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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS DEPARTAMENTO DE ZOOTECNIA MATERIAL DIDÁTICO - BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA (AF0683) MECANISMOS DE TROCA DE CALOR LATENTE Prof. Dr. Pedro Henrique Watanabe MECANISMOS DE TROCA DE CALOR LATENTE As formas latentes de troca de calor constituem o principal mecanismo de dissipação de calor (energia), sendo processo muito importante para os homeotermos na prevenção do superaquecimento (hipertermia) em ambientes quentes. Aves por exemplo, a partir de 24,4oC apresentam maior contribuição de termólise evaporativa (forma latente, vide Figura 1)1. As formas conhecidas de troca de calor latente são a evaporação e a condensação, nas quais os fluxos são causados por gradientes de pressão de vapor, que indica a quantidade de vapor de água contido em dado volume de ar. Ps{Ta} = 4,58123 * 10m, mmHg Ps{Ta} = 6,1078 * 10m, mbar Ps{Ta} = 0,61078 * 10m, kPa sendo Ps{Ta} a pressão de saturação dada a temperatura Ta, m = (7,5 * Ta) / (237,5 + Ta), Ta a temperatura ambiente em oC. A pressão parcial de vapor representa a pressão exercida pelo conteúdo em vapor de água na atmosfera não-saturada. Pp{Ta} = Ps{Tu} - ᵞ (Ta - Tu), kPa sendo Pp{Ta} a pressão parcial dada a temperatura Ta, Ps{Tu} a pressão de saturação dada a temperatura Tu (temperatura de bulbo úmido) e ᵞ a constante psicrométrica para a temperatura Ta. Quando um animal está em um ambiente térmico estressante, as formas latentes de troca de calor são acionadas. Essas formas são de fundamental importância, uma vez que as formas sensíveis deixam de ser efetivas no balanço homeotérmico, à medida que a temperatura ambiente se aproxima da corporal. Assim, nos processos de troca de calor latente, inicialmente há movimentação da água no interior do corpo do animal até alcançar a epiderme, em taxa que depende também do gradiente de pressão de vapor, depois ocorre a difusão de vapor de água para o ambiente a partir da pele e dos pulmões. Isso significa que a perda de calor ocorre na conversão para vapor, tanto do suor secretado pelas glândulas da pele quanto da umidade proveniente do trato respiratório. 1 Leia mais sobre as trocas de calor pelas aves em http://www.avisite.com.br/cet/img/20100916_trocasdecalor.pdf 1. As glândulas sudoríparas da pele são responsáveis pela dissipação do suor, sendo classificadas em apócrinas e écrinas. As primeiras estão associadas ao folículo piloso e as segundas são glândulas livres. Normalmente as glândulas se contraem de forma controlada, em função da temperatura hipotalâmica e dos estímulos periféricos e expelem a secreção sob a forma de solução salina, denominada suor. Dessa forma, sob estresse severo, ocorre alta taxa de fluxo de sangue do núcleo para a pele do animal e, consequentemente, alta taxa de fluxo de calor, resultando em altas temperaturas superficiais. À medida que as perdas evaporativas se tornam maiores, grande quantidade de calor é removida da pele por vaporização, de forma que o sangue que circula pelas superfícies do corpo se torna mais refrigerado. Consequentemente, as perdas de calor na pele por evaporação dependem principalmente do número de glândulas sudoríparas ativas. Por exemplo, o homem tem 2000 glândulas sudoríparas por cm² na palma das mãos e na sola dos pés, 200 a 300 por cm² na face e 100 a 200 por cm² no tronco, esta configuração anátomo-fisiológica é devido a maior área de superfície das regiões periféricas do corpo (mãos e pés). Bovinos apresentam em média 1800 glândulas por cm², enquanto búfalos apresentam 180 por cm² e suínos apenas 25 por cm². A função termorregulatória do suor é completada quando ocorre sua evaporação para o ar circundante, pois esse processo requer calor, que é cedido principalmente pela superfície onde ocorre a evaporação, evitando assim o superaquecimento corporal. A perda da umidade através da pele está sujeita às leis da física, as quais evidenciam que a taxa de evaporação é direta e grandemente afetada pela umidade do ar, isto é, pelo gradiente de pressão de vapor de água entre a superfície do corpo do animal e do ar. Assim, se o ar circundante está saturado de umidade e na mesma temperatura da superfície do animal, não há troca líquida de calor. A temperatura da superfície do animal exerce grande influência: se estiver mais baixa que a do ar e este próximo da saturação, haverá mais condensação e a formação de uma espécie de orvalho na superfície do animal e o animal ganhará calor do ambiente. Outros fatores como a resistência do ar à difusão do vapor, a taxa de movimentação do ar, a porcentagem de área superficial úmida e o local de evaporação na pele afetam a magnitude da dissipação evaporativa do calor pela pele. Em muitos casos, principalmente no homem e em equinos, as glândulas sudoríparas produzem calor em quantidade que excede a capacidade de evaporação e, dessa forma, a pele fica úmida. Quando isto ocorre, o calor é perdido no processo de vaporização do suor, o que leva a crer que, quando o suor cai do corpo em forma de gotas, não há benefício térmico. ROHWER (1980) desenvolveu a fórmula para fluxo evaporativo de calor do animal para o ambiente a partir do conhecimento da pressão de vapor e da velocidade do ar. CURTIS (1983) adaptou a equação a partir dos valores de pressão parcial, e não dos valores de saturação. Qevapo = 2,539 + 0,0152 * v * (Pp{Ta} - Pp{Ts}), sendo Qevapo a densidade de fluxo (kcal/dm².dia), v a velocidade do ar (cm/s), Pp{Ta} a pressão parcial para a temperatura ambiente Ta (mmHg) e Pp{Ts} a pressão parcial para a temperatura de superfície do animal Ts (mmHg). Considerando a área corporal de um homem como 1,80m², a dissipação de calor latente de evaporação através da pele pode ser de aproximatamente de 380W/m², de acordo com ROSENBERG et al. (1983). De acordo com esses mesmos autores, os animais controlam também, pelo comportamento, suas perdas evaporativas de calor através da pele, isto é, alguns se expõem às correntes de ar para incrementar o processo e outros se escondem do vento para conservar a água do corpo. Além disso, ocorre também a evaporação a partir do trato respiratório do animal, e isso constitui em poderoso meio de controle homeotérmico, muito significativo para várias espécies. Nesse processo, os mecanismos geralmente aumentam a quantidade de ar puxado pelas vias respiratórias. Há condicionamento do ar inspirado, isto é, ele é aquecido até a temperatura corporal e torna-se saturado com vapor de água durante o trajeto para alcançar os alvéolos. Na expiração, o ar passa pela mucosa já resfriada pela inspiração, quando, então, ocorre condensação com liberação de calor latente. A diferença entre o calor carreado na inspiração e na expiração constitui a perda respiratória. No entanto, embora seja uma forma importante para termólise em espécies que apresentam pequena quantidade de glândulas sudoríparas ativas, o processo de perdas evaporativas pela respiração é menos eficiente, visto que o ar presente nas vias respiratórias encontra-se muitas vezes com elevada quantidade de vapor de água, próximo da saturação. Em ovinos, por exemplo, observa-se que 70% da evaporação total é devido a evaporação cutânea (Tabela 1), em função do aumento da frequência respiratória (STARLING et al., 20022). Exercício: Um ovino apresenta frequência respiratória de 160 movimentos por minuto e temperatura no interior da cavidade bucal de 40oC e o ar interno apresenta umidade relativa do ar próxima de 80%. Esse ovino está em um galpão cuja temperatura do ar é de 20oC e umidade relativa do ar é de 60%. Considerando que o ar inspirado passa pelas vias com velocidade próximade 0,2m/s, qual o calor perdido por evaporação (via respiratória, desconsiderando as perdas por sudorese) pelo animal? Considere que este ovino tem área de superfície próxima de 0,70m² e peso de 20kg. Qevapo = 2,539 + 0,0152 * v * (Pp{Tb} - Pp{Ta}) Ps{Ta} = 4,58123 * 10m, mmHg m = (7,5 * Ta) / (237,5 + Ta) Umidade relativa do ar (%) = Pp{Ta} / Ps {Ta} * 100 Na boca do animal: Tb = 40oC m = (7,5 * 40) / (237,5 + 40) = 1,0811 Ps{Tb} = 4,58123 * 10m = 4,58123 * 101,0811 = 55,2158 mmHg Umidade relativa do ar (%) = (Pp{Tb} / Ps {Tb}) * 100 80 = (Pp{Tb} / 55,2158) *100 Pp{Tb} = 0,8 * 55,2158 = 44,1726 mmHg No ambiente: Ta = 20oC m = (7,5 * 20) / (237,5 + 20) = 0,5825 Ps{Ta} = 4,58123 * 10m = 4,58123 * 100,5825 = 17,5189 mmHg Umidade relativa do ar (%) = (Pp{Ta} / Ps {Ta}) * 100 60 = (Pp{Ta} / 17,1589) *100 Pp{Ta} = 0,6 * 17,5189 = 10,5113 mmHg Qevapo = 2,539 + 0,0152 * v * (Pp{Tb} - Pp{Ta}) 2 Leia mais sobre em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1516-35982002000800022&script=sci_arttext 1 1 Qevapo = 2,539 + 0,0152 * 20 * (44,1726 - 10,5113) Qevapo = 12,7720 kcal/dm².dia Qevapo = 0,6179 W/dm² Área de superfície = 0,7m² = 70dm² Qevapo = 0,6179 * 70= 43,25 W (calor perdido por animal) Qevapo = 43,25 / 20 = 2,16 W/kg (calor perdido por kg do animal para comparação com a Tabela 1) CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora vistos de forma isolada, as diversas formas de troca de energia térmica apresentadas ocorrem de forma simultânea e dinâmica entre o animal e o ambiente. Na verdade, a existência de equilíbrio térmico não é condição necessária nem suficiente para que haja equilíbrio de temperatura. Não é suficiente porque a temperatura em qualquer lugar do organismo será estável apenas se existir um equilíbrio na transferência de calor de e para esse local. O equilíbrio térmico será uma condição necessária para o equilíbrio de temperatura só no caso de um sistema fechado de massa constante, porém os animais estão sempre ganhando e perdendo massa (água, tecido muscular ou transitório, no caso do conteúdo da digesta). LITERATURA CONSULTADA3 BACCARI JÚNIOR, F. Métodos e técnicas de avaliação da adaptabilidade dos animais às condições tropicais. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE BIOCLIMATOLOGIA ANIMAL NOS TRÓPICOS: PEQUENOS E GRANDES RUMINANTES, 1., 1990, Sobral-CE. Anais... Sobral: EMBRAPA-CNPC, 1990. p. 9-17. BAETA, F.C.; SOUZA, C.F. Ambiência em edificações rurais. Viçosa: UFC, 2010. 269p. CURTIS, S.E. Environmental management in animal agriculture. AMES: The Iowa State University, 1983. 409p. MEDEIROS, L.F.D.; VIEIRA, D.H. Bioclimatologia animal. 1997. Disponível em: http://levy.blog.br/arquivos/aula-fesurv/downs-86-0.pdf. Acesso em 05 de outubro de 2014. MULLER, P.B. Bioclimatologia aplicada aos animais domésticos. Porto Alegre: Sulina, 1982. 158p. ROSENBERG, N.J.; BLAD, B.L.; VERMA, S.B. Microclimate: the biological environment. New York: Wiley-interscience Publication, 1983. 495p. SILVA, R.G. Introdução à bioclimatologia animal. São Paulo: Nobel, 2000. 286p. STARLING, J.M.C.; SILVA, R.G.; CERÓN-MUÑOZ, M.; BARBOSA, G.S.S.C.; COSTA, M.J.R.P. Análise de algumas variáveis fisiológicas para avaliação do grau de adaptação de ovinos submetidos ao estresse por calor. Revista Brasileira de Zootecnia, v.31, p.2070-2077, 2002. 3 ATENÇÃO: este material tem como uso único e exclusivo para fixação do conteúdo apresentado em aula da disciplina Bioclimatologia Zootécnica (AF0683) do curso de graduação em Zootecnia da Universidade Federal do Ceará. Os trabalhos não referenciados podem ser encontrados a partir da literatura consultada e dos links utilizados para confecção deste.
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