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MARIA DO SOCORRO PEREIRA DO NASCIMENTO AS CONSEQÜÊNCIAS PROVOCADAS PELA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL, CONSIDERANDO A FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO Monografia apresentada como exigência à Conclusão do Curso de Direito, ofertado pelo Centro de Ensino Superior do Amapá -CEAP, sob a orientação do Prof. Agnaldo Alves Ferreira. MACAPÁ 2008 2 MARIA DO SOCORRO PEREIRA DO NASCIMENTO AS CONSEQÜÊNCIAS PROVOCADAS PELA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL, CONSIDERANDO A FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO BANCA EXAMINADORA: Orientador Membro Membro Apresentado em: ____/____/____. Conceito: ______. MACAPÁ 2008 3 Dedico este estudo aos meus filhos Gille Simonne, Gilmário e Germânio, que entenderam meus motivos e seguem meus ensinamentos, e a Ighor Gabriel, Victor Luccas e Henrique Nascimento, pequenas estrelas em forma de netos, bálsamo para minha existência. 4 AGRADECIMENTOS Aos meus filhos Gille Simonne, Gilmário e Germânio, pela compreensão durante as ausências. Ao Professor e orientador Agnaldo Alves Ferreira. Aos meus ilustres amigos e colaboradores: Ademir Alves de Sousa, Fabrício Sena, Francisca Carvalho de Albuquerque e Perpétua Campos Mourão. 5 ¨A maneira mais segura, porém ao mesmo tempo mais difícil de tornar os homens menos propensos à prática do mal, é aperfeiçoar a educação¨. Cesare Beccaria 6 RESUMO O objetivo deste instrumento acadêmico é contribuir com as discussões polêmicas existentes em relação às propostas de Emenda à Constituição Federal, que tratam da redução da maioridade penal, de dezoito para dezesseis anos de idade, que estão sendo analisadas pelo Poder Legislativo. Aborda-se a situação em que vivem os detentos do Instituto de Administração Penitenciária do Amapá – IAPEN, na cidade de Macapá, Estado do Amapá, considerando a decadência do sistema prisional brasileiro, bem como as dificuldades e as contradições dos programas de ¨ressocialização¨ aplicados aos detentos que ali se encontram trancafiados nos muros da insensatez, à disposição da Justiça deste Estado. Palavras-chave: Redução da maioridade penal; Sistema prisional; Sistema prisional brasileiro. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...........................................................................................................09 CAPITULO I - MAIORIDADE CIVIL ........................................................................12 1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA.....................................................................................12 1.2 ACEPÇÃO JURÍDICA DO TERMO PESSOA......................................................13 1.2.1 Pessoa natural.................................................................................................14 1.2.2 Personalidade jurídica....................................................................................14 1.2.3 Estado da pessoa humana.............................................................................14 1.3 CAPACIDADE......................................................................................................15 1.3.1 Capacidade de direito e capacidade de fato.................................................15 1.4 INCAPACIDADE..................................................................................................16 1.4.1 Incapacidade absoluta....................................................................................17 1.4.2 Incapacidade relativa......................................................................................17 CAPÍTULO II – O CÓDIGO CIVIL DE 2.002..............................................................18 2.1 NOÇÕES HISTÓRICAS.......................................................................................18 2.2 ALTERAÇÕES DA MAIORIDADE EM RELAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DE 1.916...........................................................................................................................19 CAPÍTULO III - MAIORIDADE PENAL......................................................................21 3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO........................................................................................21 3.2 A MAIORIDADE PENAL À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.........22 3.3 IMPUTABILIDADE PENAL...................................................................................22 3.4 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA (LEI NO. 8.069/90)....23 3.4.1 Das Medidas Sócio-Educativas......................................................................24 3.4.2 Das Medidas Especificas de Proteção..........................................................26 3.5 LEI DE EXECUÇÃO PENAL – LEP (LEI Nº 7.210/84).........................................27 3.5.1 Os tipos de Estabelecimentos Penais...........................................................27 3.5.2 Aspectos relevantes sobre o Instituto de Administração Penitenciária do Estado do Amapá – IAPEN......................................................................................29 3.6 DIREITO ESTRANGEIRO....................................................................................30 3.7 PROPOSTAS DE EMENDAS À CONSTITUIÇÃO FEDERAL (PEC´S)...............31 3.8 CORRENTES CONTRÁRIAS E CORRENTES A FAVOR DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL ...............................................................................................33 8 3.9 PAPEL DA FAMÍLIA, DA SOCIEDADE (INCLUINDO ESCOLA) E DO ESTADO.....................................................................................................................37 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................41 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................45 ANEXOS ...................................................................................................................47 9 INTRODUÇÃO Com a promulgação da Constituição Federal Brasileira em 1988, o texto inicial nos demonstra que a sua finalidade é instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, igualitária e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem internacional, com a solução pacífica das controvérsias. O art. 227 de nossa Carta Magna, conhecida como ¨Constituição Cidadã¨, seus parágrafos e incisos são intocáveis, em decorrência de alegarem direitos e garantias individuais que a exemplo do que dispõe o art. 5º do mesmo diploma legal, são tidos como ¨cláusulas pétreas¨,que vem a ser a preservação dos princípios constitucionais por ela estabelecido, conforme explicitados no art. 60, parágrafo 4º: ¨Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:¨ Inciso IV ¨os direitos e garantias individuais¨. Ademais, no art. 227, CF está claramente definido como princípio basilar dos pais, da família, da sociedade e do Estado, o desafio de passar da democracia representativa para uma democracia participativa, atribuindo-lhes a responsabilidade de definir políticas públicas, controlar ações, arrecadar fundos e administrar recursos em beneficio de crianças e de adolescentes, priorizando o direito à vida, à saúde, à educação ao lazer à profissionalização, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de discriminação, exploração, violência crueldade e opressão. Estes princípios e direitos são a expressão da Normativa Internacional pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, promulgada pela Assembléia Geral em novembro de 1989 e ratificada pelo Brasil, mediante voto do Congresso Nacional, portanto, passou a integrar a lei e a fazer parte do Sistema de Direitos e Garantias, por força do parágrafo 2º do art. 5º da Constituição Federal que diz: ¨os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte¨. Outro diploma legal criado para atender as necessidades da criança e do adolescente, trata-se do Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA (Lei nº 8.069/90). Antes, não existia em nossa legislação uma política voltada às 10 necessidades dessa massa juvenil, haja vista a Política Nacional de ¨Bem Estar do Menor¨ (1964 a 1984) ter cunho assistencialista e paternalista. Com o advento do ECA, essa doutrina foi totalmente substituída pela doutrina ¨sócio-jurdico de proteção integral¨, proposta pela Organização das Nações Unidas e firmada pelo nosso país. Assim, o processo de reforma constitucional propondo a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, deve exigir atenção permanente e vigilância constante dos setores organizados da sociedade, a fim de garantir mobilização em defesa dos direitos conquistados. No decorrer deste instrumento de pesquisa, pretende-se contribuir com as discussões em relação às propostas de Emenda à Constituição Brasileira, que tratam da redução da maioridade penal e as conseqüências que irão provocar, caso essas propostas sejam aprovadas, considerando a falência do sistema prisional em diversas unidades da Federação, inclusive no Estado do Amapá. Fato este, comprovado através de dados coletados junto ao Instituto de Administração Penitenciaria do Amapá - IAPEN, no município de Macapá, o qual foi projetado para abrigar 756 (setecentos e cinqüenta e seis) presos, e, hoje encontra-se com mais de 1.800 (mil e oitocentos), de acordo com o censo penitenciário realizado naquele Instituto no ano 2007. No primeiro momento, farei um apanhado histórico da origem da acepção maioridade, objetivando compreender melhor o processo evolutivo desse fenômeno, levando-se em consideração que o Imperador do Brasil, D. Pedro I, quando renunciou o poder, o príncipe herdeiro contava apenas com seis anos de idade. Além da acepção da maioridade, será feita abordagem sobre a personalidade e a capacidade da pessoa civil, bem como da pessoa jurídica, com base nos fundamentos legais. Posteriormente, o objetivo será focar a maioridade no âmbito do Código Civil de 2002, fazendo um paralelo com o Código Civil de 1916, por este código ter sido elaborado em uma época em que o jovem não dispunha das mínimas condições de conhecimento, por absoluta inexistência de meios de comunicação que pudessem influenciá-los, tais como televisão, internet, etc.., razão pela qual foi considerado rigoroso, formal, individualista e patrimonial. Ao tratar sobre a redução da Maioridade Penal, essência deste instrumento acadêmico, darei ênfase ao Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA, doutrina 11 suficiente para a garantia dos direitos dos adolescentes em conflito com a lei, focando as principais Medidas Sócio-Educativas aplicadas aos maiores de 12 e menores de 18 anos, e as Medidas Especificas de Proteção. Será abordado ainda, neste capitulo, a Lei de Execuções Penais-LEP (Lei nº 7.210/84), cujo objetivo é proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado, destacando-se os principais tipos de estabelecimentos penais previstos na LEP (art. 82 a 104). E por fim, far-se-á, considerações sobre as principais propostas de emenda à Constituição Federal; as correntes contrárias e a favor à redução da maioridade penal; o papel da Família; da Sociedade (incluindo a Escola) e o papel do Estado. Considerando para o feito, o apoio das doutrinas jurídicas de renomados juristas e operadores de direito, dentro de uma visão não só legalista, mas, em especial uma análise histórica e sociológica do fenômeno da criminalidade envolvendo o infanto- juvenil. 12 CAPITULO I - MAIORIDADE CIVIL 1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA Com base nos anais da História do Brasil, o termo ¨maioridade¨ surgiu quando D. Pedro I, após sucessivos conflitos com a crescente oposição liberal e setores da elite, abdicou o Trono de Imperador do Brasil em 1831 em favor de seu filho, o príncipe Pedro Alcântara, que contava apenas com 06 anos de idade. À partir daí, e em cumprimento ao que determinava a Constituição, o Brasil passou a ser governado inicialmente por uma Regência Trina Provisória, ainda em 1831, depois por uma Regência Trina Permanente, eleita pela Assembléia-Geral, visto que o príncipe herdeiro (D. Pedro II) era menor de idade. Após a renúncia de D. Pedro I, instalou-se uma crise política institucional e a única saída de se alcançar a salvação nacional seria conduzir o príncipe ao trono, processo este nada fácil, levando-se em consideração a crise institucional instalada. A Constituição outorgada em 1824, determinava que para ocupar o trono brasileiro o imperador deveria ter 18 anos ou então o país deveria ser governado por um príncipe da família imperial de no mínimo 25 anos. Esta disposição foi modificada, antecipando-se a emancipação de D. Pedro II para 18 anos, durante o Ato Adicional, mas era preciso rebaixar ainda mais. O projeto da maioridade foi se tornando realidade. A ala dos progressistas, conhecidos como liberais, instituíram uma associação denominada Clube da Maioridade, e suas reuniões giravam em torno da melhor forma de se aclamar a tão desejada maioridade de D. Pedro II. E foi graças à atuação desse clube que este episódio chegou mais cedo. (KOSHIBA, 2006). E assim, apesar das divergências políticas entre as alas dos liberais e dos conservadores o Senado antecipou a maioridade de D.Pedro II ao proclamá-lo imperador aos 14 anos, sendo oficialmente coroado como Imperador do Brasil no dia 18/07/1841, na cidade do Rio de Janeiro, com quinze anos de idade. Fato este denominado ¨golpe parlamentar da maioridade¨. Alguns historiadores defendem a idéia de que a maioridade não foi uma manobra traiçoeira do parlamento, mas sim um “assentimento” por parte do jovem príncipe, que se encontrava pronto e ansioso para assumir o que era seu de direito. O reinado de D. Pedro II foi considerado um dos mais longo governo da 13 história brasileira,estendendo-se até a proclamação da República, em 1889. 1. 2 ACEPÇÃO JURIDICA DO TERMO PESSOA Antes de adentrar no tema central, Redução da Maioridade Penal, objeto deste instrumento acadêmico, faz-se necessário saber o significado da acepção jurídica do termo pessoa. Para a doutrina tradicional, o vocábulo "pessoa", indica que a palavra vem do latim persona, que, significa a máscara que os atores usavam antigamente para que suas vozes pudessem ser ampliadas. Na ciência jurídica, a pessoa vem a ser o primeiro elemento da relação jurídica, como afirma Giusti (2004). Segundo a mesma autora, e com base nos materiais de apoio pesquisados a respeito do assunto, analisamos que o termo "pessoa" recebeu três acepções distintas, a saber: a. acepção vulgar – este tipo torna-se incompatível com a linguagem jurídica, porque as pessoas jurídicas não são pessoas consideradas humanas, mas possuem uma conotação que lhes dá a conformação de pessoa; b. acepção jurídica – esta tem aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações. Nesta modalidade, existe um sujeito que tem a função de exercer a titularidade, podendo tanto ser o homem (pessoa física ou pessoa natural) ou um agrupamento de homens ligados a um interesse comum (pessoa jurídica ou pessoa coletiva). c. acepção filosófica - considera a pessoa como o indivíduo agindo de modo consciente na realização da finalidade moral, circunstância esta em que se destaca o homem ou uma coletividade no sentido amplo de pessoa. Ressalta-se que, na linguagem jurídica, as expressões "sujeito de direito" e "pessoa" são semelhantes e desdobram-se em duas realidades fundamentais: os seres humanos, denominados pessoas físicas, pessoas naturais, ou ainda pessoas de existência visível. E as instituições (públicas ou privadas), denominadas pessoas jurídicas, pessoas coletivas, pessoas morais, ou pessoas de existência ideal. 14 1.2.1 Pessoa natural O Ordenamento Jurídico Pátrio classifica a pessoa em duas categorias, a saber: pessoa natural e pessoa jurídica. Na visão de Diniz (2006 p. 514) ¨toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil¨, emprega o termo ¨pessoa¨ na acepção de todo ser humano, sem qualquer distinção de sexo. Como dispõe o art. 2º do Código Civil vigente, a pessoa natural somente adquire personalidade depois do nascimento com vida, ou seja, desde que a pessoa tenha respirado, tornando-se suscetível de direitos e deveres no âmbito da vida civil, concepção essa adotada pela Doutrina Majoritária, bem como pela legislação infraconstitucional supracitada. Quanto ao fim da personalidade, esta se dá com a morte, como prevê o art. 6º, CC, tal como dispusera o artigo 10 do Código Civil de 1916, in verbis: "A existência da pessoa natural termina com a morte". A lei ainda prevê casos especiais, como a morte presumida (ausentes e desaparecidos) e a comoriência, que ocorre com a morte simultânea de duas ou mais pessoas. 1.2.2 Personalidade jurídica As pessoas jurídicas são entidades sociais que objetivam alcançar um determinado propósito, portanto, sujeito de direitos e obrigações, como estabelece o art. 40,CC. A personalidade jurídica deriva do registro de seus atos constitutivos nos órgãos competentes, razão pela qual não deve ser confundido com os direitos da personalidade, pois os direitos da personalidade, como estabelecido no ordenamento jurídico, são direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a identidade, a liberdade, a reputação, a honra, a autoria e outros. 1.2.3 Estado da pessoa humana Com base em fundamentos legais, pode-se afirmar que o estado da pessoa natural representa a posição jurídica que ela ocupa no meio social, isto é, seu modo 15 particular de existir. Esta posição pode se dar de três formas: estado individual ou físico; familiar e político. Estado individual ou físico: caracteriza-se pela condição física da pessoa natural; atinge, portanto, sua capacidade em razão da idade, p.ex.: saúde ou sexo. Estado familiar: decorre da posição que o individuo ocupa dentro da entidade familiar; dele advém o vinculo conjugal e o parentesco, não havendo qualquer distinção quanto à consangüinidade ou afinidade. Estado político: advém da posição que a pessoa ocupa em uma sociedade politicamente organizada. Em síntese, estado da pessoa humana, é a maneira, o modo de ser da pessoa no que se refere à idade, sexo, saúde mental, saúde física, etc, intimamente ligados à capacidade civil. 1.3 CAPACIDADE Como já observado, qualquer pessoa tem personalidade jurídica, ou seja, aptidão para ser sujeito de direitos, sem qualquer discriminação. Porém, nem todas, podem exercer por si mesmas os atos da vida civil. Assim sendo, pode-se concluir que a capacidade é atribuição de uma pessoa que possui aptidão para contrair obrigações e exercer direitos, por si mesma. Sob o ponto de vista jurídico todos são igualmente dotados de personalidade civil, mas nem todos têm a mesma capacidade jurídica. Segundo Diniz, ¨a capacidade é a determinação de um âmbito pessoal de validade relacionada com um âmbito material normado¨ (2006, p.513). Para ilustrar este conceito, faz-se necessário saber os dois sentidos previstos na legislação sobre a capacidade, quais sejam: capacidade de direito e capacidade de fato, cujas finalidades veremos a seguir. 1.3.1 Capacidade de direito e capacidade de fato A capacidade de fato ou de exercício, como alguma doutrina denomina, representa a aptidão da pessoa para praticar pessoalmente os atos da vida civil. 16 Assim, embora o ser humano tenha capacidade para ser titular de direitos e obrigações na ordem civil, isto não significa a possibilidade de todos, pessoalmente, exercerem tais direitos. Quanto à capacidade de direito ou de gozo, entende-se que seja aquela que representa a aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, sem imposição de limitações pelo ordenamento jurídico, garantindo ao cidadão o exercício pessoal desses direitos. Ao contrário da capacidade de fato, que fica condicionada a requisitos legais que prevejam casos de incapacidade. Salienta-se que as pessoas que a lei impõe limitações são classificadas incapazes, como prevê os artigos 3º e 4º do Código Civil. Estas pessoas dependem de requisitos legais que regulam situações de incapacidade, a exemplo de um menor de idade não responde pelos seus atos, necessita de representante legal. 1.4 INCAPACIDADE Levando-se em consideração que toda incapacidade decorre de previsão legal, não se incluem como tais eventuais limitações ao exercício de direitos provenientes de ato jurídico inter vivos ou causa mortis, assim como a proibição legal de se contrair determinados negócios jurídicos. A exceção desta afirmativa, destaca-se como exemplo o caso do doador que, gravando o bem doado de inalienabilidade, deixará o donatário proibido de dele dispor. Outro exemplo: quando se proíbe ao ascendente vender bens ao descendente sem o consentimento dos demais descendentes. As hipóteses de incapacidade previstas em lei podem ser de dois tipos: incapacidade absoluta (art. 3º, CC) ou relativa (art. 4º, CC). O aspecto diferenciador de uma e outra está relacionado à idade imatura e às deficiências de ordem física ou mental. Tal é a situação do menor, desprovido do discernimento e maturidade para fazer seu próprio juízo; do pródigo, que não possui o senso preciso para preservar seu patrimônio; do amental, carecedor da faculdade para decidir o que lhe convém.17 1.4.1 Incapacidade absoluta A incapacidade absoluta , conforme previsto no art. 3º do Código Civil vigente, é a proibição total para a prática dos atos da vida civil, em razão da presunção absoluta de que o sujeito não tem condições para fazê-lo, seja em razão de sua imaturidade presumida, de enfermidade ou deficiência mental, seja em razão da impossibilidade, ainda que temporária, de discernimento, como preceitua (DINIZ, 2006). 1.4.2 Incapacidade relativa Como determina o art. 4º do Código Civil as pessoas relativamente incapazes a exercer certos atos, devem ser assistidas ou representadas, ou seja, são àquelas que podem praticar, por si, os atos da vida civil, desde que assistidas por quem de direito os represente, sob pena de anulabilidade, como determina o art. 171, inciso I, do CC. Assim, o mecanismo pelo qual é suprida a incapacidade relativa é a assistência de seus representantes legais, ou seja, o negócio é praticado em conjunto pelo relativamente incapaz e pelo representante (pais, tutor ou curador). 18 CAPÍTULO II – O CÓDIGO CIVIL DE 2.002. 2.1 NOÇÕES HISTÓRICAS Este diploma legal, criado através da Lei nº 10.406, de 10/01/2002, substituiu o Código Civil de 1.916, que vigeu durante oitenta e seis anos. Quando da vigência desse ordenamento jurídico, o mundo atravessava uma escala de transformações em quase todos os setores das atividades conhecidas. No Brasil ocorriam mudanças no sistema político, na organização social, no modelo econômico, enfim, na própria cultura política e jurídica, hoje em constante dinamismo. Mediante estudos realizados sobre este assunto, observou-se que o Brasil passou por significativas transformações, tais como: a derrubada das oligarquias, a implantação do Estado Novo, tendo como conseqüência a “Era Vargas”, o governo desenvolvimentista de Juscelino Kubistchek, o parlamentarismo interrompido de Jânio Quadros, que culminou com o Golpe Militar de 1.964, enfim, várias transformações cujas conseqüências deu-se com a implantação da ditadura que perdurou por duas décadas. Constatou-se ainda, que o Código Civil de 1.916 adotava uma forma rigorosamente fechada, formal, individual e patrimonial, cuja elaboração deu-se em uma época em que o jovem com vinte e um anos de idade não dispunha das mínimas e rudimentares condições de conhecimento, por absoluta inexistência dos meios de comunicação (jornais, revistas, TVs, rádio e Internet). Acredita-se que o legislador tenha adotado o critério biológico para a determinação da idade limite da maioridade civil em vinte e um anos, com fundamento de que os fatores ligados à pouca experiência e insuficiência mental, eram circunstâncias impeditivas de sua plena participação na vida civil. Com o advento do novo Código Civil/2002, foi abandonado o rigorismo formal e individualista do Código Civil de 1916, para dar lugar a uma concepção voltada ao espírito de valorização da pessoa humana, ligado aos aspectos sociais do direito. Tais inovações deveram-se mais aos progressos e às ideologias acumuladas nas últimas décadas, quando a maior parte das constituições dos países contemporâneos ao Brasil passaram a defender a bandeira dos interesses sociais e fundamentais como um de seus pilares, a exemplo do que ocorrera com a Constituição de 1988, cujo pressuposto principal é a valorização da pessoa humana. 19 2.2. ALTERAÇÕES DA MAIORIDADE EM RELAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DE 1.916. Após a criação do novo código civil, a população brasileira passou a ter mais afinidade com as mudanças ocorridas no território pátrio, principalmente porque este diploma legal visa a valorização da pessoa humana, preceito intimamente ligado aos aspectos sociais do direito, diferentemente do caráter individualista e patrimonial do Código Civil de 1.916. Esta legislação rigorosa reduziu a incapacidade do jovem maior de 16 e menor de 21 anos, em razão de fatores ligados à pouca experiência, e insuficiente desenvolvimento mental, circunstância impeditiva de sua plena participação civil, conforme já delineado nesta pesquisa. As hipóteses de incapacidade absoluta prevista no art. 5º do Código Civil, de 1916, eram as seguintes: Art. 5o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de 16 (dezesseis) anos; II - os loucos de todo o gênero; III - os surdos-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade; IV - os ausentes, declarados tais por ato do juiz., Presume-se que até certa idade o homem não possuía o discernimento indispensável ao exercício pessoal dos direitos. De acordo com o artigo 6º do mesmo diploma legal, eram relativamente incapazes: Art. 6o - São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de 16 e os menores de 21 anos; II - os pródigos; III - os silvícolas. Desse modo, o menor entre dezesseis e vinte e um anos podia livremente praticar os seguintes atos: a) servir de testemunha, inclusive em testamentos; b) testar; c) equiparar-se ao maior nas obrigações resultantes de atos ilícitos; d) alistar-se como eleitor, facultativamente entre dezesseis e dezoito anos. Podia também, o menor entre dezoito e vinte e um anos: 20 a) casar (para mulher a idade é de dezesseis anos, conforme artigo 183, XII do CC); b) requerer pessoalmente e isento de multa o registro de seu nascimento; c) pleitear perante a justiça do trabalho, sem assistência de pai ou tutor; d) exercer o direito de queixa, renúncia e perdão no Juízo criminal (artigos 34, 50, par. único, e 52 do Código Penal); Para muitos operadores de direito, o Código Civil de 2.002 representa mais a consolidação de mudanças legislativas e sociais verificadas nas oito últimas décadas do que propriamente uma inovação no nosso ordenamento jurídico, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Código de Defesa do Consumidor, das leis sobre a união estável, dentre outras. As inovações com relação à Constituição Federal de 1988, também são destacadas e consideradas de grande porte, eis que a família passou a se constituir pelo casamento civil ou religioso e também pela união estável. Outras inovações assinaladas dizem respeito a alteração do regime de casamento, a possibilidade de guarda dos filhos com um dos cônjuges, que detiver condições de criá-los, enfim. 21 CAPITULO III - MAIORIDADE PENAL 3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO A maioridade penal, também conhecida como "idade da responsabilidade criminal", é a idade a partir da qual o indivíduo pode ser penalmente responsabilizado. Esta é a idade em que o jovem torna-se inteiramente responsável pelos seus atos, como cidadão adulto. De acordo com o ordenamento jurídico vigente, considera-se alcançada a maioridade penal a partir do primeiro minuto do dia em a pessoa completará os 18 anos. É a regra do art. 10 do Código Penal Brasileiro. Essa norma jurídica doravante tratada, encontra-se descrita em três Diplomas Legais: 1) artigo 27 do Código Penal Brasileiro dispõe: ¨Os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial¨. 2) artigo 104 caput do Estatuto da Criança e do Adolescente que prevê: ¨São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos à medidas previstas nesta Lei. Parágrafo único – Para efeitos desta lei, deve ser considerada a idade do adolescenteà data do fato¨. 3) e artigo 228 da Constituição Federal: ¨São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial¨. Como já observado, o legislador adotou o critério biológico, justificando que o menor de 18 anos não tem personalidade formada, pois ainda não alcançou a maturidade de caráter, por isso acredita-se que a sua incapacidade para compreender a ilicitude do comportamento e para receber sanção penal. Com relação ao art. 104, ECA é o mesmo preceito constitucional, o que significa dizer que o menor envolto em situação de risco sujeitar-se-á às normas estabelecidas na legislação especial, cuja aplicação compete ao Juízo da Vara da Infância e da Juventude. O art. 228, CF, atribui aos indivíduos menores de dezoito anos posição jurídica subjetiva de inimputáveis perante o sistema penal brasileiro. Este direito vem a ser um direito à não-eliminação de uma posição jurídica. E quando se fala em 22 direito à não-eliminação de posições jurídicas está patente a interligação com um direito fundamental, portanto, a posição que se pretende perpetuar não é qualquer posição, mas sim uma posição jurídica fundamental, alicerçada no princípio da dignidade humana. No caso especifico da inimputabilidade penal entende-se que esta se constitui em um a dimensão particular do direito de personalidade. 3.2 A MAIORIDADE PENAL À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO O art. 5º do Novo Código Civil diz que a menoridade civil cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. Já o Código Penal Brasileiro (art. 27), fixou o limite de dezoito anos para que se dê à imputabilidade penal, assim considerada a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. E o Código de Processo Penal exige a nomeação de curador para acompanhar o réu menor de vinte e um anos durante a persecução penal. Resta saber se, em face de redução do limite de idade para atingir a maioridade civil, perdura a necessidade de nomear curador ao menor de vinte e um anos, conforme exige a lei processual penal, ou se a maioridade no processo penal foi reduzida juntamente com a maioridade civil, descabendo, assim, tal exigência. Alguns doutrinadores entendem a questão como resolvida, conforme expressa Gomes (2007): Todos os dispositivos processuais penais que enfocavam o menor de vinte e um anos como relativamente capaz foram afetados pelo novo Código Civil. Todos têm por base a capacidade do ser humano para praticar atos civis e, por conseguinte, processuais. Para o novo Código Civil essa capacidade é plena aos dezoito anos. Logo, todos os artigos citados acham-se revogados ou derrogados (lei nova que disciplina um determinado assunto revoga ou derroga a anterior). 3.3 IMPUTABILIDADE PENAL O modelo brasileiro da imputabilidade dos menores de 18 anos, embora tradicional na nossa doutrina, é na atualidade uma decorrência da norma incluída no art. 228 da Constituição Federal Brasileira/88. Como já assinalado, o Código Penal de 1940, fixou o limite de 18 anos para que se dê a imputabilidade penal, assim 23 considerada a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Adotou-se, assim, por razões de políticas criminais, o critério biológico, defendendo o pensamento de que o menor de dezoito anos seria inimputável, por presunção absoluta de que antes desse limite ele não estaria preparado psicologicamente para decidir acerca de condutas ilícitas, sujeitando-se à legislação especial, no caso, o Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA. Para se ter uma idéia, a Lei Federal 6.691/79, que instituiu o chamado ¨Código de Menores¨ consignava três limites de idade: com quatorze anos o infrator era inimputável; de quatorze até dezesseis anos ainda era considerado irresponsável, mas instaurava-se um processo para apurar o fato com possibilidade de cerceamento de liberdade, e finalmente entre dezesseis anos, o menor poderia ser considerado responsável, sofrendo pena. Esta legislação reafirmou o teor do Código Penal Brasileiro quando classificou o menor de dezoito anos como absolutamente inimputável. 3.4 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA (LEI Nº. 8.069/90) Este diploma legal, criado em 1990, instituiu a responsabilidade penal a partir dos dezoito anos de idade. Este marco foi estipulado por critérios políticos que se articula a um processo de maturação neurológica e psicológica que depende muito do ambiente social onde se vive. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA tem por finalidade subsidiar as discussões das propostas das emendas constitucionais, visto que, antes da sua criação não existia em nossa legislação uma política de atendimento que pudesse atender integralmente às necessidades de crianças e adolescentes. Hoje, tornou-se real a existência de uma política de Proteção Especial que atende as reivindicações da sociedade civil organizada em prol dos menores púberes e impúberes. Vale ressaltar ainda que o ECA não se restringe ao menor em situação de risco, visa principalmente a proteção integral à criança e ao adolescente. A proteção integral há de ser entendida como aquela que abrange as necessidades de um ser humano para o pleno desenvolvimento de sua personalidade. Assim, às crianças e aos adolescentes devem ser prestadas a assistência material, moral e jurídica, cujo 24 objetivo, como está expresso, é prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Ademais, toda assistência deve ser, de preferência, ofertada no seio de sua família, se possível à biológica (arts. 25 a 27, ECA). Se não for, em uma família substituta (arts. 28 a 52,ECA). O critério adotado pelo legislador, protegendo a pessoa até os dezoito anos, foi baseado no art. 1º da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 26/01/1989, assinada pelo governo brasileiro em 26/01/1990. A responsabilidade penal também encontra respaldo no art. 228 da Constituição Federal de 1988, bem como no art. 27 do Código Penal Brasileiro. Em caso de eventual modificação da idade penal mínima, estará o Brasil a descumprir o que foi estabelecido no tratado que se comprometeu a cumprir. E o descumprimento implica a responsabilização internacional do Estado violador. É oportuno destacar os três sistemas considerados basilares para sustentação do Estatuto da Criança e do Adolescente: 1. Sistema primário - trata das Políticas Públicas de Atendimento a criança e ao adolescente; 2. Sistema secundário - cuida das medidas de proteção dirigidas às crianças e adolescentes em situação pessoal ou social, enquanto vítimas que têm direitos violados; 3. Sistema terciário - trata das medidas sócio-educativas, aplicáveis aos adolescentes em conflito com a lei que passam à condição de vitimizadores. 3.4.1 Das medidas sócio-educativas As medidas sócio-educativas vão desde a advertência (Prestação de Serviços à Comunidade, Liberdade Assistida, Semi-Liberdade), até a privação de liberdade, exigindo-se flagrante ou ordem escrita e fundamentada do Juiz da Vara da Infância e da Juventude. Tais medidas são públicas, dadas pela sociedade através do Estado; individuais, pois cada sócio-educando deverá receber a medida de acordo com a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração¨(art. 112, § 1º, ECA); não cumulativas, não se somam aritmeticamente no 25 caso do adolescente cometermais de um ato infracional, porém influenciam na medida a reiteração de atos e/ou o grau de violência do ato; e não há uma correlação entre o fato e a medida, ou seja, a um ato infracional não se corresponde uma quantidade de medida aplicável, isto dá ao juiz, maior liberdade, que pode usar critérios mais plásticos podendo-se dizer, mais objetivo. E como determina o art. 3º do ECA, ato infracional é toda ¨a conduta descrita como crime ou contravenção penal¨. Pois bem, É forçoso indagar: qual a diferença entre prisão prevista no CP e a internação descrita no ECA? A medida de internação tem uma grande diferença em comparação à prisão propriamente dita aplicada ao maior de dezoito anos. A circunstância que distingue fundamentalmente uma da outra, segundo Figueiredo (2002) o Juiz Saraiva nos diz que esta ação está relacionada com local do cumprimento da sanção. Enquanto o maior de idade cumpre pena no sistema penitenciário, onde se misturam criminosos de graus de comprometimento e espécies diferentes, a internação aplicável ao menor é cumprida em estabelecimento próprio para adolescentes, dentro de um programa especial de educação escolar, profissionalização, com assistência pedagógica e psicoterápica, tudo em consonância com critérios previamente analisados dentro dos padrões internacionalmente definidos. Na verdade, a diferença entre a Justiça da Infância e da Juventude e a Justiça Penal é puramente de competência de jurisdição, pois ¨elevar¨ adolescentes à categoria de ¨presidiários¨ não acrescenta nada no caminho da evolução da segurança pública. Assim, o ECA privilegia as medidas restritivas de direitos, deixando a privação de liberdade para os casos mais graves, permitindo e incentivando a participação da família na recuperação dos menores infratores, o que certamente não ocorre no regime atinente ao sistema penitenciário. Para ilustrar esta pesquisa é de bom alvitre destacar as Medidas Sócio- Educativas contidas no ECA: Art. 112 - Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; 26 VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições. 3.4.2 Das medidas especificas de proteção As principais características da Doutrina da Proteção Integral estabelecem que é dever da família, da sociedade, da comunidade e do estado restabelecer o exercício do direito da criança que é ameaçado ou violado; que a política pública em beneficio da criança deve ser descentralizada e focalizada no município, e que as crianças já não são mais pessoas incompletas, mas sim pessoas completas que possuem a particularidade de encontrarem-se em desenvolvimento.Como estabelece art. 101, ECA: Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em entidade; VIII - colocação em família substituta. Parágrafo único. O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade. Apesar das criticas de alguns juristas em afirmar que o ECA é muito tolerante com os infratores, que não intimida os que pretendem transgredir a lei, diríamos que o ECA quer proteger a criança excluída socialmente, pois o menor é vitima de uma sociedade de consumo desumano e muitas vezes cruel. Daí a necessidade de ser tratado e amparado por políticas fortes, e não apenas punido do ponto de vista penal. 27 3. 5 LEI DE EXECUÇÃO PENAL – LEP (LEI Nº 7.210/84) A Lei de Execução Penal – LEP, criada pela Lei nº 7.210/84, tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Dentro do sistema prisional brasileiro existem vários tipos de estabelecimentos penais, destinados o cada cumprimento de sentença judicial (art.82,LEP), os quais passamos a identificar: 3.5.1 Tipos de estabelecimentos penais: De acordo com Marcão (2007), os tipos de estabelecimentos penais são os seguintes: a) PENITENCIÁRIA – É o estabelecimento penal em que se recolhem às pessoas condenadas a pena de privação da liberdade, para que aí as cumpram. Conforme os art. 87 e 88 da LEP destinam-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado, que contenha o mínimo de condições necessárias. Os condenados serão alojados em celas, pavilhões; suas acomodações devem ser edificadas correspondendo às necessidades humanas de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana. Para as mulheres, a penitenciária terá que assegurar acomodações e instalações adequadas, distintos, de acordo com a natureza, a idade e sexo, e o que dispõe a Constituição Federal/88, em seu artigo Art. 5º, XLVIII e no inciso L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação. Por isso esse direito previsto tanto na LEP (art. 89) como na CF, deve ser obedecido. Independente de sexo, a CF, XLIX - assegura aos presos o respeito à integridade física e moral, sendo que o Art. 90 refere ao direito de visitação. b) COLONIA AGRÍCOLA, INDUSTRIAL OU SIMILAR - É um tipo de estabelecimento, prédio ou local que se destina ao cumprimento, pagamento da pena no regime semi-aberto, isto é, lugar onde o condenado e apenado pratica atividades agropecuárias, tais como horticultura, piscicultura etc., ou atividades fabris, industriais ou manufaturadas (artesanato) pequenos fabricos de peças variadas (a exemplo de bolas de couro para futebol), marcenaria, serralheria dentre 28 outros aprendizados edificadores do reeducando. As acomodações poderão ser em cela coletiva, desde que atendidos os requisitos do parágrafo único do art. 88 desta LEP. c) CASA DO ALBERGADO - Como prevê o art. 93 da LEP, a Casa do Albergado é um tipo de estabelecimento, prédio ou local que possuem acomodações e instalações adequadas para ministrar palestras, localizado na área urbana, destinado aos detentos que cumpram pena privativa de liberdade, em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana. Esses não precisam permanecer em tempo integral por se tratar de regime aberto, é um tipo de compromisso que têm em comparecer a todas as reuniões que sirvam de orientação sócio-educativa e retornarem para pousar nos finais de semana. Não se trata deuma prisão e sim de um local de ¨ressocialização¨ do apenado estando ele livre durante a semana para trabalhar fora. d) CENTRO DE OBSERVAÇÃO - Todo Complexo Penitenciário deveria possuir um Centro de Observação, autônomo ou anexo para realização de exames gerais tais como, de sangue, de urina ou até mesmo de insanidade mental quando necessário, e pesquisas criminológicas. Na falta desse Centro, os Exames poderão ser realizados pela Comissão Técnica de Classificação, como estabelece o art. 96 da LEP. e) HOSPITAL DE CUSTÓDIA E TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO - Aos apenados, inimputáveis ou semi-inimputáveis, são destinados, a internação em Hospital de custódia ou em tratamento psiquiátrico, obedecendo às condições mínimas de ambiente, assim como o clima e espaço adequado (art. 88, par. Único, LEP). Todos os internados deverão se submeter ao exame psiquiátrico e a tratamento. Quanto ao tratamento ambulatorial deve ser realizado no mesmo local, na necessidade de outro local, deve ter dependência médica adequada para recebê- lo, por questão de segurança. f) CADEIA PÚBLICA - O Art. 102 da LEP é explícito ao afirmar que as cadeias públicas são destinadas aos presos provisórios, que estão aguardando uma decisão quanto ao seu destino, possui cadeias públicas em delegacias, comarcas, juizados. Cada local, os presos permanecem por pouco tempo com o intuito de atender e resguardar o interesse da justiça. As instalações devem atender as exigências mínimas referidas no Art. 88 e seu parágrafo único desta Lei. 29 Como podemos observar, a Lei de Execução Penal garante a todos os apenados/sentenciados estabelecimentos apropriados, conforme as penas que lhes foram impostas. Porém, na realidade, o que se vê são amontoados de pessoas trancafiadas nas unidades prisionais, as quais não oferecem condições mínimas de ressocialização, diante da falta de compromisso e responsabilidade na execução dos projetos sociais elaborados para este fim, além de outros fatores que culminam para essa realidade. 3.5.2 Aspectos relevantes sobre o Instituto de Administração Penitenciária do Amapá – IAPEN O Instituto de Administração Penitenciária do Estado do Amapá, foi criado para abrigar, 756 (setecentos e cinqüenta e seis) presos, mas de acordo com o censo penitenciário realizado em 2007, totalizam 1.800 (mil e oitocentos), ou seja, ultrapassa a população carcerária em 1.044 presos, amontoados sem condições de higiene, trocando experiências entre os mais diversificados criminosos ali existentes. Esta realidade é fruto de uma sociedade desprovida de programas culturais e ambientes saudáveis que estimule o jovem a sentir-se mais motivado para enfrentar a vida de forma consciente, e com responsabilidade. Com base nesses resultados, questiona-se: Será que a redução da maioridade é uma opção plausível, tendo em vista o que acontece nas penitenciárias, isto é, pessoas (detentos) brigando por um espaço físico, vivendo em condições sub-humanas? Em nosso Estado a realidade não é diferente, notadamente porque a demanda é muito superior à oferta de espaço, ocasionando, por via de conseqüência, amontoados de seres humanos. Para se ter uma idéia, em média são encaminhados diariamente ao IAPEN cinco detentos, os quais são colocados juntos aos demais, independentemente do crime que cometera. E mais, muitos destes presos nem deveriam estar ali, mas por razões diversas, alguns em regime provisórios continuam encarcerados, em perfeito desrespeito ao regime legal pátrio. Vale ressaltar que o custo de um preso no sistema penitenciário amapaense está em torno de R$ 1.053,00 (hum mil e cinqüenta e três reais), por mês. Se levarmos em conta a total deficiência material que sofre o IAPEN, com tão falada e 30 repetida falta de recursos, somos obrigados a questionar: de onde virão os recursos para ampliar as instalações para abrigar os novos detentos menores de idade? A resposta é taxativa: não virão, dar-se-á um “jeitinho” de acomodá-los, incentivando a “união” entre os reeducandos, apertando-os em celas pequenas, imundas e anti-higiênicas, em total afronta os direitos da dignidade da pessoa humana. É nesse cenário que se deseja incluir os delinqüentes menores de dezoito anos, caso a maioridade penal venha a ser aprovada? Acredita-se que em um sistema assim, caótico e ineficaz, a pena não pode jamais significar ressocialização, como se apresenta no discurso político do Estado, mas sim a certeza de reincidência, posto que dificilmente um condenado que ali permaneça por um determinado período conseguirá reabilitar-se para o convívio social saudável, sem voltar praticar mais crimes. Outro questionamento: De que adianta reduzir os índices de idade para efeitos penais se não se buscar reduzir os índices de analfabetismo que vigoram no País? Será que ao reduzir a maioridade penal para dezesseis anos, a sociedade ficará mais tranqüila e segura? Estaremos livres de novos crimes? Obviamente que não, tendo em vista que o efeito será apenas o de prender e punir mais pessoas, especificamente os menores infratores. A única certeza que se poderá ter dessa medida que prega a redução da maioridade penal é de que ocorrerá um aumento significativo do número de sentenciados a cumprir pena nos presídios de todo o País, em especial em nosso Estado, pois se este adotasse uma política de prevenção eficaz, certamente evitaria o “engaiolamento” de pessoas em presídios que retratam a retórica fracassada de seus governantes que somente se lembram que o sistema criminal existe quando ocorrem fugas ou rebeliões. 3.6 DIREITO ESTRANGEIRO Como o foco deste trabalho é a redução da maioridade penal, torna-se necessário fazer um paralelo com alguns países que adotam legislações específicas para evitar a impunidade penal. Na França, por exemplo, a maioridade penal é de dezoito anos, mas jovens a partir dos treze e até os dezoito podem ser penalizados. 31 Na Inglaterra, a maioridade penal é de vinte e um anos para crimes comuns. Tratando-se de crimes hediondos o infrator é penalizado a partir dos dez anos. Em Portugal o jovem pode ser condenado a partir dos dezesseis anos, o mesmo ocorrendo na Argentina, Espanha, Bélgica e Israel. Na Alemanha e Haiti, a partir dos quatorze anos. O quadro seguinte ilustra o limite para a imputabilidade penal, em crimes mais graves em alguns países do mundo. Quadro nº 01 Colômbia 18 anos Peru 18 anos Brasil 18 anos Etiópia 09 anos Escócia 08 anos Itália 14 anos Polônia 13 anos Japão 14 anos Egito 15 anos Estados Unidos Varia conforme a legislação estadual. Apenas 13 estados fixaram uma idade mínima legal, a qual varia entre 6 e 12 anos. Irã 09 para mulheres e 15 para homens. Fonte: Elaboração Própria 3.7 PROPOSTAS DE EMENDAS À CONSTITUIÇÃO FEDERAL (PEC´s) De acordo com os termos do art. 356 do Regimento Interno do Senado Federal, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania é competente para apreciar a matéria sobre as Propostas de Emenda à Constituição nº 18 e 20/1999, nº 03/2001, 26/2002, 90/2003 e 09/2004, que alteram o art. 228 da Constituição Federal/88 para reduzir a maioridade penal. 32 Além dessas PEC`s existem no Congresso Nacional aproximadamente 50 propostas de emenda à Constituição-PEC, sob a falsa crença de que essa seria uma eficiente medida no combate à criminalidade no país. Na Câmara, a mais antiga PEC tramita na Casa desde 1993, ou seja, há quinze anos. As seis PEC´s referidas passaram a tramitar em conjunto no SenadoFederal em razão da aprovação do requerimento nº 743/2004, fundamentado no art. 258 do Regimento Interno do Senado Federal – RISF. De acordo com o voto da Comissão a PEC nº 20/1999, de autoria do Senador José Roberto Arruda foi aprovada com a seguinte emenda: Dê-se ao art. 228 da Constituição Federal, de que trata o art. 1º da Proposta de Emenda à Constituição nº 20, de 1999, a seguinte redação: Art 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos, sujeitos às normas da legislação especial. Parágrafo único. Os menores de dezoito e maiores de dezesseis anos: I - somente serão penalmente imputáveis quando, ao tempo da ação ou omissão, tinham plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, atestada por laudo técnico, elaborado por junta nomeada pelo juiz; II – cumprirão pena em local distinto dos presos maiores de dezoito anos; III – terão a pena substituída por uma das medidas sócio-educativas, previstas em lei, desde que não estejam incursos em nenhum dos crimes referidos no inciso XLIII, do art. 5º, desta Constituição. Eis as PEC´s analisadas pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania de Justiça do Senado Federal: - PEC nº 18/1999, prevê que nos casos de crimes contra a vida ou o patrimônio cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, são imputáveis os infratores com dezesseis anos ou mais de idade; - PEC nº 20/1999, torna imputáveis, para quaisquer infrações penais, os infratores com dezesseis anos ou mais de idade, com a condição de que, se menor de dezoito anos, seja constatado seu amadurecimento intelectual e emocional; (Autoria: Senador José Roberto Arruda); - PEC nº 03/2001, também torna imputáveis, para quaisquer infrações penais, os infratores com dezesseis anos ou mais de idade, com a condição de que, se menor de dezoito anos, seja constatado seu amadurecimento intelectual e emocional e o agente seja reincidente; 33 - PEC nº 26/2002, estabelece que os maiores de dezesseis e os menores de dezoito anos de idade são imputáveis, em caso de crime hediondo ou qualquer crime contra a vida, se ficar constatado, por laudo técnico elaborado por junta nomeada pelo juiz competente, a capacidade do agente de entender o caráter ilícito de seu ato; - PEC nº 90/2003, torna imputáveis os maiores de treze anos em caso de prática de crime hediondo; - PEC nº 09/2004, prevê a imputabilidade para o menor de dezoito anos, desde que tenha praticado crime hediondo ou de lesão corporal grave e seja constatado que possui idade psicológica igual ou superior a dezoito anos, com capacidade para entender o ato ilícito cometido e determinar-se de acordo com esse entendimento. O assunto da redução da maioridade penal voltou a ser destaque quando ocorreu a morte atroz do garoto João Hélio, de seis anos, após ser arrastado por sete quilômetros nas ruas do Rio de Janeiro no dia 08/02/2007, cujos acusados envolveram menores de idade. A grande indagação é a seguinte: vale a pena reduzir o limite temporal da imputabilidade? E no que a sociedade seria beneficiada ou prejudicada com tal medida? Sabe-se que o sistema brasileiro, dentre os existentes, é um dos piores, por uma série de razões e motivos que não merecem ser analisados neste momento. As prisões encontram-se abarrotadas, não se observam as regras mínimas de higiene, de espaço, enfim, de dignidade da pessoa humana, limitando-se tais presídios em meros depósitos onde se guardam pessoas, com o único objetivo de mantê-las longe do convívio social, e com a certeza de que lá não sairão até que suas penas sejam integralmente cumpridas. 3.8 CORRENTES CONTRÁRIAS E CORRENTES A FAVOR DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL a) Correntes Contrárias: As propostas visando à diminuição de responsabilidade penal devem ser examinadas com serenidade, buscando atingir todos os aspectos básicos da 34 questão, sem deixar de considerar as circunstancias individuais e sociais, sem perder de vista os valores éticos implícitos na condição humana e as razões pelas quais se confere tratamento legal diferente às crianças e os adolescentes. Barbato (2004), nos diz que no artigo publicado na Gazeta Mercantil dia 29/04/2001 ¨A razão para manter a maioridade penal aos dezoito anos¨, o professor Dalmo de Abreu Dallari assim afirma: ¨...não há justificativa para que se proceda ao rebaixamento da idade de responsabilidade penal. Tal medida seria uma violência ética, sobretudo porque, como é publico e notório, na quase totalidade dos casos que são divulgados pela imprensa com estardalhaço, os adolescentes infratores são pobres¨. Acrescenta ainda: a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos trará mais prejuízos dos que benefícios à sociedade, pois jogará definitivamente no mundo da criminalidade adolescentes que, se receberem a aplicação das medidas sócio-educativas, inclusive privação de liberdade nas condições previstas em lei, estará sendo preparada para a convivência pacifica e respeitosa. O ilustre Professor Miguel Reale Junior, durante a Audiência Pública realizada em 10/11/1999, na cidade de São Paulo-SP também falou sobre o assunto dizendo: O mito de que o Brasil está entregue a um alarmante crescimento da criminalidade grave praticada por adolescentes não corresponde à realidade dos números¨. E diz mais: “no Brasil, não é a pobreza a produtora de atos delituosos, mas sim a imensa desorganização social, por isso há que se voltar a atenção para as políticas públicas e sociais muito mais do que para a resolução de questões dessa grandeza por mera alteração constitucional ou legal”. (2001, p. 170) O Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, manifestou-se contra qualquer redução na maioridade penal, alegando que ¨o problema não é só social, mas advém de um conjunto de fatores¨ Disse ainda que “o Estado não pode tomar decisões com base na emoção¨, se ¨a gente aceitar a diminuição da idade para 16 anos, amanhã estarão pedindo 15, depois para 10, depois para 9, quem sabe algum dia queiram punir até o feto se souberem o que vai acontecer no futuro” O governador de São Paulo, José Serra também declarou-se contrário à redução da maioridade penal, porém defende o aumento da pena máxima para punição de menores infratores, prevista no ECA, de 3 para 10 anos. Na reunião de governadores do Sudeste ocorrida em 09/01/2007, Serra incluiu esta idéia entre as 35 12 propostas que apresentou para reduzir a criminalidade, sendo a pena máxima de 10 anos “no caso de infrações praticadas com violência ou com grave ameaça à pessoa, como estupro e latrocínio”. Como podemos observar, os defensores dessas propostas são categóricos em afirmar que o problema não está na redução da maioridade, pura e simplesmente, argumentam que antes de se pensar na alteração das leis, deveriam primar pela efetividade das regras existentes, através da correta e eficaz aplicação das diretrizes constantes do Estatuto da Criança e do Adolescente em todos os seus níveis, com interligação de sociedade e Estado. Considerar que o adolescente causador de ato infracional seja o responsável pela onda crescente da criminalidade, com reflexos danosos no seio da população, é um tremendo equívoco. Acredita-se que as causas são maiores, complexas e transcendem o entendimento mediano da população, que clama por justiça em sua sede de vingança, como na época remota da antiguidade onde imperava as regras da vingança privada. Isto se deve em grande parte à desigualdade social que assola o país, associada à negligência do Estado e à mudançade fatores culturais e comportamentais que se inseriram no meio urbano com o advento da modernização. Além da extensa gama de instrumentos de cidadania e responsabilização de que dispõe o ECA, outro caminho que pode-se perseguir é o do combate à miséria e a desigualdade social, seguramente a origem da crescente criminalidade, cujo empenho deve partir principalmente de parte do Estado, de modo a reintegrar o jovem infrator à sociedade, utilizando-se de ações preventivas, que, como se sabe, custa menos aos cofres públicos. Acrescenta-se ainda, se o problema fosse à idade, o sistema prisional para os maiores de dezoito anos não estaria tão sobrecarregado como se encontra. Nesse sentido, independente da delinqüência que o jovem possa ter cometido, deve ser oferecida uma segunda chance de reintegração social, passando por um processo de sanção sócio-educativa, ao invés de deixá-los sob posição de plena responsabilidade criminal aos dezesseis anos, esquecendo-se, assim, os direitos que o próprio ECA estabeleceu em seus artigos. Por isso, antes de debater a redução da maioridade penal como tratamento da insegurança pública, deve-se examinar o motivo pelo o qual esses jovens caíram nas malhas do crime, já que como é sabido as crianças nascem puras e desprovidas de toda e qualquer maldade. 36 b) Correntes a favor: Os defensores da redução da maioridade penal, em linhas gerais, consideram que: • o atual Código Penal brasileiro, aprovado em 1940, reflete a imaturidade juvenil daquela época, e que hoje, passados 68 anos, a sociedade mudou substancialmente, seja em termos de comportamento (delinqüência juvenil, vida sexual mais ativa, uso de drogas), seja no acesso do jovem à informação pelos meios de comunicação modernos (televisão, Internet, celular, etc), seja pelo aumento em si da violência urbana. Não quer dizer que os adolescentes de hoje são mais bem informados que os do passado; • que o adolescente de hoje, a partir de certa idade, geralmente proposta como 16 anos, tem plena consciência de seus atos, ou pelo menos já tem o discernimento suficiente para a prática do crime; algumas vezes, este argumento é complementado pela comparação com a capacidade (ainda que facultativa) para o voto a partir dos 16 anos, instituída pela Constituição Federal de 1988. O argumento da votação aos 16 anos é bastante infundado, já que nesta idade o adolescente tem voto facultativo e não pode candidatar- se aos cargos.; • que justificar a não redução da maioridade pela não resolução de problemas sociais é um raciocínio meramente utilitarista e que a lei deve ser construída de forma justa, a fim de inocentar os realmente inocentes e responsabilizar os realmente culpados, na medida correta e proporcional em cada caso. Os defensores dessa corrente acreditam que o Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA falha por não punir com a desejável medida os delitos praticados pelos adolescentes, fazendo com que, pela sua brandura e condescendência, seja estimulada a prática criminosa. A pena que se aplica em casos extremos é a da internação em instituições apropriadas por um período de, no máximo, três anos, a partir do que o infrator passa a ser encarado sem nenhuma restrição, ou seja, sem antecedentes, não importando a gravidade do crime praticado. Segundo Coutinho (2003), no artigo intitulado "O menor delinqüente", o Professor Leon Frejda Szklarowski afirma que “não se justifica que o menor de dezoito anos e maior de quatorze anos possa cometer os delitos mais hediondos e graves, nada lhe acontecendo senão a simples sujeição às normas da legislação especial”. 37 A questão da maioridade eleitoral é também um dos motivos a que se apega a corrente defensora da redução da idade penal. A propósito, o mesmo legislador constituinte que concluiu pela maturidade do jovem para escolher um presidente da república deixa de considerar o mesmo jovem como responsável pela prática de condutas delituosas, enquadrando o menor de dezoito anos como inimputável, tal como expresso no artigo 228 da Constituição Federal. Diante dessa contradição cometida pelo próprio poder constituinte, muitos defensores indagam se seria mais complexo para o jovem de dezesseis anos entender toda a importância dos poderes executivo, legislativo e judiciário dentro do contexto maior da república, com as funções específicas do processo eleitoral, ou ter conhecimento de que atos como matar, roubar, seqüestrar, etc. Aos olhos do cidadão comum o processo eleitoral é o mais complicado, daí a necessidade da revisão do ponto de vista constitucional no que concerne à maioridade penal. Para Junior (2001), o responsável maior pela criação do Novo Código Civil, já afirmava, em 1.990, que a necessidade da mudança na área penal, relacionando-a com a recente novidade que o legislador-constituinte houvera inserido na Constituição de 1.988 ao abreviar a idade eleitoral do brasileiro. Ainda pesa contra a atual idade penal o fato de criminosos estarem usando, na prática de assaltos seguidos de morte, menores entre quatorze a dezoito anos, na certeza de que estes não vão para a cadeia. É comum a imprensa noticiar, em escala sempre crescente, a participação de menores em crimes hediondos, desde homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes, extorsão mediante seqüestro, estupro, até latrocínio, quase sempre em concurso com maiores de idade, que lhes servem de mentores e aos quais acabam se tornando uma espécie de escudo, na medida em que assumem sua parcela de culpa. 3.9 PAPEL DA FAMÍLIA, DA SOCIEDADE (INCLUINDO ESCOLA) E DO ESTADO O papel da família não é só ensinar, mas educar. Educar com amor, com respeito, dignidade, impondo limites na relação, para que as crianças cresçam com base em princípios fundamentais de valorização da vida. 38 É notório que a criança sofre influência das pessoas que a cercam. Essa influência acontece de forma natural, e, geralmente, inconsciente. Para as crianças, os adultos são vistos como referenciais que modelam seus comportamentos, e a forma como esses adultos agem diante de situações boas, prazerosas ou situações difíceis, servem de parâmetro para as crianças conduzirem as suas vidas. Fundamentalmente, o papel da família influencia muito a criança a escolher seu futuro, ser um cidadão de bem, dotado de valores. Em muitos casos a falta de tempo dos pais causa graves problemas dentro do lar. Alguns não sabem nada sobre seus filhos, vivem ausentes de casa, devido as atividades que ocupam fora do lar. Outros, não têm tempo para conversar com as crianças. Os filhos também não percebem a casa como um lar, apenas moram nela, sem dar importância. A questão da proteção também influencia na formação da criança, pois esta atitude deixa os filhos totalmente dependentes, precisando de atenção e ajuda constante de outras pessoas, pois não conseguem andar sozinhos. Os pais considerados autoritários, dominadores, exigentes ajudam a criar filhos impulsivos e agressivos, desenvolvendo neles uma personalidade insegura e instável. Enfim, a família, mesmo que esteja desestruturada é considerada o alicerce para a garantia de um futuro brilhante e promissor. A sociedade tem um papel de grande relevância nesse aspecto, tratando a criança com respeito e dignidade, como previsto na legislação especial, e neste contexto inclui-se a escola. Sabe-se que o Direito a Educação é um direito de todos, está expresso no Estatuto da Criança e do Adolescente ECA, e na Constituição Federal Brasileira, assunto este intimamente relacionado com o adolescente infrator. Quando se tratado envolvimento do adolescente em um ato infracional a escola possui dois papéis: O primeiro é de caráter preventivo, com a promoção de uma cultura de paz e tolerância, por meio de uma sólida formação para os valores. O segundo é receber o adolescente que já se tornou um infrator e retorna à vida e aos estudos. A atitude básica da escola nesse caso deve ser de inclusão. O sistema de ensino precisa se preparar para lidar melhor com esse jovens e os problemas que trazem consigo. Como frisamos anteriormente, a educação é um direito de todos, sem exceção, e o adolescente que tenha um conflito com a lei não pode ser excluído dessa realidade. Se olharmos a realidade atual, percebe-se claramente que as 39 crianças e adolescentes em situação de risco fazem parte da clientela da educação, ou seja, professores, diretores, supervisores e orientadores não recebem capacitação especifica para lidar com essa clientela. Essa é uma grande falha das redes públicas e particulares de ensino, por não acolher o aluno e sua realidade familiar, comunitária ou cultural. Nesse contexto de extrema exclusão social, observa-se o fenômeno da marginalização que é o contingente populacional não integrado, não participante do sistema produtivo, e a conseqüência dessa realidade provoca o deslocamento de amplas massas humanas do meio rural à procura de melhores condições de vida e de trabalho nas áreas urbanas. Com isso, acarreta crescimento demográfico que resulta no processo de industrialização e modernidade, razão pela qual a marginalidade torna-se uma prática moldadas pelas condições sociais e históricas em que os homens vivem. Quanto ao papel do Estado na formação do cidadão, sabe-se que o menor marginalizado não surge por acaso. Ele é fruto de um estado de injustiça social crônico que gera e agrava a miséria em que sobrevive a maior parte da população. Na medida em que a desigualdade econômica e a decadência moral foram crescendo nesses últimos anos, o número de menores empobrecidos também foi aumentando. E a explicação para tudo isso? A causa real deste fenômeno acredita-se que vem do próprio modelo econômico adotado pelo governo que apresenta um sistema educacional fragilizado, com professores desmotivados, em face das condições de trabalho e por políticas de remuneração inexpressivas. A realidade encontrada pelo menor em casa, também pode contribuir para sua inclusão no mundo do crime. Não que todo menor desprovido economicamente, necessariamente tenha que se envolver com a criminalidade, mas é forçoso asseverar que diante das condições precárias vivenciadas em casa, o menor possa se ver tentado a praticar os chamados atos infracionais na busca da satisfação de seu desejo através de um bem material, por exemplo. Sob os aspectos sociológicos, percebe-se que o menor é vitima de uma sociedade de consumo desumana e muitas vezes cruel, razão pela qual precisa ser tratado e amparado por políticas sociais fortes e não apenas punido do ponto de vista penal. Cabe ao Estado, responsável pela elaboração e aplicação das leis, chamar para si a responsabilidade pelo crescimento do número de menores 40 infratores, e certamente perceberá a flagrante omissão e a total falta de políticas sociais que propiciem condições dignas às famílias de menor poder aquisitivo. E mais, que a vida social requeira mais do que qualquer lei punitiva, exige solidariedade, fraternidade e igualdade de oportunidade para todos. Portanto, cada segmento necessita fazer a sua parte, a família com o papel basilar, a sociedade (inserindo a escola), e principalmente o Estado que fundamentalmente possa criar programas sociais sérios que garantam moradia, saúde, educação e trabalho, ou seja, políticas de inclusão séria, eficientes, capazes de envolver a grande massa dos desfavorecidos. Assim, evita-se que um grande número de adolescentes sejam encarcerados dentro de um sistema prisional que intensifica a cada dia os problemas que os levaram para lá. 41 CONSIDERAÇÕES FINAIS Há quem argumente que a redução da maioridade seria plenamente justificável em face da capacidade de entendimento do menor de dezesseis anos, pois, a ele é dado o direito de votar. Tal argumento não merece respaldo, pois além do fato de o voto para eles não ser obrigatório, também estão sujeitos às medidas do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, inclusive à medida máxima da internação, que equivale à prisão para os adultos. Defender a postura de redução da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos, é andar na contramão da história, pois se sabe da falência do sistema prisional brasileiro. As pessoas pouco informadas, que tendem a defender a redução, e isto o fazem impulsionadas pelo calor dos acontecimentos, por mero casuísmo, com sede de vingança, deveriam examinar com atenção quais seriam as medidas mais justas para conter a criminalidade. Conforme noticiários dos telejornais, os dois maiores grupos de criminosos que atualmente aterrorizam as maiores cidades do Brasil nasceram dentro de nossos presídios: o Comando Vermelho, no Rio, e o Primeiro Comando da Capital, em São Paulo. Isso reforça a idéia da ineficiência dos nossos presídios para a recuperação ou ressocialização dos criminosos, pois dificilmente um condenado que ali permaneça por um determinado período conseguirá reabilitar-se para o convívio social, sem praticar mais crimes. No contexto deste trabalho, analisamos as duas correntes que se posicionam de maneira sólidas, argumentadas e patrocinadas por juristas renomados no cenário penal brasileiro quanto as propostas de emendas à Constituição. Aqueles que defendem a redução alegam que o jovem com dezesseis anos já se encontra maduro em todos os sentidos, de modo a entender claramente o caráter ilícito de sua conduta e a determinar-se de acordo com esse entendimento. Outros entendem que o amadurecimento ainda não é pleno e que a redução da idade penal traria um retrocesso, pois, o sistema penitenciário aplicado ao maior de dezoito anos é ainda arcaico e rudimentar. Questiona-se: Se o menor hoje com dezesseis anos tem o senso de discernimento mínimo para saber com segurança o que é uma ilicitude, e o mais importante, reconhecendo o caráter errado de sua atuação (matar, roubar, estuprar, etc.), saber que tais atos lhe sujeitará a ir para a cadeia? 42 Diante dos avanços verificados na sociedade e do progresso intelectual vivido pelo jovem com dezesseis anos, não há dúvida que a resposta é afirmativa, principalmente levando-se em consideração que nessa idade, é permitido exercer o direito soberano do voto. No entanto, existe um grande abismo entre a aptidão à maioridade plena, ou seja, estar apto a assumir a responsabilidade por um crime praticado, e a estrutura de que dispõe o sistema penitenciário brasileiro para albergar criminosos, hoje corrompido, cruel, e, o que é mais grave, dissociado do princípio basilar do estado de direito. Nesse sentido, a idade penal não deve ser reduzida enquanto existir a atual estrutura, pois como já ocorre com os criminosos, a cadeia de hoje, longe de cumprir com sua função ressocializadora, funciona como uma espécie de escola para formação de delinqüentes. Inserir nessa estrutura menores de dezoito anos seria uma agressão à sociedade e um retrocesso às funções do Estado que em última análise tem o dever constitucional de prover o bem estar e a dignidade da pessoa humana, princípios, excessivamente enfatizados e valorizados no novo Código Civil. A
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