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Ministério da Educação Secretaria de Educação Especial Instituto Nacional de Educação de Surdos Departamento de Desenvolvimento Humano, Científico e Tecnológico ANAIS DO SEMINARIO DO INES Surdez: Diversidade Social 19 a 21 de setembro de 2001 Rio de Janeiro Anais do VI Seminário Nacional do INES - Setembro 2001 Surdez e Diversidade Social Aos Autores e Leitores de nossas Publicações Infelizmente tivemos inúmeros contratempos com a produção desta revista, afetando inclusive a qualidade gráfica com separações inadequadas de sílabas, dentre outros problemas. Embora tenha passado por inúmeras revisões estes permaneceram na edição final. Abaixo relacionamos os mais relevantes cm forma de errata. Esperamos que no próximo número tenhamos superado esta adversidade. Carinhosamente, Comissão de Publicação ERRATA Pag. 11 - onde se le "nada esperar por pretos", leia-se "nada esperar dos pretos". Pag. 24 - onde se le "de outras crianças que as quais são", leia-se "de outras crianças as quais são". Pag. 35 - onde se le "mais deverá ser devolvida a tribo", leia-sc "mas deverá ser devolvida tribo". Pag. 35 - onde se lê ", e vicejando de indignação", leia-se "vicejando de indignação". Pag. 36 - onde se le "eles assistem impacientes a nossa capacidade", leia-sc "e eles assistem a nossa incapacidade". Pag. 39 - onde se le "Elizabeth, Elaee", leia-se "Beth, Elaine". Pag. 55 - onde se le "deferindo", leia-se "diferindo". Pag. 63 - onde se le "considerá-lo como capaz", leia-sc "considerá-lo como incapaz". Pag. 74 - nos créditos incluir o nome da Prof". Jurema Santos Souza - Supervisora do Projeto Presidente da República Fernando Henrique Cardoso Ministro de Estado da Educação Paulo Renato Souza Secretária de Educação Especial do MEC Marilene Ribeiro dos Santos Diretora-Geral do Instituto Nacional de Educação de Surdos Stny Basílio Fernandes dos Santos Diretora do Departamento de Desenvolvimento Humano, Científico e Tecnológico Solange Maria da Rocha Coordenadora de Projetos Educacionais Monica Azevedo de Carvalho Campello Divisão de Estudos e Pesquisas Nádia Maria Postigo CIP - Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional de Livros, RJ. S474s Surdez Diversidade Social (organização) INES, Divisão de Estudos e Pesquisas - Rio de Janeiro Inclui bibliografia I. Surdos - Educação - Congressos: I. Instituto Nacional de Educação de Surdos (Brasil). Divisão de Estudos e Pesquisas. II. Título 96-2048 CDD-371.912 C D U - 373.33 131296 161296 002373 ANAIS DO SEMINARIO: Surdez - Diversidade Social Edição Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES Produção Gráfica Gráfica e Editora Skill Line Tiragem 4.000 exemplares Comissão de Publicação Professor André Luiz da Costa e Silva Psicóloga Carla Verônica Machado Marques Fonoaudióloga Marisa Marins Viola Fonoaudióloga Monica A. de C. Campello Professora Simone Ferreira Conforto Professora Solange Maria da Rocha Rua das Laranjeiras, 232 CEP 22240-001 Rio de Janeiro - RJ - Brasil Telefax: (0xx21 ) 2285-7284 e 2285-7393 e-mail: ddhctl @ ines.org.br Instituto Nacional de Educação de Surdos Agradecimentos À incansável equipe do DDHCT, aos profissionais do INES e às alunas do CEAD. Sumário Editorial 11 Conferências Sociedade e Diversidade: Mistura ou Diferença Otávio Velho 15 Um Olhar Psicanalitico a Respeito da Questão da Identidade do Surdo Leny Magalhães Mrech 23 Oficina-Palestra de Cultura e Diversidade Nelson Pimenta 24 Palestras Escola para Todos - um Olhar pelo Mundo Monica Pereira dos Santos 27 Anacronismo nas Representações Sociais de Cidadãos Surdos e Políticas Públicas Solange Maria da Rocha 35 Projeto Dicionário Virtual de LIBRAS Tanya A. Felipe 37 Mesas Redondas Educação e Profissionalização de Surdos no Brasil. Ações da SEESP, INES, FENEIS Luzimar Camões Peixoto Stny Basilio F. dos Santos Tanya Amara Felipe 49 Diversidade na Família Heloise Gripp Diniz 52 Esmeralda Peçanha Stellig 55 Helenita Cardoso Silva 58 Tany Mary S. de Andrade 59 Cidadãos Surdos no Ensino Superior: Um Direito e Muitas Dificuldades Graziella C. Faini 62 Mauro S. Ribeiro 65 Alex Curione 66 André Sampaio 72 Aspectos Históricos dos Movimentos Sociais e Políticos dos Cidadãos Surdos - Uma Experiência Curricular no INES Heloise Gripp Diniz Marcus Vinicius F. Pinheiro Ronise Conceição de Oliveira 74 O Cidadão Surdocego: Socialização e Escolarização Maria Aparecida Cormedi 81 Shirlei Rodrigues Maia 87 Márcia Regina Gomes 91 Bioética - Surdez Surdez também uma Diversidade Genética Edi Lúcia Sartorato 96 Autonomia Reprodutiva e Justiça: um Estudo de Caso sobre a Sudez Debora Diniz 98 Escola Especial para Surdos Lorena Kozlowski 105 Maria Joaquina Nogueira da Silva 108 Thais Enê Fagundes Silva 111 Apresentação de Trabalhos Língua de Sinais e Fonoaudiologia - um Encontro Necessário Ana Paula Santana Priscilla Mara Ventura Amorim 119 Programa de Capacitação para Educadores que Atuam com Alunos Deficientes Auditivos ou Surdos no Ensino Regular Buffa MJMB, Nevenfeld Mel. Oliveira K.F. 120 Meu Livro Eletrônico Regional: Uma Experiência de Autonomia da pessoa Surda no Processo de Alfabetização Rita de Nazareth Souza Bentes Lúcia Cristina Bessa de Brito Coelho Maria do Carmo Ferreira Gomes 121 Fonoaudiologia e Surdez: Possibilidade de Atuação na Linguagem Escrita Graziella Nascimento Esteves Patrícia Rodrigues de Sordi Heloisa Arruda Boechat Prof. Dra. Maria Cecília M. Pinheiro Lima (orientadora) 122 Resultados de uma Investigação acerca da Inclusão Escolar do Deficiente Aditivo Palamin, M.E.E. Bortoleto, R.H.; Rodrigues, O.M.R.P; Motti, T.F.G.; Castanho, RM 123 Superando Limites Jane Strey Ivonete Julia Andrade Sandra Aparecida Jorge Paleto Antonio Carlos dos Santos Souza 124 Competência Pictórica do Surdo: um Futuro Profissional Tânia Maria de Oliveira Nery 126 Editorial A Contribuição das Diversidades "O macho adulto branco sempre no comando, riscar os índios, nada esperar por pretos". Caetano Veloso reflete na sua música "Estrangeiros" a questão das hegemonias. A trama social enreda-se nas relações de poder e significações que definem destinos de sujeitos, grupos, nações e estados. uma trama violenta de relações de lassidão. No jogo das hegemonias acima descrito, acrescentamos o macho, adulto, branco, que anda, vê e ouve. O que está fora disso? Quase todo mundo. As mulheres, as crianças, os velhos, os surdos, os cegos, os negros, os homossexuais e mais uma enxurrada de segmentos sociais que têm sua existência significada longe da respeitabilidade, das políticas, do acesso aos bens materiais e intelectuais da cultura humana e da vida produtiva. Por isso mesmo são essas pessoas, organizadas em suas identidades negadas, que estão movendo o mundo, desestabilizando as favas contadas. Incomodam quando distanciadas do que minimamente se espera de conforto existencial físico. Associações, ONG's, passeatas, manifestos promovem ações tendo como aliados eternos a arte. Dra. Nise da Silveira reescreveu a história da esquizofrenia com a mediação da arte. Bispo do Rosário fica como artista na memória coletiva. Sua esquizofrenia, apenas uma remissão. As manifestações artísticas são acolhimentos de diversidades aceitas, e desveladas em linguagem. Na arte ou em parceria com ela, o homem "enlouquece" no sentido de transcender para não "enlouquecer" no sentido de adoecer. E quando é que adoece? Quando se distancia da diversidade. Quando guetifica-se e homogeiniza-se. Sufoco, violência existencial, destruição psíquica, vocação para as massas. Movimento contra a natureza humana.Vitória de Tanatos (Deus do mal). Opressão, vida de mercado, liberalismos novos. O que pode nos apontar Eros, a vitória da vida, da solidariedade, do bem? como desvendar essa trama? A trama da legião de excluídos que tiveram suas existências únicas agrupadas em categorias para serem abortadas em vida. Contra-ato. Contra-senso. Hoje, organizadas, essas existências apontam uma luz em direção a todos nós. Tratados como deficientes, diferentes, incapazes, carentes, raça inferior, credo inferior, hoje vêem-se e querem ser vistos como diversidades. Queremos também. Queremos muito e intuímos o quanto juntos podem realizar de transformações nesse mundo. Lancemos um olhar para a surdez e para os surdos. Querem ser significados como identidade. Mais uma de tantas da diversidade humana. Mais que uma identidade, um segmento com uma língua própria, com uma língua própria onde sua escolaridade e relações sociais devam ser majoritariamente desenvolvidas com ela. Sua lingua. uma ressignificação que não deve ser, em sua ação, um fim em si, visto como mais um gueto autofágico de nada adiantaria. Ressignificar a surdez é contribuir para a desconstrução da homogenização em que estamos imersos. Portanto, desguetificar-se para entrar no enredo social com sua diversidade. Se tôda essa movimentação for no sentido do mesmo, o mundo surdo, a arte surda, a vida surda, de nada terá valido essa ruptura de paradigma (deficiência x diversidade). Será do mesmo para o mesmo. como as escolas irão se preparar para esses desafios? Em um Congresso Internacional de Reabilitação, observa-se um rapaz pintando um quadro com um pincel nos lábios, um jovem com ar de intelectual em uma cadeira de rodas lê bastante concentrado. Observando mais detalhadamente, não tem as duas pernas. O jovem cego toca "Aquarela do Brasil" ao piano, mulheres vaidosas desfilam em cadeiras de rodas. Cada uma de estilo diferente. Diversidades. Estaremos todos dispostos à interação? Leis, declarações, documentos não têm força para deslocar paradigmas. Só os atores vivos do processo poderão. Escola inclusiva é a escola da alteridade. Quem pode? Todos podemos? Vamos apostar? Finalmente nos aprontaremos para o outro? E as mil e uma faces da relação ensino-aprendizagem, grande entrave, tormento dos professores e alunos, como fica? Sócrates, o pensador grego, de tantos séculos e pelo menos dois milênios atrás, utilizava como estratégia dialógica a maièutica. Refletindo sobre a profissão de sua mãe, que era parteira, e observando sua prática, entendeu que, assim como uma criança é retirada do ventre materno, as idéias e concepções que uma pessoa tem sobre si mesma e sobre todas as coisas também devem ser partejadas. Partejadas através do questionamento paulatinamente aumentado em seu grau de complexidade até que possa formar um conceito sólido, crítico e significado em sua própria existência. Nessa perspectiva os sujeitos são construídos dialeticamente e não como meros repetidores de valores, com os quais nem sempre concordam e, por vezes, ao reproduzi-los, deles ficam reféns. O posicionamento crítico diante do conhecimento de mundo, do saber formal e da própria vida deveria ser objetivo primeiro nos processos educacionais. As disciplinas seriam instrumentos de saberes organizados a serviço do pensamento crítico. Segundo esse raciocínio, todo ser humano estaria, então, contribuindo, com sua diversidade, para as questões que desafiam a humanidade. Essa relação, portanto, em bases sócio-interacionais, estabeleceria o diálogo crítico entre as diversidades promovendo a construção de novos enredos. Solange Rocha Conferências Sociedade e Diversidade: Mistura ou Diferença Otáv io Velho Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro Carlos Lessa publicou, no número de julho de 2000 de Ciência Hoje, um artigo ("Globalização e Crise: alguma esperança?") extremamente importante para o esforço ainda incipiente de relançar o debate no interior do pensamento crítico, praticamente imobilizado há mais de uma década por um conjunto de eventos hoje já sobejamente conhecidos. O texto vem somar-se a um conjunto significativo de intervenções que Lessa vem fazendo de diversas formas, desde conferências públicas, passando por entrevistas escritas e televisionadas, artigos, livros e a própria participação firme e esclarecida na política universitária. uma atividade que serve de exemplo raro para os que acreditam que a atividade acadêmica deva estar em sintonia e diálogo com a sociedade e com os problemas do nosso tempo. A meu ver, pelo menos três pontos devem ser exaltados nessa última contribuição de Lessa: 1. O reconhecimento dos processos de "globalização" e "pós-modernidade", sem se perder em questões nominalistas estéreis. Para além das difíceis questões conceituais ainda por resolver e independentemente dos nossos desejos, aceita que os termos, pelo menos, apontam para processos sociais objetivos, que incluem mas não se reduzem a processos anteriormente conhecidos, à política econômica de eventuais governos e/ou às estratégias de determinados atores sociais, particularmente as grandes empresas multinacionais. A sinalização é o que importa. Essa atitude é sobretudo um grande passo adiante em relação à postura que considera tudo isso mera fantasia ou artimanha, e não um terreno a ser disputado, o que na prática tende a traduzir-se em derrotismo. Representa a retomada de uma postura que norteava os clássicos da Economia Política, o que parece ser uma preliminar indispensável, sem a qual não se pode fazer uma crítica verdadeira, ultrapassando a imobilidade do ressentimento. 2. O aceno com a idéia de "esperança", o que permite encarar os fatos, por mais desagradáveis que pareçam. Embora hoje talvez possamos prescindir da dialética - com todo o peso filosófico do século XIX que carrega -, não há dúvida de que não se deva jogar fora a criança junto com a água. E a criança, a meu ver, é no caso a aposta, a esperança de que a complexidade objetiva dos processos sociais impeça que algum ator social tome posse desses processos e controle plenamente os seus desdobramentos; embora, como veremos, a idéia de esperança também possua outras implicações. 3. O retorno a atores sociais concretos (como o "povão" e a classe média), a ultrapassagem de uma análise economicista e a centralidade conferida às questões da cultura. Lessa, assim, retoma e renova mais uma vez a melhor tradição da Economia Política, apoiado em sólida formação cultural, e abre a possibilidade de diálogo com outras tradições de estudo. É óbvio que ao abordar corajosamente um amplo leque de temas. Lessa não pretende estar dizendo a última palavra sobre tudo, mas sim querendo estimular a nossa imaginação, o nosso entusiasmo e o debate. É juntando-se a esse espírito que as considerações aqui esboçadas são feitas, de modo extremamente resumido, tomando o texto publicado em CH como inspiração inicial, mas não única. Em ciências sociais (como na politica) é crucial tentar distinguir nos processos sociais o que é irreversível do que não é. Os últimos anos foram testemunhas do desmantelamento de muitas estruturas institucionais que pareciam sólidas, fadadas apenas a um desenvolvimento normal. Nada mais justo, portanto, que consideremos também com ceticismo os ideólogos que pretendem cristalizar os novos processos que hoje parecem dominar a cena mundial, sobretudo a onipotência do mercado. Nada mais justo e saudável. Lessa aposta na volta do Estado nacional como referência política central, o que permitiria uma nova aliança entre o "povão", sempre inventivo, e a classe média desiludida com os benefícios do mercado e do novo cenário por ele dominado. Deixemos de lado por necessidade a rica etnografia apresentada por Lessa. Porém, registre-seque um encanto adicional que sua análise reserva para um antropólogo está justamente na importância que empresta às questões normalmente abordadas pela Antropologia. E fiel a uma tradição da Economia brasileira que no passado permitiu interessantes experimentos interdisciplinares. Mas isso é raro. Outro autor, que também sempre teve sensibilidade antropológica, é o historiador Eric Hobsbawm. Em livro recente aborda alguns dos mesmos temas de Lessa. Embora de um ponto de vista da "periferia" sua síntese possa parecer insuficiente, faz, a meu ver, considerações preciosas sobre a política e o Estado no mundo contemporâneo, cujas vicissitudes não se restringiriam à limitada história do neoliberalismo. Segundo Hobsbawm, o que estamos presenciando não é propriamente um enfraquecimento do Estado, a não ser nas extensas áreas em que efetivamente tem ele se esvanecido (particularmente na África, mas também na Ásia Ocidental e Central, e talvez nos Bálcãs e na Colômbia). De fato, quem, por exemplo, milita na universidade pública brasileira, é testemunha dos crescentes poderes orwellianos do Estado, exponenciados pelos recursos eletrônicos e contraditórios com um discurso (neo)liberal. Aantropóloga britânica Marilyn Strathern já alcunhou para isso a expressão "cultura da auditoria". O que na verdade estaria ocorrendo, diz Hobsbawm, é que "os cidadãos estão menos dispostos do que antes a obedecer às leis do Estado" (p. 42). O contraste entre o respeito às regras dos tribunais por parte dos que nos Estados Unidos nos anos 50 foram acusados de atividades comunistas e o comportamento dos estudantes e radicais da Nova Esquerda a partir de 1968, "como se não mais reconhecessem os princípios fundamentais que regiam a condução dos assuntos públicos", é revelador. E imagino que nos próprios Estados Unidos o desenvolvimento da noção de "desobediência civil" seja um marco não menos significativo. Para Hobsbawm, indicações dessa tendência na própria Europa remontam aos anos 40. O protesto social, que havia sido institucionalizado como parte do processo político normal, quase como um ritual, vai-se assemelhando a revoltas. E em muitos casos, até na própria Europa, o Estado mostra-se incapaz durante longos períodos de eliminar forças armadas organizadas no interior do território nacional. Há como que uma queda de "racionalidade", pelo menos do ponto de vista de uma concepção moderna de política e de um futuro ideologicamente programado. Posta desta forma, a questão ganha outra dimensão. Assustadora para quem, apesar de reconhecer teoricamente que o Estado moderno é uma construção humana de poucos séculos e que boa parte da humanidade historicamente não o conheceu, naturalizou a sua (oni)presença e a sua legitimidade. Por outro lado, é importante que se diga que a contestação do Estado não é a única. O próprio Hobsbawm sugere uma fórmula mais geral (que não explora) quando diz que, após o século das pessoas comuns, a disposição para aceitar uma autoridade superior não pode ser mais pressuposta. No terreno da religião, por exemplo, assiste-se hoje ao surpreendente paradoxo do enfraquecimento das estruturas institucionais convivendo com o crescimento de uma religiosidade difusa, como que desorganizada, espécie de guerrilha no território das grandes religiões, mas também desrespeitando os limites e invadindo territórios que o Grande Acordo Moderno reservara para outras instituições (médicas, mercantis, jurídicas, etc). Desse ângulo, diria mesmo que não é só o mercado que invade tudo, mas são em geral as fronteiras institucionais que são sacudidas. Quase que tanto se pode dizer que a religião (ou a política) se mercantiliza, quanto que a religião (ou a política) penetra na esfera do consumo. Questão de perspectiva. Boa parte das controvérsias religiosas hoje gira em torno da demanda moderna por uma definição clara e unívoca do religioso e a cada vez mais freqüente contestação (pós- moderna?) das definições, na prática, desses limites (Giumbelli, E.). Parece ser esta a nova era em que estamos ingressando, desconhecida e perturbadora. Qualquer previsão é, mais do que nunca, arriscada. Mas parece razoável supor, diante do exposto, que a pretensão ao domínio absoluto da lógica de mercado não se sustentará por muito tempo. A posteriori talvez venha a ser vista como um momento de um processo mais geral. O fundamentalismo neoliberal já apresenta alguns indícios de esgotamento e o sucesso da China e da Malásia na superação da última crise financeira, tanto quanto o desastre russo, é apenas uma das razões e sinal disto. Significa, então, que teremos o retorno ao Estado como fundamento? Pela lógica do que venho desenvolvendo, não. Seria uma ilusão. Ao contrário, parece que teremos de nos acostumar à ausência de um fundamento sólido para a vida social. O que não significa, evidentemente, que a ação estatal não possa ser relançada, uma vez passada a euforia neoliberal. Mas de que Estado e de que nação se tratará? Lessa nos recorda alguns elementos comumente associados à nossa identidade brasileira que, como não foram característicos do regime autoritário de 1964, pelo contrário, não teriam por que ser questionados: cordialidade, não-violência, ausência de segregação e tolerância. Eis, mais uma vez, um tema caro aos antropólogos, que nem sempre é apropriado nas análises políticas: o de uma sociedade que não se confunde com o mundo oficial e seus projetos de nação e nem, necessariamente, com as alternativas apresentadas pelas elites. No entanto, a partir de alguns setores da sociedade, esses elementos da suposta identidade brasileira vêm sendo de fato questionados, e talvez não tanto simplesmente por uma espúria associação com o regime militar. O próprio sincretismo, competência que Lessa (e muitos outros) exalta como valor síntese, tem sido contestado. Até que ponto, pergunta-se, trata-se, na apresentação desses valores, também de uma construção das elites, pelo menos na maneira de organizar elementos efetivamente presentes? Lessa, em seu texto, associa a pós-modernidade ao consumismo e ao modismo. Imagino que essas contestações possam ser consideradas parte dessa "onda". Dever-se-ia, talvez, explorar melhor até que ponto o consumo é, hoje, realmente (como também se tornou moda ou senso comum dizer), apenas terreno do niilismo ou se, pelo contrário, pode ser um lugar de produção de valor; de formas inusitadas, mas ricas. O sociólogo inglês Colin Campbell vem investigando isso, emprestando ao consumo uma nobre ancestralidade no Romantismo do século XIX que merece atenção. Mas de qualquer forma, é inegável que a "onda" associada à globalização e à pós-modernidade trouxe ao debate público questões cuja legitimidade poucos contestariam abertamente em nome da nossa identidade. E o caso da pauta levantada pelo movimento feminista e a do ambientalismo, que tendem a globalizar-se cada vez mais. Será que o mesmo poderá vir a acontecer em relação à denúncia do sincretismo do "pé na cozinha" no terreno das relações interétnicas? E possível, mas aí a questão talvez seja mais espinhosa, como ficou claro no drama coletivo que vivemos nas comemorações dos "quinhentos anos". Até um artigo de Genética publicado originalmente em CH (Sergio Pena e outros, "Retrato Molecular do Brasil", Vol. 27, no. 159) foi amplamente apropriado para mostrar que somos, de fato, biologicamente misturados, não fazendo sentido - dessa limitada perspectiva - as reivindicações de identidade étnica por parte de indígenas e negros. No plano da cultura, criou-se até um emblema: o chinelo de dedo. O fato de boa parte dos nossos indígenas utilizar-se desse simples e prático artefato cultural japonês sugeriria que também aí a identidade étnica (bem como a temática do multiculturalismo) não se sustentaria. O chinelo de dedo, que pode ser usado, por exemplo, pelos índios Waurá,a cuja rica cosmologia somos introduzidos logo após o artigo de Lessa, no mesmo número de CH (Aristóteles Barcelos Neto, "Monstros Amazônicos: Imagens Waurá da (Sobre)Natureza", Vol. 27, no. 162), torna-se critério de (não)indianidade. E a ausência de história apresentando-se como imposição. Curioso imaginar a que levaria a aplicação de critério análogo a nós mesmos. Se é que isso já não é feito: o McDonald's parece ser o nosso chinelo de dedo e, no final, todos são acusáveis de inautenticidade e infidelidade à cultura. No entanto, se o que resta no primeiro caso (o do chinelo de dedo) é o diagnóstico salvador do sincretismo, nesse segundo parece que há uma mudança na lógica, produzindo-se a bela sugestão primitivista do canibalismo cultural orientando a inventividade popular. Só que essa possibilidade é negada a nossos canibais originais, por medo, talvez, não confessado na acusação de inautenticidade, de que se afirmem excessivamente, em prejuízo do "todo" nacional. Fora do sincretismo os índios só podem ser exaltados como ícones ou reduzidos a "fragmentos". E interessante como esse tipo de posicionamento, nas comemorações dos "quinhentos anos", abarcou praticamente todo o arco político e intelectual das nossas elites, sugerindo que de fato estamos aqui lidando com elementos ideológicos muito profundos. Só que ao mesmo tempo, como sugere o próprio Lessa, é inegável que a posição contrária vem crescendo, e não apenas nas elites. A ponto, por exemplo, de hoje ter-se revertido o declínio numérico das populações indígenas. Reversão devida não apenas a alguma melhoria nas condições sanitárias, mas porque mais gente do "povão" hoje se identifica como índio, mesmo tendo que "inventar" tradições, no que estão em muito boa e ilustre companhia, conforme já mostrou o próprio Hobsbawm. E o mesmo ocorre no caso dos negros. A Antropologia diz que é preciso estranhar o familiar. Mas quantos de nós somos capazes de enxergar o óbvio? Por exemplo, a ausência de negros nas nossas universidades públicas, sobretudo na pós-graduacão. É crível, ainda, justificar isso em nome do sincretismo? Ou é de fato necessária a ajuda de um olhar estranho para estranhar? Por outro lado, uma vez mostrado o óbvio, poucos de nós não nos sensibilizamos de alguma maneira, embora possamos divergir no tratamento da questão. Não será isso sinal de que a cultura não é unívoca e de que portanto essas estranhezas encontram eco "aqui dentro"? Nesse caso, a oposição entre externo e interno precisaria ser revista. Sem perder de vista os elementos de poder envolvidos, nem sempre evidentes para uma análise que não se queira banal, o "externo" pode ser um recurso heurístico necessário e constitutivo de nós mesmos. Assim como o seria, do "outro lado", o primitivismo, a que voltaremos mais adiante. A ênfase, então, por vezes exaltada (além de exaltadora) na cordialidade, na não-violência, será pura representação da realidade? Ou será exorcismo agonístico dos seus contrários, remédio contra males que espreitam bem da esquina? O regime militar, afinal, por mais que se queira, não foi basicamente produto alienígena. E até a esperança talvez traga embutida, aflita, a desesperança. Mesmo o amor-próprio - e isso, significativamente, sugere o próprio Lessa - é um sentimento delicado, e o de inferioridade ameaça sempre ressurgir. Talvez como parte de uma grande ciclotimia, sobretudo das elites, grandes promotoras desses auto-retratos. Vale a pena, então, simplesmente tentar levantar a gangorra, mais uma vez? Temo que isso não nos tire do lugar, mas apenas realimente essa visão implicitamente dualista do mundo, que na verdade não corresponde ao que predomina no plano da cultura, que está sendo sugerido aqui nao ser unívoca. Lessa diz que a pós-modernidade fragmenta-nos por raça, sexo, idade, etc. E que não há substituto para a pátria, a não ser o consumo. Já mencionei a necessidade de tratar de modo novo o consumo. Mas sem dúvida é a partir dessas questões que se trava a polêmica; embora talvez tivéssemos, então, que acrescentar classe (muitos já o fizeram) às identidades fragmentadoras do ponto de vista do "todo". E compreensível, até certo ponto, o medo da fragmentação. Mas é preciso apostar que os processos não-controlados podem ser virtuosos. O risco contido na.defesa obsessiva da integração não deve ser esquecido. Lessa já o experimentou na própria universidade e denodadamente se opôs ao que ocorre quando um grupo se arvora, ancorado no poder do Estado, em árbitro do que é ou não "radicalismo". E a ironia está em que o fazem justamente em nome do "jogo democrático", que Lessa sugere como antídoto, justamente, para os "radicalismos". Portanto, a questão é complexa: é precisamente em torno do que se entende por democracia que se deve travar o debate crucial para os nossos destinos. Isso tem sido encoberto lançando-se mão do espectro do binômio radicalismo-ditadura diante de manifestações dos movimentos sociais que, nesses tempos em que o alinhamento automático ao Estado é cada vez menos a regra geral, tornam-se cada vez mais normais. Normais a não ser para os últimos a saber, os ciosos e inseguros de suas prerrogativas. O espectro da ditadura, estimulando a obsessão pelo controle, é brandido para forçar a aceitação de uma concepção restrita de democracia, apresentada como a única. O sistema representativo, cuja crise no mundo todo (também compreensível pelo já exposto) é ignorada, é utilizado como barreira contra uma democracia de cunho mais participativo. Aqui talvez se atinja um outro real paradoxo dos nossos tempos: o dos "progressistas" conservadores (ao lado dos conservadores que apostam na mudança). Fazem pós-modernidade sem sabê-lo. Para neutralizar as ciclotimias, talvez seja preciso buscar o "caminho do meio". A exaltação da fragmentação não cabe. Porém, igualmente não cabe a nostalgia de um fundamento sólido, pois que também ele tende a se desmanchar no ar; ou seja, a se fragmentar. como ocorre cada vez mais na vida conjugai, talvez tenhamos que nos acostumar com a costura de parcerias e arranjos, ao invés de casamentos e alianças mais amplas. Um pouco por toda a parte as instituições são postas em cheque e o enrijecimento em sua defesa derrota-se a si mesmo. Tem efeito paradoxal, porque retira-lhes o espírito original, retroalimentando os elementos mesmos que as tornam suspeitas. Talvez a genuína aceitação das "fragmentações" seja o único cacife possível para se entrar no jogo da sua transmutação, que não se sabe em que direção poderá se dar. A História brasileira, nesse ponto, pode ajudar. Aqui não cultivamos em demasia uma visão essencialista de nós mesmos e as elites tiveram menos sucesso que em outras partes em fixá-la, mesmo não se podendo negar-lhes qualquer eficácia ideológica. Sempre nos vimos em movimento, nos fazendo, ambíguos. Ambigüidade que representa uma sábia consciência, bem adequada à nova era, de que os opostos não se excluem, como nos dualismos. Guerra e paz, dentro e fora, malandros e heróis, Dona Flor e seus dois maridos: Gilberto Freyre (Benzaquen de Araújo), Jorge Amado e Roberto DaMatta (Geiger e Velho) já o disseram. Aí também residiria o sincretismo "bom", enquanto modo de operar; mas subordinado à ambigüidade, o operador maior, o meta-operador, que o contextualiza de modo diferente de sua reificação ideológica, ele mesmo sincretismo tendo que supor, sem excluir, o seu oposto. Se não nos distinguimos de modo unívoco substantivamente, pelo menos nesta visada, nesta epistemologia, neste modo de ver e de atuar o fazemos, em relação a muitos povos, sobretudo do Ocidente, que hoje vivem o drama da penosa revisão das suas identidades e de seus modos de pensar, que antes nos pareciam um ideal a atingir. Eis o paradoxo do nosso primitivismo, elaborado literariamente no interior do nosso Modernismo (Geiger):não se põe nos começos, como arquétipo, mas vai sendo digerido como antídoto, que nos acompanha, contra as ilusões de uma modernidade auto-suficiente, em todas as suas versões. O Estado brasileiro provavelmente será relançado. Mas jamais será o mesmo. A administração dinâmica de nossas diferenças, mais que uma integração pressuposta, deverá ganhar espaço. Não haverá retorno de filho pródigo, nem redescoberta, porque não haverá a que retornar ou redescobrir. Menos metafísica e mais pragmatismo do chinelo de dedo. Foi essa a lição do nosso sincretismo, que, agora, é desafiado a transmutar-se para que não sirva de encubridor das diferenças, mas continue a prestar o seu serviço ajudando para que essas diferenças não se reifiquem, como já aconteceu lá onde ele esteve ausente. Nossa criatividade, bem lembrada por Lessa, deve permitir que descubramos como realizar a alquimia, a acrobacia sem rede desse duplo movimento, no âmbito de uma identidade (com aspas) não-essencialista e ambígua, em que os opostos (e as diferenças) não se excluam. Sinais dessas possibilidades, no entanto, precisam ser buscados agora. O próprio Estado se move por vezes de modo não controlado pelos governantes e com fronteiras pouco nítidas. Por vezes, também, isso é mais perceptível lá no terreno tradicional dos antropólogos brasileiros, no interior do país, onde muitas pessoas desconhecem tanto o patriotismo, quanto o consumismo. Impressionaram-me nesse ano de 2000, no Médio Purus (Amazonas), os modos pelos quais se sente a presença do Estado. Pelo menos nessa área avança o reconhecimento das terras indígenas, sem dúvida como resultado de um conjunto de forças que ultrapassa o país. Em conseqüência, dá-se uma inversão dos papéis tradicionais na região, já que os índios são "federais". A lógica é a do reforço das diferenças, criando-se, por exemplo, uma assistência à saúde separada para brancos e índios e forçando-se uma definição étnica. Contra isso e em nome da "mistura" colocam-se os grupos políticos locais, embora essa ideologia da mistura mostre nitidamente seus limites na queixa de que no Sul do país se considera que todos os habitantes do Amazonas são índios ou no espanto diante da hipótese de se votar num candidato indígena a vereador (sem falar do espanto diante da permanência de pesquisador em aldeia onde, no entanto, iconicamente, tudo seria "natural"). Por outro lado, o Estado não tem forças para agir sozinho, mas depende de "parcerias" com organizações não-governamentais, igrejas, prefeituras e associações indígenas (no caso, atualmente, a Organização dos Povos Indígenas do Médio Purus, fundada há cinco anos). Sozinhos, todos são incompletos, não fazem sistema. A incompletude impõe uma espécie de integração, provisória, mas que não se identifica com subordinação à lógica do mercado. E como num caleidoscòpico quebra-cabeças, desses em que podem sobrar peças. As coisas só acontecem quando há uma confluência de vários atores, o que também permite maior vigilância sobre a utilização dos recursos, assunto melindroso e crítico. São muitas energias humanas e interações envolvidas e a "química" entre as pessoas é um elemento crucial. As questões de meio ambiente também carreiam recursos em função de uma pauta extra-local, provocando tensões com os hábitos e costumes consagrados. Há muitas diferenças em relação ao período de minha primeira pesquisa na Amazônia há mais de trinta anos, quando o Estado mostrava-se onipotente na intenção e impotente na prática, como no caso paradigmático da Rodovia Transamazônica. Tudo isso, delicado e contraditório, é, mais uma vez, menos produto de uma intenção de governo e mais do surgimento de novas forças sociais em complexa interação. E preciso tentar entender o que está sendo gestado. E de tabela tudo isso sugere igualmente a importância do trabalho de pesquisa, que ajuda a manter os pés no chão do existente. Trabalho antenável às grandes questões do nosso tempo, que, por sinal, vão além das do Estado, da política e dos supostos centros de decisão. A própria "despolitização", tão lamentada, pode ser tomada, em sua positividade, como um ceticismo realista e saudável, baseado na experiência concreta, e que nada tem de anacrônico, prestando-se a comunicar-nos a fluidez das fronteiras e apontar para outras realidades fora da política. Não é justo, nem proveitoso, pensar e medir (auditar?) a riqueza da vida social exclusivamente do ponto de vista de sua instrumentalização, pois esse movimento, por si, já compromete a capacidade de compreendê-la e resguardá- la, reforçando com isso os modos de pensar, as epistemologías dominantes. Os nossos evangélicos, por exemplo, sobretudo os pentecostais, não devem ser vistos apenas como os novos portadores de uma ética protestante progressista (tal como também não são agentes da CIA, como já foi costume dizer antes que fizessem valer sua presença). Menos distinções claras e nítidas e mais complexidade e fluidez. Mistura e diferença. Sistemas vivos, não mecânicos, que podem ser parte de sistemas maiores. Sistemas nem sempre lógicos ("racionais") ou conscientes, mas que, no entanto, buscam a auto-regulação e adiar a entropia por meio de comunicações que se dão em inúmeros níveis e de múltiplas e insuspeitadas maneiras. Isso tudo exige de muitos de nós (entre os quais me incluo) uma penosa reeducação. Benefício da crise, o que traz a esperança de enxergarmos com novos olhos - mais janelas que projetores -, não o que estaria por vir, mas o que já está entre nós. Esperança no presente porque se aceita a aventura da vida, o que talvez permita concentrar as energias e agir com mais eficácia, respondendo às questões que estão efetivamente postas. Sugestões de leitura: BENZAQUEN DE ARAÚJO, R. - Guerra e Paz: Casa-Grande e Senzala e a Obra de Gilberto Freyre nos Anos 30. Rio de Janeiro: Editora 34, 1994. CAMPBELL, C. - The Romantic Ethic and the Spirit of Modern Consumerism. Oxford: Blackwell Publishers, 1995(1987). GEIGER, A. - uma Antropologia sem Métier: Primitivismo e Crítica Cultural no Modernismo Brasileiro. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: Museu Nacional (UFRJ), 1999. GEIGER, A. e VELHO, O. - "A liminaridade antropofágica de Roberto DaMatta ou Tupi or not tupi? A virtude está no meio" in GOMES, L., BARBOSA, L. e DRUMMOND, J. A. (orgs.), O Brasil Não É Para Principiantes: Carnavais, Malandros e Heróis 20 Anos Depois. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000. GIUMBELLI, E. - O Fim da Religião: Controvérsias acerca das "seitas" e da "liberdade religiosa" no Brasil e na França. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: Museu Nacional (UFRJ), 2000. HOBSBAWM, E. - O Novo Século. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. STRATHERN, M. - "A avaliação no sistema universitário britânico". Novos Estudos Cebrap, no. 53, março de 1999, pp. 15-32. VELHO, O. - "Globalização: Antropologia e Religião". Mana - Estudos de Antropologia Social. Vol. 3, no. 1, abril de 1997, pp. 133-53. Um Olhar Psicanalitico a Respeito da Questão da Identidade do Surdo Profa. Dra. Leny Magalhães Mrech Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Súmula: Serão discutidos, a partir das mais recentes pesquisas e encaminhamentos da teoria psicanalitica lacaniana, os principais impasses que geralmente acontecem no processo de constituição da criança surda. Para isto serão apresentadas as principais diferenças entre as abordagens da Psicologia e da Psicanálise. Em segundo lugar, a forma como as teorias de desenvolvimento e a teoria psicanalitica têm lidado com os conceitos de desenvolvimento e estrutura, tendo em vista o processo de constituição da criança surda. Em terceiro lugar, abordar-se-á de que maneira os conceitos de identidade e os processos de identificação têm sido trabalhados pelas teorias do desenvolvimento e pela teoria psicanalitica. Por último,serão privilegiados os efeitos dessas discussões na prática do professor de Educação Especial, Educação Inclusiva e do ensino regular. Oficina-Palestra de Cultura e Diversidade Nelson Pimenta com a oficina que acabamos de fazer, vivenciamos uma situação em que a diversidade se impôs. Houve momentos em que foi difícil relativizar valores e aceitar as diferenças. A vida e a sociedade são assim, temos que conviver com a diferença e com a oposição o tempo todo. Eu me chamo Nelson Pimenta e nasci em Brasília, no dia 6 de setembro de 1963. Mudei-me com a família para o Rio de Janeiro em 1976. Fui o primeiro ator surdo a se profissionalizar no Brasil, estudei no NTD (National Theatre of the Deaf) de Nova Iorque, sou pesquisador de Língua de Sinais e já atuei como instrutor de teatro e de Língua de Sinais Brasileira em diversas instituições de ensino, entre elas o INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos) e a FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos). Atualmente estudo para graduação em Cinema pela Universidade Estácio de Sá. Em 1999 criei, com Luiz Carlos Freitas, a LSB Vídeo, empresa com a missão de contribuir para o aprimoramento da educação dos surdos. Montamos uma equipe de trabalho com profissionais da área de educação que acreditam que a situação de exclusão social em que muitos surdos brasileiros se encontram poderia ser evitada a partir da construção da identidade surda nos indivíduos, possibilitando a luta por seus direitos e promovendo a conscientização de seus deveres. Eu sou surdo e sou feliz. Minha trajetória de sucesso começou na família, com a absoluta aceitação da diversidade da minha natureza, principalmente por parte de minha mãe, que desde a descoberta da surdez teve a intuição de que o mais importante em sua relação comigo seria termos uma comunicação satisfatória, partindo do princípio de que ela deveria se adequar à forma de comunicação mais fácil e natural para mim, e não o contrário. Logo descobriu que essa forma era com os sinais e adotou a língua de sinais em nossa casa. Por causa disso, cresci acreditando que a comunicação do mundo era dessa forma, através dos sinais, e, portanto, nunca cogitei que eu pudesse ser diferente. Meu referencial nunca foi a audição e sim a surdez, o que contribuiu, definitivamente, para a construção da minha identidade como um indivíduo com elevada auto-estima e autoconfiança, ao contrário de outras crianças que às quais são impostos modelos de comportamento e comunicação adequados a quem tem audição e, com isso, passam a ter os ouvintes como referência. Invariavelmente, essas crianças crescem com baixa auto-estima, acreditando serem deficientes por não conseguirem a mesma performance que os ouvintes na fala e na escrita. Mais tarde descobri que eu sou, de fato, diferente da maioria, e minha luta começou no sentido de que a surdez seja reconhecida como apenas mais um aspecto das infinitas possibilidades da diversidade humana. Ser surdo não é melhor ou pior do que ser ouvinte, é apenas diferente. E ser surdo é diferente de ser deficiente auditivo. Se um de vocês aqui presentes, que ouve e que, por isso, tem a cultura da audição, ou seja, se comunica através da fala, gosta de música e do barulho do mar etc, perder a audição, certamente será um deficiente auditivo, pois estará com um déficit, uma vez que perdeu algo que já teve um dia. Mas eu nasci surdo e, como só se perde aquilo que se tem, nunca perdi a audição, pois nunca a tive. Eu tenho o direito de viver assim, e o mundo tem o dever de aceitar minha diferença. Sou surdo e sou feliz. Palestras Escola para Todos - um Olhar pelo Mundo Monica Pereira dos Santos' I - Introdução Este artigo tem como objetivo discutir e defender a existência de um sistema educacional que se proponha a atender, com qualidade, a todo o seu alunado, independente de suas características particulares originadas de suas habilidades, origem cultural, étnica, religiosa, opção sexual ou qualquer outro aspecto que o diferencie. Pretende ainda mostrar o que as pesquisas internacionais têm apontado como principais obstáculos à viabilização de uma educação democrática e de qualidade para todos, bem como mostrar que argumentos têm sido utilizados para combater esses obstáculos, removendo-os, ou pelo menos minimizando-os. As experiências relatadas nas pesquisas podem ser consideradas como iniciativas tomadas por esses países em relação à transformação de suas escolas numa direção cada vez mais inclusiva de seu alunado. Se essas experiências não devem, por um lado, ser tfaduzidas ao pé da letra para o contexto brasileiro, elas podem e devem, por outro, servir de fontes de inspiração para que possamos repensar nossa própria realidade e prática. Partimos do princípio de que não há, em contexto algum, grupos que possam ser considerados homogêneos. A escola é, em especial, o lugar por excelência em que a heterogeneidade se encontra presente, e esta deve ser celebrada como um recurso, ao invés de ser vista como um problema. Argumentamos que sem uma perspectiva de celebração das diferenças, através da qual velhos paradigmas educacionais relativos a uma prática pedagógica excludente possam ser combatidos e transformados, o objetivo de uma escola de qualidade para todos pode ser inviabilizado. Dividimos o material subseqüente em duas partes. Na primeira, estaremos discutindo o que é a escola para todos no que diz respeito a suas origens históricas, aos seus objetivos e ao porquê de sua existência. A segunda parte tratará de apontar os obstáculos mais comumente encontrados nos diferentes contextos mundo afora, e a relatar o que tem sido sugerido para enfrentá-los. II - O que é a escola para todos? 2.1 - Origens - de onde ela vem? A idéia de escolas que atendam a todo o seu alunado se origina de uma movimentação histórica a favor da democratização e humanização da educação em diversos países. Suas origens já foram apresentadas em diversos artigos e livros, tanto na literatura nacional quanto internacional (ver, por exemplo, Carvalho, 2000, 1998; Santos, 1997, 1998 a, 1998b, 1999; Werneck, 1997). A despeito dé uma ou outra visão diferenciada sobre os autores quanto ao assunto, todos concordam em que, historicamente, a origem da noção de escola para todos remonta há pelo menos 'Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade do Brasil (Universidade Federal do Rio de Janeiro). quatro décadas, quando da publicação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). A própria existência desse documento denota o ano de 1948 como um importante marco no sentido da expressão, em declaração, de preocupações ligadas aos direitos básicos de qualquer cidadão do mundo. Entre tais direitos, já se encontra o relativo à educação. Na verdade, tais preocupações não foram manifestas ao acaso. Tratava-se de uma época pós-Segunda Guerra Mundial, em que o desemprego e a recessão econômica assolavam muitos dos países líderes e outros, aliados e inimigos na Guerra. As desigualdades sociais, decorrentes de propostas político-econômicas que primavam principalmente pela prosperidade econômica dos países, tornaram-se ainda mais gritantes. No campo da produção científica, estudos comprovavam cada vez mais tôda uma série de discriminações e exclusões ocorrendo nos mais variados terrenos da vida humana. Era, portanto, imperativo uma tomada de atitude pública e manifesta, nos termos de uma Declaração Universal, a respeito das desigualdades constatadas e da reafirmação da necessidade de se combatê-las. A partir desta época a luta pelo reconhecimento dos direitos humanos, bem como pela sua proteção, se acirrou e se organizou. Grupos minoritários que sofriam o peso maior da exclusão inauguraram seus próprios movimentos de defesa, constituindo grandes redes de defesae produção de conhecimentos que propiciassem a adoção de alternativas, em todos os campos, para que uma vida mais digna fosse garantida aos seus membros. Esses grupos ganharam força política, e passaram também a exercer influência na elaboração de políticas mais humanistas em seus respectivos países. A educação, um dos principais campos por meio dos quais se promove a formação humana, não ficou de fora. Nos sistemas de ensino, constatava-se a exclusão de vários grupos sociais, pelos mais variados motivos, ora explícitos, ora velados. Havia grupos que sequer conseguiam acesso à educação e outros que, mesmo usufruindo dela, eram vulneráveis às mais variadas práticas de discriminação que culminava em sua exclusão. As décadas de 60 a 90 preocuparam-se especialmente com a investigação científica desse quadro. Constatou-se que a exclusão se dava por motivos de etnia, de religião, de gênero, de condições sociais, de supostas incapacidades físicas ou mentais, entre vários outros aspectos. A escola seguia sua pedagogia, preponderantemente elitista, e a premissa básica era a de que cabia aos alunos adaptarem-se a ela e a sua cultura seletiva. As avaliações, a didática, tudo colaborava para a manutenção de uma escola única, inflexível, em que as diferenças não possuíam nenhum valor - pelo contrário, eram no mínimo inconvenientes. O pressuposto, equivocado, era o de que uma educação "correta" deveria ser uma só para todos, em princípio e na prática, como se todos fossem iguais. como se todos aprendessem pelas mesmas vias, movidos pelos mesmos interesses e com a mesma motivação. A questão que as realidades sociais nos apresentavam, no entanto, pela da constatação cada vez mais alarmante dos índices de fracasso e exclusão dos indivíduos dos mais variados setores das sociedades, era: embora sejamos todos iguais em valor (como seres humanos), isso não significa que somos todos iguais também em nossa forma de ser. Em outras palavras: apesar de termos declaradamente o mesmo valor comò seres humanos, e conseqüentemente os mesmos direitos a uma vida digna, não vivemos de forma homogênea. Pertencemos a grupos variados, temos características (físicas, familiares, históricas, religiosas, culturais, de gênero, psíquicas, etc.) variadas, e isso por si só implica a consideração, por parte de qualquer serviço social, de que para que atenda, de fato, a todos com maior igualdade, é preciso considerar as diferenças na organização desses serviços. Inverte-se, assim, o pressuposto: uma educação "correta", democrática, justa, jamais poderia ser a mesma para todos no que diz respeito à sua prática, embora sim no que diz respeito aos seus princípios. O princípio de que a educação deve proporcionar uma formação social básica a todo e cada ser humano deveria ser preservado. Mas as práticas através das quais tal princípio se manifesta não podem ocorrer sem flexibilidade e variação. Porque nem todos têm a mesma motivação para aprender, nem todos aprendem melhor apenas ouvindo (há os que preferem ver, os que preferem tocar, os que preferem exercitar, os que preferem falar...), e nem todos querem aprender a mesma coisa. Portanto, uma escola de qualidade para todos deve levar esses aspectos em consideração. 2.2 - Objetivos - para que serve a escola para todos? uma escola para todos serve, portanto, como meio reconhecido através do qual os membros de uma sociedade possam ter acesso ao conhecimento e, mais do que isso, à produção deste, como indivíduos ativamente participantes e construtores de seu próprio meio. A escola de qualidade para todos reconhece a importância de seu próprio papel na formação de sociedades mais justas e luta para extinguir ou minimizar todo e qualquer tipo de exclusão: dentro e fora de sala de aula. Ela serve ao objetivo mais amplo de constituição de sociedades - e conseqüentemente de um mundo - em que as diversidades sejam vistas como riquezas, e nunca como problemas. Pois como nos diz Booth: A necessidade de se pensar inclusivamente em educação nunca foi tão importante quanto nesta última década. Temos sido dolorosamente relembrados do quanto a paz e a estabilidade ficam abaladas quando a diversidade deixa de ser valorizada.(in: Savolainen et alii, 2000, p. 29). Nesse sentido, cabe lembrar sua estreita associação com o que hoje se chama educação inclusiva. Essa relação fica explícita num dos documentos internacionais mais importantes da década de 90, que reafirma os princípios expressos em 1990 na Declaração Mundial sobre Educação para Todos: a Declaração de Salamanca (1994). Em sua versão original (inglesa), lê-se, na página 78 de suas linhas de ação, no tocante aos recursos necessários para que tais linhas tenham efeito: O desenvolvimento de escolas inclusivas como o meio mais eficaz de sé atingir a educação para todos deve ser reconhecido como uma política-chave no plano governamental e a ele [ao desenvolvimento - nota da autora] deve ser dado um lugar privilegiado no planejamento do desenvolvimento nacional. Em outras palavras, fica claro que a inclusão em educação é a filosofia com base na qual uma educação para todos possa, de fato, acontecer. Ao planejarem seu próprio desenvolvimento, as nações deverão levar em conta que a educação para todos, princípio básico de desenvolvimento nos dias de hoje, é alcançada quando fundamentada numa filosofia - de inclusão - que leve em consideração a diversidade presente nas sociedades e seus sistemas de ensino. Isso deve acontecer em todos os níveis: no da organização das instituições educacionais (formais e não formais), na administração de sistemas (educacionais e outros), na formulação e implementação de políticas (nacionais e internacionais), e, acima de tudo, nas práticas sociais (pedagógicas e outras). 2.3 - Justificativa - por que uma escola para todos? Assim, justifica-se a escola para todos. Fundamentada no reconhecimento da importância de se lutar contra as exclusões - e conseqüentemente promover a inclusão -, ela estará promovendo um mundo cujas relações internacionais e intranacionais se darão de forma mais justa, mais igualitária. Ill - como a escola para todos tem sido promovida? 3.1 - Obstáculos e seu enfrentamento Sete têm sido os temas orientadores de ações nacionais propostos pela Declaração de Salamanca (1994): (a) Política e organização; (b) Fatores escolares; (c) Recrutamento e treinamento de pessoal de educação; (d) Serviços externos de apoio; (e) Áreas prioritárias; (f) Perspectivas comunitárias e (g) Recursos requeridos. Em cada um desses temas, as pesquisas levantam o que se podem considerar obstáculos ainda presentes - e conseqüentes ações necessárias - para que a educação para todos seja promovida. Discutiremos aqui os três primeiros temas, considerados mais imediatamente ligados ao assunto do presente artigo. Cabe esclarecer, no entanto, que todos possuem igual importância para o contexto brasileiro, e que o "corte" de alguns neste artigo dar-se-á meramente em função dos limites de espaço. A respeito do primeiro tema (política e organização), ele afirma a importância de se operacionalizarem as políticas em todos os níveis, com apoio mútuo entre comunidades e governos locais e nacionais. De nada adianta formular políticas sem elaborar estratégias para sua implementação. Entre as estratégias, encontra-se a de engajar tais políticas às realidades das comunidades em que serão aplicadas e a de assegurar maneiras pelas quais elas sejam de fato implementadas localmente. Um outro aspecto levantado como obstáculo no tocante ao tema política e organização refere-se à separação que se verifica em vários países entre educação pública e a educação privada: Em muitos países existe um vasto setor privado cuidando dos mais privilegiados e o Estado provendo educação básica nas áreas mais pobres. Tal educaçãoé geralmente vista como tendo um valor baixo e isso em si constitui uma grande pressão a favor da exclusão, bastante difícil de ser combatida. (Savolainen et alii, 2000, p. 21) Ainda um terceiro aspecto do tema refere-se à existência de políticas e legislações que estabelecem as categorias "especial" e "regular", e a associação da política de inclusão como sendo parte de uma estratégia reservada a um segmento "especial" da população - o de deficientes. Booth (in Savolainen et alii, 2000) critica isso, dizendo que legislações separadas apenas impedem um exame acurado das pressões excludentes dentro do sistema como um todo, prejudicando, assim, o desenvolvimento da inclusão - que, conforme dito anteriormente, constitui fundamento básico ao para a implementação da escola para todos e não diz respeito apenas às deficiências, embora estas façam, também, parte do espectro da inclusão. Quanto ao segundo tema, fatores escolares, podem-se destacar, para efeitos deste artigo, questões relativas ao projeto político-pedagógico da escola, à flexibilidade curricular, à avaliação, dentre muitos outros. O projeto político-pedagógico, novidade trazida ao contexto brasileiro pela Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, numa perspectiva de educação para todos, deveria preocupar-se com o desenvolvimento de uma cultura inclusiva dentro da escola, com apoio interno e externo. uma vez mais, é a Declaração de Salamanca ( 1994, p. 67, versão inglesa) que delineia o assunto: O desenvolvimento de escolas inclusivas que sirvam a uma grande variedade de alunos de áreas tanto rurais quanto urbanas requer: a articulação de uma clara e poderosa política de inclusão junto com uma provisão financeira adequada - um eficiente esforço de informação pública para combater preconceitos e criar atitudes informadas e positivas - um extenso programa de orientação e treinamento de pessoal - e a provisão dos serviços de apoio necessários. Mudanças em todos os seguintes aspectos da escolarização, bem como de muitos outros, são necessárias à contribuição para o sucesso de escolas inclusivas: currículo, ambiente físico, organização da escola, pedagogia, avaliação, treinamento de pessoal, ética da escola e atividades extra- curriculares. No contexto de nossa legislação, fica claro, portanto, que se tais aspectos não são contemplados no projeto político-pedagógico das escolas, a educação para todos e sua fundamentação filosófica (inclusão) correm o risco de ficar apenas no plano das idéias. Quanto à flexibilidade curricular, preconiza-se que para que a educação seja de qualidade para todos, é necessário que se adapte o currículo aos interesses, ritmos e necessidades do alunado, e não o contrário, como tem tradicionalmente acontecido. A idéia é que as escolas estejam aptas a estimular o melhor desempenho por parte de todo o seu alunado, levando-se em consideração o fato de que a aquisição de conhecimentos não se limita à instrução formal. como propõe a Declaração de Salamanca (1994, p. 68, versão inglesa): O conteúdo da educação deveria ser orientado a altos padrões e às necessidades dos alunos com vistas a habilitá-los a participar ativamente no seu desenvolvimento. O ensino deveria ser relacionado à experiência dos próprios alunos e a preocupações práticas afim de melhor motivá-los. A avaliação, conseqüentemente, precisa ser repensada. uma perspectiva formativa de avaliação deveria ser adotada, de modo que, com o acompanhamento freqüente do processo de ensino-aprendizagem, possíveis "problemas" no percurso pudessem logo ser identificados e abordados. Portanto, tanto o percurso de ensino do professor quanto o de aprendizagem do aluno seriam avaliados com freqüência. Sistemas educacionais que ainda fazem uso da repetição de ano como forma de "correção" do fracasso estão decididamente ultrapassados. É Booth (in: Savolainen et alii, 2000, p. 22) quem nos incita a pensar sobre o assunto: Em sistemas que tentam corresponder à diversidade do alunado, tentam-se introduzir políticas flexíveis de avaliação. A repetição tem sido questionada, bem como práticas padmnizadoras. Tais práticas se baseiam na premissa de que as turmas devem ser homogêneas. A inclusão implica valorizar a diversidade das turmas e a adaptação do ensino no sentido de apoiá-las. Chegamos, assim, ao terceiro tema escolhido para análise: recrutamento e treinamento de pessoal de educação. Tal como acontece com os outros temas, também neste há uma variedade de aspectos a serem discutidos, potencialmente considerados como obstaculizantes à educação de qualidade para todos. Um primeiro aspecto freqüentemente mencionado sobre esse tema com respeito ao sucesso de uma educação de qualidade para todos trata da necessidade premente de um bom preparo de docentes para a tarefa de educar para a diversidade. A própria Declaração de Salamanca (1994, p. 70, versão inglesa) sugere: Programas de formação de professores deveriam prover a todos os licenciandos e futuros professores (primários ou secundários) uma orientação positiva em relação às deficiências, desenvolvendo uma compreensão do que pode ser alcançado em escolas com serviços locais de apoio disponíveis. O conhecimento e as habilidades requeridas são primariamente aquelas de um bom ensino e incluem a identificação das necessidades especiais, a adaptação de conteúdos curriculares, a utilização de tecnologia de apoio, procedimentos de individualização do ensino para atender a uma maior variedade de habilidades, etc. Em escolas de estágio de professores, atenção específica deveria ser dada ao preparo desses profissionais para exercerem sua autonomia e utilizar suas habilidades em adaptar o currículo e o ensino a fim de atender as necessidades dos alunos, bem como a fim de colaborar com especialistas e cooperar com as famílias. Felizmente, a legislação brasileira corrobora essa idéia em algumas legislações, pelo menos no que diz respeito ao alunado composto pelos deficientes. Dentre elas podemos citar a Portaria Interministerial 1973, de 1989, e a própria LDB 9394, de 1996. Na primeira, há a sugestão da inclusão de disciplinas relativas às deficiências em vários cursos de licenciaturas, e outros, das áreas médicas e para-médicas. Na segunda, no próprio Capítulo V, referente à Educação Especial, destaca-se, no artigo 59, o seguinte trecho: Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais (...) professores com especialização adequada em nível médio ou superior para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns. Ainda que se possa fazer uma série de ressalvas quanto aos aspectos propostos na LDB - como, por exemplo, o de reforçar dois tipos de formação de professores, o especial e o regular, realimentando a separação entre "educações" especial e regular - , trata-se de um avanço, no caso brasileiro, a idéia de que todo professor deva ser preparado para atender à diversidade em sala de aula. Outro aspecto relevante a respeito da formação de educadores refere-se à presença de um professorado representativo de grupos excluídos exercendo a profissão. É Booth (in: Savolainen et alii, 2000, p. 26) quem nos auxilia uma vez mais a esse respeito, e complementa o aspecto anterior: Em muito países, o professorado não é representativo de grupos excluídos. Em muitos cursos de formação de professores a inclusão é considerada em sessões separadas, usualmente associadas com alunos deficientes ou categorizados como tendo necessidades educacionais especiais, ao invés de permear a perspectiva educacional em todos os cursos. Isto desencoraja o desenvolvimento de perspectivas inclusivas de ensino. Em alguns casos as qualificações não permitem que professores especialistas lecionem para turmasregulares. Tem havido um crescente reconhecimento de que qualquer especialização deve ser precedida por uma formação geral comum. E ainda um terceiro aspecto a ser levantado refere-se ao treinamento em serviço e capacitações. E crescente na literatura a ênfase dada à importância de se planejarem tais atividades em consonância com um projeto de desenvolvimento da escola como um todo. E, mais do que isso, têm-se tornado cada vez mais populares e bem- sucedidas as experiências em que se agrupam escolas a fim de se otimizar e enriquecer recursos. Recorremos uma vez mais a Booth (in: Savolainen et alii 2000, p. 26-27), finalizando o assunto: O agrupamento de centros de aprendizagem amplia os recursos disponíveis para treinamento e disseminação [de conhecimentos - nota da autora]. Os agrupamentos poderiam incluir centros especiais e regulares de aprendizagem compartilhando recursos como um passo rumo a uma maior inclusão. Em muitos países professores assistentes são empregados para apoiar alunos deficientes. Deve haver uma clara estratégia sobre como esse profissional pode apoiar a aprendizagem e participação de todos os alunos. como se vê, se em cada escola cada professor fosse compreendido como um recurso em potencial para a promoção da inclusão, provavelmente estaríamos discutindo outros aspectos, menos básicos, de promoção de uma educação para todos, com qualidade. IV - Conclusões São muitos os obstáculos à promoção da educação para todos, mas também têm sido muitas as alternativas encontradas nos mais variados países no sentido de superar tais obstáculos. A falta de recursos, ainda que constitua um problema real e sério a ser considerado em todo esse processo, não é, e nem pode ser, suficiente para justificar uma desistência, ou mesmo o fracasso da promoção de uma escola de qualidade para todos. Cumpre, acima de tudo, compreender que a educação fundamentada na filosofia de inclusão não é um ideal ao qual devemos pretender chegar um dia, mas um processo que já se encontra em andamento e cujo fim não existe. Tal processo tem seu peso maior nas atitudes que assumimos perante o mundo que desejamos ter. Estaremos sempre lutando por uma educação para todos na medida em que estivermos lutando pela inclusão de alunos, ou seja, contra sua exclusão da participação nos currículos e na vida da comunidade escolar como um todo. E ao lutar por uma educação para todos, estaremos continuamente preparando um mundo que abrace cada vez mais a todos. Bibliografia BRASIL/MEC. Lei no. 9394 de dezembro de 1996 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, 1996. CARVALHO, Rosita Edler (2000). Removendo Barreiras para a Aprendizagem. Porto Alegre: Mediação. (1998). Temas em Educação Especial. Rio de Janeiro: WVA. SANTOS, Monica Pereira dos (1997). 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Rhevisão - Recursos Humanos em Revista - No. 4, jul-ago. http:// www.revistas.net/rhevisão/4/index.shtml. Declaração Universal dos Direitos Humanos. http://www.um.org/Overview/rights.html Anacronismo nas Representações Sociais de Cidadãos Surdos e Políticas Públicas Solange Maria da Rocha1 Brasília, MEC, agosto de 2001, cidadãos surdos, oriundos de quase todos os estados brasileiros, estiveram por uma semana na capital federal. Financiados pelo poder público, capacitaram-se para capacitarem professores, alunos surdos e comunidade em geral em LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais). Ao ser reconhecida como língua de instrução para alunos surdos em nossas escolas, LIBRAS apresenta enorme potencial para mudar velhos paradigmas. Se é língua, o surdo desloca-se no espaço de nosso imaginário. como nativos dessa língua, vão subsidiar os sistemas de ensino para viabilizarem projetos bilíngües. Então, a história dá uma guinada. Da condição de impotentes, deficientes, com ínfima ou nenhuma capacidade de abstração, transformam-se em docentes de seus docentes. Estaremos portanto, sincronicamente, vivendo uma inserção do surdo no espaço real e imaginário da cidadania? Rondônia, Porto Velho, agosto de 2001. Informada de que a área dos índios Parecys ficava naquele estado, senti-me estimulada a contar uma história envolvendo esses índios e o INES, ocorrida em 1922. uma história que, antes de contá-la, tornou- se desimportante diante do que me contaram os profissionais sobre esses índios. A criança Parecy que apresenta alguma diferença física, sensorial ou mental não tem direito à vida. Cabem aos pais cumprir um doloroso ritual de tortura até a morte. Julguei que estaríamos em outras idades, mas o relato era atual e não acabaria ali. uma mulher Parecy deu luz a gêmeos, um menino e uma menina, ambos surdos. Pelos imperativos da cultura, caberia ao casal cumprir o ritual esperado. Não conseguiram, deram cabo de suas vidas e os demais elementos da tribo se incumbiram da missão. Cumprida pela metade, pois uma das crianças, a menina, depois de torturada e enterrada, sobreviveu e foi resgatada por outros elementos da mesma tribo. Talvez, para estes, a surdez estivesse em outro plano de representação. Hoje, está na FUNAI, mais deverá ser devolvida à tribo. De volta ao hotel, comentei o fato com os colegas, e vicejando de indignação, quando o motorista virou-se e concluiu: - Isso é coisa dos índios, é deles, é da cultura deles. O que é exatamente "coisa dos índios" ? Eliminá-las ou salvá-las? No entanto, o que mais impressiona é que ele, o motorista, não chegou na menina. Na análise dele e de tantos, em outras tantas circunstâncias, não existe a menina, o menino, o adolescente, a mulher, o homem. Não tem nada disso, só o estigma, só a marca, só o ferro imaginário torrando a carne real. Não são cidadãos, são marcas. É aí que está o cerne da questão. Políticas públicas, quando desenvolvidas, ficam irremediavelmente atreladas às representações que se tem dos sujeitos sociais. Em que espaços reais e imaginários transitam os surdos no plano das representações e dos discursos hegemônicos? 'Diretora do Departamento de Desenvolvimento Humano, Científico e tecnológico do INES, Pedagoga, historiadora e mestre em educação - UERJ Dizer que entre as comunidades indígenas brasileiras são eliminados é um erro. Entre as que conhecemos encontramos posturas distintas. uma, pela presença de surdos, é bilíngüe.Noutra, os surdos não freqüentam a escola da aldeia e ficam em casa, segregados, sem convívio com as outras crianças. Tal como nós, fora das aldeias. Nesse mesmo farto agosto, uma publicação evangélica foi distribuída no INES aos seus alunos. Um exemplar me chegou às mãos. Chama-se Carta Viva, e a manchete diz: "Surdos curados em todo o país". Em seu interior, depoimentos de cura. Curar a surdez. Curar a doença, o doente. O doente? Então aqui ele se re(apresenta) como doente. Nesses tempos de Escola paraTodos, o impacto dessa proposta acomete a todos. Não há ninguém indiferente. E aí, caímos numa guerra juvenil, contra ou a favor, escolhendo caminhos para os tímidos alcances de nossa consciência. Lançando um olhar pouco mais profundo, evitando politicagem epidérmica, encontraremos uma massa de excluídos de potencial impressionante, aprisionados nos paradigmas da doença, da cura, da mudez e do nao. Submetidos a um anacronismo perverso de não terem escolas por não estarem aptas para eles, ou não terem escolas por não estarem aptos para elas. E o tempo passa sem cerimônia e eles assistem impacientes a nossa capacidade, desembarcando nas políticas públicas como coitados, mudinhos, deficientes. Espectro de cidadania é espectro de cidadão. O que temos oferecido a eles? Exclusão é saber que em torno de 70% de crianças surdas em idade escolar nunca freqüentou uma escola. Não são conhecidas, não freqüentam espaços públicos, não são vistas e ninguém se sente preparado para trabalhar com elas. Esta é a realidade brasileira. Suas famílias não as representam como capazes. Qualquer coisa serve. Estão representadas como o nada, o nada que leva os Parecys a exterminá-las. As 30% restantes vivem outras exclusões: ou estão agrupadas em espaços especiais com crianças que a escola regular não quer ou estão nas classes regulares isoladas e espetacularizadas. Onde a informação não circula, a desinformação reina. Não adianta usar o passado como fonte de pesquisa estática, identificar o que aconteceu e ficar julgando. O passado torna-se nefasto quando se embrenha no presente e se estabelece com suas verdades num tempo em que outras já o superou. E a outra Idade Média situada no futuro, como dizia Caetano. Para construção de Políticas Públicas, devemos bem conhecer os sujeitos a serem beneficiados, examinar com intensidade como os representamos, principalmente se eles forem sujeitos passivos de nossas políticas e não tiverem, pelos mais variados motivos, oportunidade de estar construindo junto. Se forem sujeitos ativos de sua história, tanto melhor para todos nós. Projeto Dicionário Virtual da LIBRAS Tanya A. Felipe1 1. Introdução As Comunidades urbanas surdas no Brasil têm como fatores principais de integração a utilização da língua de sinais brasileira ou, como os surdos a denominam, a língua brasileira de sinais - LIBRAS - e os esportes, por isso têm uma distribuição hierárquica com a Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS): 7 Federações/ Liga Desportivas e 60 associações/clubes/sociedades/congregações, em várias capitais e cidades do interior, e a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos - FENEIS - com sede no Rio de Janeiro e regionais em Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre. Em muitas dessas comunidades há interferência de grupos religiosos, representados por pessoas ouvintes com domínio da LIBRAS ou de outra língua dos sinais estrangeira. A ocorrência deste último caso tem favorecido uma utilização de "estrangeirismos", ou seja, uso de sinais diferentes dos utilizados em outras comunidades brasileiras. Admitindo-se que há dois tipos de bilingüismo, o individual e o social, e que a diglossia estaria em nível coletivo e seria a coexistência de duas ou mais variedades de língua ou línguas, pode-se afirmar que as comunidades urbanas dos surdos no Brasil são bilíngües por possuírem membros bilíngües que utilizam duas línguas em uma situação de diglossia: a língua portuguesa - a variante superposta utilizada nas escolas e com os ouvintes da comunidade maior à qual também estão inseridos, e a LIBRAS, a variante informal usada entre os surdos e nas suas associações (Felipe, 1888,1989a, 1990, 1991a, 1992a, 1993a, 1995). Devido à tradição oralista, há surdos que só querem falar, usando sempre o português, e outros que, devido ao fato de não dominarem bem a LIBRAS, usam um bimodalismo, ou seja, falam português enquanto sinalizam, como os ouvintes quando começam a aprender alguma língua de sinais. Mas as escolas podem ser um dos fatores de diversificação, favorecendo a integração ou desintegração das comunidades surdas porque, dependendo da metodologia adotada, elas, até bem pouco tempo, rejeitavam a LIBRAS e, conseqüentemente, as crianças não podiam conhecer suas comunidades e não aprendiam a variedade local de sua língua, podendo apenas, em escolas mais liberais, comunicarem-se através de dialetos restritos ao ambiente escolar. O Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), no Rio de Janeiro, mesmo ainda sem uma proposta bilíngüe generalizada, é fator de integração porque as crianças e adolescentes se comunicam em LIBRAS e vários professores já sabem ou estão aprendendo com "professores surdos" além de oferecer cursos também para os pais dessas crianças e estar modificando a proposta curricular, inserindo o ensino sistemático 'Professora Doutora Tanya Felipe é Professora Titular da Universidade de Pernambuco, coordenadora do Grupo de Pesquisa da FENEIS - Rio de Janeiro e Coordenadora, em nível nacional, do Programa LIBRAS o idioma que se vê - Cursos de LIBRAS: Metodologia para o ensino de LIBRAS para Instutores/ Agentes Multiplicadores e Curso de LIBRAS para ouvintes. da LIBRAS em tôdas as séries. Essa prática está acontecendo também em várias outras escolas de surdos pelo país. Por outro lado, várias escolas que não estão ainda articuladas com as comunidades surdas, ou por falta de interesse ou por estarem em cidades que não possuem associação de surdos, trabalham ainda somente com uma metodologia neo- oralista, o que faz com que as crianças surdas desenvolvam um dialeto entre elas para uma comunicação mínima, ficando totalmente desintegradas da cultura surda, sendo consideradas, apenas, como deficientes auditivas (DA). Essa tradição oralista fez surgir também diferenças em relação ao uso da LIBRAS pelas comunidades surdas; assim, há comunidades que possuem mais sinais em relação a outras, que utilizam a datilologia, sinais soletrados, ou um mesmo sinal para conceitos diferentes. Para se conhecer melhor a LIBRAS têm surgido iniciativas em termos de estudos lingüísticos, materiais de divulgação não especializados e elaboração de dicionários por instituições religiosas, públicas e privadas. A partir da pesquisa dessas publicações e da necessidade de se elaborar um dicionário com bases lingüísticas, surgiu essa proposta que estamos agora apresentando. Sabemos que posteriormente teremos que acrescentar novos sinais, já que optamos por colocar somente aqueles reconhecidamente utilizados pelas comunidades surdas e, como estão surgindo novos sinais, gostaríamos que os surdos de todo o país nos ajudassem nessa coleta de dados para a segunda edição. Desenvolvemos esse trabalho árduo, exaustivo, desafiador, em oito meses, e por isso sabemos que é passível de erros, que gostaríamos que nos fossem informados para que possamos revê-los e corrigi-los futuramente. 2. Organização do Dicionário Digital Bilíngüe da LIBRAS 2.1. Metodologia de trabalho 2.1.1. Formação da equipe: Para a elaboração do Dicionário Digital Bilíngüe da LIBRAS, houve a preocupação em formar uma equipe de especialistas nas áreas de lingüística com conhecimento da LIBRAS, lexicografía e informática, e surdos que tivessem um ótimo domínio em LIBRAS, conhecessem bem a língua portuguesa e já tivessem participado de pesquisa ou estivessem envolvidos com educação de surdos. Assim, no mês de dezembro foi organizada essa equipe que ficou composta por: • Coordenador administrativo-financeiro, Guilherme Lira, responsável pela organização da equipe, gerenciamento da verba, prestação de contas e relatório final, supervisor da equipe de informática e filmagem; • Coordenadora administrativa, Prof. Solange Rocha (INES), responsável pela escolha dos componentes
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