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Conteudo BVE 270 Fotossintese (parte 1)

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Material Didático de apoio a disciplina BVE 270 
Professor Marcelo Ehlers Loureiro 
Professor Carlos Martinez 
 
 
 
1) Introdução 
A fotossíntese pode ser considerada a principal rota biossintética da vida no 
planeta Terra. Em um ano, cerca de 7 1010 toneladas de carbono são fixados em compostos 
orgânicos. Isto equivale a 1% das reservas conhecidas de combustíveis fósseis (carvão, gás e 
petróleo) e cerca de 10 vezes o consumo mundial de energia. Por meio da fotossíntese, as 
plantas, algas e alguns tipos de bactérias convertem a energia física da luz solar em energia 
química. Essa energia será então armazenada nos compostos orgânicos presentes nas plantas, 
e servirá como elo fundamental na manutenção de outras cadeias alimentares. 
A fotossíntese pode ser definida como um processo físico-químico, mediante a 
qual os organismos fotossintéticos sintetizam compostos orgânicos a partir de matéria-prima 
inorgânica, na presença de luz solar. Ela pode ser dividida em duas fases: a fase fotoquímica, 
na qual a energia luminosa é utilizada, gerando ATP e NADPH, os quais serão então 
utilizados na segunda fase, a fase de fixação de CO2 (Fig. 1). O processo fotossintético das 
plantas ocorre nos cloroplastos e resulta na liberação de oxigênio molecular e na captura de 
dióxido de carbono da atmosfera, que é utilizado para sintetizar carboidratos. 
 
Figura1: Fases da fotossíntese. Na fase fotoquímica, a energia luminosa é utilizada para retirar elétrons de 
moléculas de água, os quais serão transportados na membrana do tilacóide resultando na produção de ATP e 
NADPH, compostos ricos em energia, e que serão utilizados nas reações bioquímicas para a fixação de CO2. 
Participação na editoração e processamento de imagens: 
Marcelo Francisco Pompelli, Leonardo Carnevalli Dias 
2) Luz: Conceitos Básicos 
A luz , fonte primária de energia na fotossíntese, é parte da radiação 
eletromagnética que é visível ao olho humano. A "luz visível" têm comprimentos de onda que 
vão do violeta, com cerca de 380 nm, ao vermelho, com 700 nm. Essa faixa do espectro de 
radiação eletromagnética também é chamada "radiação fotossinteticamente ativa" (Figura 2). 
A luz possui características de uma partícula (fóton) e de uma onda 
eletromagnética. Assim a luz é uma corrente de partículas carregando energia, a qual é 
designada quanta (singular quantum). Cada quantum de luz, ou fóton, contem uma quantidade 
de energia. Assim, nem todas as “cores” da luz (comprimentos de onda) possuem a mesma 
energia, pois o nível energético de um fóton é inversamente proporcional ao seu comprimento 
de onda. 
 
Figura 2: Características de várias regiões de comprimentos de onda da luz. Os limites de comprimentos de 
onda ligados a sensação de uma cor particular são de algum modo arbitrários e variam com os indivíduos. 
 
 
3) Pigmentos Fotossintéticos 
3.1 Tipos de pigmentos presentes em plantas e sua função 
Para que a energia da luz possa ser utilizada na fotossíntese, ela primeiro precisa 
ser absorvida. Moléculas que absorvem luz são chamadas de pigmentos, e pigmentos 
fotossintéticos são aqueles pigmentos localizados no cloroplasto, especificamente associados 
à membrana dos tilacóides, os quais captarão a energia da luz e permitirão a sua utilização. As 
clorofilas (Fig. 3) são os principais pigmentos fotossintéticos. Carotenóides (Fig. 4) também 
são pigmentos fotossintéticos, embora com uma função acessória a das clorofilas. 
 
 
 
 
 
Figura 4: Estrutura de alguns carotenos. Xantofila representa um subgrupo dentro dos carotenóides, e são 
caracterizados pela presença de hidroxilas em um ou mais dos seus anéis, sendo representadas acima pela 
luteina, violaxantina e zeaxantina. b-caroteno e luteína são os carotenos mais abundantes nos tilacóides. Outro 
exemplo de caroteno, o licopeno, presente em altos níveis em frutos do tomate, responsável pela cor vermelha 
desse fruto. 
Figura 3: Estrutura da clorofila a e b, principais formas 
de clorofilas presentes em plantas. Outras clorofilas 
estão presentes em algas e bactérias e apresentam valor 
taxonômico. 
As moléculas de clorofila possuem uma “cauda” hidrofóbica, chamada de fitol, a 
qual é responsável pela sua inserção, em conjunto com proteínas associadas (proteínas das 
antenas fotossintéticas), na membrana do tilacóide, não influenciando suas propriedades de 
absorção de luz. 
O número de átomos de oxigênio presentes em uma molécula é um dos principais 
fatores determinantes da polaridade de uma substância, sendo diretamente proporcional a 
essa. Assim, comparando-se as estruturas químicas dos pigmentos acima apresentadas, 
conclui-se que os carotenos são mais hidrofóbicos (menos polares) do que as clorofilas, e de 
que a clorofila b é mais polar que a clorofila a. Clorofilas e carotenos também possuem 
diferentes espectros de absorção, o qual pode ser comparado com o espectro de ação 
fotossintético, como mostrado na figura abaixo: 
 
 
Figura 5: Espectro de absorção de clorofilas e carotenos, e taxa fotossintética sob luz monocromática (espectro 
de ação). 
Observa-se na figura acima que as clorofilas possuem dois picos de absorção, um 
localizado sob a região da luz azul, e outro sob a região da luz vermelha. Já os carotenos 
possuem dois picos de absorção limitados à região do azul. Observa-se também que, embora 
possuam os carotenóides um segundo pico de absorção na faixa do espectro de 520 nm, a taxa 
fotossintética nessa região apresenta-se em franco declínio, representando evidência para a 
função acessória dos carotenóides na absorção da energia luminosa para a fotossíntese. De 
fato, possui esses pigmentos uma função mais importante como elementos estruturais das 
antenas e tem importante participação na dissipação de excesso de excitação energética das 
clorofilas. 
Outros pigmentos existem que não participam na fotossíntese, e estes estão 
presentes principalmente no vacúolo. Esses pigmentos não fotossintéticos são hidrossolúveis e 
grande parte deles pertence a grande classe de compostos fenólicos denominada flavonóides, 
a qual é composta por mais de 4500 tipos de pigmentos já caracterizados. A estrutura básica é 
composta por 15 átomos de carbono em um arranjamento “C6” (anel fenólico A) – “C3” 
(ponte de 3 carbonos), e “C6” (anel fenólico A) (Fig.6). As antocianinas são flavonóides com 
açúcares ligados a sua estrutura carbônica. Esses flavonóides possuem importante papel na 
interação plantas-animais, sendo os responsáveis pela cor das flores e frutos, na atração à 
polinizadores e dispersadores de sementes e frutos. Antocianinas sem açúcares ligados a sua 
estrutura são chamadas de antocianidinas (Fig. 6). Flavonóides podem também proteger as 
plantas contra a radiação ultravioleta ou de ataques de herbívoros e fungos, sinais na interação 
legume-Rhizobium, e na formação do cerne de troncos lenhosos, aonde são responsáveis 
pelas características de cor, qualidade e resistência da madeira. Vários flavonóides têm 
também sido estudados devido suas propriedades medicinais, como moduladores da resposta 
imune, antiflamatória, anti-cancer, antiviral, e hepatoprotetora. 
 
Antocianidina Substituição Cor 
Pelargonidina 4’ = OH Vermelho-alaranjado 
Cianidina 3’ = OH, 4’ = OH Vermelho-arrouxeado 
Delfinidina 3’ = OH, 4’ = OH, 5’ = OH Púrpura-azulado 
Peonidrina 3’ = OCH3, 4’ = OH Vermelho-róseo 
Petunidina 3’ = OCH3, 4’ = OH, 5’ = OCH3 Púrpura 
Figura 6: Estrutura de algumas antocianinas e antocianidinas responsáveis pela coloração de algumas flores e 
frutos.As cores das antocianidinas dependem em parte das moléculas ligadas ao anel B. Um aumento no número 
de grupos hidroxílicos muda a absorção para comprimentos de onda maiores e resultam em uma cor azul do 
pigmento. Substituição de um grupo hidroxil por um grupo metoxil (OCH3) muda a absorção para comprimentosde onda mais curtos, resultando em uma cor mais avermelhada. As antocianinas possuem cores variadas, 
dependendo do pH do vacúolo. 
3.2 Pigmentos Fotossintéticos: Absorção da Luz 
e Conversão Energética 
Quando um pigmento fotossintético absorve a energia de um fóton, ocorre uma 
transformação na molécula do pigmento, a qual passa do seu nível energético baixo (nível 
básico) a um alto nível energético (estado excitado). Essa alteração no nível energético 
corresponde à passagem de um elétron de um orbital mais próximo do núcleo atômico, para 
um orbital mais externo (mais alto nível de energia). 
 
 
3.3 Absorção de Luz pelos Pigmentos no Conmplexo “Antena” e 
Transferência de Energia 
Funcionalmente, as moléculas de clorofila atuam agrupadas. A luz é coletada por 
um complexo formado por 200-300 moléculas de pigmento, que estão ligados a proteínas 
formando o complexo antena coletor de luz (LHC, Light-Harvesting-Complex). Essas antenas, 
por sua vez, encontram-se associadas a dois grandes complexos protéicos fundamentais às 
reações fotoquímicas: fotossistema I e fotossistema II (ver mais adiante). De acordo com essa 
concepção, a energia de um fóton, absorvida em qualquer ponto do conjunto de moléculas de 
clorofila da antena, migra a um centro de reação e promove o evento de transferência de um 
elétron (Figura 7). 
 
Figura 7: Representação esquemática de um fotossistema e sua respectiva antena. Os pigmetos fotossintéticos 
localizados na antena são aqueles que realizarão a transferência de energia por ressonância indutiva até as 
moléculas de clorofila do centro de reação. Somente essas moléculas de pigmentos (cilindro verde, no esquema), 
localizadas no centro de reação é que participarão das reações fotoquímicas, perdendo elétrons para um aceptor 
de elétrons (cilindro rosa), sendo reposto esse elétron à clorofila por um doador de elétrons (cilindro azul). 
A estrutura da antena é composta por proteínas e pigmentos, possuindo as 
proteínas a função estrutural do arranjamento espacial ordenados das clorofilas e 
carotenóides. A proteína LCHII é a proteína mais abundante dos tilacóides (50%) e sua 
interação com os pigmentos tem sido caracterizada como mostrada na Fig. 8. 
 
Figura 8: Distribuição espacial da associação entre os pigmentos e a proteína LCH2 no complexo antena dos 
fotossistemas. Somente o anel tetrapirrólico das moléculas de clorofila é apresentado. Doze moléculas de 
clorofila e 2 moléculas de carotenóides fazem parte dessa unidade funcional. (Fonte Buchanan, Gruissen e Jones, 
2000) 
 
A unidade formada pela proteína LCHII e os seus pigmentos associados, 
organizam-se funcionalmente como trímeros, os quais são elementos responsáveis pela 
absorção de luz tanto nas antenas dos fotossistema I como do fotossistema II. Outros 
complexos entre outras proteínas, como mostrado na figura 10, têm a função de transferir a 
energia captada pelo complexo LCHII ao centro de reação de cada fotossistema. 
 
Figura 9: Esquema mostrando a organização de trímeros do complexo LCHII na antena do fotossistema I e II, 
bem como do arranjamento espacial de outras proteínas componentes dessa estrutura (Modificado de Buchanan, 
Gruissen e Jones, 2000). 
As proteínas LCHII também possuem a importante função do deslocamento de 
parte das antenas entre o fotossistema II e I, de forma a equilibrar a energia recebida por cada 
fotossistema, visto a alteração da composição espectral da luz durante o dia, e o diferente 
espectro de absorção de cada centro de reação, variações e diferenças essas que poderiam 
causar uma não sincronia ideal entre o funcionamento de cada fotossistema. 
A organização dos pigmentos fotossintéticos em outros organismos ocorre de 
outra forma. Nas cianobactérias os pigmentos encontram-se organizados em ficobilossomas. 
 
 
4) Cloroplastos: Estrutura, Função e Evolução 
4.1 Estrutura e Função do Cloroplasto 
Nas plantas, o processo fotossintético ocorre dentro dos cloroplastos, que são 
plastídeos localizados em células especializadas das folhas (células do mesófilo palissádico e 
do mesófilo lacunoso). O número de cloroplastos por célula varia de um a mais de cem, 
dependendo do tipo de planta e das condições de crescimento. Os cloroplastos têm forma 
discóide com diâmetro de 5 a 10 micrômetros, limitado por uma dupla membrana (externa e 
interna). A membrana interna atua como uma barreira controlando o fluxo de moléculas 
orgânicas e íons dentro e fora do cloroplasto (Fig. 10). Moléculas pequenas como CO2 , O2 e 
H2O passam livremente através das membranas do cloroplasto. 
 
Figura 10: Estrutura do cloroplasto, indicando as membranas e organização dos tilacóides. O interior dos 
tilacóides é denominado de lúmem. 
 
Internamente, o cloroplasto é composto de um sistema complicado de membranas, 
conhecidas como membranas fotossintéticas (ou membranas tilacoidais ou lamelas), que 
contêm a maioria das proteínas necessárias para a etapa fotoquímica da fotossíntese. As 
proteínas requeridas para a fixação e redução do CO2 estão localizadas na matriz incolor 
chamada estroma. As membranas tilacoidais formam os tilacóides, que são vesículas 
achatadas com um espaço interno aquoso chamado lúmen. Os tilacóides, em certas regiões, se 
dispõem em pilhas chamadas de grana. 
 
 
Figura 11: Estrutura granal de um cloroplasto, indicando as membranas e organização dos tilacóides. 
 
Além da fotossíntese, ocorrem várias outras rotas metabólicas dentro do 
cloroplasto, como a síntese de aminoácidos , redução do nitrogênio inorgânico, síntese de 
amido, síntese de ácido graxo, síntese de hormônios como o ácido abscísico, entre várias 
outras rotas de compostos secundários, como, por exemplo, de compostos envolvidos nas 
interações das plantas com outros organismos (fungos e herbívoros, por exemplo). A riqueza 
energética dessa organela explica em parte a presença de tantas diferentes rotas metabólitas 
compartimentalizadas dentro dessa organela, sendo a sua regulação metabólica muito 
complexa e muito longe ainda de ser satisfatoriamente estudada e compreendida. 
 
4. Evolução do Cloroplasto 
Existem evidências de que os cloroplastos foram bactérias de vida livre que 
invadiram células não fotossintéticas. A presença de DNA cromossomal que se replica de 
forma semelhante a bactérias e de ribossomas com estrutura semelhante a estes procarióticos 
no estroma são evidências para suportar a teoria endossimbionte. As mesmas evidências 
também existem paras as mitocôndrias, suportando a aplicação dessa teoria na explicação da 
origem dessa organela durante a evolução. 
Mas, como dito na introdução, a fotossíntese também ocorre em procariotos, os 
quais não possuem organelas. O cloroplasto somente surge nos eucariotos durante a evolução. 
Nas bactérias verdes, os pigmentos e proteínas localizam-se em uma região discreta (a, linha 
de cor vinho, fig. 12) na membrana plasmática da célula da bactéria (a, linha preta). Na 
evolução dos procariotos, essas regiões fotossintetizantes discretas da membrana 
envaginaram-se, originando posteriormente os cromatóforos nas bactérias púrpuras (b). Nos 
procariotos mais evoluídos, como nas cianobactérias , surge pela primeira vez na evolução 
uma estrutura similar aos tilacóides (c). 
O cloroplasto começa a ser observado nas algas vermelhas. Os tilacóides 
apresentam-se como inúmeras estruturas individuais, essencialmente não conectados. Nas 
algas marrons e dinoflageladas ocorre então a interconecção e arranjamento organizados dos 
tilacóides, os quais agora podem ser encontrados formando dupletes ou tripletes. Organização 
mais complexa dos tilacóides podem ser observadas nas Briófitas (musgos, por exemplo), nas 
quais pode ser observado um maior empilhamento de tilacóides, embora ainda não tão 
organizados como observados em plantas. Assim, somente em plantas podem serobservada o 
grana, forma mais organizada de empilhamento dos tilacóides. 
 
Figura = 12: Evolução da estrutura fotossintetizante entre os procariotos e eucariotos. 
 
A evolução do cloroplasto é ainda um processo dinâmico na evolução. Observa-se 
que quando maior o nível de evolução, menor será o número de genes presentes no 
cloroplasto ou mitocôndria. Durante a evolução, os genes têm migrado para o cromossoma 
nuclear por um processo de mecanismo ainda desconhecido e denominado de fluxo gênico. 
Um exemplo é a proteína Rubisco (Carboxilase de Rubisco 1,5-fosfato), a qual é formada por 
dois tipos de subunidades, a grande e a pequena. O gene responsável pela síntese da 
subunidade pequena esta presente no cromossoma nuclear enquanto que o gene que codifica 
para a subunidade grande está no cromossoma cloroplástico.

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