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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E COMUNICAÇÃO – ICSC CURSO: LETRAS LINGUÍSTICA: a ciência da língua e da linguagem Apostila para acompanhamento da aulas de Linguística Geral Conteúdo – NP1 Curso de Letras – 2º semestre de 2017 Docente: Profa. Dra. Denise Durante Santos 2017 2 DISCIPLINA: Linguística Geral DOCENTE: Profa. Dra. Denise Durante I – EMENTA: Conhecimentos fundamentais da Linguística concebida como ciência descritiva e explicativa da linguagem verbal humana, em contraposição à gramática normativa; conceitos básicos das perspectivas estruturalista e gerativista; contraposição das perspectivas teóricas e outras perspectivas da linguística para o ensino de língua materna e de língua estrangeira. Conhecimentos básicos de análise dos mecanismos formais da língua, através dos níveis de análise linguística. II – OBJETIVOS GERAIS: Demonstrar a relevância do conhecimento linguístico para a formação do profissional de ensino, em especial do ensino de línguas. Dar uma visão panorâmica da Linguística, como recurso essencial para o conhecimento e a significância de mundo. III – OBJETIVOS ESPECÍFICOS: Levar o aluno a familiarizar-se com as principais teorias linguísticas. Demonstrar ao aluno o caráter interdisciplinar da Linguística. Veicular o conteúdo de modo a provocar uma postura crítico-reflexiva. Desenvolver o raciocínio abstrato. Apresentar a Linguística como um instrumento de prática docente. Aplicar os conhecimentos teóricos ao ensino de línguas. IV – CONTEÚDO PROGRAMÁTICO NP1 - 1. A Linguística - concepção e origem: 1.2. Revisão histórica: 1.2.1. A gramática tradicional: 1.2.1.1. O ponto de vista da gramática normativa: análise prescritiva 1.2.2. A linguística: 1.2.2.1. A visão científica dos estudos linguísticos: ciência social, empírica, descritiva e explicativa. 1.2.3. Contraposição entre a visão tradicional e a visão linguística no ensino de língua materna e língua estrangeira. 1.2.3.1. Contraposição entre a visão tradicional e a visão linguística no processo de identificação e análise das variedades linguísticas situacionais, regionais, socioculturais. 1.2.3.2. Identificação das variedades linguísticas - fonológicas, lexicais, sintáticas - na língua portuguesa, fazendo uso da intuição linguística, enquanto falante nativo, no processo de análise da língua. 1.2.3.3. A perspectiva normativa e o denominado preconceito linguístico. 1.2.3.4. O foco na forma (gramática tradicional) e não no conteúdo (tomando por base a visão contida nos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs) 1.2.3.5. os conceitos de aquisição e aprendizagem de línguas: a noção de erro em uma perspectiva linguística (estratégia de conhecimento) e da gramática normativa (enquanto evidência de falta de conhecimento). NP1- 2. O estruturalismo - conceitos básicos: 2.2. Prioridades dos estudos linguísticos na visão estruturalista: 2.2.1. Língua / fala; língua oral / língua escrita; análise descritiva / prescritiva; estudos sincrônicos /diacrônicos. 2.2.2. Os conceitos dicotômicos: 2.3. Língua/ fala e linguagem; 2.4. O signo linguístico: 2.4.1. Significado e significante. 2.4.2. Características do signo linguístico: linearidade e arbitrariedade. 2.5. O estruturalismo e o método de análise descritivo. 2.6. Os limites da análise estruturalista: a frase (a exclusão da fala [sujeito] e do contexto sócio-histórico) 2.7. O estruturalismo americano e a psicologia behaviorista na explicação sobre a aquisição de linguagem: 2.7.1. A língua enquanto sistema virtual de signos, fora do sujeito. 2.7.2. A linguagem interpretada como um comportamento aprendido por estímulo e resposta, a partir da ação do meio sobre um sujeito passivo. 2.8. Implicações para o ensino de língua materna e língua estrangeira. NP2 - 3. O gerativismo: visão inatista de aquisição de linguagem: 3.2. Contra-argumentos do gerativismo (Chomsky) à visão behaviorista de aprendizagem da linguagem: 3.2.1. Capacidade inata: o meio ambiente fornece modelos linguísticos para um sujeito competente; 3.2.2. Capacidade universal e específica da espécie; 3.2.3. Complexidade x tempo de aquisição; 3.2.4. Criatividade linguística. 3.2.5. Os conceitos de aquisição x aprendizagem de linguagem. 3.3. Conceitos básicos do gerativismo: 3.3.1. Competência; 3.3.2. Desempenho (performance); 3.3.3. Produtividade dos sistemas linguísticos x criatividade linguística dos sujeitos falantes; 3.3.4. A intuição linguística; 3.3.5. Gramaticalidade e aceitabilidade; 3.3.6. Princípios e parâmetros. 3.4. O modelo de análise gerativista: explicativo (dar conta da competência).3.5. Os limites de análise do gerativismo: estudo 3 da competência (exclui do escopo de análise o falante – limites da performance, e o contexto sociocultural). 4. Considerações sobre aquisição de linguagem. Os conceitos de aquisição e aprendizagem de línguas. 5. A dupla articulação da linguagem: unidades significativas / unidades não significativas. 6. A linguagem humana e a linguagem dos animais. 7. Prática de Ensino como Componente Curricular: O ensino/aprendizagem de língua materna: apresentação das diversas modalidades e variantes linguísticas da Língua Portuguesa. Explanação sobre a importância da norma culta e as diversas atividades em que seu uso é exigido. V – AVALIAÇÃO (datas prováveis) – NP1 – Prova: 02.10 a 11.10; NP2 - Prova: 13 a 23.11 (datas prováveis); Prova substitutiva: 24.11 a 01.12; Exame: 05 a 13.12 VI – BIBLIOGRAFIA BÁSICA BAGNO, M. A norma oculta. Língua e poder na sociedade. SP: Parábola, 2007. FIORIN, J. L. (Org.) Introdução à linguística. São Paulo: Contexto, 2006/2007. 226p. Vol. I e Vol II. MUSSALIN, F.; BENTES, A. C.(Orgs.) Introdução à linguística. São Paulo: Cortez, 2008. Vol I e Vol. II. BIBLIOGRAFIA DIGITAL LOPES, Edward. Fundamentos da Linguística Contemporânea. São Paulo: Cultrix, 1999. <http://books.google.com.br/books> SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2006. <http://books.google.com.br/books> BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR CARBONI, F. Introdução à linguística. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. CORREA, Djane Antonucci. (org.) A relevância social da linguística: linguagem, teoria e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2007. (Coleção Na Ponta da Língua, 18). HANKS, William F. Língua como prática social. Org. BENTES, Anna Cristina; REZENDE, Renato C.; MACHADO, Marco Antônio R. São Paulo: Cortez, 2008. LOPES, Edward. Fundamentos da Linguística Contemporânea. São Paulo: Cultrix, 1999. XAVIER, A. C.; CORTEZ, S. (Org.) Conversas com linguistas: virtudes e controvérsias da Linguística. São Paulo: Parábola, 2007. Sugestão de filme: LÍNGUA: Vidas em Português. Direção: Victor Lopes. Produção Renato Pereira (TV Zero), Suely Weller (Sambascope) e Paulo Trancoso (Costa do Castelo). 2004. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JBmLzbjmhhg 4 Origem e concepção da Linguística OBJETO DE ESTUDO DA LINGUÍSTICA A LINGUÍSTICA ou LINGUÍSTICA MODERNA SE CONSTITUI COMO O ESTUDO CIENTÍFICO DA LINGUAGEM VERBAL HUMANA. Por meio dessa ciência estudamos as línguas particulares e a natureza geral destas mesmas línguas particulares. Essa ciência surge no início do século XX, com a publicação do Curso de Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure (1857 - 1913), linguista suíço. A referida obra é fruto de anotações dos alunos de Saussure, conforme explicam Charles Bally e Albert Sechehaye no prefácio da 1ª edição da obra, de junho de 1915. A linguísticadedica-se ao estudo da linguagem em geral e das diferentes línguas. Descrição científica, segundo Lyons: “[...] descrição feita sistematicamente com apoio em observações objetivamente certificáveis e dentro da estrutura de alguma teoria geral, adequada aos dados em jogo”. (As ideias de Chomsky, p. 18) • CIENTÍFICO: SISTEMÁTICO, OBJETIVO, EMPÍRICO; • NÃO CIENTÍFICO: NÃO-SISTEMÁTICO, SUBJETIVO, ESPECULATIVO (SENSO COMUM) Características fundamentais que atribuem cientificidade aos estudos da Linguística: 1. exigência de comprovação empírica. 2. caráter não-preconceituoso. 3. caráter explicativo e explícito. • A Linguística tenta responder a dois tipos de perguntas: (a) O que as diferentes línguas têm em comum e o que as diferencia entre si? 5 (b) O que há nas línguas humanas que lhes atribui caráter único e as distingue dos demais sistemas de comunicação? • Linguística teórica e aplicada: A Linguística teórica estuda: 1. GRAMÁTICA: a estrutura da língua 2. SEMÂNTICA: significado das palavras e das sentenças 3. MORFOLOGIA: a formação das palavras 4. SINTAXE: as regras de combinação das palavras em sentenças 5. FONÉTICA: os sons produzidos pelos falantes de uma língua. 6. FONOLOGIA: o sistema abstrato de sons de uma língua. A Linguística Aplicada refere-se ao estudo dos resultados práticos das teorias linguísticas. Entre as áreas de abrangência estão: linguística aplicada ao ensino de língua materna e de línguas estrangeiras, tradução e interpretação, planejamento linguístico-social, dramaturgia, fonoaudiologia, linguística forense, entre outras. Existe também a Linguística Comparativa ou Histórica, que se dedica ao estudo das línguas pelo método de comparação. A Linguística Histórica investiga as propriedades universais das línguas e suas origens. A GRAMÁTICA TRADICIONAL = NÃO CIENTÍFICA, PONTO DE VISTA- PRESCRITIVA A palavra “gramática” provém do termo grego gramma (proveniente de grapho = risco) que significa letra. O vocábulo grammatica, em latim, origina-se de grammatiké, feminino substantivado de grammatikós, ou seja, a ciência ou arte de ler e escrever. 6 Panini (gramático hindu, nascido por volta de 500 a.C.) é autor da gramática mais antiga do sânscrito1, intitulada Doutrina das palavras (Sabdanusasana ou Astadhyayi). Essa primeira descrição linguística surgiu quando a língua sânscrita culta (blasha) precisava ser estabilizada para defender-se da “invasão” dos falares populares (prácritos), portanto, num momento em que uma determinada variedade linguística deveria ser valorizada e difundida. ANÁLISE PRESCRITIVA X ANÁLISE DESCRITIVA, CIENTÍFICA E EXPLICATIVA • O QUE SE ENTENDE POR “GRAMÁTICA” NO USO COMUM? Gramática normativa: “conjunto de prescrições e regras que determinam o uso considerado correto da língua escrita e falada”; tratado descritivo-normativo da morfologia e da sintaxe de uma língua (ficando de fora, portanto, a fonética e a semântica). (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa) A gramática normativa corresponde ao estudo do uso considerado correto da língua. Ela nos apresenta uma ANÁLISE PRESCRITIVA da língua. A gramática normativa tem o mérito de estabelecer padrões que são compartilhados pelos falantes. Pode auxiliar no ensino de línguas estrangeiras, bem como na unificação linguística. Visão crítica da gramática normativa: A gramática prescritiva ou gramática normativa explicita as regras determinadas para uma língua qualquer. Contudo, é basicamente impossível encontrar um falante que faça uso de todas as regras gramaticais prescritas, sem violações. (Silva, T. C. Fonética e Fonologia do Português, São Paulo: Contexto, 2008, p. 15). 1 Trata-se de língua indo-européia do ramo indo-irânico, sub-ramo indo-árico, grupo sânscrito, que se supõe ter sido falada no Norte da Índia até meados do primeiro milênio a.C., e que foi descrita pelo gramático hindu Panini no século IV a.C. [É a língua indo-européia de registro escrito mais antigo; a sua descoberta, no século XVIII, deu nascimento à lingüística histórico-comparativa e à indo-europeística, quando se perceberam as suas semelhanças com o grego antigo, o latim, o persa antigo e o gótico; é uma das línguas sagradas do bramanismo (ao lado do védico) e língua literária e, como tal, permaneceu durante muito tempo, mesmo quando já não era mais falada; é até hoje a língua do culto brâmane.] 7 Científico versus prescritivo: Mostra-nos a história que até há pouco a maioria dos autores que se ocuparam da linguagem ou das línguas o fez com intenções prescritivas, declaradas ou evidentes. Ainda hoje, a maioria das próprias pessoas cultas quase ignora que existe uma ciência da linguagem distinta da gramática escolar e da atividade normativa exercida, por exemplo na imprensa, por cronistas mundanos e puristas. Mas perante casos como os de vende-se livros, haviam muitas lutas, a pessoa que eu lhe disse o nome, etc., o linguista contemporâneo ignora tanto a indignação do purista conservador como o júbilo do iconoclasta revolucionário. Casos como esses representam para ele simples factos a observar e explicar dentro dos usos em que aparecem. O seu papel não o inibe de apontar as censuras ou apreciações trocistas a que tais ´barbarismos´ou ´solecismos´se prestam na boca de uns, nem a indiferença em que deixam outros; mas ele abstém-se de tomar partido a favor ou contra, porque não é esse o seu papel. (Martinet, André. Elementos de Linguística Geral. Lisboa: Sá da Costa, 1967, p.3) Os estudos da língua, no âmbito da gramática tradicional, que remonta à Antiguidade Clássica (greco-romana), tinham CARÁTER ESPECULATIVO, ou seja, não se pautavam pela exigência de comprovação científica. Não havia investigação prática, somente teórica. A gramática na Antiguidade era parte da filosofia geral, cujo objetivo era explicar o universo como um todo. A partir do ESTRUTURALISMO, cujo marco é a publicação póstuma do Cours de Linguistique Générale, de Ferdinand de Saussure, em 1916, a Linguística adquiriu caráter científico. • Características que atribuem cientificidade ao estudo linguístico: 1. Exigência de comprovação empírica (as hipóteses teóricas devem ser comprovadas pelos dados); 2. Caráter não preconceituoso; 3. Caráter explicativo e explícito – a análise linguística requer que se observe, descreva e, idealmente, explique os fenômenos atestados. Atenção! 8 A LINGUÍSTICA, POR SEU CARÁTER CIENTÍFICO, SE ABSTÉM DE QUAISQUER JUÍZOS DE VALOR. Científico se opõe a prescritivo. Linguística sincrônica: investiga as propriedades linguísticas de uma língua em um dado ponto no tempo. Linguística diacrônica: analisa a linguagem e suas mutações através do tempo. Delimitação do objeto de estudo Ferdinand de Saussure, Cours de Linguistique Générale, publicado em 1916. Propõe a dicotomia = LÍNGUA x FALA 9 Língua = sistema linguístico compartilhado por todos os falantes da língua. O sistema a ser definido e descrito pelo linguista. Fala = expressa as idiossincrasias particulares da língua utilizada por cada falante. Noam Chomsky, Gramática Gerativa ou Transformacional – Syntactic Structures, 1965 Competência: conhecimento subjacente e internalizado que o falante tem de sua língua; Desempenho: uso que o falante faz de sua língua. Os falantes têm um conhecimento ilimitado de sua língua ao criarem e reconhecerem enunciados completamente novos e ao serem capazes de identificar erros de desempenho. A análise linguística devedescrever as regras que governam a estrutura da competência. QUESTÕES FUNDAMENTAIS • Não há línguas primitivas ou mais evoluídas: toda língua permite a expressão de qualquer conceito. Caso seja necessário, amplia-se o léxico da língua, incorpora-se vocabulário novo. • A língua escrita, diferentemente do que postula a visão prescritiva da gramática tradicional, não é superior nem mais correta do que a língua falada. • Todas as línguas mudam: as alterações que se observam nas línguas NÃO são resultado de um processo de deterioração das línguas, mas, sim, um aspecto a elas inerente. 10 “Todas as línguas até hoje estudadas constituem um sistema de comunicação estruturado, complexo e altamente desenvolvido. Nenhum traço da estrutura linguística pode ser atribuído a um reflexo da estrutura diferenciada de uma sociedade agrícola ou de uma sociedade moderna industrializada.” (Petter, Margarida. “Linguagem, língua, linguística”. In: FIORIN, J. L. Introdução à linguística I, São Paulo: Contexto, 2008, p. 20) A abordagem prescritiva é, ainda hoje, intensamente utilizada no ensino de línguas, sobretudo no ensino da língua materna. Essa abordagem conduz ao chamado “preconceito lingüístico”. Este conduz a um conhecimento limitado e empobrecido sobre a complexidade dos fenômenos linguísticos. QUESTÕES PARA REFLEXÃO 1. Qual é o objeto de estudo da Linguística? 2. A língua escrita é superior à língua falada? 3. A gramática normativa reconhece a diferença entre língua falada e língua escrita? 4. Por que o estudo da gramática normativa é importante? 5. Existem variedades de língua melhores? 6. Quais são algumas das diferenças entre a gramática normativa e a gramática descritiva? 11 Revisão histórica dos estudos sobre a linguagem Antes do surgimento da Linguística Moderna, no início do século XX, os estudos da língua passaram por outras fases sucessivas e distintas: • análise gramatical de tradição hindu, mais especificamente, com Pãnini, no século IV a.C.. • a Gramática: visava unicamente formular regras para definir o que é certo e o que é errado; • a Filologia: sua preocupação principal era comparar textos escritos de épocas diferentes para determinar as peculiaridades de cada autor, antecedendo a Linguística Histórica; • a Gramática Comparada: ao justapor línguas diferentes, como o sânscrito, o grego e o latim, concluiu que todas pertenciam à mesma família, a família indo-europeia, sendo possível, por exemplo, explicar as formas de uma língua pelas formas de outra. A Gramática Comparada foi desenvolvida por Franz Bopp. John Lyons, em sua obra Introdução à lingüística teórica. (São Paulo: EDUSP, 1979), aborda o desenvolvimento dos estudos sobre a linguagem. A Lingüística, considerada como os estudos da linguagem dos tempos antigos, é designada pelo autor “gramática tradicional”, isto é, a gramática que resulta de especulações dos filósofos gregos do século V a.C., os quais entendiam o estudo sobre a linguagem como parte da busca pelo entendimento geral sobre o homem e o mundo. Muitos dos debates ou conceitos da Lingüística moderna, bem como muitos termos ligados ao estudo da linguagem ou das línguas como são analisadas hoje, e que serão vistos ou usados aqui, encontram suas bases nessas discussões filosóficas; exemplos dessas indagações são: • Há alguma relação natural entre o significado de uma palavra e a forma dessa mesma palavra? 12 • Qual é a origem da língua/ das línguas? • Existe regularidade nas línguas? • Todas as línguas terão palavras para os mesmos conceitos (mesmo que essas palavras não sejam as mesmas)? O SIGNO LINGUÍSTICO SIGNO LINGUÍSTICO = SIGNIFICADO + SIGNIFICANTE Saussure distingue as duas faces do SIGNO LINGUÍSTICO: O signo corresponde a uma relação entre um significado e um significante. • Plano do conteúdo: significado - conceito • Plano da expressão: significante - palavra, imagem acústica Para que seja cumprida a função social da linguagem no processo de comunicação, é necessário que as palavras tenham um SIGNIFICADO, ou seja, que cada palavra represente um conceito. A combinação de CONCEITO E PALAVRA é denominada SIGNO. O SIGNO LINGUÍSTICO une um elemento concreto, material, perceptível (um som), uma imagem acústica, chamado significante, a um elemento inteligível (o conceito) ou imagem mental, chamado significado. 13 DENOTAÇÃO X CONOTAÇÃO Ao enunciado “Isso é um castelo de areia” podemos atribuir um sentido denotativo ou conotativo. Sentido denotativo: construção feita na areia em forma de castelo. Sentido conotativo: ocorrência incerta, sem solidez. Denotação: uso do signo em seu sentido real. Conotação: uso do signo em seu sentido figurado, simbólico. VARIEDADES LINGUÍSTICAS “A Língua não é usada de modo homogêneo por todos os seus falantes. O uso de uma língua varia de época para época, de região para região, de classe social para classe social e assim por diante. Nem individualmente podemos afirmar que o uso seja uniforme. Dependendo da situação, uma mesma pessoa pode usar diferentes variedades de uma só forma da língua”. Celso Cunha, Uma política do idioma Visão de Bakhtin sobre a linguagem (diversa da visão de Saussure): A linguagem é um produto social (e não institucional) e o sujeito é parte atuante do meio social, então ele acaba também por ser um fator de interação. Assim como o fazer social não é constante ou imutável, a linguagem também não o é. Segundo Bakhtin (Marxismo e Filosofia da Linguagem, p. 127): 14 1. A língua como sistema estável de formas normativamente idênticas é apenas uma abstração científica que só pode servir a certos fins teóricos e práticos particulares. Essa abstração não dá conta de maneira adequada da realidade concreta da língua. 2. A língua constitui um processo de evolução ininterrupto, que se realiza através da interação verbal social dos locutores. 3. As leis da evolução linguística não são de maneira alguma as leis da psicologia individual, mas também não podem ser divorciadas da atividade dos falantes. As leis da evolução linguística são essencialmente leis sociológicas. O que chamamos de “língua portuguesa” engloba os diferentes modos de falar utilizados pelo seu conjunto de falantes nesses diversos países. • Angola (10,9 milhões de habitantes) • Brasil (185 milhões) • Cabo Verde (415 mil) • Guiné Bissau (1,4 milhão) • Moçambique (18,8 milhões) • Portugal (10,5 milhões) • São Tomé e Príncipe (182 mil) • Timor Leste (800 mil, na Oceania) . Na Ásia: Macau, Damão, Diu Goa Todas as línguas variam! • Não existe nenhuma sociedade ou comunidade na qual todos falem da mesma forma (em todos os países); • A variedade linguística é o reflexo da variedade social e, como em todas as sociedades existe alguma diferença de status ou de papel entre os indivíduos ou grupos, estas diferenças se refletem na língua. 15 As diferenças não são casuais. Elas não são encaradas como um problema pela Sociolinguística, mas como uma qualidade constitutiva do fenômeno linguístico. • Os actantes (emissor e receptor), o tema e as circunstâncias (tempo e lugar) condicionam a produção do ato comunicativo (enunciação), que, por sua vez condiciona a forma linguística do enunciado produzido. Haverá tantas variedades linguísticas, quantas sejam essas características e relações. Fatores de variação linguística: 1. Variações geográficas ou diatópicas: dialetos ou falares regionais. São responsáveis pelos regionalismos, provenientes de dialetos ou falares locais. Essas variedadessão limitadas pela força de uma língua padrão, que age no sentido de uniformizar as diferenças regionais. As variedades geográficas levam à oposição entre linguagem urbana e linguagem rural. Segundo Preti (1977, pp. 15-23), a primeira aproxima-se mais da língua padrão em decorrência da influência que sofre da escola, dos meios de comunicação de massa e da literatura, por exemplo. Já a linguagem rural tende a desaparecer no contato com a civilização urbana2. São responsáveis pelos chamados regionalismos provenientes de dialetos ou falares locais. 2 É preciso ter em vista, entretanto, que, nos dias atuais, o mundo rural está altamente tecnologizado, de maneira que o falar da sua população é intensamente influenciado pelos meios de comunicação que divulgam a linguagem urbana. 16 Em São Paulo, diz-se abóbora. Na Bahia, usa-se o termo jerimum; jerimu. A palavra mandioca apresenta variações como: aipi, aipim, castelinha, macaxeira e pão-de-pobre, por exemplo. No português falado no Brasil, percebem-se: Diferenças fonéticas: Nordeste x Sudeste em relação à pronúncia das vogais médias pretônicas: melado (e aberta ou fechada). Diferenças gramaticais: posposição verbal da negação – sei não x não sei Uso do artigo definido: Falei com Joana (Nordeste) x Falei com a Joana (Sudeste) 1. Variedades socioculturais ou diastráticas: correspondem aos dialetos sociais. Demonstram que as diferenças linguísticas refletem diferenças sociais. Essa variação está interligada a fatores relativos à: IDENTIDADE SOCIAL DO FALANTE e/ou à SITUAÇÃO (variação diafásica): a) As variedades relacionadas ao falante incluem: Idade/ faixa etária: - Na faixa etária jovem, por exemplo, observa-se o uso de léxico particular. O emprego de gírias é característico da faixa etária jovem: “e aí” “beleza” (Adulto: “tudo bem?); “tipo assim”, “maneiro”; - Falantes mais velhos: pronúncia fechada da vogal tônica posterior da palavra “senhora”. Sexo: Observam-se diferenças entre a fala de homens e mulheres. As mulheres tendem a empregar mais frequentemente os diminutivos. Ex.: “Olha que gracinha!, Olha o vestidinho amarelinho!, Que bonitinho! 17 Duração de vogais como recurso expressivo: “maaaaravilhoso” Profissão: relacionada ao campo dos registros técnicos ou profissionais. Ex.: jargão policial – pessoa = elemento; carro de polícia = viatura, camburão. Nível de estudos, classe social, nível de instrução formal, localizadas dentro de uma mesma região: os usos lingüísticos estão associados ao status do falante. Ex.: substituição do “l” pelo “r”: crube, probrema, Cráudio. 2. Variações contextuais ou diafásicas (variação de registros): Ligadas à situação. O falante está envolvido numa situação concreta de comunicação. Uso que se faz da língua em função do receptor e da situação de produção, influências alheias na linguagem do locutor: Grau de intimidade entre os falantes: o grau de formalidade varia. Ex.: conversa entre amigos, entrevista de trabalho; Registro formal e coloquial. Modalidade: oral, falada e escrita; Sintonia: assunto, tipo de ouvinte, lugar em que o diálogo ocorre e relações que unem os interlocutores. Todo falante varia a sua fala segundo a situação em que se encontra. Dialeto social culto e popular. Os graus de maior ou menor formalidade linguística podem ser expressos tanto na linguagem em sua modalidade oral como na escrita: bilhete x discurso proferido em uma solenidade. 18 A influência desses fatores é: a. Acentuada no léxico; b. Expressiva na fonologia; c. Diminuta na morfossintaxe. Segundo Paul Teyssier: Principais características do português do Brasil As divisões dialetais no Brasil são menos geográficas que socioculturais: Há mais diferenças entre um homem culto e o vizinho analfabeto que entre dois brasileiros do mesmo nível cultural originários de duas regiões distantes uma da outra. Língua das pessoas cultas (com gradações entre um registro oficial estrito e um registro familiar livre) • FATORES DE VARIAÇÃO INTERNOS À LÍNGUA: A variação é, de alguma forma, regrada por uma gramática interior da língua. Níveis de variação linguística: • Fonológico: /l/ pronunciado pelo gaúcho como consoante, pelo santista como vogal no final de uma palavra: carnaval. Pronúncia do /r/ carioca x paulistano x gaúcho; 19 • Morfológica: há pessoas que conjugam os verbos regularindo-os: “ansio” por “anseio”, “fazeu” por fez. Fazer x fazê; • Lexical: “guri” – gaúcho; “menino” – paulista; “aipim” = mandioca; jerimum = abóbora. Variável Fonética Variação no nível fonético: variação na produção dos sons: Português: Ex: “r” carioca (r aspirado) x paulistano (r vibrante) Inglês: alive x bride – sul dos EUA /a:/ alongado Variável morfológica “andar” x “andá”: presença ou ausência do “r” final são as variantes “fazer” x “fazê”: pode ser uma variação diafásica: “fazer” em uma situação de formalidade; “fazê” em uma situação de informalidade. Pode variar também em função do nível de escolaridade do falante. Variável sintática 1. Essa aqui é a pessoa em cujo casa fiquei. (raramente utilizada em uma conversa informal no Português do Brasil) 2. Essa aqui é a pessoa que eu fiquei na casa. 3. Essa aqui é a pessoa que eu fiquei na casa dela. 20 Variantes de prestígio x variantes estigmatizadas e neutras Certas variantes gozam de mais prestígio do que outras, segundo a maneira pela qual as sequências sonoras são pronunciadas. Variantes-padrão e não-padrão Extrapolam os critérios linguísticos. O que determina, na maioria das vezes, uma variante-padrão relaciona-se à classe social de prestígio e o grau relativamente alto de educação formal dos falantes. Variante-padrão em BH: “falano”, “fazeno”, “quereno” Variante-padrão em Santos: “tu faz”, “tu quer” Variante não-padrão: formais verbais 1ª pessoa plural: a gente gosta, nós gostamos (“nós gosta”, “a gente gostamos”) Lexicalização Assobio x assovio Ruím x rúim Não há variante melhor ou pior de uma língua. Há variantes de prestígio, estigmatizadas ou neutras. Cabe à linguística formular explicações sobre o mecanismo subjacente à linguagem. Variantes coletivas: dividem-se em dois tipos principais: • Variantes diatópicas: variantes regionais ou normas regionais. (“cair um tombo” RS; “levar um tombo” RJ) • Variantes diastráticas: relacionadas à estratificação social, evidenciam a variedade de diferenças culturais dentro de uma comunidade. 21 Podem subdividir-se em: Norma culta padrão (ou nacional): É a modalidade escrita empregada na escola, nos textos oficiais, científicos e literários. É a variante de maior prestígio sociocultural. Ex.: Há muito tempo não o vejo. Vendem-se carros. Havia dez alunos em sala. Norma coloquial (tensa ou distensa) É empregada oralmente pelas classes sociais médias escolarizadas. Seu grau de desvio em relação à norma culta pode variar conforme as circunstâncias de uso. Ex.: Tem muito tempo que não lhe vejo. Vende-se carros. Tinha dez alunos na sala. Norma popular (ou vulgar) Caracteriza a fala das classes populares semi-escolarizadas ou não-escolarizadas. O desvio em relação à norma gramatical é maior, caracterizando o chamado “erro”. Ex.: A gente fomos na praia. Dois cachorro-quente custa três real.
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