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UFF Educacao Tese JanePaiva

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JJAANNEE PPAAIIVVAA 
EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDEE JJOOVVEENNSS EE AADDUULLTTOOSS:: 
DDIIRREEIITTOO,, CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS EE SSEENNTTIIDDOOSS 
NNiitteerróóii,, nnoovveemmbbrroo 22000055 
JJAANNEE PPAAIIVVAA 
EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDEE JJOOVVEENNSS EE AADDUULLTTOOSS:: 
DDIIRREEIITTOO,, CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS EE SSEENNTTIIDDOOSS 
TTeessee aapprreesseennttaaddaa aaoo PPrrooggrraammaa ddee PPóóss--
ggrraadduuaaççããoo eemm EEdduuccaaççããoo ddaa UUnniivveerrssiiddaaddee 
FFeeddeerraall FFlluummiinneennssee,, ccoommoo rreeqquuiissiittoo àà 
oobbtteennççããoo ddoo ttííttuulloo ddee DDoouuttoorr.. 
OOrriieennttaaddoorr:: PPrrooff.. DDrr.. OOssmmaarr FFáávveerroo 
NNiitteerróóii,, nnoovveemmbbrroo 22000055 
 P149 Paiva, Jane. 
Educação de jovens e adultos: direito, concepções e sentidos /
Jane Paiva. – 2005. 
480 f. 
Orientador: Osmar Fávero. 
Tese (Doutorado) – Universidade Federal Fluminense, 
Faculdade de Educação, 2005. 
Bibliografia: f. 462-477. 
1. Educação de jovens e adultos. 2. Alfabetização de adultos. 3. 
Direito à educação. I. Fávero, Osmar. II. Universidade Federal 
Fluminense. Faculdade de Educação. III. Título. 
CCDDDD 337744 
JJAANNEE PPAAIIVVAA 
EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO DDEE JJOOVVEENNSS EE AADDUULLTTOOSS:: 
DDIIRREEIITTOO,, CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS EE SSEENNTTIIDDOOSS 
NNiitteerróóii,, 1111 ddee nnoovveemmbbrroo ddee 22000055.. 
PPrrooffªª.. DDrrªª.. NNiillddaa AAllvveess –– UUEERRJJ 
PPrrooff.. DDrr.. OOssmmaarr FFáávveerroo -- UUFFFF 
PPrrooff.. DDrr.. PPaauulloo CCééssaarr CCaarrrraannoo -- UUFFFF 
PPrrooff.. DDrrªª.. SSôônniiaa MMaarriiaa RRuummmmeerrtt –– UUFFFF 
PPrrooff.. DDrr.. TTiimmootthhyy DDeenniiss IIrreellaanndd –– UUFFPPBB 
PPaarraa VViiccttoorr HHuuggoo,, nnoossssoo pprroojjeettoo ddee vviiddaa,, aa qquueemm aass 
ooppoorrttuunniiddaaddeess ccoomm aa ccuullttuurraa eessccrriittaa ddeessccoorrttiinnaarraamm 
pprreeccoocceemmeennttee aa lleeiittuurraa ddaa ppaallaavvrraa,, aammpplliiaannddoo ooss 
hhoorriizzoonntteess ddaa lleeiittuurraa ddoo mmuunnddoo,, ee ccoomm qquueemm tteennhhoo 
aapprreennddiiddoo--eennssiinnaaddoo aa vviivveerr oo pprreesseennttee,, rreeeennccaannttaannddoo--oo.. 
AA JJoossiimmaarr,, cciiddaaddããoo ssíímmbboolloo ddoo qquuee aass ooppoorrttuunniiddaaddeess 
eedduuccaacciioonnaaiiss eemm qquuaallqquueerr tteemmppoo ppooddeemm ffaazzeerr ccoomm uumm 
úúnniiccoo hhoommeemm —— rraazzããoo ssuuffiicciieennttee ppaarraa aaccrreeddiittaarr nnoo 
ddiirreeiittoo àà eedduuccaaççããoo ddee jjoovveennss ee aadduullttooss ppaarraa ttooddooss ooss 
hhoommeennss ee mmuullhheerreess.. 
AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS 
Muitos são os agradecimentos a fazer, por ocasião do término deste trabalho. 
Reconhecer aqueles que me ajudaram a realizá-lo, mesmo sem saber, e generosamente dizer 
obrigada!, compartilhando as alegrias — muito maiores que as dores — de chegar até aqui. 
Ao meu orientador, Prof. Osmar Fávero, pela confiança em mim e no tema — 
presença e firmeza na condução dessa pesquisa. 
Pela minha disciplina com a vida intelectual, devo começar por agradecer à UERJ, na 
figura de meus pares e direções, que compreenderam meus limites em algumas negativas de 
que precisei lançar mão, e nos tempos roubados em que passei dedicada às atividades da 
pesquisa, superando a falta de condições para o doutorado, realizado em concomitância com 
todas as minhas atividades acadêmicas. 
Por esse mesmo critério, sou grata aos meus alunos, em especial a minhas bolsistas, 
com quem o diálogo permanente formou-me mais que a elas. 
Grata aos espaços conquistados de trabalho e à confiança em mim depositada, 
principalmente de Sandra Sales e Fátima Lobato, parceiras de muitas horas na formação 
continuada de professores de EJA, com quem dividi a coordenação de projetos, as apostas em 
um coletivo interinstitucional de formadores, ao qual também, reverenciadamente, agradeço 
os múltiplos aprendizados, os reconhecimentos, as cumplicidades. Grata a Pablo Gentili, 
coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ, que confiou no Núcleo de 
Educação de Jovens e Adultos (NEJA) e valorizou nossos empreendimentos. 
Na esfera pessoal, muitas gratidões: à minha mãe, que soube me esperar muitas vezes, 
sem que fosse possível chegar até ela, mas presente no seu cuidado à distância com a minha 
saúde e minhas muitas horas de trabalho diante do computador. Ao Padilha, companheiro leal 
que enfrenta, pela segunda vez, a maratona da pós-graduação, esperando/contribuindo a/para 
a conclusão, paciente e impacientemente. À Jéssica, nas muitas apostas que me perpetuam. À 
Fabrízia, ousadia e desafio permanentes. Ao Beto, mano, isso basta. À minha sobrinha 
Vanessa, que me surpreende sempre, com quem com-partilhei pedaços de um tempo comum 
de estudos, na sua conquista do título de Mestre. 
À Ira, companheira de partilha de muitos e preciosos momentos pessoais e 
profissionais, vivenciando criativamente a prática do trabalho coletivo e o exercício da 
democracia nesse fazer. 
À banca, mais que examinadores, companheiros de muitas lides e percursos comuns: 
pela leitura atenta, pela escuta acurada, pelo brilho e generosidade dos comentários e 
questionamentos. Sou-lhes grata. 
A todos os que colaboraram com essa pesquisa respondendo a entrevistas, 
questionários, disponibilizando materiais, fazendo-me participar de seus projetos de trabalho, 
agora e há muito tempo sem saber o quanto me ajudariam, meu obrigada sincero pelos 
subsídios, pelos aprendizados, pelo exercício da construção coletiva. 
Aos companheiros do Fórum EJA/RJ que, como eu, têm permanecido vigilantes, 
nesses quase dez anos de embates pela educação como direito, redescobrindo e multiplicando 
as forças dos movimentos da sociedade e reinventando a ação coletiva. Nas pessoas de Eliane 
Andrade —a Lili —, de Alex Aguiar e de Aline Dantas, simbolizo minha gratidão. 
À Edna, companheira mais que constante, com quem partilhei um momento comum 
do doutorado, apostando nos mesmos sonhos, nas mesmas esperas, no encontro e 
consolidação de respeito e amizade. Obrigada, companheira, pelo que pudemos ser, juntas. 
Por fim, não um agradecimento, mas o reconhecimento do quanto a esfera pública 
possibilitou-me a formação, desde a escola primária, até este curso de doutoramento. Porque 
reconheço o que isto significa de privilégio na sociedade excludente em que vivemos, sinto-
me responsável por devolver o que recebi, em serviço à educação de jovens e adultos. Para 
que eu tivesse esse direito, uma grande parte da população não chegou sequer a ser 
alfabetizada. A luta de minha vida continuará sem titubeações por essas escolhas, pelas quais 
tenho feito apostas éticas, rigorosas e trabalhado incansavelmente, sem que a vida seja, por 
isso, fardo, ou culpa. Mas seguirá, como risco que me desafiará ainda por muito tempo, todo 
que eu puder, enquanto houver um único que não saiba ler e escrever como eu. 
Aos brasileiros que não me sabendo aqui neste momento, nem sabendo ler e escrever, 
possibilitam e são razão suficiente para que eu não os abandone, mas siga em luta pelo direito 
à educação para todos. 
 
[...] os direitos não nascem todos de uma vez. Nascem quando devem ou podem nascer. Nascem 
quando o aumento do poder do homem sobre o homem — que acompanha inevitavelmente o 
progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e os outros 
homens — ou cria novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permite novos remédios para as suas 
indigências: [..]. (BOBBIO, 1992, p. 6). 
A realidade não passa de uma tradução redutora da enormidade do mundo, e o louco é aquele quenão 
se adapta a essa linguagem. (MONTERO, 2004, p. 138-139). 
[...] Sempre recusei os fatalismos. Prefiro a rebeldia que me confirma como gente e que jamais deixou 
de provar que o ser humano é maior do que os mecanicismos que o minimizam. (PAULO FREIRE, 
1996, p. 129-130). 
Porque os seres humanos não apenas são menores que seus sonhos [...]. A imaginação sem freio é 
como um raio no meio da noite: abrasa mas ilumina o mundo. Enquanto dura essa faísca 
deslumbrante, tentamos vislumbrar a totalidade [...]. Na pequena noite da vida humana, a louca da casa 
acende as velas. (MONTERO, 2004, p. 141). 
RREESSUUMMOO 
Os programas e projetos na área da educação de jovens e adultos, na contemporaneidade, vêm 
revelando formas de compreender e apreender sentidos e necessidades dos variados públicos 
que os buscam, intentando fazer cumprir, mais do que a perspectiva do aprender por toda a 
vida, o direito à educação sistematicamente negado a tantos na população brasileira. Com essa 
premissa inicial, a pesquisa escavou os modos como as propostas de atendimento de seis 
entidades — públicas, não-governamentais, de movimento social e do Sistema S — têm 
enunciado as formulações na área e realizado práticas, visando a compreendê-las na história 
política nacional e internacional da educação de jovens e adultos, e as conexões, sentidos, 
nexos, articulações e imbricamentos que se produzem entre elas, para além dos limites das 
entidades — no complexo tecido social. Movida pela perspectiva do direito, investiguei em 
busca de penetrar os diferentes níveis de realidade, assim possibilitando fazer emergir as 
produções subjacentes aos programas e projetos, com vista a cartografar a complexidade com 
que se fazem prática, evidenciando e visibilizando elementos constituintes e instituidores de 
suas concepções. 
Palavras-chave: educação de jovens e adultos – direito à educação – concepções – alfabetização 
AABBSSTTRRAACCTT 
At present, programs and projects in the area of Youth and Adult Education have been 
unveiling different ways of understanding and apprehending the meanings and needs which 
emerge in the various groups who are in search of such educational proposals, less so with 
life-long education in perspective than to assert their right to education, a right that has 
systematically been denied to so many Brazilians. Based on this initial premise, this study has 
explored the different ways in which six organizations have formally stated their postulates as 
well as carried out their practical work in this area. Such organizations are characterized by 
being public, non-governmental, and pertaining to the Social Movement and the S System. 
The aim of the study is to comprehend such postulates and practices, in the light of the 
national and international youth and adult educational policies, as well as the 
interconnections, meanings, nexus, articulations and overlappings which are produced within 
and beyond their dominions, more precisely inside the complex social network. Impelled by a 
view centered on rights, this investigation has attempted to gain access to the different layers 
of reality, so as to make it possible for the productions underlying those programs and 
projects to emerge, for the sake of mapping out the complexity of that practice, thus 
identifying and giving visibility to the elements which are constitutive and institutive of their 
conceptions. 
Key-words: Youth and Adult Education - right to education – conceptions - literacy 
SSUUMMÁÁRRIIOO 
1. INTRODUÇÃO: A ARQUEOLOGIA DA PESQUISA.....................................................................11 
2. COMO CIGANA: O PERCURSO METODOLÓGICO....................................................................25 
2.1 Questões da pesquisa................................................................................................................37 
2.2 De critérios, opções, escolhas...................................................................................................40 
3. CAROS CONCEITOS: DIREITO À EDUCAÇÃO COMO BASE DA DEMOCRACIA........................46 
3.1 Premissas iniciais para pensar o conceito de direito à educação: contribuições de educadores 
brasileiros.................................................................................................................................46 
3.2 Perspectiva histórica do direito e imbricações com a perspectiva democrática.......................53 
3.3 Direito à educação na escola brasileira....................................................................................70 
4. TRABALHOS DE HÉRCULES: OS SENTIDOS DO DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONFERÊNCIAS 
E ACORDOS INTERNACIONAIS.................................................................................................76 
4.1 Onde tudo começou: Dinamarca, Elsinore, 1949.....................................................................77 
4.2 II Conferência Internacional de Educação de Adultos — Montréal, Canadá, 21 a 31 de agosto 
de 1960.....................................................................................................................................78 
4.3 III Conferência Internacional – Tóquio – 25 de julho a 7 de agosto 1972...............................82 
4.4 Conferência Geral Unesco 19ª Reunião — Nairóbi, 26 a 30 de novembro de 1976...............86 
4.5 IV Conferência Internacional sobre Educação de Adultos – Paris, 19-29 de março de 1985..88 
4.6 Aportes internacionais protagonizados pela Unesco, revisitados até a metade da década de 
1990..........................................................................................................................................91 
4.7 V Conferência Internacional de Educação de Adultos – CONFINTEA – Hamburgo, 
Alemanha, julho 1997 — Aprendizagem de adultos, uma chave para o século XXI............105 
4.8 Seminário Nacional de Educação de Pessoas Jovens e Adultas Pós-CONFINTEA..............128 
4.9 O Marco de Ação de Dacar — reafirmando compromissos de 1990, reeditando o mito de 
Sísifo em 2000........................................................................................................................129 
4.10 Projeto Principal de Educação para América Latina e Caribe 2002-2017.............................133 
4.11 A presença da sociedade civil organizada – o CEAAL..........................................................137 
4.12 A sociedade civil em rede — o Pronunciamento Latino-americano......................................138 
4.13 Conferência de seguimento à CONFINTEA V: balanço seis anos pós-Hamburgo — Bangcoc, 
setembro 2003........................................................................................................................141 
4.14 Grupo de alto nível de educação para todos — Declaração de Brasília.................................147 
4.15 Algumas conquistas de Hércules............................................................................................147 
5. O DIREITO À EDUCAÇÃO PARA TODOS NO BRASIL: CONQUISTAS HISTÓRICAS E 
PERSPECTIVAS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS.......................................................149 
5.1 Evocando o mito de Sísifo: direito formal e realidade social.................................................149 
5.2 Tensões conceituais e sentido do direito à EJA.....................................................................160 
5.3 O poder da sociedade na constituição do direito à educação de jovens e adultos..................165 
5.4 EJA em tempos autoritários — onde o direito?.....................................................................170 
5.5 A luta pelo direito à educação na Constituição Cidadã..........................................................179 
5.6 Direito à educação na década de 1990...................................................................................1856. PROGRAMA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO 
ESTADO DA BAHIA — DAS VIVÊNCIAS ÀS COMPREENSÕES................................................210 
6.1 Constituintes e determinantes da concepção de EJA e de alfabetização expressos em 
discursos e em documentos....................................................................................................213 
6.2 Concepção de EJA na rede estadual: artes de fazer...............................................................229 
6.3 Emergências do mergulhador: compreensões vêm à tona.....................................................263 
7. PROGRAMA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – PEJA: EM CENA, O PÚBLICO 
JOVEM....................................................................................................................................267 
7.1 O útero político, social e teórico do Programa de Educação Juvenil – PEJ...........................269 
7.2 Do útero à luz do dia: nascimento do PDT desfraldando a educação como bandeira............275 
7.3 Constituintes e determinantes da concepção de EJA e de alfabetização expressos em 
discursos e em documentos do PEJ........................................................................................280 
7.4 Revelações recentes do PEJ: artes de fazer a mudança de concepções..................................289 
7.5 “Deixem os velhinhos morrerem em paz! Deixem os velhinhos morrerem em paz!” Resistir é 
preciso....................................................................................................................................310 
8. PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO DO TRABALHADOR — TRAVESSIAS...................................313 
8.1 Programa SESI Educação do Trabalhador — concepções e direito para a classe-que-vive-do-
trabalho...................................................................................................................................323 
8.2 A rede SESI de educação e o projeto pedagógico..................................................................330 
8.3 Constituintes e determinantes da concepção de EJA e de alfabetização expressos no Programa 
SESI Educação do Trabalhador..............................................................................................332 
8.4 Apreensões e significados para o Programa Brasil Alfabetizado: novas formas de 
parceria?.................................................................................................................................340 
8.5 Algumas reflexões sobre o cenário de EJA e a ação do SESI na esfera pública....................344 
9. PROGRAMA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO SESC: A PROPOSTA PEDAGÓGICA 
E O PROGRAMA SESC LER — A EXPERIÊNCIA “QUE NOS PASSA”....................................347 
9.1 A proposta pedagógica da educação de jovens e adultos — concepções e direito para a classe-
que-vive-do-trabalho..............................................................................................................349 
9.2 A proposta pedagógica do Projeto SESC Ler — ação/concepção de alfabetização..............358 
9.3 A experiência que me acontece: SESC Ler em parceria com o Programa Brasil Alfabetizado 
no interior do Piauí.................................................................................................................371 
10. “O LATIFÚNDIO DO CONHECIMENTO SE TORNOU ROÇA COLETIVA” – EDUCAÇÃO DE 
JOVENS E ADULTOS E ALFABETIZAÇÃO NO MST................................................................381 
10.1 A pesquisa nacional da educação na reforma agrária – PNERA: dados que se somam à 
compreensão da educação do campo.....................................................................................382 
10.2 O movimento social fez 20 anos e atinge a maioridade em 2005..........................................386 
10.3 Constituintes e determinantes da concepção de EJA e de alfabetização expressos na proposta 
pedagógica do MST para o trabalhador do campo.................................................................393 
10.4 “Tirando a viseira”.................................................................................................................416 
11. PROGRAMA ALFABETIZAÇÃO SOLIDÁRIA: BENEVOLÊNCIA DO ESTADO EMERGINDO NA 
ESFERA PÚBLICA?..................................................................................................................419 
11.1 Constituintes e determinantes da concepção de EJA e de alfabetização expressos em 
documentos............................................................................................................................428 
11.2 Concepção de EJA e de alfabetização no PAS......................................................................431 
11.3 Algumas indicações para repensar a ação do PAS na esfera pública....................................445 
12. TRAMANDO CONCEPÇÕES E SENTIDOS PARA REDIZER O DIREITO À EDUCAÇÃO DE JOVENS 
E ADULTOS.............................................................................................................................444 
12.1 Perspectivas internacionais do direito....................................................................................445 
12.2 Parcerias e financiamentos.....................................................................................................447 
12.3 Os fóruns — tecidos conjuntivos constituem redes de projetos.............................................449 
12.4 Direito à educação...................................................................................................................451 
12.5 Presença freireana...................................................................................................................453 
12.6 Sucesso e continuidade na EJA...............................................................................................456 
12.7 Concepções de formação continuada de professores..............................................................457 
12.8 Sujeitos alunos — foco e identidades......................................................................................458 
12.9 Concepções de alfabetização...................................................................................................460 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................................................462 
ANEXO 1...............................................................................................................................................478 
ANEXO 2...............................................................................................................................................479 
ANEXO 3................................................................................................................................................480 
 11
11.. IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO:: AA AARRQQUUEEOOLLOOGGIIAA DDAA PPEESSQQUUIISSAA 
 
Recuperar parte da história da educação de jovens e adultos (EJA), buscando fazê-la 
pela compreensão das negações e conquistas do direito, é trazer minha própria história como 
protagonista, há 28 anos, da mesma luta. 
Os recentes acontecimentos do mundo, antes insuspeitados, e que causam horror e 
insegurança, abalam em grande parte nossas convicções na humanidade, e por isso mesmo 
não podem estar fora das reflexões e de necessárias revisões aos sentidos que vêm sendo 
produzidos, porque sem dúvida os acontecimentos que acirram intolerâncias e ódios colocam 
em cheque mais do que os direitos sociais, se não a perspectiva mesma de direito humano, 
valor tão caro ao tema que escolhi discutir. Cotidianamente, a própria condição de vida que as 
opressões produzidas pelo sistema econômico mundial vêm determinando às populações se vêatravessada pela possibilidade de novas ameaças, em tempos inimagináveis. O refazer da 
história pelo direito à educação, desafia-nos, no que a “louca da casa”1 pode ser motivada, 
para de novo imaginar que é possível acreditar na história como possibilidade, que reinvente o 
direito à vida, com todas as diferenças, como iguais. 
Quem somos, que lugar ocupamos na história, com que direito se pode sonhar e pensar 
educação, pensar um mundo novo diante das fragilidades dos supostos poderosos e das 
resistências inventivas que criam rupturas nos esquemas seguros desses poderosos, em reação, 
talvez recusa, dos que se sabem vítimas e que não aceitam a morte, escolhida como modelo, 
passivamente, nem que para isso muitas mortes devam ser perpetradas, incluindo e iniciando 
pelas próprias? De que direito se falará daqui para diante: dos já interiorizados como idéia e 
valor, dos que se (re)criam e cerceiam liberdades atestando legítima defesa, ou será preciso 
confrontar o corpus teórico que se põe a nu diante de nós, testemunhas e co-protagonistas do 
tempo presente? 
A questão do direito envolve, inelutavelmente, a condição democrática, valor 
assumido pelas sociedades contemporâneas em processos históricos de luta e conquista da 
igualdade entre os seres humanos. Admitindo que é impossível pensar o direito sem pensar 
democracia, alerto que, no entanto, esses conceitos serão tratados pelas imbricações que entre 
eles se estabelecem no campo da educação de jovens e adultos, restringindo-se ao movimento 
de buscar as raízes históricas do que se consagrou, na contemporaneidade como direito à 
 
1 A louca da casa é a expressão de Santa Teresa de Jesus referindo-se à imaginação, recuperada por Rosa 
Montero In: A louca da casa. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. 
 12
educação, uma categoria de direitos de segunda geração, que comporta valores que me 
constituíram e dos quais ainda não sei abrir mão. 
Com base nesse fundamento, verifiquei que a educação de jovens e adultos ganhou 
oficialmente, ao longo de pouco mais de meio século, novos sentidos e concepções, 
produzidos no interior dos países, nas tensões sociais em tentativas de reafirmação de direitos 
de maiorias vistas, na sociedade desigual, como minorias. 
Historicamente a prática social (re)significava o campo de atuação, exigindo dos 
pesquisadores outras formulações para compreender e apreender esses sentidos, no âmbito da 
cultura de suas populações. Esses novos sentidos e concepções, acredito, estiveram sempre 
formulados em função da oposição ter ou não ter direito, e quando se optou pelo direito, as 
concepções formais deram conta de delimitar e restringir sua abrangência e magnitude. 
Ora, os nomes são muitos e debaixo deles: educação popular, educação de 
base, educação de adultos, educação fundamental, educação comunitária, 
educação permanente, há coisas e intenções iguais, semelhantes e até 
opostas. Neste emaranhado estão escondidas idéias iguais com rótulos 
diferentes e idéias diferentes com rótulos iguais. Há projetos e sobretudo há 
propósitos, muitas vezes opostos, que se cobrem das mesmas falas e, com 
palavras que pela superfície parecem apontar para um mesmo horizonte, 
procuram envolver as mesmas pessoas, prometendo a elas mudanças nas 
suas vidas, ou em seus mundos. (BRANDÃO, 1984, p. 15). 
Brandão revela-me, nesse trecho de conhecido artigo em que trata Da educação 
fundamental ao fundamental na educação, a confusão dos nomes que não são inocentes, mas 
trazem imbricados sentidos e significados de fortes marcas ideológicas, orientadoras dos 
caminhos e das escolhas dos projetos educativos/educacionais. Porque com ele compartilho a 
mesma preocupação, vivenciando também em minha prática essa confusão, assumo explicitar 
uma concepção provisória sobre educação de jovens e adultos para, ao longo do estudo, 
questioná-la e com ela dialogar à exaustão, com a finalidade de favorecer a compreensão de 
inevitáveis mudanças de concepção na educação de jovens e adultos, historicamente, guiada 
pela perspectiva do direito. 
Essa confusão tem sido percebida por mim em vários momentos de formação 
continuada de professores, quando se discutem as propostas, os projetos, as práticas. 
Professores quase sempre formados para lidar com crianças acabam “caindo”, no âmbito dos 
sistemas, em classes de jovens e adultos com pouco ou nenhum apoio ao que devem realizar. 
Em outros espaços, educadores populares, plenos de verdades sob o prestígio da educação 
popular, descrevem concepções pautadas em um tempo, em uma realidade social cujo 
 13
movimento da história há muito alterou, sem que as enunciações o acompanhassem. Além 
disso, observo um nível de discurso muitas vezes revelador de novas enunciações, mas em 
franco descompasso com as práticas, eivadas de “escolarismo”, praticadas sem muito saber 
porque fazê-las, defendendo rituais e procedimentos distantes de alguns princípios caros à 
educação que se pensa como direito, como possibilidade de exercitar a igualdade entre 
sujeitos diferentes, democraticamente. Pouco consigo reconhecer dos discursos de ambos nas 
práticas que realizam. Tanto professores de redes públicas, quanto educadores populares, uns 
e outros com diferenciados paradigmas, quase sem exceção denotam discursos e práticas que 
mais se afastam, do que se aproximam, deixando-me com um amargo sabor de desesperança 
pelo muito que ainda precisa ser feito, diante do tempo-espaço possível para fazê-lo, com 
vista a alterar, de fato, as relações entre sujeitos aprendizes, entre eles e a sociedade, entre eles 
e seu estar no mundo. 
Na contemporaneidade, pois, a educação de jovens e adultos continuou adquirindo 
novo sentido. Fruto das práticas que se vão fazendo nos espaços que educam nas sociedades, 
este sentido se produz em escolas, em movimentos sociais, no trabalho, nas práticas 
cotidianas. Para além da alfabetização, cada vez se afastou mais, nas políticas públicas, das 
conquistas e reconhecimento do valor da educação como base ao desenvolvimento humano, 
social e solidário. Mais que a alfabetização, o direito constitucional de ensino fundamental 
para todos, sintetizou o mínimo a que se chegara, o de aprender a ler e a escrever com 
autonomia e domínio suficientes para, em processo de aprendizado continuado, manter-se em 
condições de acompanhar a velocidade e a contemporaneidade do desenvolvimento das 
ciências, técnicas, tecnologia; das artes, expressões, linguagens, culturas; enfim, do que o 
mundo, especialmente globalizado no tocante à difusão de informações, conferia à história. 
Ao mesmo tempo, a complexidade do mundo contemporâneo exige um aprender 
continuadamente, por toda a vida, ante os avanços do conhecimento e a permanente criação 
de códigos, linguagens, símbolos e de sua recriação diária. Exige não só o domínio do código 
da leitura e da escrita, mas exige também competência como leitor e escritor de seu próprio 
texto, de sua história, de sua passagem pelo mundo. Exige reinventar os modos de sobreviver, 
transformando o mundo. 
As mudanças no mundo do trabalho produziram multidões de desempregados e a 
oportunidade de emprego não existe mais para muitos, com e sem qualificação. Nesta 
“desordem do progresso” (BUARQUE, 1992), ricos e pobres assustam e se assustam em todas 
as partes do planeta, em países ricos e em países pobres. Crescem as intolerâncias e as 
 14
discriminações que fertilizam o ódio por desconhecer o próximo como outro. Sua presença 
obstrui e ameaça. 
A experiência da sociedade civil tem ensinado algumas importantes lições, 
especialmente aos poderes públicos devotos do valor do pensamento único, que esvazia de 
sentido as resistências e os pensamentos divergentes. A forma de pensar hegemônica, somada 
ao quadrode pobreza das maiorias e à perda de direitos historicamente conquistados (como é 
o caso do trabalho), compõem os marcos com os quais se exige propor a educação de jovens e 
adultos neste terceiro milênio. 
Muitas municipalidades, sensíveis aos anseios das pessoas, têm dado respostas para a 
educação de jovens e adultos e sabem que governam para todos, não devendo excluir 
ninguém. Estas são, de fato, as experiências mais significativas, porque vêm construindo 
saberes, lideranças e legitimidade política. Os profissionais participam da formulação 
pedagógica e sua formação continuada segue sendo um outro processo de educação de jovens 
e adultos. 
Pós-Hamburgo, duas importantes vertentes consolidam a educação de jovens e 
adultos: a primeira, a da escolarização, assegurando o direito à educação básica a todos os 
sujeitos, independente da idade, e considerando a educação como direito humano 
fundamental; a segunda, a da educação continuada, entendida pela exigência do aprender por 
toda a vida, independente da educação formal e do nível de escolaridade, o que inclui ações 
educativas de gênero, de etnia, de profissionalização, questões ambientais etc., assim como a 
formação continuada de educadores, estes também jovens e adultos em processos de 
aprendizagem. Como verdadeiro sentido da EJA, ressignificando os processos de 
aprendizagem pelos quais os sujeitos se produzem e se humanizam, ao longo de toda a vida, 
não mais se pode mantê-la restrita à questão da escolarização, ou da alfabetização, como foi 
vista por largo tempo. Assim desenvolvida, a EJA legitima-se por meio de ordenações 
jurídicas, de acordos, firmados e aprovados pelas instâncias de representação que conformam 
as normas da ordem social. 
Este é, sem dúvida, um dilema para o mundo contemporâneo que, mesmo em regimes 
produtores de exclusão, obrigatoriamente carece do fortalecimento de uma concepção de 
educação voltada para o regime de colaboração entre as esferas governamentais e não-
governamentais, em que, necessariamente, a sensação de agravamento da exclusão social 
demanda do Estado políticas públicas eficazes na área social, principalmente voltadas para os 
setores populacionais mais vulneráveis às transformações econômicas. 
 15
O que tento compreender, como tese que defendo, é que as mudanças conceituais 
estiveram ocorrendo, por um lado, pelas formas como o Estado, a serviço dos interesses 
dominantes, regulou os alcances dessas concepções, traduzindo-as como direitos. Por outro 
lado, como as compreensões dos sujeitos de direito / não-direito envolvidos com o campo da 
prática, do fazer cotidiano, ressignificaram e transformaram esses conceitos, apropriando-se 
deles segundo necessidades, usos, interesses, costumes. Nessa tensão, observei que caros 
conceitos, valorizados pela questão ideológica que representaram, permaneceram 
conservados, passando incólumes na defesa de suas formulações, mas não resistindo a 
qualquer teste da prática, da experiência. E seguem assim formulados e apregoados, mas 
encerrando sentidos distintos dos originalmente praticados. 
Essas percepções me surgem com mais visibilidade quando eu, interessada em 
conhecer como se produzem os saberes e o conhecimento pela população, especialmente 
tematizado, ao longo dos anos, na educação de jovens e adultos, e a forma como os poderes 
“negociam” esse direito para os excluídos dele, participei, por quatro anos, da vivência de um 
projeto de pesquisa-ação em educação ambiental, em um bairro do município de Nova Iguaçu 
(Rancho Fundo, área da Baixada Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro), no intuito de 
acompanhar moradores na organização de um espaço de luta capaz de mudar/melhorar as 
condições de vida no lugar. Essa organização tomou como questão primeira o lixo mas, com o 
tempo, muitas outras se foram pondo à frente das pessoas e — o que é mais relevante — 
muitos saberes e compreensões da realidade se produziram, tanto para mim, quanto para os 
moradores diretamente envolvidos nesse processo de organização2. 
A ação política dos movimentos sociais, tão cara na década de 1970, não era — e nem 
podia ser — mais a mesma. Os embates e o enfrentamento visíveis como estratégias de luta 
do projeto original eram superados pelas produções táticas (CERTEAU, 1994) dos sujeitos no 
cotidiano (LÉFÈBVRE, 1991), criando maneiras de fazer próprias, autônomas, não 
padronizadas, criativas, em que as subjetividades se revelavam inteiras, não apenas pela 
lógica da razão, mas admitindo outras lógicas que a mim, enquanto pesquisadora, cabia 
compreender e desvelar, para acompanhar o movimento que repensava a melhoria da vida 
cotidiana, ao mesmo tempo em que transformava os sujeitos, em interação. O emaranhado de 
saberes, que se punham à minha frente, enredavam-me em uma trama complexa, em que a 
linearidade não podia ser o fio de compreensão, pois o desafio estava, justamente, em seguir 
 
2 Esta pesquisa encontra-se publicada In: CECCON, Claudius, PAIVA, Jane (coord.). Bem pra lá do fim do 
mundo. Histórias de uma experiência em Rancho Fundo, Baixada Fluminense, Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 
CECIP, União Européia, CCFD, 2000. 
 16
os pontos e nós que urdiam os saberes, poderes e conflitos que essas novas e diferentes 
práticas mostravam. 
Vi emergirem, ali, sujeitos políticos capazes de fazer valer seus direitos de cidadania e 
de, tomando a palavra, fazê-la sua e permitir a pronúncia de seu mundo, à semelhança do que 
me ensina Paulo Freire, tanto pela forma como a linguagem passou a mediar suas relações 
com o meio social em que vivem, quanto com a classe política dirigente, pelo modo como se 
apropriaram da argumentação, da lógica e como, pelo diálogo, estabeleceram relações 
dialéticas com a realidade. Linguagem que se fez ouvir não apenas nas relações imediatas, 
mas se tornou permanente com a escritura e a publicação de um jornal, no qual seu poder 
ampliou-se tanto quanto a abrangência que este alcançou. Linguagem do vídeo, que registrou 
suas intervenções e roteirizou suas histórias, de diversas maneiras, fazendo-os, uma vez mais, 
atores sociais cuja imagem e papel se difundiam pelos diferentes pontos de exibição dos 
vídeos. Linguagem que encontrou outros interlocutores, postos também nos espaços 
acadêmicos, em universidades, como a USP, por exemplo, sempre que puderam participar, 
levando sua experiência e discutindo os caminhos metodológicos que construíram ao longo do 
tempo em que se envolveram com o trabalho. 
Histórias, muitas histórias e muitas questões instigantes para desvendar. A das 
mulheres, presença maciça no trabalho, marcando com seus modos próprios a luta com o 
poder público, eminentemente masculino, e produzindo saberes na rede de relações novas e 
desafiadoras a que se lançavam. 
Acompanhei, com respeito e olhar atento de investigadora, cada movimento que o 
trabalho foi produzindo. O movimento social instaurado, entendido como ação coletiva 
(RIBEIRO, 1992) de quem faz história, porque se sabe sujeito de mudança da realidade, foi 
redefinindo a compreensão e o saber disponíveis quanto aos movimentos sociais. Ao mesmo 
tempo, suscitava-me, a cada dia, novas questões, que permitiram ir caminhando no sentido da 
produção de um conhecimento mais ampliado sobre a realidade de jovens e adultos que, 
intervindo no meio ambiente social, se educavam na luta, (re)construindo novos sentidos para 
o que é educar. 
O movimento gesta uma importante dimensão educativa. Aceitar que o processo de 
conhecimento é uma produção social e coletiva, sem desprezar a indispensável participação 
do indivíduo, é romper com muito da lógica de que a aprendizagem é resultado de 
"transmissão de conhecimentos" e de que olugar de fazer isto é a escola. Mesmo sabendo, na 
prática, que esse saber da escola, quando se deu, não mudou as condições de vida, a 
 17
representação que as pessoas trazem da escola é fortemente impregnada dessa fantasia. E 
porque entre eles a escolaridade não configurava o fundamento de seu saber, nem sempre os 
protagonistas do movimento percebiam a importância que esse outro saber, tecido na luta, tem 
como arma e poder para transformar a dura realidade em que vivem. Entender-se como parte 
de um coletivo que produz, em conjunto, um conhecimento; que, como parte desse coletivo, 
cabe a cada um contribuir sempre para o seguimento desse processo; que o conhecimento não 
é produzido apenas nos limites daquele grupo, mas em todos os espaços sociais é tarefa 
grandiosa, de permanente vigilância. A dicotomização do grupo com o mundo, e deste com o 
grupo, não dá conta de entrever a rede de relações de aprendizagem a que cada um 
participante esteve inextricavelmente ligado. E mais, que não era necessário romper ou 
renunciar a qualquer dessas relações para que novas produções de conhecimento tivessem 
lugar. Pelo contrário, são: 
[...] relações que se desenvolvem na participação e a descoberta dos espaços 
públicos (que) recriam situações que ensinam muito, porque desvelam 
situações de desigualdade, criam desafios nesse movimento de apropriação 
do público. [...] A consciência da relação desigual é o primeiro momento que 
pode explicitar uma nova necessidade. (SPOSITO, 1993, p. 375). 
A luta social ensina e o processo de apropriação do conhecimento é (re)significado, na 
luta. Novos conteúdos dão-se a conhecer. Ao se aliarem, "os que não sabem" — diante do 
saber técnico da autoridade — descobrem-se como iguais no "não saber", e acabam por 
desvelar o saber que têm, mas que é negado pela escola e pela sociedade. O saber, produzido 
socialmente, de modo geral só significa porque expressa um conjunto de necessidades 
históricas, determinadas pelas relações econômicas. O movimento, enquanto luta política que 
interferia nas condições de vida da população de Rancho Fundo, criava um outro significado 
para o saber: o que revela o caráter não econômico dessas necessidades, porque construído de 
modo a permitir a satisfação social, e que acaba por preencher as necessidades de um claro 
sentido político. 
Muitas outras questões surgiram. Dentre elas, a que aproximou, inevitavelmente, os 
movimentos sociais e o saber neles produzido com a área da educação de jovens e adultos, até 
então muito restrita à questão da escolarização. Com isto, iniciei um processo de reflexão para 
tentar compreender de que forma, tanto no Brasil, quanto na América Latina, foram-se 
constituindo os movimentos de educação de jovens e adultos. De que forma uns e outros se 
aproximavam, historicamente, e que dados da realidade determinavam essa necessária 
aproximação. De tal modo esta questão agigantou-se em minha busca de pesquisadora, que 
 18
pensei ser indispensável formulá-la como uma hipótese de trabalho a ser verificada, capaz de, 
enquanto possibilidade, anunciar a ampliação das concepções com que até então lidara sobre 
o que se entende por educação de jovens e adultos, no Brasil de hoje. 
Brandão (1984, p. 8) já levantava esta questão, buscando perceber o movimento que as 
práticas educativas com adultos anunciavam, especialmente as de educação popular, em 
relação às direções políticas que se encaminhavam. 
Houve um tempo em que sobre a educação popular julgávamos possuir 
coletivamente um repertório sólido de conceitos, métodos e técnicas 
profeticamente renovadores de tudo o que houve e se fez antes. Hoje 
sabemos, também coletivamente, que esta, como tantas outras práticas 
especiais de trabalho político, possui múltiplas faces, de que as mais estáveis 
e sistematizadas, como a própria alfabetização, são apenas uma modalidade 
e, nem sempre, a mais importante. Da década dos anos 60 para cá 
envelhecemos palavras, como conscientização e criamos outras, como 
participação. Símbolos sonoros de efeito poderoso que, apenas instrumentos 
de trabalho no momento da gênese, ameaçam sempre tornar-se o mito da 
prática, ou uma espécie de senha que, aos que sabem pronunciá-la, sugerem 
poder abrir todas as portas. 
Alerta-nos sobre o risco da crença na solidez dos conceitos, e na mitificação das 
palavras, que não se cristalizam, e por isso mesmo se redizem, e no meu entender atualizam 
esses conceitos. 
Desde o pós-guerra a educação de adultos veio sendo marcada por significados e 
compreensões diversas, em função dos inúmeros movimentos realizados junto aos setores 
populares, tanto originados na Igreja Católica, quanto por governos de diferentes matizes, 
quanto por entidades representativas dos interesses de empregadores e de grupos da sociedade 
civil, organizando movimentos e campanhas. O caráter desenvolvimentista, marcadamente 
posto na condição de homem-trabalhador-força-de-trabalho, teve papel fundamental na 
história da educação de adultos e na conceituação que o termo assumiu entre nós. 
Desse caráter são representantes o Sistema S na década de 1940 (SESI, SESC, SENAI, 
SENAC; bem mais tarde também o SENAR, em 1991), a Campanha Nacional de Erradicação 
do Analfabetismo, a Cruzada Nacional de Educação, a Campanha Nacional de Educação de 
Adultos (1947) e o Movimento de Educação de Base (1961), a Fundação Movimento 
Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) criada em 1967 e com início das atividades em 1970, 
todos contribuindo, ainda que com intensas contradições, para a formulação do conceito e a 
delimitação do campo de conhecimento. 
 19
Nos anos 1970, com o advento da Lei nº. 5692 em 1971, da Educação Nacional, o 
ensino supletivo passa, paralelamente ao MOBRAL, a configurar no interior dos sistemas de 
ensino, uma modalidade compensatória de educação, firmemente ancorada nos valores da 
teoria do capital humano, de caráter desenvolvimentista, que a ditadura militar assumiu para 
tirar o país do atraso, mas que passava ao largo da perspectiva do direito, principalmente 
porque aqueles não eram tempos de respeito aos direitos sociais, nem políticos, nem humanos: 
a face mais evidente desse tempo de negação de direitos se expunha pela tortura e atrocidades 
cometidas nos porões da ditadura militar. 
Destaque-se que, no caso do MOBRAL, este constituiu a entidade formuladora e 
executora das políticas federais na área que por mais tempo esteve estruturada para essa 
finalidade (admitida sua sucedânea Fundação Nacional para Educação de Jovens e Adultos – 
Fundação EDUCAR, extinta em 1990), e para ela foram destinadas fontes rubricadas para 
financiamento e desenvolvimento das ações. Paradoxalmente, foi apenas durante a ditadura 
militar que a área viveu definição governamental clara e aporte de recursos significativos, 
desvinculados das variações orçamentárias que tanto ameaçam programas e projetos, gozando 
a Fundação de expressiva autonomia, inclusive quanto a plano de carreiras e cargos e salários. 
Mas até aí a questão do analfabetismo era tratada pelas políticas como problema do 
sujeito analfabeto, a ser resolvido nesse âmbito. Fixada uma década para a “erradicação do 
mal”, ao seu final os resultados eram desanimadores. Se por um lado alguns pontos 
percentuais se reduziam nas estatísticas oficiais, por outro, o contingente absoluto 
demonstrava como o sistema público de ensino era insuficiente em número, em propostas, em 
qualidade para absorver todos os que deveriam ser escolarizados na “época própria”, aliado ao 
fato de que o agravamento das condições estruturais e conjunturais do país favorecia o 
aumento quantitativo desses excluídos de direitos. Entretanto, esse aspecto não vinha sendo 
considerado para a compreensão da complexidadedo fenômeno do analfabetismo, adotando-
se a idéia simplificadora de que o problema se encontra no próprio analfabeto. Esta idéia 
ainda hoje é corrente, pregnante em educadores e em muitos dirigentes, ajudando a 
compreender a lógica de que qualquer investimento que aí se faça é inócuo. 
O campo da educação de adultos já então abrangia não apenas a idéia da alfabetização, 
mas incorporava a de educação permanente, pelas exigências da chegada da industrialização 
tardia em países pobres, do mesmo modo que incorporava a idéia de qualificação profissional, 
para atender às novas demandas do setor produtivo. 
 20
Mais recentemente, os caminhos de democratização no país vieram exigindo a 
condição de cidadania para todos, e não apenas para alguns e, dessa feita, a educação de 
adultos passa a tratar de questões relativas a direitos de cidadania, como tarefa eminentemente 
educativa, ao lado da consciência das exclusões — por exemplo, de etnia e gênero, que se 
vinham reproduzindo historicamente no país, mitificadas pelo ideário da democracia racial. 
Essa perspectiva se adensa na década de 1980, pelas lutas em prol do Estado de 
direito, articuladas e estimuladas em formas de organizações sociais que surgiam em resposta 
à repressão empreendida pela ditadura militar. Metas primeiras dessas organizações se 
coroam com a Constituinte e com a mobilização de inúmeros fóruns da sociedade3, 
propositores de temas e princípios para incorporação na nova Carta. 
A Constituição de 1988 vem contribuir para a legitimação dessas tensões históricas, 
garantindo no texto da lei a educação para todos como direito, novamente, e as Conferências 
Internacionais e os acordos firmados na década de 1990, reafirmam o papel da educação 
continuadamente nas políticas de todas as áreas, embora esse entendimento e a garantia 
constitucional não sejam suficientes para mudar as práticas. 
Ao mesmo tempo em que esses outros conteúdos adubavam esse campo, implicava 
pensar com que lógicas deveria conhecê-los: se com aquelas que os pensavam como 
conhecimento objetivo e, portanto, absoluto e eterno, do “homem desencarnado”, ou se 
concebido à semelhança do que propõe Najmanovich (1995, p. 46), como objetivado por uma 
cultura em contextos sociais específicos. O que significa dizer: com que pressupostos 
(teórico-)metodológicos punha-me a compreender a sua presença e o seu significado? 
Formulada nesse plano político, já não se pensa mais a educação restrita aos 
instrumentos do saber ler e escrever, imprescindíveis, mas insuficientes para dar conta da 
complexidade do mundo contemporâneo. As outras dimensões que adentram a área da 
educação de jovens e adultos alargam seu espectro para a idéia de educação continuada, e a 
retomada de um novo sentido para o que se chamara de educação permanente. Uma intricada 
rede de relações, de conhecimentos, de saberes, de atores sociais, de sujeitos que conhecem e 
 
3 Um dos Fóruns mais significativos dessa época foi o Fórum em Defesa da Escola Pública, constituído em 1987, 
por entidades científicas, acadêmicas, profissionais, sindicais, estudantis e movimentos populares de âmbito 
nacional, para atuar na defesa intransigente da universalização da educação pública, gratuita, laica, com 
qualidade social, em todos os níveis. Inicialmente organizado para atuar na Constituinte, foi responsável pelas 
principais conquistas que os setores sociais, comprometidos com essa concepção de educação, conseguiram 
inserir na Constituição Federal de 1988, na LDB e no PNE. Ao longo de 17 anos de existência, o Fórum e as 
entidades que dele fazem parte assumiram, em inúmeras situações e ocasiões, o papel de espaço crítico e 
combativo em relação às políticas de regulação e gestão desenvolvidas. 
 21
se dão a conhecer, se tece no cotidiano das populações, em âmbito local, alterando e exigindo 
o debruçamento dos que pensam os destinos do mundo na esfera global sobre as relações que 
uns e outros estabelecem, mesmo quando distanciados pelo tempo e pelo espaço. Não mais a 
dicotomia e a dualidade que se pensava capazes de, relacionadas, dar conta da completude do 
conhecimento. Pensar o mundo pela perspectiva do conhecimento em sua incompletude, pela 
contribuição do pensamento complexo, que não luta contra a incompletude, mas contra a 
mutilação (MORIN, 1998, p. 176). Aí, certamente, inclui-se a educação, pelas formas 
complexas como necessariamente se expressa, o que exige repensar os paradigmas que até 
então nortearam nossos modos de ler a realidade. Para isso, Morin (1998, p. 176-177) afirma 
ser necessário desfazer o primeiro mal-entendido, que: 
[...] consiste em conceber a complexidade como receita, como resposta, em 
vez de considerá-la como desafio e como uma motivação para pensar. [...] 
nesse sentido, é evidente que a ambição da complexidade é prestar contas 
das articulações despedaçadas pelos cortes entre disciplinas, entre categorias 
cognitivas e entre tipos de conhecimento. De fato, a aspiração à 
complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Ela não quer 
dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas 
diversas dimensões. 
A experiência de Rancho Fundo foi provocadora de um processo de reflexão que 
assumiu em mim a disposição para enfrentar os caminhos de desenvolvimento dessa pesquisa. 
Emblemática, trouxe-a para o texto para melhor situar esses caminhos e fundamentar a tese, 
alimentada pelo compromisso político que tenho mantido com a EJA, nas diversas esferas de 
minha atuação. No entanto, a experiência não limita, nela, a riqueza das ações na área, nem 
esgota meu rol de questionamentos. 
Rancho Fundo mostrou ser um processo educativo de ação sistemática de intervenção 
na realidade. Aproxima-se da atuação pedagógica — intervenção intencional — agindo, 
também, de modo sistemático. Os saberes que a experiência foi produzindo nas tessituras em 
rede que os sujeitos urdiram — para meu uso e da própria população — eram inequívocos em 
me afirmar que ali havia um claro — e renovado — processo de educação de adultos e de 
jovens, reconceptualizado. E que a mim, cabia pensá-lo complexamente, compreendê-lo e 
(re)significá-lo. 
Esta compreensão alargada dos processos de educação de jovens e adultos, no entanto, 
nem sempre se revela de modo a assumi-la como conteúdo dessa educação — o educar-se na 
luta —, nem também aparece como demanda expressiva nos movimentos por escola para 
jovens e adultos, nem para trabalhadores. Sposito (1993, p. 135) estudando a luta social pela 
 22
escola pública, na periferia de São Paulo, ilustra como a reivindicação por educação se 
organizou, pela população, entre 1970 e 1985, apontando que a pesquisa não confirmava a 
hipótese de que essas lutas eram pela qualidade do serviço oferecido, mas sim pelo acesso. 
Expressas em jornais da época, as reivindicações se referem à expansão da rede em 40% 
delas, e destas, a luta pelo acesso ao ensino de primeiro grau4 chega a 52% dos 
encaminhamentos. Ampliação da pré-escola e do segundo grau vêm em seguida com 17% e 
19% respectivamente do total de demandas de expansão; e 40% das reivindicações pela 
expansão da rede referem-se à conquista de novos direitos, tanto pela antecipação do 
atendimento, quanto pelo prolongamento da escolaridade, ou pelo direito à escolaridade para 
adultos. Sobre esses dados, Sposito assinala que: 
[...] em todo o período a luta mais inovadora sob a ótica da intervenção do 
Estado em outras modalidades de ensino consiste na criação de unidades de 
ensino supletivo de primeiro e segundo graus. Não obstante inexista até o 
momento uma clara definição sobre a educação de adultos no país, a 
conquista do ensino supletivo público em alguns estados, como São Paulo,parece ser irreversível, ao menos, enquanto direito de acesso aos cursos. 
Resta, no entanto, para os grupos populares o desafio de conquistar, de fato, 
uma prática pedagógica e um processo de escolarização mais adequados às 
suas necessidades e condições de vida. (SPOSITO, 1993, p. 138). 
Como se observa, a expansão do direito ocupa apenas 40% das demandas, e não 
exclusivamente para a educação de jovens e adultos, mas vem acompanhada da pré-escola (a 
antecipação do atendimento) e do prolongamento dos cursos (após o ensino de primeiro grau, 
ou seja, o atual ensino médio), o que significa dizer que é, ainda, muito tímida, diante do 
universo de sujeitos não-alfabetizados e pouco escolarizados, não-concluintes do ensino 
fundamental oriundos principalmente das áreas pobres. O fato notável é que a conquista de 
novos direitos passa a se incorporar como horizonte possível a setores antes socialmente 
segregados, assim como, assinala Sposito, o acesso aos cursos não vem acompanhado de 
práticas pedagógicas nem de processos de escolarização adequados aos sujeitos que os 
acessam. 
As observações empíricas têm mostrado que mesmo pais de pequena ou nenhuma 
escolaridade reivindicam, primeiro, para seus filhos a condição de direito à educação, diversa 
da deles próprios, e poucas vezes se incluem como credores desse direito. Quando a 
perspectiva de direitos passa a constituir demanda, novas relações se estabelecem com o 
poder público e o exercício da democracia passa a ser praticado nas intermináveis 
 
4 Mantenho a expressão primeiro grau utilizada pela autora, pois esta era a denominação do ensino fundamental 
à época da pesquisa. 
 23
negociações em defesa desses novos direitos. Que concepções os poderes assumem ao 
responder as tensões criadas pelos movimentos? Que resposta os movimentos e os sujeitos 
esperam receber? 
A pesquisa, portanto, pretendeu desvelar a face atual da área da educação de jovens e 
adultos, nos movimentos que experiências e práticas vêm realizando e na relação com as 
proposições políticas que as instâncias oficiais têm assumido. Para esse desvelamento, estou 
propondo escavações em torno de concepções, propondo um entendimento não de supressão 
de outros entendimentos, mas uma incorporação de perspectivas que possam permitir 
compreender mais amplamente o campo do fenômeno, percebidas na complexidade das 
relações em que se dão, levando em conta que ou sempre estiveram presentes sem serem 
consideradas, ou tenderam a aparecer diante das transformações que afetam as sociedades e as 
culturas na economia globalizada. 
Para fazê-lo, passei pela necessária organização e sistematização teórico-metodológica 
de formulações e práticas de EJA, buscando estabelecer relações entre elas, como fios e nós 
da rede de saberes que constituem. 
Com vista à constituição de meu objeto, propus-me a lidar com “novos paradigmas 
[que] questionam um conjunto de premissas e noções que orientaram até hoje a atividade 
científica, dando lugar a reflexões filosóficas sobre a ação social e sobre a subjetividade” no 
dizer de Schnitman (1996, p. 16), para quem a base dessas perspectivas se assenta na 
“exploração que inclui em seu desenvolvimento a consideração do próprio processo de 
conhecer, do sujeito cognitivo, da rede social na qual este conhecimento está distribuído”, ou 
de outras produções teóricas que sem comportarem o arcabouço paradigmático, vêm 
buscando contribuir para o repensar do que está posto. Dentre elas, as noções de pensamento 
complexo, de sujeito, como proposto por Morin (2001) e de rede, como metáfora para o 
processo de conhecimento, de que Schnitman (1996), Dabas e Najmanovich (1996) e Alves 
(1998) se valem. Para isso, exigiu-se o esforço de uma construção metodológica coerente com 
esse novo paradigma, que permitisse a mim e aos meus interlocutores trabalhar em um tempo 
de criatividade, de restauração de elementos singulares e da abertura de novas 
potencialidades, experimentando a vivência de que: 
Sentir-se partícipes/autores de uma narrativa, da construção de relatos 
históricos, é uma das vias de que dispõem os indivíduos e os grupos 
humanos para tentar atuar como protagonistas de suas vidas, incluindo a 
reflexão de como emergimos como sujeitos, de como somos participantes de 
e participados pelos desenhos sociais. (SCHNITMAN, 1996, p. 17). 
 24
Entendendo que a questão da educação de jovens e adultos inclui a perspectiva de 
inclusão em sociedades democráticas, e que esta inclusão passa a se dar pela conquista de 
direitos, tomei como matrizes conceituais direito e democracia, admitindo que são eles os 
conceitos fundantes da ampliação da compreensão do que é a EJA, na contemporaneidade. 
Meu objeto de pesquisa, à procura de novos “achados” entre as concepções de 
educação de jovens e adultos, compõe um corpus em que os movimentos da sociedade 
revelam-se pelas práticas dos últimos anos, alterando os sentidos que lhes são atribuídos 
originalmente, quando formulados e retratados em documentos e em aparatos jurídicos. 
Contrapondo formulações do cotidiano a textos legais, experimento compreender a educação 
de jovens e adultos a partir de carecimento e necessidade social, essencialmente produzidos 
na história, que vêm constituir o que se reconhece como direito em resposta a esses 
carecimento e necessidade, fundamentais ao entendimento teórico, por ser o direito 
freqüentemente negado e em poucos momentos respeitado, em relação a todos os cidadãos. 
Portanto, o que apresento nesse texto, mais do que um trabalho acabado, traduz um 
conjunto de reflexões de quem percorre um caminho de estudo teórico que ultrapassa os 
conhecimentos já disponíveis para, crítica e criativamente, ampliá-los. A escritura, como obra 
aberta, segundo Eco, à medida que se ascende no seu uso, estabelece novas significações, 
tanto mudando seus sentidos, quanto seus sujeitos enunciadores. 
 25
 
22.. CCOOMMOO CCIIGGAANNAA:: OO PPEERRCCUURRSSOO MMEETTOODDOOLLÓÓGGIICCOO 
[...] há cerca de quarenta anos, estamos diante de um mundo singularmente novo. E 
temos de nos situar neste mundo, do qual não passamos, evidentemente, de uma 
minúscula parte. [...] essa parte se encontra num todo gigantesco, o todo se encontra, 
ao mesmo tempo, no interior dessas parcelas ínfimas que nós somos, [...] Somos os 
filhos do cosmos e, ao mesmo tempo, como disse Jacques Monod, nele vivemos 
como “ciganos”. Somos diferentes e distantes dele devido a nossa cultura, nosso 
espírito, nosso pensamento, nossa consciência, e é esse distanciamento que nos 
permite tentar conhecê-lo e interrogá-lo. (MORIN, 2001, p. 27). 
Tomar a fala de Morin como epígrafe deste capítulo remete-me ao sentimento errante 
de que muitos de nós somos tomados, quando precisamos definir e fazer escolhas teórico-
metodológicas. Vagueando como ciganos, intentamos caminhos, aproximamo-nos e 
distanciamo-nos do todo e da parte e do objeto, parecendo sempre perguntar, como Cecília 
Meireles (1994, p. 335), no poema Noite: 
Tão perto! 
Tão longe! 
Por onde 
é o deserto? 
[...] 
Somos um 
ou dois? 
Às vezes, 
nenhum. 
E em seguida, 
tantos! 
A vida 
transborda 
por todos 
os cantos. 
Com essas incertezas, que me acompanharam em todo o percurso, fui traçando um 
caminho para dar conta de responder as questões que há alguns anos vêm ocupando espaços e 
tempos diversos das minhas reflexões e práticas profissionais no campo da EJA. Esse 
percurso, que por exigência do curso e da titulação supõe-se ser solitário, produzido por um 
sujeito como requisito ao doutoramento, no entanto, mostrou-se, no meu caso — por não ter 
me afastado de minhas atividades acadêmicas na universidade, nem de atividades 
profissionais conformadaslongamente em minha trajetória — como um percurso solidário, 
trilhado — sempre como cigana — com muitos outros sujeitos com os quais compartilhei 
minhas produções, modos de compreender, e com os quais fui trançando e tecendo fios e 
enredando saberes, num espaço-tempo social inimaginável. Difícil, ao redigir esse capítulo, 
ocultar a participação direta de meus alunos, nas diversas disciplinas que permitiram múltiplas 
 26
 
interlocuções e intercâmbios5; de minhas bolsistas (no feminino mesmo, porque sempre 
mulheres), atentas, aprendizes/tecelãs de novas tramas/saberes; de autores — dos livros 
técnicos aos livros de literatura dos quais jamais ousei afastar-me; de pares escolhidos; de 
outros não-escolhidos, mas que se fizeram presentes sem que eu demandasse ou esperasse, 
tudo isso constituindo, inequivocamente, um saber coletivo, que a mim, porque guiada por um 
olho de ver6,7 para além da experiência física, surpreendeu e possibilitou sistematizar, junto a 
outros sujeitos discursivos escolhidos, as idéias que compõem esse trabalho. Posso afirmar 
que foi vivendo as experiências8 e a práxis que a idéia de rede e de complexidade, aos poucos, 
fez-se viva como metodologia de pesquisa, assumindo o lugar central para compor o método 
de investigação utilizado. 
Minha investigação orientou-se, teoricamente, pelas postulações de autores que me 
ajudaram a perceber, multirreferencialmente, o tempo histórico em que as experiências se 
dão/se deram, de modo a que eu, ao investigar, pudesse “ejercer una función historizante para 
construir una narración posible y coherente que permita producir sentido en nuestro navegar 
histórico” (NAJMANOVICH, 1994, p. 37). São todas elas fruto de trabalhos e reflexões dos 
últimos anos e de meu envolvimento e encontro com outros interlocutores em reuniões 
científicas, conferências nacionais e internacionais no âmbito das políticas que envolvem 
práticas educativas com jovens e adultos, tanto as “escolarizadas” como as que ocorrem em 
relação a outros direitos ainda não democratizados, negados à maioria da população. 
 
5 Inter-câmbio, apreendendo o sentido de Najmanovich (1994, p. 66), de trocas e mudanças entre sujeitos, 
efetivamente, que também mudam modos de pensar e de ver a realidade. 
6 Soares (2005, p. 173), discutindo a idéia do que é ver, e não ver, conclui que “se o olhar transporta para a 
imagem daquilo que é olhado um pouco da pessoa que olha, se o olhar transporta para a imagem a relação entre 
o que vê e o que é visto, deduz-se que ver é relacionar-se”. E continua: “Isso é surpreendente para quem pensa 
que o ato de olhar serviria como uma metáfora perfeita para designar a suposta objetividade do vínculo entre o 
sujeito da ciência e seu objeto. Pelo contrário, não há pureza nem objetividade no olhar. Nossa visão das coisas e 
das pessoas é carregada de expectativas e sentimentos, valores e crenças, compromissos e culpas, desejos e 
frustrações. Acima de tudo, é necessário reter na memória esse ponto: ver é relacionar-se”. 
7 Sacks (1995, p. 129), do mesmo modo, pela neurologia, discutindo o caso de um paciente em “Ver e não ver”, 
afirma: “Quando abrimos nossos olhos todas as manhãs, damos de cara com um mundo que passamos a vida 
aprendendo a ver. O mundo não nos é dado: construímos nosso mundo através da experiência, classificação, 
memória e reconhecimento incessantes”. 
8 Retomo como conceito central da produção de conhecimento a recomendação de Larrosa (1999, p. 20-28) 
sobre experiência e o saber de experiência — “é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca” —, pelo 
alerta que faz de que, por vivermos em uma sociedade de informações, deixamos de viver as experiências, 
supondo que informações podem substituí-las. Do mesmo modo, alerta que a experiência é cada vez mais rara 
por falta de tempo, pela velocidade e a obsessão pela novidade que caracteriza o mundo moderno, assim como 
pelo excesso de trabalho e pelo excesso de opinião, que não é conhecimento, tudo isso impedindo a conexão 
significativa entre os acontecimentos. Evoca a reintegração dessa forma de conhecer em nossas vidas, pelo fato 
de a experiência produzir diferença, heterogeneidade e pluralidade; por ser irrepetível, e uma dimensão de 
incerteza, que não pode ser reduzida. 
 27
 
Historicamente, a educação de jovens e adultos vem assumindo concepções e práticas 
bastante diferenciadas. Da visão ainda muito corrente de que ela se faz para recuperar o tempo 
perdido daqueles que não aprenderam a ler e a escrever; passando pelo resgate da dívida 
social; até chegar à concepção de direito à educação para todos, da presente década, e do 
aprender por toda a vida, as enunciações variaram, deixando, no entanto, no imaginário social, 
a sua marca mais forte, ligada à volta à escola, para fazer, no tempo presente, o que não foi 
feito no tempo da infância. 
Essas diferentes concepções pelas quais passou a área foram produzidas em contextos 
históricos e culturais9 que favoreceram seu alargamento ou sua variação, mais ou menos 
tensionados pelas forças sociais que se colocavam em jogo. Ao mesmo tempo, revelavam 
enunciações que, nem sempre, caminharam pari passu com as práticas e com as necessidades 
dos jovens e adultos envolvidos, nem com o sentido de que a oferta de EJA deve-se fazer 
como direito, em sociedades democráticas, e muito menos com a idéia projetada a um futuro 
próximo do aprender por toda a vida. 
O objeto da pesquisa seguiu um percurso inicial bastante ambicioso, mas considerado 
exigentemente necessário, porque se propunha a estudar projetos e práticas, confrontando-os 
entre si e com as formulações políticas e teóricas na área, visando à compreensão e à 
apreensão das concepções da educação de jovens e adultos, na vertente escolarizada, ao 
tempo em que se enunciam pela perspectiva, ou não, de direito de todos à educação. Mas o 
diálogo com meu orientador e com a banca de qualificação, intenso principalmente neste item, 
mostrou-me — e acabou por convencer-me — da necessidade de um recorte, do mesmo modo 
representativo das diferentes experiências e contornos que a área vem assumindo, sem 
abranger o espectro todo que inicialmente eu formulara. 
Voltando outra vez como cigana aos projetos, vivenciei uma nova etapa exploratória, 
com a finalidade de, sem perder os critérios definidores daqueles que deveriam constituir meu 
objeto, recortar a amostra com a qual eu, finalmente, trabalharia. Para isso, intensifiquei o 
olhar sobre esses critérios, buscando ver em relação, no dizer de Soares (2005, p. 173), 
garantindo relevância ao recorte tomado como objeto de estudo e compreensão da realidade, 
 
9 Estou tomando a concepção de cultura segundo Freire, por meio da qual influencia Bosi (1992, p. 319), ao 
expressá-la como conceito antropológico: “conjunto de modos de ser, viver, pensar e falar de uma dada 
formação social”. O caráter difuso dessa cultura, espraiada em lugares, tempos e modos que não os da vida 
acadêmica, mescla-a intimamente com a vida psicológica e social do povo (BOSI, 1992, p. 320), e é com esta 
vida, cujos símbolos e bens nem sempre são objeto de análise ou de interpretação sistemática, mas sim vividos e 
pensados esporadicamente e não tematizados em abstrato, que Paulo Freire identifica seu modo de pensar a 
educação e de propor a metodologia que possibilita o aprendizado dos sujeitos jovens e adultos. 
 28
 
recorte esse que pudesse estabelecer algumas enunciações conceituais sobre o campo, cujo 
conhecimento produzido estivesse também orientado para a surpresa e a partilha 
(NICOLESCU, 2003, p. 46), diferentemente do saber do conhecimento disciplinar, orientado 
para o poder e a posse. 
A surpresa, sempre bem-vindae necessária, deveria levar-me, como conhecedora do 
campo, a novos estranhamentos, capazes de objetivar a compreensão do mundo presente, no 
movimento, na dinâmica gerada pela ação dos vários níveis de realidade10 ao mesmo tempo, 
onde poderia apreender os objetos, realizando também movimentos que possibilitassem 
percebê-los nas múltiplas relações em que ocorrem, e não referidos como fragmentos de um 
mesmo e único nível de realidade (NICOLESCU, 2003, p. 44). 
Para Nicolescu (2003, p. 46), ainda, o conhecimento produzido por meio dessa 
abordagem — transdisciplinar —, gera a compreensão, enquanto a abordagem disciplinar 
produz o saber; na primeira abordagem há um novo tipo de inteligência, que implica o 
equilíbrio entre o mental, os sentimentos e o corpo, incluindo-se os valores, e atuando-se com 
a lógica do terceiro incluído; na disciplinar a inteligência é analítica, a lógica é binária e há 
exclusão dos valores. Pode-se dizer que, pela abordagem transdisciplinar, há uma evolução do 
conhecimento, ou seja, o conhecimento permanece aberto para sempre. 
A definição dos critérios de seleção dos projetos foi estabelecida, então, pela 
necessidade de que a pesquisa tivesse abrangência nacional, face ao fato de que deveria tomar 
referências mais amplas para empreender a aventura do estudo proposto — compreender as 
concepções da EJA, por entender que concepções, porque históricas, têm temporalidade e 
espacialidade, são multidimensionais, organizando-se segundo diversas ordens de fatores que 
não permanecem duradouramente, mas são sensíveis aos movimentos dos sujeitos nas suas 
ações de fazer e desfazer, pensar e transformar o mundo. Burke (1992, p. 24-25) discutindo a 
perspectiva da história como um problema dos historiadores sociais contemporâneos, observa 
 
10 Nicolescu (2003, p. 46-47) parte da idéia inicial de que Realidade (com R maiúsculo), é tudo aquilo que resiste 
às nossas experiências, representações, descrições, imagens ou formalizações matemáticas, porque o real, por 
definição, está oculto para sempre (aquilo que é). Por nível de Realidade, diz o autor, “deve-se entender um 
conjunto de sistemas invariante à ação de um certo número de leis gerais: por exemplo, as entidades quânticas 
subordinadas às leis quânticas, que divergem radicalmente das leis do mundo macrofísico. Isso quer dizer que 
dois níveis de realidade são diferentes se, ao passar de um para o outro, houver ruptura das leis e ruptura dos 
conceitos fundamentais (por exemplo, da causalidade)”. A visão transdisciplinar parte dos questionamentos de 
Edmund Husserl e de outros pesquisadores sobre os fundamentos da ciência, descobrindo a existência de 
diferentes níveis de percepção da Realidade pelo sujeito-observador, o que já fora afirmado por diferentes 
tradições e civilizações, mas baseada em dogmas religiosos ou em explorações do universo interior. Essa forma 
de visão propõe “considerar uma Realidade multidimensional, estruturada em múltiplos níveis, que substituiria a 
Realidade unidimensional, num único nível, do pensamento clássico”. (NICOLESCU, 2003, p. 48). 
 29
 
o quanto difícil é descrever ou compreender a relação entre as estruturas do cotidiano e a 
mudança, indicando que um foco de atenção deve estar posto no “processo de interação entre 
acontecimentos importantes e as tendências por um lado, e as estruturas da vida cotidiana por 
outro”. Este, portanto, consistiu em mais um importante alerta para o exercício empreendido 
de captar as concepções de EJA, como me propus. 
Os critérios, então, construídos, foram considerados isoladamente ou cruzados um 
com outro, reforçando-se e/ou intensificando-se. São eles: 
ƒ Abrangência nacional — independente da proposta/concepção, a prática está sendo 
realizada em vários estados da federação, por um ou mais organismos, envolvendo 
um largo número de sujeitos, o que quase sempre contraria as lógicas da EJA, de 
pequenas experiências, localizadas. 
ƒ Antiguidade e permanência da organização na rede pública — independente da 
concepção, o fato de estar institucionalizada, ininterruptamente, como modalidade 
de atendimento, no sistema de ensino. 
ƒ Necessidade de oferecer resposta específica, considerando a realidade de uma dada 
região/sujeitos — verificar a consistência de propostas que se orientaram pela ação 
de EJA com formato próprio, considerando a especificidade de uma região. 
A metodologia previu, assim, o estudo prévio das origens e sentidos que direito à 
educação assume na história como fundamento para melhor apreender as proposições de 
programas/projetos e suas formulações conceituais, assim como a compreensão de práticas 
desenvolvidas, quando possível, pela voz do coordenador, do dirigente, do professor/educador 
confrontando-as quanto ao pensar (dos especialistas que formulam) e o fazer cotidiano dos 
sujeitos que coordenam, dirigem, realizam essas propostas. Porque propostas não definem, 
necessariamente, seus fazeres, suas práticas, busquei a perspectiva metodológica da 
experiência, em maior aproximação com os quefazeres de algumas delas, no intuito de poder 
compreender as apreensões dos sujeitos que as desenvolvem, na expressão de suas 
concepções, nos contextos socioculturais em que se dão. 
Desde o início orientei a construção metodológica do projeto pela noção de redes e de 
complexidade, procurando tecer um modo de apreender não apenas as expressões conceptuais 
dos projetos e práticas, mas as teias que se formam entre eles, relacionadas às diversas 
dimensões da vida sociopolítica em que se dão/são possíveis. Mas, apesar da minha 
determinação, ditada pela experiência que vivencio há tantos anos com projetos de EJA e 
 30
 
sujeitos, que me levava à quase certeza de que só chegaria a capturar suas concepções se os 
pensasse pela perspectiva da complexidade, como redes, o esforço feito não chegou a me 
assegurar que tenha sido bem-sucedida na tentativa metodológica, o que exige a leitura de 
meus pares e estudiosos da área, para apontar e auxiliar meu próprio juízo crítico, quanto ao 
que consegui formular por meio desse percurso intentado. Não se trata de negar ou 
desqualificar a abordagem definida mas, exatamente, como por ela proposto, dialogicamente 
interrogá-la para perceber o quanto o exercício da pesquisa possibilitou aproximar-me ou não 
da intenção original, tratando essa produção como “obra aberta”, pela possibilidade de 
garantir a ambigüidade, fundamental e constante em qualquer “obra” em qualquer tempo, no 
dizer de Eco (1988, p. 25-26), que “representa um modelo hipotético”, embora elaborado com 
a ajuda de numerosas interpretações concretas. 
Estava aí o desafio: aproximar as enunciações e compreensões sobre redes, a 
complexidade e as formulações da transdisciplinaridade, que percebo muito próximas do que 
as redes vêm apontando. Por ser esse um campo novo para transitar, empreendi, mais uma vez 
como cigana, a aventura de tentar dialogar com essas concepções, em torno do meu objeto, 
compreendendo-o, não pela análise, mas pela busca de um outro modo de conhecer, que 
intentei produzir como metodologia de pesquisa. 
Alguns autores nacionais vêm encabeçando a discussão sobre redes de conhecimentos, 
em contraposição à metáfora da árvore, e para isso vêm se valendo de estudos empreendidos 
por um grupo de pesquisadores de diversas áreas, em busca de modelos explicativos mais 
adequados ao lugar epistemológico do conhecimento na contemporaneidade. Morin, um 
desses pensadores, junto a outros como Prigogine, Maturana representam os mais conhecidos, 
embora Basarab Nicolescu, Lima de Freitas, o próprio Morin e muitos outros tenham 
participado do Primeiro Congresso Mundial da Transdisciplinaridade, ocorrido no Convento 
da Arrábida,

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