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Despatologizacao da transexualidade

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Universidade Veiga de Almeida
	Curso: Psicologia
	Matéria: Psicologia e Profissões
	Profa: Elizabete Paiva
	Aluna: Cristina Amorim (20172102013)
	Data: 20-09-2017
	
A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia
Como parte de uma campanha de comunicação em apoio à luta pela despatologização das identidades trans e travestis lançada em 2014, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Conselho Federal de Psicologia (CFP) produziu a série de documentários “A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia”, um site (http://despatologizacao.cfp.org.br/) e debates online sobre o tema. A ação marcou o posicionamento do CFP a respeito da Campanha Internacional Stop Trans Pathologization (STP), que convoca, desde 2009, sempre no mês de outubro, um Dia Internacional de Ação pela Despatologização Trans, com manifestações simultâneas e outras ações em diversas cidades do mundo. O título deste trabalho se refere aos vídeos, divididos em três partes, com duração entre 15 e 25 minutos cada um.
A autarquia propõe uma discussão sobre o papel do psicólogo na atuação junto a transgêneros. Isso porque, se por um lado, existe um movimento de despatologização dessa condição psíquica; por outro, a própria condição é descrita e baseada legalmente nos documentos CID 10 – Código Internacional de Doenças e DSM V - Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais – os títulos desses documentos falam por si.
Além disso, as pessoas trans se encontram no centro de uma acirrada discussão: se os tratamentos seriam resultado de um legítimo acolhimento médico-psíquico de um paciente ou resultado de um fenômeno sócio-jurídico, segundo a doutora em Psicologia Tatiana Lionço, na parte I da série. Depreende-se daí a necessidade de engajar outros campos de estudo além da psicologia e da medicina, atualmente envolvidas: direito, antropologia, sociologia e, até mesmo, história.
O mais recente documento que estabelece e uniformiza o entendimento sobre patologias psíquicas, o DSM V - Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais, publicado em 2013, traz um avanço: passa a chamar a condição das pessoas trans de disforia de gênero – antes eram portadoras de um transtorno de identidade de gênero. “Disforia de gênero refere-se ao sofrimento que pode acompanhar a incongruência entre o gênero experimentado ou expresso e o gênero designado de uma pessoa. Embora essa incongruência não cause desconforto em todos os indivíduos, muitos acabam sofrendo se as intervenções físicas desejadas por meio de hormônios e/ ou de cirurgia não estão disponíveis. O termo atual é mais descritivo do que o termo anterior transtorno de identidade de gênero, do DSM-IV, e foca a disforia como um problema clínico, e não como identidade por si.” (APA, 2015, pag. 19088-19092). 
Mas só o fato desta condição constar em um manual que trata de doenças – e isso atende a uma necessidade prática dos profissionais que lidam com as dificuldades enfrentadas por pessoas trans – já traz uma conotação negativa. Relatos de experiências com transgêneros apontam demandas e necessidades bem diversas em meio a um cenário de divergências envolvendo vários segmentos da sociedade. Nesse cenário, corre-se o risco, de mesmo na técnica básica da escuta, ao invés de prestar um acolhimento, usar um “filtro” de ideias, conceitos e crenças pré-estabelecidos que podem afastar o psicólogo da pessoa em atendimento. A professora Tatiana Lionço, que tem formação em psicanálise, confronta a teoria dessa linha com sua prática em consultório. “A psicanálise entende a transexualidade ora como perversão, ora como psicose. Eu atendia pessoas transexuais no serviço público de saúde. A maior parte das que escutei – e foram muitas – não se enquadravam nem na perversão, nem na psicose. Essa terminologia contribui, no imaginário coletivo, para uma concepção patologizadora.” (CFP, 2015).
O questionamento que fica é: será que a doença que é retratada neste documento não estaria na sociedade e não nos indivíduos que apenas vivem sua subjetividade? Para a professora Jaqueline Gomes de Jesus, doutora em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações pela UnB, a comparação à condição do negro na sociedade ilustra bem a condição da pessoa trans. Para ela, uma pessoa negra não pode ser considerada doente porque sofre pelo fato de ser inferiorizada em função de suas características biológicas, tendo como atores pessoas à sua volta, instituições e sistemas sociais. 
A discussão perpassa pelo senso comum por meio da mídia; e isso é positivo porque há fortes indícios de que esse descompasso não é apenas uma questão de saúde do indivíduo trans e sim de saúde coletiva. De acordo com a revista Veja, quando da publicação da primeira edição do manual, em 1952, havia uma lista de 106 transtornos psiquiátricos. Em, 1968, esse número aumentou para 182 e, em 1980, para 265. E dá um exemplo da patologia transtorno do déficit de atenção com hiperatividade. “Nos Estados Unidos, onde os dados sobre essa condição são constantemente atualizados, o número de crianças com TDAH no país aumentou 41% na última década, segundo dados divulgados em abril pelo Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC, sigla em inglês), órgão federal de saúde do país. Porém, é preciso lembrar, o último DSM foi publicado há quase 20 anos – ou seja, os critérios para diagnóstico dessa condição não muda desde então.”
No segundo vídeo da série, foi destacada a importância histórica e contemporânea dos movimentos sociais na mudança e criação de leis e convenções que respeitem as subjetividades, mesmo em um cenário onde ocorrem retrocessos protagonizados por grupos isolados de psicólogos e da instância judiciária. Um exemplo é a liminar emitida na última semana por um juiz do Distrito Federal em favor da cura gay. “Para o conselho, a medida fere entendimento da OMS (Organização Mundial de Saúde), segundo a qual a homossexualidade não pode ser considerada uma patologia, mas uma variação natural da sexualidade humana, um posicionamento reforçado por outras associações médicas e científicas. A Associação Americana de Psiquiatria, por exemplo, não classifica homossexualidade como "distúrbio" ou "perversão" desde 1973. No Brasil, a classificação "homossexualismo" foi retirada da lista de patologias pelo Conselho Federal de Medicina em 1985.” (Cancian, 2017) 
Para a professora Ana Paula Uziel, coordenadora do Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero, Políticas e Direitos da UERJ, o próprio procedimento de transgenitalização está marcado, em sua essência, por um retrocesso. Por que a pessoa “precisa” passar por uma adequação? Não seria a sociedade, a começar pela a comunidade acadêmica, em especial a de psicólogos, que deveria passar por adequação?. Segundo o professor Emerson Fernando Rosera, doutor em psicologia pela USP, em geral esse profissional de saúde não tem uma formação curricular obrigatória que contemple e que ajude a pensar a diversidade. 
Defende-se, inclusive, uma revisão desde a raiz, já que o papel do psicólogo, historicamente, vem de uma perspectiva patologizante, em especial, a respeito do tema sexualidade e identidade de gênero. O que se busca, portanto, é uma adequação da prática à legislação, já que a Lei 8.080/90 que orienta sobre a assistência via Sistema Único de Saúde (SUS) diz em seu artigo 2º: “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.” Ou seja, que o sujeito seja tratado como um ser humano integral em sua integralidade. 
Ao invés de oferecer um “pacote” pronto, o provimento da saúde integral é, acima de tudo, ouvir o sujeito. Na visão do doutor em psicologia pela PUC-SP, Marco Aurélio Máximo Prado, a experiência da pessoa tem sido descartada em detrimento do olhar científico. “A gente está no momento de inverter essa hierarquia. Aprender a produzir um olhar para o corpo junto com a pessoa que vivencia as transições de todasas formas [neste corpo].”
Já o terceiro e último vídeo reafirma a necessidade de descolar, na prática, as questões de sexualidade, gênero, desejo e identificação sexual a fim de acompanhar, inclusive, as mudanças sociais. Mais uma vez, a necessidade de adequação da coletividade e não do indivíduo. A pesquisadora Sônia Corrêa, da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, destaca que, historicamente, se os registros sobre diversidade de gênero estavam restritos à área médica, hoje o âmbito é dos direitos humanos. Uma das constatações mais sérias da pesquisadora é que há muito desconhecimento da matéria, a ponto de documentos levados à ONU cometerem equívocos de tratar orientação sexual e identidade de gênero como conceitos correspondentes.
A psicóloga Beth Fernandes, mestre em Saúde Mental, que passou por uma cirurgia de transgenitalização questiona a qualidade dos serviços de saúde oferecidos e que consequências negativas podem perdurar pelo resto da vida das pessoas atendidas. Ela propõe que seja amplamente discutido o “como fazer” deste processo. 
Há que se deixar uma outra reflexão aqui: não seria nós, a sociedade, que teríamos que nos adequar às subjetividades destas pessoas que sofrem, em algum medida, pela pressão social, sob pena também do Brasil descumprir os termos dos direitos humanos internacionais do qual é signatário?
A pesquisadora Sônia Corrêa mostrou que, na prática, promover a saúde integral de pessoas quanto à identidade de gênero e orientação sexual é uma questão política. Na Argentina, para trocar nome civil, ajustando-o ao nome social, basta a pessoa ir a um cartório. As estatísticas apontam inúmeros casos em que não há sofrimento – o indivíduo deseja apenas ter a imagem social ajustada aos seus sentimentos. Obrigar uma pessoa que se sente confortável com sua identidade a passar por três anos, tempo mínimo de terapia obrigatória para o processo transexualizador (Ministério da Saúde, 2013) é, não só descuidar da saúde do indivíduo, como também tomar a saúde deste, causando-lhe um verdadeiro transtorno.
Referências
American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM-5 [recurso eletrônico]; [tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento et al.; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli et al.]. Porto Alegre: Artmed, 2015, 5ª edição e-pub.
Câmara dos Deputados. Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990. Documento, online, 1990. [Data de consulta: 19 de setembro de 2017] Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1990/lei-8080-19-setembro-1990-365093-normaatualizada-pl.pdf>
CANCIAN, Natália. Justiça concede liminar que permite tratar homossexualidade como doença. Jornal Folha de São Paulo, online, 2017. [Data de consulta: 19 de setembro de 2017] Disponível em:<http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/juiz-concede-liminar-que-permite-aplicacao-de-cura-gay-por-psicologos/>
Conselho Federal de Psicologia. A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia – Parte I. YouTube, online, 2015 [Data de consulta: 23 de agosto e 17 de setembro de 2017] Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xLugxnORfd0>
Conselho Federal de Psicologia. Dia internacional pela despatologização das Identidades Trans. Site, online, 2015 [Data de consulta: 23 de agosto de 2017] Disponível em: <http://site.cfp.org.br/dia-internacional-pela-despatologizacao-das-identidades-trans/>
ELIAS, Vivian Carrer e SANTOS, Juliana. Nova ‘bíblia da psiquiatria’ vem aí. E, com ela, mais doenças, Revista Veja, online, 2013 [Data de consulta: 17 de setembro de 2017] Disponível em:<http://veja.abril.com.br/saude/nova-biblia-da-psiquiatria-vem-ai-e-com-ela-mais-doencas/>
Ministério da Saúde. Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013. Documento, online, 2013. [Data de consulta: 19 de setembro de 2017] Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt2803_19_11_2013.html>

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