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TEORIA GERAL DO PROCESSO PRINCÍPIOS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 2018.1 Profa. Beatriz Roland 1 DIREITO PROCESSUAL FUNDAMENTAL Didier: conjunto de normas processuais que estruturam o processo civil brasileiro + servem de norte interpretativo para as demais normas jurídicas processuais > princípios + regras constitucionais infraconstitucionais 2 PRINCÍPIOS 1) Princípio do Devido Processo Legal CF art. 5o, LIV. Ninguém será privado da liberdade ou dos seus bens sem o devido processo legal. construção histórica: da Magna Carta (1215) para o futuro garantia constitucional contra o exercício abusivo de poder: cláusula geral modernamente: devido processo legal = processo justo > garantia da efetividade dos direitos fundamentais 3 Espécies: devido processo legal procedimental (formal): ligado à teoria geral do processo devido processo legal substantivo (material): proporcionalidade e razoabilidade NCPC art. 8o. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. 4 Concretizações do devido processo legal (modelo constitucional do processo brasileiro): contraditório e ampla defesa (CF art. 5o, LV) igualdade processual (CF art. 5o, I) duração razoável do processo (CF art. 5o, LXXVIII) juiz natural (CF art. 5o, XXXVII e LIII) proibição da prova ilícita (CF art. 5o, LVI) publicidade do processo (CF art. 5o, LX) garantia do acesso à justiça (CF art. 5o, XXXV) motivação das decisões judiciais (CF art. 93, IX) e também: independência e imparcialidade do juiz, adequação, boa-fé processual e efetividade Para José Maria Tesheiner e Rennan Thamay: DPL = superprincípio 5 PRINCÍPIOS 2) Princípio da Dignidade da Pessoa Humana fundamento da RFB (CF art. 1o, III): direito fundamental; sobreprincípio constitucional NCPC art. 8o. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. 6 Limite: autonomia da vontade das partes = liberdade CPC art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. 7 Exemplos (rol exemplificativo): art. 1048: prioridades de tramitação - idosos, portadores de doenças graves, ECA. art. 162, III: direito do portador de deficiência auditiva a comunicar-se em LIBRAS em audiência art. 388: direito ao silêncio no processo civil art. 459 § 2o: proibição de pergunta vexatória à testemunha art. 833: impenhorabilidade de certos bens 8 Repercussões da dignidade da pessoa humana no processo: construção de NJs processuais que visem mais diretamente à proteção da dignidade da pessoa humana vide exemplos anteriores, que tbm remetem ao DPL na interpretação das NJs processuais ex. interpretação extensiva dos bens absolutamente impenhoráveis (art. 833) para abranger outros bens que possam comprometer a dignidade como equipamentos médicos para manutenção da saúde. 9 PRINCÍPIOS 3) Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa CF art. 5o, LV. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. reflexo do princípio democrático: participação das partes no processo figuras conexas: não há contraditório sem ampla defesa e vice- versa 10 Garantias do princípio do contraditório a) participação: dimensão formal (conteúdo mínimo) = garantia de ser ouvido, de ser comunicado; visão tradicional CPC art. 77 § 1o. Nas hipóteses dos incisos IV [cumprir as decisões e não causar embaraços] e V [atualização do endereço] o juiz advertirá qualquer das pessoas mencionadas no caput de que sua conduta poderá ser punida como ato atentatório à dignidade da justiça. b) possibilidade de influência na decisão: dimensão material = poder de influência = ampla defesa Reforçam a igualdade processual 11 CPC art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes a oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. Ex. Autor faz pedido com base na lei X. Réu apenas afirma que a lei X não é aplicável ao caso. Juiz entende que a lei é inconstitucional. Portanto, deve intimar as partes para que se manifestem a respeito da inconstitucionalidade. 12 CPC art. 9o. Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. decisão a favor: não há prejuízo para a parte Exs. indeferimento na inicial (art . 330); improcedência liminar do pedido (art. 332): são favoráveis ao réu e proferidas sem que ele tenha sido citado. Exceção: decisões inaudita altera parte = tutela provisória liminar de urgência e de evidência (arts. 300 § 2o e 311, II e III) 13 PRINCÍPIOS 4) Princípio da Publicidade CF art. 5o, LX. A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem. CF art. 93. IX. todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; X. as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros; 14 CPC art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público. Funções: proteção das partes contra arbitrariedades secretas do juízo, que também ferem a imparcialidade (aspecto interno do princípio) controlar a função jurisdicional (aspecto externo do princípio) 15 CPC art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos: I - em que o exija o interesse público ou social; II - que versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separação, união estável, filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescentes; III - em que constem dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade; IV - que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo. 16 O princípio da publicidade ganha especial relevância no sistema de precedentes: as decisões judiciais passam a interessar a pessoas que não integram a lide originária. CPC art. 979 §§§1o, 2o e 30. 17 PRINCÍPIOS 5) Princípio da Duração Razoável do Processo Previsão no Pacto de São José da Costa Rica (art. 8o), do qual o Brasil é signatário. CF art. 5o, LXXVIII. A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade desua tramitação. CPC art. 4o. As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. CPC art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: II - velar pela duração razoável do processo. 18 Corte Europeia dos Direitos do Homem Critérios para aferir se a duração de um processo é razoável: complexidade do assunto comportamento dos litigantes e de seus procuradores ou da acusação e da defesa no processo atuação do órgão jurisdicional 19 Possíveis instrumentos de concretização do princípio: representação por excesso de prazo, com possível perda de competência do juízo em razão da demora (CPC art. 235) MS por omissão judicial 20 PRINCÍPIOS 6) Princípio da igualdade processual repulsa ao tratamento privilegiado CF art. 5o. CPC art. 7o É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório. 21 Igualdade processual > 4 aspectos a serem observados: a) imparcialidade do juiz b) igualdade no acesso à justiça, sem discriminação quanto ao gênero, orientação sexual, raça, nacionalidade etc c) redução de desigualdades que dificultem o acesso à justiça financeira = concessão da gratuidade de justiça (CPC arts. 97 - 102) comunicação = LIBRAS (CPC art. 162, III) d) igualdade no acesso às informações necessárias ao exercício do contraditório tratar desigualmente os desiguais … nomeação de curador especial para incapazes processuais (CPC art. 72) presença obrigatória do MP nos casos de interesse de incapazes (CPC art. 178, II) prazo em dobro para os entes públicos se manifestarem nos autos (CPC art. 183) uniformização de jurisprudência e o sistema de precedentes 22 PRINCÍPIOS 7) Princípio da Boa-Fé Processual CPC art. 5o Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé. = aplicada a todos que participam da relação processual boa-fé objetiva = norma de conduta cláusula geral Aplicações no processo: (a) dever de cooperação entre os sujeitos, (b) negociação processual, (c) função interpretativa. 23 Exemplos da Concretização da Boa-Fé Processual proibição da má-fé: penalização para litigância de má-fé (CPC art. 80) proibição do venire contra factum proprium: recorrer contra decisão que foi aceita (CPC art. 1000) proibição de abuso de direitos processuais: abuso do direito de defesa (CPC art. 300, I), abuso do direito de recorrer (CPC art. 80, VII) supressio = perda de poderes processuais pelo não-exercício por tempo suficiente para que outrem tenha confiança legítima de que esse poder não será mais exercido supressio processual: juiz perde poder para suscitar a inadmissiblidade do processoa após anos de tramitação regular, sem que ninguém houvesse suscitado a questão 24 PRINCÍPIOS 8) Princípio Dispositivo e Inquisitivo Modelos de estruturação do processo Adversarial: forma de competição ou disputa; conflito desenvolve-se entre 2 adversários diante de um juiz passivo, cuja função é decidir o caso. Os protagonistas são as partes. Aqui prepondera o princípio dispositivo. Inquisitorial: pesquisa oficial, sendo o órgão jurisdicional o grande protagonista. Aqui prepondera o princípio inquisitivo. Foi se instaurando quando o direito processual ganhou autonomia e foi enquadrado com ramo do direito público, e a função jurisdicional passa a ser vista como um poder- dever do Estado, em torno do qual se reúnem os interesses dos particulares e os do próprio Estado. 25 Atualmente, eles co-existem: CPC art. 2o O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei. 26 PRINCÍPIOS 9) Princípio da Cooperação CPC art. 6o Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. consectários do devido processo legal e da boa-fé processual e do contraditório desenvolvimento da estruturação do processo Para Didier: “O princípio da cooperação define o modo como o processo civil deve estruturar- se no direito brasileiro”. Órgão jurisdicional: dupla posição paritário na condução do processo: diálogo e equilíbrio assimétrico na decisão: função exclusiva 27 Manifestação do princípio em relação às partes: dever de esclarecimento: redação da demanda com clareza e coerência dever de lealdade: partes devem obedecer à boa-fé não litigando com má-fé dever de proteção: não se pode causar danos à parte adversária 28 Manifestação do princípio em relação ao órgão jurisdicional: dever de esclarecimento: esclarecer junto às partes eventuais dúvidas que tenha sobre suas alegações e pedidos + esclarecer seus próprios pronunciamentos para as partes dever de consulta: variante do dever de informar. O juiz não deve decidir sem que as partes tenham sido intimadas a manifestar-se (relacionado, também ao contraditório) dever de prevenção: variante do dever de proteção. Ao perceber uma deficiência na postulação das partes, deve o juiz dar tempo para que elas possam supri-las. explicitação de pedidos pouco claros, elucidação de fatos, sugestão de determinada atuação da parte, adequação do pedido à situação concreta. (CPC arts. 76, 321, 932, par. único etc) 29 PRINCÍPIOS 10) Princípio da Eficiência Corolário do devido processo legal. Não é possível imaginar um DPL ineficiente. CPC art. 8o Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcional idade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. 30 Repercussão binária: a) Sobre a administração judiciária: CNJ: EC 45/2004 CF art. 103-B § 4o. é norma de direito administrativo b) Sobre a gestão de um determinado processo: dirigido ao órgão do PJ que, neste caso, é visto como administrador de um processo evolução do princípio da economia processual exemplos da concretização do princípio: reunião de processos (conexão), reconvenção, indicação do réu correto (CPC art. 339), denunciação da lide (CPC art. 125 e ss.) etc o princípio da economia processual está ligado ao princípio da instrumentalidade das formas 31 PRINCÍPIOS 11) Princípio da Efetividade direitos devem ser reconhecidos e efetivados atividade executiva CPC art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. O juiz deve tomar todas as medidas que forem necessários para a prestação integral da tutela executiva. 32 PRINCÍPIOS 12) Princípio da Primazia da Decisão de Mérito CPC art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Há diversos dispositivos no CPC que consagram esse princípio: saneamento de vícios processuais (CPC arts. 139, IX, 317, 321, 485 § 7o etc). 33 PRINCÍPIOS 12) Princípio da Verdade Formal: possibilidade de se proferir decisão dissociada da realidade com base em elementos probatórios insuficientes para o completo esclarecimento dos fatos, mas na ponderação das cargas probatórias atribuídas às partes. Real: a que chega o julgador, reveladora dos fatos tal como ocorreram historicamente e não como querem as partes que apareçam realizados. 34 Atualmente: "Diz-se que a verdade é a judicial, caracterizada por ser contextual, qualquer que sejao âmbito de pesquisa em que é obtida, e funcional, no sentido de compor os valores presentes na sociedade em nome de quem a Justiça é administrada. Seja no processo penal, seja no civil, a verdade a ser alcançada é a processualmente válida”. 35 PRINCÍPIO 13) Princípio do Duplo Grau de Jurisdição Regra geral, a parte tem direito a que sua pretensão seja conhecida e julgada por 2 juízos distintos, mediante recurso, caso não se conforme com a decisão prolatada. Não é um direito absoluto! A garantia é que não haja julgamento monocrático único. Exceção: causas com competência originária de Tribunal 36