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Profª Drª Simone F. Souza Aula 12 Indutância e circuito RL Introdução Como vimos em aulas anteriores, um capacitor pode ser usado para produzir um campo elétrico com as propriedades desejadas. Analogamente, um indutor pode ser usado para produzir um campo magnético com as propriedades desejadas. O tipo mais simples de indutor é o solenóide (constituído por um enrolamento helicoidal de fio sobre um núcleo). Indutância mútua Na aula 10 (slide 29) consideramos a interação magnética entre dois fios que conduziam corrente estacionárias (não variavam no tempo); a corrente de um dos fios produzia um campo magnético que exercia uma força sobre a corrente do outro fio. Quando existe uma corrente variável em um dos circuitos, ocorre uma interação adicional entre eles. Considere duas bobinas vizinhas como ilustrado na figura ao lado. Uma corrente circulando na bobina 1 produz um campo magnético 𝐵 e, portanto, um fluxo magnético através da bobina 2. Quando a corrente na bonina 1 varia, o fluxo magnético através da bobina 2 também varia; de acordo com a lei de Faraday, isso produz uma fem na bobina 2. Sendo assim, a variação da corrente em um dos circuitos produz uma corrente induzida no outro circuito. Na figura ao lado, a corrente 𝑖1 na bobina 1 induz um campo magnético e algumas linhas de campo passam pela bobina 2. O campo magnético é proporcional a 𝑖1, de modo que Φ𝐵2 também é proporcional a 𝑖1. Quando 𝑖1 varia, Φ𝐵2 varia; esse fluxo magnético variável induz uma fem na bobina 2, dada por: Designamos por Φ𝐵2 o fluxo magnético através de cada espira da bobina 2 produzido pela corrente 𝑖1 na bobina 1. (1) Visto que Φ𝐵2 é proporcional a 𝑖1, poderíamos representar essa proporcionalidade na forma: Contudo, é mais conveniente incluir o número de espiras 𝑁2 na relação. Na equação acima, Φ𝐵2 é o fluxo magnético através de uma única espira da bobina 2. Introduzimos uma constante de proporcionalidade 𝐌𝟐𝟏 chamada indutância mútua das duas bobinas: Portanto, podemos escrever (derivando os dois membros da eq.): (2) Dessa forma, podemos reescrever a eq. (1): A indutância mútua definida pela eq. (2) pode ser escrita na forma: Ou seja, a variação da corrente 𝑖1 na bobina 1 induz uma fem na bobina 2 diretamente proporcional à taxa de variação da corrente 𝒊𝟏 . Quando as bobinas estão no vácuo, o fluxo magnético Φ𝐵2 é proporcional a 𝑖1, então a indutância mútua é uma constante que depende apenas da geometria das duas bobinas. Podemos repetir o raciocínio anterior para o caso oposto, no qual uma corrente variável 𝒊𝟐 na bobina 2 produza um fluxo magnético variável Φ𝐵1 e induza uma fem na bobina 1. Poderíamos pensar que a constante correspondente, 𝑴𝟏𝟐 fosse diferente de 𝑴𝟐𝟏 porque, em geral as duas bobinas não são idênticas. Contudo, verificamos que 𝑴𝟏𝟐 é sempre igual a 𝑴𝟐𝟏 . Chamaremos esse valor comum simplesmente de indutância mútua, designada pelo símbolo M. Os sinais negativos decorrem da lei de Lenz. A primeira equação afirma que a variação da corrente na bobina 1 produz uma variação do fluxo magnético na bobina 2, induzindo uma fem na bobina 2 que se opõe à variação desse fluxo magnético. Na segunda equação, os papéis desempenhados pelas bobinas são invertidos. A unidade SI de indutância mútua denomina-se henry (1 H) em homenagem ao físico norte-americano Joseph Henry (1797-1878), um dos descobridores da indução eletromagnética. Exemplo 1: Cálculo da indutância mútua Exemplo 2: fem induzida por indutância mútua Usando os dados do exemplo anterior: Indutores e auto-indutância Em nossa discussão sobre indutância mútua, consideramos dois circuitos separados e independentes; uma corrente variável em um dos circuitos cria um fluxo magnético varável sobre o outro circuito, induzindo uma fem neste. Um efeito relacionado ao citado acima ocorre até mesmo quando consideramos um único circuito isolado! Quando existe uma corrente em um circuito, ela produz um campo magnético que gera um fluxo magnético através do próprio circuito; quando a corrente varia, esse fluxo também varia. Portanto, qualquer circuito percorrido por uma corrente variável possui uma fem induzida nele mesmo pela variação do seu próprio fluxo magnético. Tal fem denomina-se fem auto-induzida. De acordo com a lei de Lenz, uma fem auto-induzida sempre se opõe à variação da corrente que produz a fem e, portanto, tende a tornar mais difícil qualquer variação da corrente. Seja a bobina com N espiras como na figura ao lado. Em virtude da corrente i variável, existe um fluxo magnético médio através de cada espira da bobina. Por analogia com a eq. (2), definimos a auto- indutância L do circuito do seguinte modo: Quando a corrente i no circuito varia, Φ𝐵 também varia; reagrupando a última equação e tomando a derivada em relação ao tempo, as taxas de variação são relacionadas por: De acordo com a lei de Faraday para uma bobina com N espiras, a fem auto-induzida é dada por: Portanto, concluímos que: O sinal negativo decorre da lei de Lenz; ele mostra que a fem auto-induzida em um circuito se opõe a qualquer variação de corrente que ocorra no circuito. Indutância de um solenóide longo Considere um solenóide longo de seção reta A. Qual a indutância apor unidade de comprimento perto do centro do solenóide? Para aplicar a definição de indutância precisamos conhecer o fluxo magnético que passa por cada uma das espiras do solenóide. Considere um segmento de comprimento l perto do centro do solenóide. O fluxo magnético para esse segmento será dado por: O módulo do campo magnético no interior de um solenóide é dado por (aula 10, slide 63): Sendo: Dessa forma, teremos: Assim, a indutância por unidade de comprimento perto do centro de um solenóide longo é dada por: Note que, como a capacitância, a indutância depende apenas da geometria do dispositivo. Circuito RL Como vimos na aula 8 (slide 43) quando introduzimos uma força eletromotriz em um circuito RC com um capacitor inicialmente descarregado, a carga do capacitor não aumenta instantaneamente para o valor final 𝐶𝜀 mas tende exponencialmente para esse valor: A taxa de aumento da carga do capacitor é determinada pela constante de tempo capacitiva, definida através da equação: Quando removemos a força eletromotriz do mesmo circuito a carga do capacitor não diminui instantaneamente para zero, mas tende exponencialmente para esse valor: A corrente apresenta um comportamento análogo quanto introduzimos ou removemos uma força eletromotriz em um circuito que contem um resistor R e um indutor L. Quando a chave S a figura ao lado é colocada na posição a, por exemplo, a corrente no resistor começa a aumentar. Se o indutor não estivesse presente a corrente atingiria quase instantaneamente o valor final De acordo com a lei de Lenz, a fem auto-induzida se opõe ao aumento da corrente, o que significa que tem a polaridade oposta à da fem da fonte. A presença do indutor, faz com que uma força eletromotriz auto-induzida apareça no circuito. Dessa forma, a corrente no resistor corresponde à diferença entre duas forças eletromotrizes, uma fem constante produzida pela fonte e uma fem variável (-Ldi/dt) produzida pela auto-indução. Esses resultados podem ser generalizadosda seguinte forma: Enquanto fem induzida está presente, a corrente é menor que Com o passar do tempo a taxa de aumento da corrente diminui e o valor absoluto da fem auto-induzida, que é proporcional a di/dt, também diminui. Assim, a corrente tende assintoticamente para Vamos agora analisar quantitativamente a situação com a chave S na posição a (como mostrado na figura). Indutor: como a corrente i está variando existe uma fem auto-induzida no indutor. Como vimos, o valor absoluto da fem é Ldi/dt. O sentido é para cima (lei de Lenz), porque o sentido da corrente i é para baixo no indutor e a corrente está aumentando. Assim, quando passamos do ponto y para o ponto z, atravessamos o indutor no sentido contrário ao da fem auto-induzida, o potencial varia –Ldi/dt. Resistor: como atravessamos o resistor no sentido da corrente i o potencial elétrico diminui de iR. Assim, quando passamos do ponto x para o ponto y o potencial varia – iR. Vamos aplicar a regra das malhas, começando no ponto x da figura e nos deslocando no sentido horário, o mesmo da corrente i. x y z Fonte: quando passamos do ponto z para o ponto x, voltando ao ponto inicial, o potencial varia de + devido à fem da fonte. Essa é uma equação diferencial que envolve a variável i e sua derivada primeira. A solução deve ser uma função i(t) tal que i(0)=0. De acordo com a regra das malhas temos: x y z A equação acima (e sua condição inicial) têm a mesmo forma que a equação de um circuito RC. Resolvendo a equação diferencial: Façamos: Neste caso, teremos: Relacionando as derivadas de i e y, encontramos: Logo, podemos escrever Aplicando a operação de integral, teremos: Verificando os limites de integração (de acordo com a condição inicial): Podemos escrever: Resolvendo a integral: Aplicando as propriedades dos logaritmos: Lembrando que: Aplicando a operação de exponencial em ambos os lados da equação anterior: Podemos escrever: Reagrupando os termos: Podemos reescrever a equação anterior da seguinte forma: Sendo 𝜏𝐿 a constante de tempo indutiva, dada por: Vamos examinar a eq. (3) acima em duas situações particulares: A análise de unidades mostra que 𝜏𝐿 tem dimensão de tempo. (3) (1) No instante em que a chave S é fechada (ou seja, t = 0); (2) Um longo tempo depois da chave S ter sido fechada (ou seja, 𝑡 → ∞. Fazendo t = 0 na eq.(3), a exponencial se torna Logo, a corrente é zero no instante inicial: Fazendo 𝑡 → ∞ a exponencial se torna É possível examinar as diferenças de potencial no circuito. Lembrando que 𝑉𝑅 = 𝑅𝑖 e 𝑉𝐿 = 𝐿𝑑𝑖/𝑑𝑡 podemos construir os gráficos para valores particulares de fem da fonte, L e R, tal como mostrado nas figuras do próximo slide. Logo, para longos tempos, a corrente tende para o valor final: Para compreender o significado físico da constante de tempo indutiva podemos usar a eq. (3) fazendo t = 𝜏𝐿 = L/R. Neste caso, teremos: Assim, a constante de tempo indutiva é o tempo necessário para que a corrente no circuito atinja 63% do valor final. Se a chave S da figura é mantida na posição a por tempo suficiente para que a corrente atinja o valor final E/R e depois é colocada para a posição b, o efeito é remover a fonte do circuito. Na ausência da fonte a corrente no resistor cai para zero mas não de forma instantânea. A equação diferencial que governa o decréscimo da corrente pode ser obtida fazendo-se: A solução dessa equação diferencial que satisfaz a condição inicial: é dada por: Assim, tanto o aumento da corrente quanto a diminuição da corrente em um circuito RL são governados pela mesma constante de tempo 𝜏𝐿 Exemplo 3: circuito RL durante uma transição Energia armazenada em um campo magnético Quando afastamos duas partículas carregadas uma da outra podemos dizer que o aumento da energia potencial elétrica associado a este afastamento fica armazenado no campo elétrico que existe nas vizinhanças das partículas. Podemos recuperar essa energia permitindo que as partículas se aproximem novamente. Da mesma forma, podemos dizer que existe uma energia armazenada no campo magnético criado por uma corrente. Para obter uma expressão matemática para a energia armazenada no campo magnético considere novamente o circuito ao lado, que mostra uma fonte de fem ligada a um resistor e a um indutor. De acordo com a regra das malhas, vimos que a equação diferencial que descreve o aumento da corrente no circuito é dada por: Como vimos na aula 8, a aplicação da regra das malhas nada mais é do que a aplicação da lei da conservação da energia em circuitos com uma única malha. Multiplicando por i ambos os membros da eq. Acima, obtemos: que tem a seguinte interpretação em termos do trabalho e energia: Assim, o lado esquerdo da eq. (4) representa a taxa com a qual a fonte fornece energia ao resto do circuito. (1) Se uma quantidade elementar de carga dq passa pela fonte de fem da figura em um intervalo de tempo dt, a fonte realiza um trabalho: (4) (2) O termo 𝑖2𝑅 na eq. (4) representa a taxa com a qual a energia é dissipada como energia térmica no resistor (lembre-se do cálculo da potência!). (3) De acordo com a lei da conservação da energia, a energia que é fornecida ao circuito e não é dissipada no resistor deve ser armazenada no campo magnético do indutor. Como a eq. (4) representa a lei da conservação da energia para circuitos RL, o termo Lidi/dt deve representar a taxa com a qual a energia potencial magnética é armazenada no campo magnético : (4) Que pode ser reescrita na forma: Integrando ambos os membros, obtemos: Que nos fornece: Note a semelhança entre essa expressão e a expressão para a energia armazenada por um capacitor de capacitância C e carga q: A variável i² corresponde a q² e a constante L corresponde a 1/C. A energia armazenada no campo magnético da bobina em qualquer instante é função da corrente que atravessa a bonina nesse instante. Exemplo 4: energia armazenada em um campo magnético (a) (b) Densidade de energia de um campo magnético Considere um segmento de comprimento l perto do centro de um solenóide longo de seção reta A percorrido por uma corrente; o volume do segmento é Al. A energia 𝑈𝐵 armazenada nesse trecho do solenóide deve estar toda no interior do solenóide, já que o campo magnético do lado de fora de um solenóide longo é praticamente zero. Além disso, a energia armazenada deve estar uniformemente distribuída, pois o campo magnético é (aproximadamente) uniforme no interior do solenóide. Assim, a energia armazenada no campo por unidade de volume é: onde L é a indutância do segmento do solenóide de comprimento l. E como Temos: Substituindo L/l por seu valor (encontrado no slide 20) : Teremos: onde n é o número de espiras por unidade de comprimento. Lembrando que para um solenóide longo: Podemos escrever a densidade de energia na forma: Essa equação fornece a densidade de energia armazenada em um ponto do espaço onde o módulo do campo magnético é B. Embora tenha sido demostrada apenas para o caso especial de um solenóide, a eq. acima é valida para qualquer campo magnético, independente da forma como é produzido. Essa equação é análoga àquela que fornece a densidade de energia armazenada em um ponto do espaçoonde existe um campo elétrico E (aula 6 – slide 38): Exemplo 5: cálculo da energia armazenada em um campo magnético Um cabo coaxial longo é formado por dois cilindros concêntricos de paredes finas e raios a e b. O cilindro interno conduz uma corrente constante i, e o cilindro externo constitui o caminho de retorno da mesma corrente . A corrente cria um campo magnético entre os dois cilindros. (a) Calcule a energia armazenada no campo magnético em um segmento l do cabo. (b) Qual a energia armazenada por unidade de comprimento do cabo se a = 1,2 mm, b = 3,5 mm e i =2,7 A? a b 1) Podemos calcular a energia total 𝑈𝐵 armazenada no campo magnético a partir da densidade de energia 𝑢𝐵 do campo. 2) A relação entre a densidade de energia e o módulo B do campo é dada pela equação: 3) Devido à simetria circular do cabo, podemos determinar o valor de B usando a lei de Ampère e a corrente conhecida i. Cálculo de B: Começaremos pela lei de Ampère, usando uma amperiana circular de raio r tal que A única corrente envolvida por essa amperiana é a corrente i do cilindro interno. Assim, a lei de Ampère assume a forma: Vamos simplificar a integral. Graças à simetria circular, sabemos que em todos os pontos da amperiana o campo B é tangente à curva e tem o mesmo módulo B. Vamos tomar o sentido de integração como sendo o sentido do campo magnético. Neste caso: a b Dessa forma, teremos Cálculo de 𝒖𝑩 : Para obter a densidade de energia, substituímos o resultado acima na eq. encontrada no slide 47: Cálculo de 𝑼𝑩: Observe que 𝒖𝑩 não é uniforme na região entre os dois cilindros, mas varia com a distância radial r. Assim, para calcular a energia total 𝑼𝑩 armazenada entre os dois cilindros devemos integrar 𝒖𝑩 nesse volume. a b Como o volume entre os dois cilindros possui simetria circular em relação ao eixo central do cabo, consideramos o elemento de volume dV de uma casca cilíndrica situada entre os dois cilindros. A casca tem um raio interno r, raio externo r + dr e comprimento l. A área da seção reta da casca será dada por: Assim, o volume dV da casca será: Assim, a energia total contida em uma casca de volume dV será dada por: dr a b dr r dr a b dr r Ou ainda: Substituindo as equações encontradas anteriormente: Para determinar a energia total contida entre os dois cilindros, integramos a eq acima para o voluma entre os cilindros: dr a b dr r (b) Qual a energia armazenada por unidade de comprimento do cabo se a = 1,2 mm, b = 3,5 mm e i =2,7 A? De acordo com a eq no último slide: Logo: