressa, geral e definitiva (ação penal e penas – art. 29/duas vertentes: obrigação de fazer com que tais crimes sejam imprescritíveis no âmbito interno dos Estados ou que os crimes são imprescritíveis perante o TPI apenas). Parte da doutrina considera que tal Estatuto tem efeito apenas declaratório de regra costumeira prévia; outros acreditam que a baixa adesão à Convenção demonstra a falta de consistência costumeira (ausência de opinio juris); parte da doutrina entende, ainda, que o art. 29 reflete o estado do direito internacional costumeiro ou configura norma costumeira em formação. OBS: não cabe a crítica da aplicação retroativa da imprescritibilidade no TPI!
A favor da imprescritibilidade: Relatório do XV Encontro Nacional de Procuradoras e Procuradores dos Direitos do Cidadão, 2009: “Como se tratam de crimes jus cogens, a prescritibilidade desses crimes pela inação do Estado não é admitida pelo direito costumeiro internacional. O Brasil não firmou a Convenção da ONU sobre crimes imprescritíveis, mas esta tem efeito declaratório e não constitutivo, expressa um consenso”. No mesmo sentido, Debate sobre a imprescritibilidade da tortura/ desaparecimento forçado, que se aplicam ao tema: “Marcelo Miller – PRDC/ RJ –(...) O primeiro ponto diz respeito à existência de um costume de imprescritibilidade com base na Convenção das Nações Unidas, que até a década de 30 tinha poucos Estados partes, não se podendo falar assim de prática reiterada. Falar de um conteúdo declaratório da Convenção é também uma dificuldade, porque a convenção estabelece apenas um dever de se criar imprescritibilidades e não as declara. E esse costume de imprescritibilidade seria oponível perante a ordem internacional e não interna. Também quando o TPI fala nos crimes mais graves de violação aos direitos humanos exigem uma tipificação além da prevista no Estatuto de Roma. Eugênio Aragão – Compreendo suas ponderações. O assunto não é fechado. Entendo que o Tratado de Roma para obrigar os Estados a legislarem antes declaram a imprescritibilidade desses crimes”.
Competência para processar: A jurisdição do TPI limita-se a crimes cometidos após 1º/07/2002, atuando de forma complementar aos sistemas nacionais. Também é possível a jurisdição universal por parte dos Estados. Lembrar que o exercício da jurisdição penal internacional pelos Estados é, em regra, livre, cabendo ao Estado que se opõe comprovar o impedimento: CIJ, Caso Lótus (Império Turco x França); e Caso Bélgica x Congo. A competência do TPI está restrita aos crimes de guerra previstos no tratado que o criou (nullum crimen sine lege). Não basta subsunção formal ao art. 8º do Estatuto de Roma, mas também lesão efetiva à comunidade internacional (art. 17.1.d). Restringe-se aos crimes ocorridos no território de Estado-parte ou réu nacional de Estado-parte (iniciativa do Procurador/Estado-parte)
Para os crimes anteriores houve a criação de Tribunais “ad hoc” (Iugoslávia, Ruanda, Tóquio) – que, por definição, julgam crimes anteriores à sua constituição. Não há limitações territoriais quando a iniciativa é do Conselho de Segurança da ONU (Sudão x Líbia).
Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha: O Comitê é competente para cuidar da assistência à pessoa nos conflitos armados/catástrofes/tragédias, naturais ou não. É competente também para velar pela aplicação do Direito Humanitário por parte dos Estados, para o que tem poderes inclusive para investigá-los ou para servir de intermediário entre entes estatais em tratativas que envolvam matéria humanitária (PORTELA, 2009).
A competência investigativa pode ser extraída do artigo 4º do Estatuto do CICV: "1. O papel do CICV será: c) empreender as tarefas determinadas pela Convenção de Genebra, trabalhar pelo cumprimento correto do Direito Internacional Humanitário em casos de conflitos armados e tomar conhecimento de quaisquer queixas baseadas em supostos casos de desrespeito deste direito; 2. Na qualidade de instituição neutra, independente e de intermediação, o CICV pode promover qualquer iniciativa humanitária que tenha relação com o seu papel, e pode examinar qualquer problema que necessite de análise por uma instituição deste tipo".
Ponto 2.a. Direito Internacional Privado. Evolução histórica. Conflito de leis e espécies de normas.
Principais obras consultadas: Resumo do Grupo do 26º CPR; PORTELA, P. H. G. Direito internacional público e privado. 3ª Edição. Ed. Jus Podivm, 2011. DOLINGER, J. Direito internacional privado. 4ª Edição. Ed. Renovar, 1997. STRENGER, Irineu. Direito internacional privado, 5ª ed. S. Paulo: Ltr, 2003.
Legislação básica: Código Bustamante (Decreto 18.871/1929) e LINDB (DL 4.657/1942)..
O Direito Internacional Privado regula os conflitos de leis no espaço, cuidando, essencialmente, de estabelecer critérios para determinar qual a norma, nacional ou estrangeira, aplicável a relações privadas com conexão internacional, ou seja, que transcendem os limites nacionais e sobre as quais incidiria mais de uma ordem jurídica (PORTELA, 2011, p. 58).
Embora consagrada, a expressão “direito internacional privado” costuma ser criticada, pois o ramo jurídico a que se refere integraria o direito interno e abrangeria, p. ex., questões processuais, alheias ao direito privado.
De fato, o objeto do direito internacional privado inclui: (1) conflito de leis interespacial ou interpessoal (possibilidade de aplicação simultânea de mais de um sistema jurídico para regular determinada situação — para DOLINGER (1997, p. 23), podem colidir até mesmo sistemas pessoais diversos, como os baseados em etnias); (2) conflito de jurisdições; (3) cooperação jurídica internacional, incluindo o reconhecimento de sentenças estrangeiras.
Na França, diversamente do que ocorre nos EUA, parte da doutrina inclui no DIPRI: (1) nacionalidade, aqui entendida como a caracterização dos nacionais do Estado; (2) condição jurídica do estrangeiro no País; por outro lado, exclui-se o que “não corresponde ao direito privado”, como, p. ex., extradição. Atualmente, a exemplo de VALLADÃO, a doutrina brasileira tende a congregar a opção americana e a francesa, com algumas variações.
Tomando a antiguidade como ponto de partida, DOLINGER cita FUSTEL DE COULANGES, em seu clássico “A Cidade Antiga”, no qual este autor realça as limitações e distinções impostas aos estrangeiros, aos quais eram vedados de participar do direito da cidade. Na Grécia e Roma o estrangeiro não tinha direitos, pois estes derivavam exclusivamente da religião, da qual o alienígena era excluído. Daí porque não podia ser proprietário, não podia casar, os filhos nascidos de um cidadão e uma estrangeira eram considerados bastardos, não podia contratar, nem herdar, e dele nada podia ser herdado. Enfim, aos estrangeiros as leis da cidade não existiam.
Sécs. XII e ss.: o comércio entre cidades do norte da Itália (Módena, Florença, Gênova, Veneza, dentre outras) e províncias francesas cria situações de conflito de leis no espaço. Começam daí a reduzir a escritos o seu próprio direito consuetudinário, ocupando-se principalmente das relações jurídicas de direito privado, de modo a regular os novos conflitos exsurgentes com o fluxo crescente de pessoas de diferentes partes, atraídas pela perspectiva de ganho.
1849: a consolidação científica do DIPRI dá-se em 1849, em obra de SAVIGNY, que propõe encontrar a sede da relação jurídica para determinar se aplicável a lei nacional ou estrangeira: “Abandonando o unilateralismo, a ideia que o legislador só poderia criar normas que se aplicassem em seu território e a seus nacionais, Savigny pregava a igualdade entre direitos e uma comunidade de direito entre as nações, a permitir o bilateralismo, isto é, a aplicação em pé de igualdade da lei nacional ou da lei estrangeira” (MARQUES, 2008, p. 335).
1928: Na América Latina, busca-se de modo pioneiro a codificação do DIPRI, a exemplo do Código Bustamante. Posteriormente, as cortes norte-americanas criticam a indiferença com o resultado material na solução do conflito de leis no método europeu e, nos anos 60, passam a considerar o resultado material na escolha da norma a ser aplicada especialmente em matéria contratual e de responsabilidade civil (busca da justiça substancial no caso concreto – Caso Babcock/1963: troca da regra de conexão clássica “lex loci delicti” pela flexível “proper law of the tort”). Na Europa, atualmente, a evolução do DIPRI, propulsionada pelas normas comunitárias, levou ao pluralismo de métodos (recurso a regras materiais de DIPRI e regras alternativas) e flexibilização das normas de conflito (cláusulas de exceção e adoção de princípios como o da proximidade). A evolução recente do DIPRI na América Latina, foi provocada pela OEA (CIDIPs), iniciativas do Mercosul e reformas legislativas em alguns países. No Brasil, o DIPRI tradicional está incorporado à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (1942), e a evolução faz-se sentir especialmente nos tratados.
Acerca do conflito de leis, pode-se afirmar que a principal tarefa do direito internacional privado é a de procurar qual a solução adequada para resolver um conflito de leis no espaço. Este pode ser considerado o objeto básico do direito internacional privado. Nesse ponto, vale referir que duas escolas divergem acerca do objeto do direito internacional privado. São elas a (a) Escola Francesa: diz que o Direito Internacional Privado possui cinco objetos: conflito de leis, conflito de jurisdição, direitos adquiridos, nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro; e a (b) Escola Anglo-americana: diz que o Direito Internacional Privado só possui um objeto, que é o conflito de leis. Essa é a corrente adotada no Brasil.
O conflito surge do contato entre ordens jurídicas diferentes. O Direito Internacional Privado soluciona o conflito de forma indireta, pois ele apenas indica a norma a ser aplicada de acordo com cada caso concreto em que se envolva um estrangeiro. Ex: o juiz brasileiro em determinados casos pode aplicar lei estrangeira aqui no Brasil (vide LINDB, art. 7º, § 4º).
Atualmente, as espécies de normas de direito internacional privado não se limitam a princípios (tal qual a ordem pública) e regras de conexão clássicas (ou rígidas). Para alcançar resultados materialmente equitativos, hoje o direito internacional privado conta também com: (1) normas materiais: regulam a conduta, solucionando diretamente o caso; (2) normas narrativas: sem regular conduta, ditam diretrizes e fins, para a interpretação de outras normas (soft law); (3) normas alternativas, como, p. ex., a aplicação da lei favorável ao consumidor; (4) normas flexíveis: permitem ao juiz ou partes valorar elementos do caso concreto, para determinar a lei aplicável, p. ex. aplicando o princípio da proximidade.
Ponto 2.b. Organização Internacional. Características. Evolução. Espécies e finalidades. Regime jurídico. Santa Sé. Prerrogativas e imunidades no Brasil
Principais obras consultadas: Resumo do 26º CPR; PORTELA, P. H. G. Direito internacional público e privado. 3ª Edição. Ed. Jus Podivm, 2011. REZEK, J. F. Direito internacional público. 10ª Edição. Ed. Saraiva, 2007. MAZZUOLI, VALÉRIO. Curso de Direito Internacional Público. 5ª Edição, 2011.
Legislação básica: não indicou.
A sociedade internacional não é composta apenas por Estados. Com efeito, outros entes atuam no âmbito das relações internacionais, dentre os quais entidades criadas e formadas por Estados, com estrutura e personalidade jurídica próprias e com o objetivo de administrar a cooperação internacional em temas de interesse comum. Tais sujeitos de Direito Internacional são as organizações internacionais, também conhecidos como organismos internacionais ou organizações intergovernamentais.
Organização Internacional: entidades compostas por Estados por tratado multilateral (“Carta”) de caráter especial (natureza convencional e institucional), com aparelho institucional permanente (órgãos/agentes; em geral: órgão plenário/órgão executivo/secretariado) e personalidade jurídica própria de direito internacional (derivada= porque se origina dos Estados) para cooperação internacional em temas de interesse comum. A personalidade jurídica ou está no ato constitutivo ou é inferida dos poderes/objetivos da organização e sua prática (vide “caso Reparação por ferimentos recebidos a serviço das N. Unidas”- CIJ: ONU tem direito à reparação pela morte de seu mediador (Folke Bernadotte) em Jerusalém/1948 e tem personalidade jurídica internacional objetiva (vale também perante Estados não membros) porque era indispensável para atingir seus objetivos/princípios. Não se confundem com ONG´s: entes privados c/ personalidade jurídica de direito interno que eventualmente atuam no âmbito internacional (PORTELA).
Características: multilateralidade (mín. 3 membros); permanência (prazo indeterminado); institucionalização (órgãos/agentes próprios); voluntariedade da associação; poder normativo (interno: suas atividades; externo: para demais sujeitos de DIP); princípio majoritário (Mercosul é por consenso); controle (competência para supervisionar cumprimento de tratados/normas de seu âmbito); competência impositiva (impor suas decisões/ aplicar sanções).
Evolução: surgimento com evolução do Estado moderno e de uma ordem internacional que demandava cooperação internacional que a diplomacia não satisfazia. Surgiram as conferências internacionais: reuniões para tratar de problemas entre Estados. Após Congresso de Viena/1815: conferências internacionais regulares que ensejaram surgimento de “instituições internacionais” (SHAW). Séc. XIX: desenvolvimento de instituições internacionais não governamentais privadas (Comitê Internacional da Cruz Vermelha/Associação de Direito Internacional) e também organizações internacionais públicas. Conceitos introduzidos por elas (encontros regulares/ secretariados permanentes/ decisão maioria/ voto ponderado/ contribuição financeira proporcional) formam as bases das organizações internacionais do séc. XX: grande inovação é a abrangência global (ONU).
Espécies e finalidades: (REZEK): Quanto ao alcance: universal (maior número de Estados sem restrições geográfica/cultural/etc; ONU/Agências Especializadas da ONU como OIT/UNESCO) e regional (Estados com vínculo geográfico/cultural/histórico; Ex: OEA/Liga dos Estados Árabes-LEA/Mercosul); Quanto domínio temático: vocação política (principalmente paz e segurança – ONU/OEA) e vocação específica (fim econômico/financeiro/cultural/técnico. Ex: Agências Especializadas da ONU/FMI/OMS) (PORTELA): Quanto à natureza dos poderes exercidos: intergovernamentais (relação de coordenação com membros; decisões maioria/consenso) e supranacional (relação de subordinação; decisões imediatamente executáveis nos Estados)
Regime jurídico: como são criadas por tratados e estes devem ser interpretados/aplicados por meio do DIP, este é, em regra, o direito aplicável às organizações internacionais. A regulamentação interna da organização rege relações de trabalho/criação de órgãos/serviços administrativos. Se não há previsão, o DIP aplica-se subsidiariamente. O direito interno dos Estados rege: aquisição/arrendamento de terras, contratos de equipamentos/serviços, responsabilidade civil danos causados pela organização ou contra ela (SHAW).
Santa Sé: Cúpula governativa da Igreja Católica, não é Estado (embora tenha território/pop./governo; não preenche o critério teleológico= fins do Estado e não possui dimensão pessoal= nacionais); não é organização internacional e sim caso único de personalidade internacional anômala (REZEK, 2007, p. 242). Atual configuração: Acordos de Latrão (1929): concordata+tratado político+convenção financeira (+ reconhecimento de propriedade de imóveis dispersos/plena soberania nos 44 hectares da colina vaticana = Estado da Cidade do Vaticano). Celebra concordatas:
compromissos sobre as relações da Igreja com o Estado. No entendimento de Valério Muzzuoli (MAZUOLI, 2011, páginas 408-414), “Desde muito tempo se discute a que categoria jurídica pertencem a chamada Santa Sé (cúpula do governo da Igreja Católica) e o Estado da Cidade do Vaticano. Embora a Santa Sé esteja intimamente ligada ao Estado do Vaticano (este último resultante dos Tratados de Latrão de 1929) e o Papa seja tanto o chefe de uma como do outro, a personalidade jurídica internacional da Igreja não é precisamente a mesma do Estado da Cidade do Vaticano.
Dessa forma, cabe aqui estudar em separado a Santa Sé e o Estado da Cidade do Vaticano, analisando suas principais diferenças à luz do Direito Internacional Público. A Santa Sé. Como se sabe, o início do Direito Internacional coincide, não por acaso, como fim da ideia da república cristã chefiada pela Igreja Católica, quando se passa (desde os tratados de Westfália de 1648) da Respublica sub deo para sociedade de Estados soberanos e independentes. Em outras palavras, os Estados nasceram (a partir desse momento histórico) de forma autônoma e independente, com características soberanas e sem qualquer subordinação (superiorem non recognoscentes) a um poder do tipo religioso (ao que se chamou de "sistema estatal europeu", também caracterizado pela diversidade religiosa, fruto da reforma protestante).
Ocorre que mesmo essa nova estruturação da sociedade internacional (formada agora por Estados soberanos e independentes, desvinculados do poder religioso da Igreja) manteve o reconhecimento da figura do Papa com a qualidade de Soberano perante as relações internacionais, à semelhança de qualquer Chefe de Estado. Como consequência, a expressão de sua autoridade (chamada de Santa Sé) foi reconhecida como sujeito do Direito Internacional, mesmo não sendo tecnicamente um Estado. Tal se deu porque o Direito Internacional aceita a subjetividade internacional de certos entes que não são Estados, desde que presentes certos requisitos, como a mantença de relações internacionais com os demais sujeitos do direito das gentes, seu reconhecimento por parte de tais sujeitos etc. Sob a ótica do Direito Internacional é relevante o fato de que nunca se negou à Santa Sé a capacidade jurídica de agir (isto é, de participar das relações internacionais) em pé de igualdade com as demais potências soberanas, ao que se denomina princípio da efetividade nas relações internacionais. É relevante também o fato de que sua personalidade internacional nunca foi posta em dúvida mesmo por Estados de população predominantemente não católica. Posteriormente, com a criação da Cidade Estado do Vaticano (a partir de 1929) o Papado passou então a abranger "duas pessoas internacionais distintas, uma das quais uma das quais, a própria Igreja, é a condição básica da existência da outra". Daí alguns autores terem equiparado essa situação à de uma união real.
A definição de Santa Sé é feita pelo art. 361 do Código de Direito Canônico de 1983 nos seguintes termos: "Sob a denominação de Sé Apostólica ou Santa Se, neste código vêm não só o Romario Pontífice, mas também) a não ser que pela natureza da coisa ou pelo contexto das palavras se depreenda o contrário., a Secretaria de Estado, o Conselho para os negócios públicos da Igreja e os demais organismo da Cúria Romana".
Não obstante ter a Santa Sé o seu governo sediado na Cidade Estado do Vaticano, ela não se acha limitada ao território deste; aliás, ela não se limita a território algum. De fato, os seus membros encontram-se espalhados por todas as partes do planeta e suas normas não encontram limitação de outra ordem que não as da própria Igreja. Aliás, muito antes da criação da Cidade Estado do Vaticano (o que ocorreu somente em 1929) a Santa Sé já firmava tratados e acordos internacionais e participava das relações internacionais, de sorte que a sua personalidade jurídica (e isso não se nega) é bem anterior aos Tratados de Latrão. Assim, o fato do reconhecimento da personalidade internacional da Santa Sé sem dúvida, sui generis - é histórico, não tendo sido jamais contestado à luz do direito das gentes. Como observou Le Fur, não é porque Constitui um Estado que a Santa Sé é soberana: "é, ao contrário, a criação do Estado pontifício que constitui uma consequência da soberania inerente à natureza da Igreja”.
É preciso compreender a história para se ter a exata noção da personalidade jurídica internacional da Santa Sé, que representa, repita-se, a cúpula do governo da Igreja Católica e tem como autoridade máxima o Papa.
A primeira parte dessa história diz respeito ao período anterior a 1870, quando o Papa englobava em sua pessoa o poder espiritual, de chefe da Igreja Católica, e o poder temporal, de chefe dos Estados pontifícios." Havia, assim, duas pessoas de Direito Internacional: a Santa Sé e os Estados pontifícios, ambas tendo como chefe a figura do Papa. No que tange ao seu poder temporal, o papa tinha autoridade Similar a de qualquer chefe de Estado: mantinha relações com potências estrangeira e participava das relações internacionais. Mas como destaca Accioly, esse poder temporal do Papa "nunca foi senão um acessório de seu poder espiritual. O primeiro era, sem dúvida, uma garantia para a independência do segundo. Mas, o certo é que, acima de sua qualidade de soberano temporal, sempre esteve a de soberano espiritual, cuja autoridade ultrapassava os limites dos Estados pontifícios, tornando-se mundial. E essa qualidade primacial é o que constitui a verdadeira razão de ser do Papado". E conclui: "Em todo caso, a soberania temporal do Vigário de cristo bastava para que se não discutisse a situação internacional da Santa Sé"'.
A segunda parte da história ocorre depois de 1870, quando Vittorio Emanuele II se apodera violentamente de Roma (sede do Papado) e dá surgimento à chamada "questão romana". O que ocorreu foi o seguinte: a partir da referida anexação de Roma ao reino da Itália sob a dinastia da Casa de Savoia, em 20 de setembro de 1870, o poder temporal do Papa (de chefe dos Estados pontifícios) desapareceu, pois até então (internacionalmentee juridicamente) só se considerava ao Papa o caráter de chefe de um Estado. Desaparecendo o Estado (pela anexação de Roma à Itália), o Papa perderia a sua personalidade internacional. Certamente, esse despojo territorial geraria um inconformismo em todo o mundo e aos milhares de católicos espalhados pelas diversas potências, os quais obviamente exigiriam uma satisfação do governo italiano por conta da nova situação instaurada. Em vista desse fato, os estadistas italianos procuraram não constranger o exercício do poder espiritual do Papa na sua condição de chefe da Igreja Católica e, para tanto, promulgaram (em 13 de maio de 1871) a chamada Lei das Garantias, segundo a qual o "Sumo Pontífice conserva a dignidade, a inviolabilidade, e todas as prerrogativas pessoais de soberano, garantindo-se lhe, com a franquia territorial, a independência e o livre exercício da autoridade especial da Santa Sé". Com isso, além de a Itália ter deixado claro que o Papa não é súdito de ninguém, também atribuiu personalidade jurídica (em princípio, interna) à Santa Sé. É dizer, atribuiu-se ao Papa soberania internacional, por não depender de nenhum dos poderes conhecíveis do sistema tripartite moderno (Legislativo, Executivo e Judiciário), além de inviolabilidade e imunidade à jurisdição penal e civil (sem a possibilidade de ser demandado judicialmente). Apesar das divergências doutrinárias sobre a juridicidade de tais prerrogativas papais, uma coisa foi certa: a soberania espiritual (honorífica, religiosa, moral) da Igreja Católica tornou-se inconteste pela Lei das Garantias.
Como se percebe, as relações entre a Santa Sé e o Vaticano têm natureza absolutamente sui generis. Foi precisamente nos Tratados de Latrão que esses dois atores- a Santa Sé e a Itália - com suas estipulações recíprocas, deram origem a esse novo sujeito: o Estado da Cidade do Vaticano, que pode ser considerado um Estado instrumental a serviço
da Santa Sé. Assim, tem-se que a soberania do Estado da Cidade do Vaticano é originária, porque decorre da própria existência do Estado, mas com sua Representação e seu poder de governo submetidos à autoridade da Santa Sé, suprema instituição governativa da Igreja Católica. A Santa Sé, portanto, não é um elemento acima e fora do Estado, mas dele integrante, sendo o seu poder (ou chefia) espiritual, formando com o Estado um único ente jurídico.
Além do referido acordo político, como se falou, foi também celebrada (no âmbito dos tratados de Latrão de 1929) uma concordata entre a Santa Sé ea Itália. Esta, contudo, foi de menor interesse para o Direito Internacional Público (não obstante ter sido de grande interesse para a Santa Sé). Entre outras coisas, por meio dela reconheceu-se ao catolicismo a qualidade de religião oficial do Estado italiano. Ali também se previu o respeito às festas religiosas católicas (tidas a partir dai como feriados nacionais), a validade civil do casamento religioso e a proibição da instituição do divórcio.
Em suma, nenhuma outra comunidade religiosa agrupa, no mundo, todo as características que tem a Igreja Católica (universalidade, unidade, autoridade moral etc.) e uma organização semelhante à sua, o que transfonna a Santa Sé num caso verdadeiramente único na arena internacional. Mas se não se quiser atribuir ao Papa individualmente, a qualidade de sujeito do Direito Internacional Público - qualidade, ao que parece do estudo ora realizado, inconteste-, não se poderá negar ao Estado da Cidade do Vaticano tal prerrogativa, como se verá a seguir.”
Prerrogativas e imunidades no Brasil: As imunidades das organizações internacionais estão fundadas na necessidade para o efetivo exercício de suas funções (preservar independência).
Prerrogativas e imunidades de representantes também são abordadas em acordos sobre sedes entre as organizações e os Estados (em regra: imunidade de jurisdição interna/ inviolabilidade de prédios e arquivos/privilégios fiscais e monetários/liberdade de comunicação). Não existem regras generalizadas e sim acordos específicos. A ONU e suas Agências Especializadas têm ampla imunidade prevista em sua Carta e Convenções Gerais de 1947 (SHAW).
No Brasil: STF (RE 578543/MT) cassou decisão do TST que não reconheceu imunidade da ONU/PNUD em reclamação trabalhista (a relativização da imunidade de jurisdição dos Estados estrangeiros é baseada na igualdade soberana e reciprocidade, distinguindo-se atos de império/gestão com base em norma costumeira internacional e não se aplica às organizações internacionais porque não têm as mesmas características daqueles). Sua imunidade tem fundamento em tratados (vontade dos Estados). Segundo REZEK, é possível que isso mude por coerência e face a interesses sociais relevantes para situação análoga a dos Estados.
Obs.: parecer consultivo da CIJ Imunidade ao processo legal (reconheceu imunidade de Cumaraswamy, Rel. Especial da Comissão de Dir. Hum. da ONU sobre independência de juízes e advogados na Malásia em relação a palavras pronunciadas em entrevista publicada em jornal e que a Malásia tinha obrigação de informar seus tribunais sobre a decisão do Secretário Geral da ONU nesse sentido - SHAW).
QUESTÃO DE PROVA: O tema foi abordado na questão 60, do CPR 26, a seguir transcrita, juntamente com a assertiva dada como correta no gabarito definitivo: 60. GOVERNOS ESTRANGEIROS BEM COMO AS ORGANIZAÇÕES DE QUALQUER NATUREZA, QUE ELES TENHAM CONSTITUÍDO, DIRIJAM OU HAJAM INVESTIDO DE FUNÇÕES PÚBLICAS, c) ( ) não podem adquirir no Brasil bens imóveis ou suscetíveis de desapropriação, mas podem, os governos estrangeiros, adquirir a propriedade dos prédios necessários à sede dos representantes diplomáticos ou dos agentes consulares.
Ponto 2.c. Desaparecimento forçado como crime internacional. Crime de ius cogens. Normativa internacional. Imprescritibilidade.
Principais obras consultadas: Resumo do 26º CPR; PORTELA, P. H. G. Direito internacional público e privado. 3ª Edição. Ed. Jus Podivm, 2011. REZEK, J. F. Direito internacional público. 10ª Edição. Ed. Saraiva, 2007. MAZZUOLI, VALÉRIO. Curso de Direito Internacional Público. 5ª Edição, 2011.
Legislação básica: não indicou.
Desde a década de 80 a ONU se debruça sobre o tema do desaparecimento forçado, no entanto, foi apenas em 2006 que a Assembleia Geral aprovou a Convenção para Proteção de Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado definindo-o como crime contra a humanidade. Na Convenção, os Estados comprometem-se a incluir o crime no código penal e garantir mecanismos para aplicação da lei nos seus territórios.
O art. 7° do Estatuto do TPI também criminaliza a prática do desaparecimento forçado como crime contra a humanidade, sendo que sua competência está circunscrita aos ataques generalizados/ou em grande escala contra população civil, que tenha como autores não apenas o Estado, mas também organizações políticas e motivações políticas. Salienta-se que a categoria de crimes contra a humanidade surgiu ainda na década de 50, com o Tribunal de Nuremberg, sendo reafirmada no Estatuto de Roma.
A normatividade internacional conta também com a Convenção Interamericana contra o Desaparecimento Forçado, que entrou em vigor em 1996, sendo considerada precursora na normativa internacional sobre o tema (HEINTZE, 2009, p. 56).
O crime de desaparecimento forçado é crime de lesa-humanidade e como tal abarcado pela Convenção sobre a Imprescritibilidade de Crimes de Guerra e Crimes contra a Humanidade de 1968, assinada pelo Brasil, que, no entanto, não a ratificou, o que não impede sua aplicação a todos os Estados, conforme relembrou ex-presidente da Corte, A. A. Cançado Trindade, em seu voto separado no Caso Almonacid: que a configuração dos crimes contra a humanidade é uma manifestação mais da consciência jurídica universal, de sua pronta reação aos crimes que afetam a humanidade como um todo. Destacou que com o passar do tempo, as normas que vieram a definir os “crimes contra a humanidade” emanaram, originalmente, do Direito Internacional consuetudinário, e desenvolveram-se, conceitualmente, mais tarde, no âmbito do Direito Internacional Humanitário, e, mais recentemente no domínio do jus cogens, do direito imperativo (Almonacid, parágrafo 28). Esse entendimento foi um dos fundamentos para condenação do Brasil, no caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) VS. Brasil, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Crimes contra a humanidade são reconhecidos como normas de jus cogens (conforme esposado no entendimento da Corte Interamericana), que é a norma aceita pela comunidade internacional de Estados que não permite nenhuma derrogação. Também chamada de norma peremptória ou cogente (ARAGÃO, 2009:360).
Apreciando o tema, o judiciário argentino (Cámara Federal en lo Criminal y Correccional) já decidiu que ”o desaparecimento forçado de pessoas, em cuja definição se inscrevem os fatos aqui investigados, constitui um crime contra a humanidade, como tal imprescritível, e essa característica se impõe sobre todas as normas internas que possam estar contidas em disposições contrárias, independentemente da data de sua consumação”[1]. Essa decisão possui o diferencial de ter sido proferida por uma corte local interna, que se mostra alinhada ao entendimento das cortes supranacionais pela imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade e cogência da normativa internacional.
Dessas afirmações decorre a conclusão de imprescritibilidade do crime de desaparecimento forçado: 1) regras de ius cogens não estão sujeitas à prescrição, 2) da natureza de crime contra a humanidade, também não prescritíveis. Ademais, a jurisprudência Internacional, inclusive da Corte Interamericana, também alude à natureza permanente do crime de desaparecimento forçado, que embora não seja em si um fator de imprescritibilidade, impede a contagem do prazo prescricional, enquanto desaparecida a pessoa, impedindo a alegação da prescrição do crime pelo Estado infrator.
Obs.: ANISTIA NO BRASIL: Em 29 de abril
2010, o STF, no julgamento da ADPF 153/DF (rel. Min. Eros Grau), afirmou que a lei da anistia se deu por solução consensual das partes (em plena ditadura), que não era aplicável a jurisprudência internacional (não seria anistia ‘unilateral’, mas recíproca) e que o cidadão tinha direito à verdade (mas que eventual ‘Comissão de Verdade’ não tinha qualquer finalidade de persecução penal). Ficaram vencidos apenas o Min. Lewandowski e o Min. Ayres Britto. Vale transcrever trecho do voto do Min. Rel. Eros Grau:
“Reconheço que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em diversos julgamentos – como aqueles proferidos, p. ex., nos casos contra o Peru (“Barrios Altos”, em 2001, e “Loayza Tamayo”, em 1998) e contra o Chile (“Almonacid Arellano e outros”, em 2006) -, proclamou a absoluta incompatibilidade, com os princípios consagrados na Convenção Americana de Direitos Humanos, das leis nacionais que concederam anistia, unicamente, a agentes estatais, as denominadas “leis de auto-anistia”.
A razão dos diversos precedentes firmados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos apoia-se no reconhecimento de que o Pacto de São José da Costa Rica não tolera o esquecimento penal de violações aos direitos fundamentais da pessoa humana nem legitima leis nacionais que amparam e protegem criminosos que ultrajaram, de modo sistemático, valores essenciais protegidos pela Convenção Americana de Direitos Humanos e que perpetraram, covardemente, à sombra do Poder e nos porões da ditadura a que serviram, os mais ominosos e cruéis delitos, como o homicídio, o sequestro, o desaparecimento forçado das vítimas, o estupro, a tortura e outros atentados às pessoas daqueles que se opuseram aos regimes de exceção que vigoraram, em determinado momento histórico, em inúmeros países da América Latina.
É preciso ressaltar, no entanto, como já referido, que a lei de anistia brasileira, exatamente por seu caráter bilateral, não pode ser qualificada como uma lei de auto-anistia, o que torna inconsistente, para os fins deste julgamento, a invocação dos mencionados precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Com efeito, a Lei nº 6.683/79 – que traduz exemplo expressivo de anistia de “mão dupla” (ou de “dupla via”), pois se estendeu tanto aos opositores do regime militar quanto aos agentes da repressão – não consagrou a denominada anistia em branco, que busca, unicamente, suprimir a responsabilidade dos agentes do Estado e que constituiu instrumento utilizado, em seu próprio favor, por ditaduras militares latino-americanas.
Como anteriormente ressaltado, não se registrou, no caso brasileiro, uma auto-concedida anistia, pois foram completamente diversas as circunstâncias históricas e políticas que presidiram, no Brasil, com o concurso efetivo e a participação ativa da sociedade civil e da Oposição militante, a discussão, a elaboração e a edição da Lei de Anistia, em contexto inteiramente distinto daquele vigente na Argentina, no Chile e no Uruguai, dentre outros regimes ditatoriais”.
Obs.: COMISSÃO DA VERDADE: Planalto anuncia nomes dos 7 integrantes da Comissão da Verdade[2]. O Palácio do Planalto anunciou nesta quinta-feira sete nomes que vão integrar a Comissão da Verdade, criada para esclarecer violações de direitos humanos durante a ditadura militar. Os nomes serão publicados na edição de amanhã do Diário Oficial da União. A posse dos membros da comissão será realizada no dia 16 de maio, com a presença dos ex-presidentes José Sarney, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda não foi escolhido o presidente do grupo. Quem são os sete integrantes: José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça; Gilson Dipp, ministro do STJ; Rosa Maria Cardoso da Cunha, advogada de Dilma durante a ditadura; Claudio Fonteles, ex-procurador-geral da República; Paulo Sérgio Pinheiro, diplomata; Maria Rita Kehl, professora e José Paulo Cavalcante Filho, jurista. A Comissão da Verdade será responsável por apurar as violações de direitos ocorridas entre 1946 e 1988 - período que compreende os chamados "Anos de chumbo". Os sete integrantes, com ajuda de 14 auxiliares, terão a missão de ouvir depoimentos em todo o País, requisitar e analisar documentos que ajudem a esclarecer os fatos da repressão militar. O prazo para o trabalho de investigação é de dois anos. As atribuições da comissão foram intensamente criticadas pelos militares, enquanto o assunto foi discutido no Congresso Nacional. O grupo deverá ter um perfil de imparcialidade: seus membros não podem ter cargos executivos em partidos políticos ou trabalharem em cargos de comissão ou de confiança em qualquer dos três poderes. A Comissão da Verdade poderá pedir à Justiça acesso a documentos privados, investigar violações aos direitos humanos - com exceção dos crimes políticos, de motivação política e eleitorais abrangidos pela Lei da Anistia -, "promover a reconstrução da história dos casos de violação de direitos humanos" e disponibilizar meios e recursos necessários para a localização e identificação dos restos mortais de desaparecidos políticos. O grupo também terá poderes de requisitar informações públicas, não importando se protegidas por sigilo, e até convocar pessoas, incluindo os militares e ex-guerrilheiros. Prevista no projeto que veio do Senado, outra das polêmicas com as Forças Armadas é a que classifica como "dever" dos militares colaborar com a comissão.
Obs.: Tramita no Senado o PROJETO DE LEI DO SENADO, Nº 245 de 2011, da autoria do Sen. Vital do Rêgo, que busca acrescentar o art. 149-A ao Código Penal, para tipificar o crime de desaparecimento forçado de pessoa. Explicação da ementa: Altera o Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Penal) para incluir o art. 149-A que trata do crime de - Desaparecimento forçado de pessoa -, para tipificar a conduta de apreender, deter ou de qualquer outro modo privar alguém de sua liberdade, ainda que legalmente, em nome do Estado ou de grupo armado ou paramilitar, ou com a autorização, apoio ou aquiescência destes, ocultando o fato ou negando informação sobre o paradeiro da pessoa privada de liberdade ou de seu cadáver, ou deixando a referida pessoa sem amparo legal por período superior a 48 horas; dispõe que na mesma pena incorre quem ordena, encobre os atos ou mantém a pessoa desaparecida sob sua custódia; majora a pena de metade, se o desaparecimento durar mais de trinta dias ou se a vítima for criança ou adolescente, portador de necessidade especial, gestante ou tiver diminuída, por qualquer causa, sua capacidade de resistência. Data de apresentação: 11/05/2011 Situação atual: Local: 29/02/2012 - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - PRONTA PARA A PAUTA NA COMISSÃO.
QUESTÃO DE PROVA: A imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade foi objeto de questionamento na prova subjetiva do CPR 26, nos seguintes termos: GRUPO I – Questão 4: A categoria de crimes contra a humanidade tem aplicabilidade no direito brasileiro? É juridicamente sustentável, neste, a imprescritibilidade desses crimes? O Estado brasileiro é obrigado a persegui-los incondicionalmente? Considere, na resposta, a hipótese de crimes alcançados pela lei de anistia – Lei nº 6.683/1979.
Ponto 3.a. Espaços Globais Comuns. Princípios. Patrimônio Comum da Humanidade. Alto Mar. Fundos Marinhos. Antártica. Ártico. Espaço Sideral.
Principais obras consultadas: Resumo do 26º CPR; Paulo Henrique Gonçalves Portela. Direito Internacional Público e Privado. 3ª edição. Editora Jus Podivm; J. F. Rezek. Direito Internacional Público. 9ª edição. Editora Saraiva; MAZZUOLI, VALÉRIO. Curso de Direito Internacional Público. 5ª Edição, 2011.
Legislação básica: Convenção de Montego Bay de 1982 (Decreto 1.530/95) / Lei 8617/93 / Decreto 80.978/77 e Decreto 5.753/06 / Tratado da Antártida (ou Tratado Antártico) de 1959 (Decreto 75.963/75) / Convenção das Focas Antárticas (Decreto 66/91) / Convenção sobre a Conservação dos Recursos Vivos Marinhos Antárticos (Convenção de Canberra – Decreto 93.935/87) / Protocolo ao Tratado da Antártida sobre Proteção
ao Meio Ambiente (Protocolo de Madri – Decreto 2.742/98) / Tratado sobre Exploração e Uso do Espaço Cósmico (Decreto nº 64.362, de 17 de Abril de 1969) / Acordo sobre Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas e de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico, de 1968 (Decreto 71.989/73) / Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais (Decreto 71.981/73) / Convenção Relativa ao Registro de Objetos Lançados no Espaço Cósmico (Decreto 5.906/06).
1. Espaços Globais Comuns (Global Commons). Expressão norte-americana. Para a doutrina tradicional (Rezek), a expressão é sinônimo de “domínio público internacional” ou “bem público internacional”. São as áreas e recursos que não pertencem a nenhum Estado específico ou que se revestem de amplo interesse internacional, embora estejam sob a soberania de um Estado. Também conhecidos como “patrimônio comum da humanidade” (res communnis, diferente de res nullius). Ressalta-se que há determinadas áreas que pertencem ao território de um ou de mais Estados e que parecem muito importantes para boa parcela da humanidade, como a Amazônia, o Saara e a Sibéria, que não são considerados como domínio público internacional.
Áreas de domínio público internacional
Áreas de domínio público internacional que estão sob a jurisdição total ou parcial de um estado
Áreas de domínio público internacional que NÃO estão sob a jurisdição total ou parcial de um estado
Mar; Espaço aéreo; Zonas polares; Espaço extra-atmosférico.
Mar territorial (até 12 milhas); Zona contígua (de 12 a 24 milhas); Zona econômica exclusiva (12 a 200 milhas); Plataforma continental (200 milhas a partir da linha de base); Espaço aéreo subjacente às áreas sob a jurisdição do Estado (atmosfera terrestre).
Alto Mar; Zonas polares; Espaço aéreo subjacente ao alto mar e às zonas polares; Espaço extra-atmosférico; “Área” (fundos marinhos, leito e subsolo do alto mar)
2. Princípios Gerais. A impossibilidade de apropriação nacional, liberdade de acesso pesquisa e exploração e não-militarização. Assim, o principal princípio que rege é não submetê-lo a nenhuma apropriação individual. Desta feita, tem-se como conclusão inicial que eles são considerados res communis, ou seja, coisa comum que, em tese, todos podem explorar. Havendo risco para a res communis, haverá a necessidade da cooperação internacional para sua preservação, para seu melhor aproveitamento.
3. Patrimônio Comum da Humanidade. São protegidos os patrimônios cultural, natural e imaterial. Ver: Decreto 80.978/77 e Decreto 5.753/06. Tema passou a ser objeto de atenção da UNESCO que, através de seu comitê, administra a cooperação internacional sobre o tema. Essa cooperação é complementar à ação estatal que é a responsável em identificar, delimitar, proteger, conservar, valorizar e transmitir a futuras gerações tais patrimônios por meio de políticas próprias.
4. Alto Mar. É a parte do mar sobre a qual não incide o poder soberano de qualquer Estado (Montego Bay, arts. 86-115), tendo eles, no entanto, alguns deveres, tais como o de prestar assistência, impedir e punir o transporte de escravos, combater a pirataria e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes. 1) Princípios: liberdade de navegação e sobrevoo, colocação de cabos e dutos submarinos, construção de ilhas artificiais e instalações congêneres e pesquisa. Passagem inocente (arts. 17/32 da Convenção). 2) Jurisdição: a preservação da ordem se dá pelo conceito de nacionalidade do navio e consequente jurisdição do país de registro sobre a embarcação em alto mar (princípio da exclusividade de jurisdição; caso Lotus). 3) Nacionalidade das embarcações: a nacionalidade deve ser única, não pode ser de conveniência – a mas sim efetiva (ligação genuína) – e o navio deve sempre navegar com a bandeira do Estado de registro hasteada. O navio não pode mudar de bandeira durante uma viagem ou em porto de escala, a não ser no caso de transferência efetiva da propriedade ou de mudança de registro, e uma embarcação que navegue sob a bandeira de mais de um Estado não pode reivindicar qualquer dessas nacionalidades perante um terceiro Estado, podendo, ainda, ser considerada sem nacionalidade (Montego Bay, arts. 90/94). 4) Exceções à liberdade de uso: inspeção, pirataria, tráfico de escravos, tráfico de entorpecentes, transmissões não autorizadas de rádio e televisão, perseguição (direito regulado pela convenção no art. 111), poluição, colisões, reserva de peixes transzonais e direitos estabelecidos em tratados.
Curiosidade. Em 1982, quando a Convenção de Motego Bay finalmente foi aprovada, foi criado o conceito de patrimônio comum da humanidade, consistindo no direito de a humanidade explorar determinados espaços globais comuns em seu próprio benefício. Segundo ARC, nasce aí uma tentativa de criação de um sujeito de direito internacional chamado “humanidade” (todos os indivíduos do globo) que, no entanto, não deu os frutos que se imaginava, uma vez que foi considerado como patrimônio comum da humanidade apenas os fundos marinhos. Assim, a Convenção de Montego Bay não considerou o alto mar, por exemplo, como patrimônio comum da humanidade. A res communis rege o alto mar. Apesar disso, ACR diz que não existe mais aquela res communis do tempo do Grócio (espaço terrestre serviria de apropriação, salvo raríssima exceção, como a antártica, mas o espaço marítimo não), já que naquela época não havia tecnologia suficiente para servir de suporte à apropriação do espaço marítimo. Hoje a história é outra. Tanto é assim que a própria Convenção de Montego Bay fala de deveres de preservação. Casos: a Austrália processa diuturnamente o Japão no Tribunal Internacional do Mar, por entender que eles estão extinguindo o atum (pesca predatória – o pais fica até anos pescando, armazenando o produto em suas embarcações – frigorífico em alto mar).
5. Fundos Marinhos. 1) Denominação: também conhecida como “área”, na forma da Conv. Montego Bay (arts. 133/155). Os fundos marinhos são definidos por exclusão: não abarca a Zona Econômica Exclusiva nem a Plataforma Continental, absorvendo as áreas subaquáticas, o leito marinho e o subsolo. São patrimônio comum da humanidade. 2) Princípios: a área e seus recursos são insuscetíveis de apropriação, mas os minerais eventualmente extraídos são alienáveis; a exploração deve necessariamente reverter em prol da humanidade em geral (benefícios distribuídos equitativamente, independentemente de sua localização geográfica) pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos. Há um órgão de solução de controvérsia chamado de “Câmara de Controvérsias dos Fundos Marinhos do Tribunal Internacional do Direito do Mar”. 3) Regime de Estados em reciprocidade (estágio inicial): os Estados começaram a promulgar leis internas para estabelecer uma estrutura provisória de pesquisa e exploração da área, normalmente com uma política fundada em reciprocidade, i.e., reconhecimento mútuo de licenças de exploração e de regimes tributários. 4) Acordo de 1994 sobre a Implementação dos Dispositivos da Convenção de 1982 sobre o Direito do Mar Referente ao Leito Oceânico (estágio atual): iniciativa da ONU para evitar conflito de regimes estabelecidos autonomamente pelos Estados.
O autor Valério Mazuoli (MAZUOLI, 2011, páginas 780-781), diz o seguinte sobre os fundos marinhos: “A Convenção de Montego Bay chama de área (ou Zona) o leito do mar na região dos fundos marinhos. Sobre essa área - que se encontra fora dos limites da jurisdição do Estado - repousam as águas do fundo do mar e o espaço aéreo respectivo. Trata-se de um espaço (terrestre) considerado internacional, que não se sujeita à soberania territorial de qualquer Estado. A chamada Area é, enfim, o espaço terrestre que integra, grosso modo, o solo e o subsolo subjacentes ao alto-mar e que são o prolongamento da plataforma continental.
São inúmeros os recursos existentes nos fundos marinhos, principalmente os minerais. Para os efeitos da Convenção, a expressão "recursos" significa todos os recursos minerais sólidos, líquidos

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