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O movimento Marcha das Vadias surgiu no Canadá

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O movimento Marcha das Vadias surgiu no Canadá, batizado de Slutwalk. O movimento surgiu porque, em janeiro de 2011 na Universidade de York, um policial, falando sobre segurança e prevenção ao crime, afirmou que “as mulheres deveriam evitar se vestir como vadias, para não serem vítimas de ataque”. A reação de indignação foi imediata, pois esse pensamento transfere a culpa da agressão sexual para a vítima, insinuando que, de alguma forma, é a vítima que provoca o ataque.
No dia 03 de abril de 2011, na cidade de Toronto, aconteceu a primeira
Slutwalk, uma passeata pelo fim da culpabilização da vítima em casos de
agressão sexual. Aqui no Brasil organizou-se, no mês seguinte, a “Marcha das
Vadias”, movimento de enfrentamento à violência doméstica. Ao longo de 2011 diversas cidades brasileiras realizaram suas marchas e, em 2012, mais
de 20 cidades organizaram a primeira “Marcha Nacional das Vadias”.
Apesar da polêmica do nome, o movimento ganhou força, pois as
mulheres refletiram sobre os usos e o poder da palavra “vadia”. Há muito
tempo os homens têm usado a palavra “vadia” para justificar diferentes tipos de
agressão. Afirmam que apanhamos porque somos “vadias”, que merecemos
ser estupradas porque somos “vadias”. Que um decote ou uma minissaia
nos tornam “vadias”. O termo “vadia” oprime nossa sexualidade, pois nos torna um mero objeto de satisfação sexual.
Desta forma, usamos a força da polêmica da palavra “vadia” para
ressignificá-la. “Se ser livre é ser vadia, então somos todas vadias” tornou-
se o lema do movimento. A irreverência da reapropriação de uma palavra que
carrega uma conotação tão negativa sugere o caráter subversivo da marcha.
Estamos aqui para buscar a transformação do quadro de violência contra a
mulher e a polêmica nos dá força para chamarmos a atenção da população
brasileira para este problema histórico, que há tempos não recebe a devida
atenção do poder público.
Vivemos em uma sociedade que estimula a violência contra a mulher. Os
números da violência doméstica são alarmantes em todo o Brasil. As últimas
pesquisas publicadas revelam que o Brasil é o 7º país que mais mata mulheres
em todo o mundo. O Paraná é o 3º estado em número de feminicídios.
Essa é a nossa realidade e é para isso que queremos chamar a atenção.
Ao gritarmos: “Eu sou vadia, e você?” reafirmamos que agora “vadia” virou
sinônimo da mulher que luta e que não se cala diante da violência. É a nossa
força de reação e o nosso poder de mobilização. Nossos polêmicos corpos à
mostra escancaram a busca pelo fim da opressão. Chocamos a população?
Sim. Esse é o nosso propósito e o grande questionamento que levamos para
as ruas é: “Por que o termo vadia é mais chocante do que os números da
violência contra a mulher”?
Nós, as vadias.
Em 2011 ouviu-se a seguinte frase: “Evitem vestir-se como vadias para não serem estupradas”. Percebendo que essa afirmação culpa a própria vítima pela agressão sexual, decidimos ir às ruas pelo fim da culpabilização da mulher e para gritar que a culpa do estupro é sempre do estuprador.
Ao discutirmos o uso da palavra “vadia” para intitular o movimento, percebemos a força de opressão que o termo carrega. Vadia é aquela que se veste como quer, que não realiza todos os desejos do homem, que tem uma personalidade forte, que exerce sua liberdade sexual. Vadia é a mulher que trabalha para sustentar a casa, que apanha do marido, que faz sexo forçado. Vadia é a mulher que não tem voz na nossa sociedade patriarcal, que existe apenas para realizar os desejos do outro, que é vítima da violência.
E então descobrimos: somos todas vadias. Esse é o lugar que nos é reservado e nos apropriamos dele. Percebemos que vadia é quem busca libertar-se da dominação machista e nos assumimos como tal. Se ser livre é ser vadia, então somos todas vadias. Não queremos mais nos sujeitar à violência, seja ela física, sexual, psicológica, moral ou institucional. Queremos exercer o nosso direito à igualdade sem sermos rotuladas ou agredidas. Vadia, para nós, virou sinônimo de mulher que luta e não se cala. Nós, vadias, somos hetero, homo e bissexuais. Somos cissexuais e trans. Somos cidadãs e cidadãos e exigimos os nossos direitos.
Assim, organizamos o movimento Marcha das Vadias de Curitiba e fomos conhecer a verdadeira realidade da violência contra a mulher. Fomos bem recebidas pelas secretarias municipais e por organizações que atuam na área, como Espaço Mulher e Rede Feminista de Saúde, e tivemos acesso a alguns números relativos à violência. Descobrimos que existe apenas uma casa-abrigo para mulheres em situação de risco; que o agressor demora até 2 meses para ser notificado sobre uma medida protetiva; que 80% das vítimas de agressão sexual (conjunção carnal e ato libidinoso) têm de 0 a 18 anos e que os bairros Cajuru e Boa Vista são os campões em registros de agressões contra a mulher.
Sabemos que o trabalho com esses dados não envolve apenas a questão da violência doméstica, mas principalmente a conscientização sobre a violência de gênero. Em nossa luta nos unimos à causa LGBTQ em busca do respeito e da igualdade de direitos. A realidade da violência na nossa cidade e no nosso estado nos deixa à mercê do agressor. Não temos segurança e nem os nossos direitos básicos de cidadania assegurados.
Temos trabalhado muito no enfrentamento à violência de gênero e o nosso principal mérito tem sido o da conscientização. Diversas mulheres cissexuais e trans, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e queers não se percebem como vítimas da violência. Desconhecem a Lei Maria da Penha, que regula as questões referentes à violência doméstica.
Perceber-se na condição de vítima, seja qual for o tipo de violência, é um processo muito doloroso. Demanda acolhimento, aceitação, apoio e acima de tudo ausência de julgamento. Essa tem sido a nossa luta e convidamos todos os que se interessarem a passar uma tarde conosco no atendimento às vítimas de violência. Somos polêmicas e usamos a provocação como forma de mobilização, mas o ultraje não é nosso nome nem nosso protesto, e sim a violência que nos cerca. A Marcha das Vadias, que hoje sai pelas ruas, não é sobre sexo, é sobre violência.

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