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10 anos editorial Um olhar psicológico sobre o câncer Gláucia Viola, editora “Uma cama de hospital é um táxi estacionado com o taxímetro a correr.” Groucho Marx A relação do câncer com o sofrimento e a morte precoce faz com que a grande maioria das pessoas não saiba lidar com tudo que envolve essa doença. O surgimento da Psicologia Oncológica serviu PARA�DESMISTIlCAR�OS�MEDOS�E�CRIAR�NOVOS�PARÊMETROS�EM�RELA¥ÎO�A�QUESTÜES�COMO�DIAGNØSTICO�� MEDIDAS�DE�ENFRENTAMENTO��COMPREENSÎO�DAS�CHANCES�DE�CURA�E�ENTENDIMENTO�DO�QUE�PODE�REPRE- sentar qualidade de vida. O câncer deve ser enfrentado e encarado como um problema verdadeiramente de SAÞDE�PÞBLICA��QUE�ATINGE�PESSOAS�DE�TODAS�AS�IDADES�E�EM�TODOS�OS�LUGARES�DO�MUNDO�� sendo a segunda causa principal de morte por doença no planeta. Todas essas CARACTERÓSTICAS�EXIGIRAM�A�NECESSIDADE�DE�OS�PROlSSIONAIS� ENTENDEREM�O�PROBLEMA� ALÏM�DA�VISÎO�CLÓNICA�MÏDICA��!�0SICO ONCOLOGIA�ASSUME�ESSE�PAPEL��RECONHECENDO� QUE�O�DESENVOLVIMENTO�DO�CÊNCER�E�SEU�PROCESSO�DE�TRATAMENTO��SEM�DÞVIDA��SOFREM� INTENSA�INmUÐNCIA�DE�VARIÉVEIS�SOCIAIS�E�AFETIVAS�� !LÏM� DOS� PROBLEMAS� CAUSADOS� PELA� DOEN¥A�� O� DESGASTE� PSÓQUICO� SOFRIDO� PELO� PACIENTE�E�POR�SEUS� FAMILIARES�E�AMIGOS�DURANTE�O�PROCESSO�DE�TRATAMENTO�OCORRE�� PRINCIPALMENTE��EM�FUN¥ÎO�DE�A�DOEN¥A�SER�ASSOCIADA�A�DOR��SOFRIMENTO��DEGRADA¥ÎO� HUMANA��OU�SEJA��O�DIAGNØSTICO�Ï�ENCARADO�COMO�UMA�SENTEN¥A�DE�MORTE��%STA�EDI¥ÎO� da Psique Ciência & Vida�MOSTRA�COMO�A�0SICOLOGIA�/NCOLØGICA�AJUDA�NA�CONDU¥ÎO� DESSE� PROCESSO�� BUSCANDO� AMENIZAR�MITOS� E� ATÏ�MESMO� FANTASIAS� PROVOCADAS� POR� ELA��/� AMBIENTE� HOSPITALAR�� POR� EXEMPLO�� Ï� UM� FATOR� ESTRESSANTE� CHEIO� DE� ESTIGMAS�� APESAR� DE� DESPERTAR� SENTIMENTOS� AMBÓGUOS�� 0OIS�� ALÏM� DE� TRAZER� ALÓVIO� A� QUEM� CHEGA� A� SUAS� INSTALA¥ÜES� EM� MOMENTOS� DE� SOFRIMENTO��CAUSA�GRANDE�REJEI¥ÎO��0ARA�VALIDAR�ESSES�SENTIMENTOS��A�0SICOLOGIA�GANHA�IMPORTÊNCIA�NO�SENTIDO� DE� ATUAR�� JUSTAMENTE��NO�CAMPO�DAS� VARIÉVEIS� EMOCIONAIS��/�CÊNCER�� EM�CONJUNTO� COM�A�HOSPITALIZA¥ÎO�� CARREGA�ESSAS�SENSA¥ÜES��ESPECIALMENTE�NO�QUE�DIZ�RESPEITO�Ì�MORTE� A verdade incontestável e difícil de aceitar é que o sofrimento está intimamente ligado ao câncer. Por ISSO��CABE�AO�PROlSSIONAL�DE�SAÞDE�MENTAL�COMPARTILHAR��DIVIDIR�E�MOBILIZAR�TODOS�OS�RECURSOS�DISPONÓVEIS� para que as pessoas tenham mais possibilidades de elaborar a situação da melhor maneira possível e para QUE�POSSAM�SE�ANCORAR�NA�REALIDADE�DE�FORMA�SAUDÉVEL��!TÏ�PORQUE�A�DOEN¥A�GUARDA�EM�SI�A�CONSCIÐNCIA�DA� possibilidade da morte e essa constatação é acompanhada de angústias que seguirão o paciente durante o PERCURSO�DO�TRATAMENTO��%�CADA�PACIENTE�ENXERGA�UM�SENTIDO�PARTICULAR�NA�MORTE��DE�ACORDO�COM�A�FASE�EM� QUE�SE�ENCONTRA�NO�PROCESSO�DE�EVOLU¥ÎO�VITAL��%SSA�OBSERVA¥ÎO�DE�lNITUDE��VIVÐNCIAS�E�CONDI¥ÜES� FÓSICA�� PSICOLØGICA��SOCIAL�E�CULTURAL�DEPENDE��TAMBÏM��DE�UM�ACOMPANHAMENTO�EMOCIONAL�ADEQUADO��LEVANDO�A� uma intersecção entre todos os fatores no desenrolar da vida. Boa leitura! Gláucia Viola psique@escala.com.br www.facebook.com/RevistaPsiqueCienciaeVida CAPA DOSSIÊ: PSICOLOGIA NO ESPORTE A preparação psicológica pode ser o diferencial nos resultados expressivos de ATLETAS��RATIlCANDO�SEU�PAPEL� central no universo esportivo sumário 3510 anos MATÉRIAS ENTREVISTA Neurologista Marcela Amaral Avelino destaca a heterogeneidade dos quadros CLÓNICOS�COMO�DESAlO�CIENTÓlCO� para a obtenção de diagnósticos dos transtornos mentais SEÇÕES 05 EM CAMPO 16 IN FOCO 18 PSICOPOSITIVA 20 PSICOPEDAGOGIA 22 SEXUALIDADE 24 SUPERVISÃO 32 COACHING 34 LIVROS 50 CYBERPSICOLOGIA 52 NEUROCIÊNCIA 54 RECURSOS HUMANOS 64 DIVà LITERÁRIO 66 CINEMA 70 PERFIL 78 UTILIDADE PÚBLICA 80 EM CONTATO 82 PSIQUIATRIA FORENSE Apoio fundamental !S�DIlCULDADES�EM�LIDAR�COM� o câncer, suas consequências e a proximidade da morte fazem com que a Psicologia Oncológica seja fundamental na atuação hospitalar A Ética do psicólogo !TUA¥ÎO�DO�PROlSSIONAL� na Perícia Psicológica, no âmbito judicial e principalmente nas Varas de Família apresenta inúmeras diferenças do que é exigido na área clínica Uma nova ordem Counseling organizacional é uma ferramenta que usa o conhecimento técnico de uma pessoa para ORIENTAR�UM�PROlSSIONAL�A� tomar decisões assertivas 26 72 08 56 IM AG EM D A CA PA : S HU TT ER ST OC K www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 5 em campo TRABALHO E FELICIDADE Enquanto as mais diversas vertentes organizacionais discutem um modelo de liderança, um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Greenwich e Sussex mostra que propor- cionar uma percepção de propósito no trabalho entre os seus liderados não é uma habilidade dos gestores. Muito pelo CONTRÉRIO��ELES�DESTROEM�ESSE�SIGNIlCADO�� A pesquisa ouviu 135 pessoas trabalhan- do em 10 ocupações muito diferentes, desde sacerdotes até coletores de lixo, para perguntar sobre incidentes ou momentos em que os trabalhadores pen- saram que o seu trabalho era algo signi- lCATIVO�E��POR�OUTRO�LADO��MOMENTOS�EM� que eles se perguntaram: “Por que estou trabalhando com isso?”. A despeito das lideranças, a autora do estudo, Katie Bailey, diz que para as organizações que BUSCAM�NUTRIR�ESSE�SIGNIlCADO��OPERAR� “com responsabilidade ética e moral é uma boa alternativa, uma vez que são qualidades que fazem a ponte entre o trabalho e a vida pessoal”. POR OUTRO LADO... Um novo estudo, desta vez da Univer- sidade de Split, Croácia, relacionou a satisfação no trabalho ao sucesso da empresa. A pesquisa comparou desempe- nho empresarial de 40 grandes e médias companhias com a avaliação dos funcio- nários sobre 10 diferentes aspectos de seu trabalho, totalizando 6 mil avaliações. (Fonte: ScienceDaily.com) por Jussara Goyano IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K AÇÃO X HÁBITO MECANISMOS DE AÇÃO DIRIGIDA E ESTRUTURAS DE AÇÃO HABITUAL COMPETEM NA TOMADA DE DECISÃO Com um modelo de experiência com ratos, uma equipe internacional de pesquisadores, sediada na Universidade da Califórnia, em San Diego (EUA), demonstra o que acontece no cérebro para que os hábitos controlem o nosso comportamento. O estudo, publicado na revista Neuron, fornece a evidência mais forte até hoje, segundo seus autores, de que os circuitos do cérebro designados tanto para a ação habitual quanto para a ação dirigida competem pelo controle no córtex orbitofrontal, uma área do cérebro responsável pela tomada de decisão. .EUROQUÓMICOS�CHAMADOS�ENDOCANABINOIDES��ENVOLVIDO�EM�VÉRIOS�PROCESSOS�l- siológicos, incluindo apetite, sensação de dor e humor, são os mecanismos que permitem ao hábito assumir o controle, agindo como uma espécie de freio no circuito da ação dirigida. Os resultados sugerem, segundo os autores da pesquisa, um novo alvo tera- pêutico para pessoas que sofrem de transtorno obsessivo-compulsivo ou vícios, para interromper a dependência excessiva do hábito e restaurar a capacidade de mudar das ações habituais para as ações dirigidas por objetivos; Pode ser útil para tratar o sistema endocanabinóide do cérebro e assim reduzir o controle das ações habituais sobre o comportamento do indivíduo. (Fonte: ScienceDaily.com) 6 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br ESTRESSE COMO OS NEURÔNIOS CEREBRAIS COMANDAM REAÇÕES FISIOLÓGICAS Ao experienciar o estresse, o nosso corpo desvia re- cursos metabólicos para sua resposta de emergência. Pen- sava-se que o sistema nervoso simpático - sistema instinti- vo do corpo para reagir ao estresse - dirigia essa atividade, mas uma pesquisa recente do Weizmann Institute of Science, em Israel, agora mostraque os neurônios no cérebro têm um papel surpreendente nessa atividade. As descobertas, que apareceram recentemente na Cell Metabolism, pode- rão, no futuro, ajudar no desenvolvimento de melhores medicamentos para patologias relacionadas com o estres- se, tais como os transtornos alimentares. Quando somos expostos a situações estressantes, o hipo- TÉLAMO�INTENSIlCA�A�ATIVA¥ÎO�DE�UM�RECEPTOR�EM�SUAS�PARE- des exteriores, o CRFR1. Sabe-se que esse receptor contribui para a rápida ativação da rede nervo simpática - aumentando o ritmo cardíaco, por exemplo. Como essa área do cérebro também regula o equilí- brio de energia do corpo, os cientistas partiram RESOLVERAM�VERIlCAR� SE�O� CRFR1 poderia desem- penhar um papel nisso. Eles descobriram que é o receptor que desem- penha efeito inibitório sobre as células nervosas, e isso é o que ativa o sis- tema nervoso simpático. A descoberta, entre outros detalhes revela- dos pela pesquisa, pode auxiliar no desenvolvimento de tratamentos psicofarmacêuticos que atuem no hipotála- mo, o que já está sendo feito por algumas empresas, em busca de um possível tratamento para os transtornos de ansiedade ou depressão. Os cientistas alertam, no entanto, que, como as células estão envolvidas no equilíbrio ener- gético, bloquear os receptores poderá ter efeitos colate- rais, como ganho de peso. PARA SABER MAIS: Yael Kuperman, Meira Weiss, Julien Dine, Katy Staikin, Ofra Golani, Assaf Ramot, Tali Nahum, Claudia Kühne, Yair Shemesh, Wolfgang Wurst, Alon Harmelin, Jan M. Deussing, Matthias Eder, Alon Chen. CRFR1 in AgRP Neurons Modulates Sympathetic Nervous System Activ- ity to Adapt to Cold Stress and Fasting. Cell Metabolism, 2016; DOI: 10.1016/j.cmet.2016.04.017 AR Q UI VO P ES SO AL Jussara Goyano é jornalista. Estuda Psicologia, Medicina Comportamental e Neurociências, com foco em ������È�I�G9�H��¢���G�����������G�I�:�U�I�GI��I����IG G� pelo Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento. COMPORTAMENTO E INTELIGÊNCIA SABEDORIA VARIA DE ACORDO COM A SITUAÇÃO Estudo mostra que não existe pessoa sábia, mas ati- tude, sim. Pesquisadores da Universidade de Waterloo, nos Estados Unidos, observaram a reação de indivíduos em resposta a diversas situações cotidianas para estudar a sabedoria humana. Entre seus achados está a percepção de que raciocínio sábio é aquele que põe em prática uma combinação de habilidades, tais como a humildade in- telectual, a consideração da perspectiva dos outros e a procura por compromisso. E não depende exclusivamente de personalidade, tendo essas características postas em prática de acordo com a circunstância. !�OBSERVA¥ÎO�DE�QUE�O�RACIOCÓNIO�SÉBIO�VARIA�SIGNIl- cativamente entre as situações na vida cotidiana sugere que ele não é raro. Além disso, para indivíduos diferentes, apenas determinadas situações promovem esta qualidade. Para a próxima etapa do trabalho, os cientistas prepa- ram uma ferramenta para avaliar a sabedoria de acordo com a situação. Eles têm planos de realizar o primeiro estudo longitudinal com o objetivo de ensinar as pessoas a raciocinar sabiamente em suas próprias vidas. O novo mapa da sabedoria foi publicado recentemente na revista Social Psychological and Personality Science. (Fonte: ScienceDaily.com) em campo IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 7www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 7 ENTENDENDO A CRISE REVISTA SOCIOLOGIA - EDIÇÃO 64 giro escala POLÍTICA EM XEQUE REVISTA FILOSOFIA - EDIÇÃO 119 O Brasil passa por um grave momen- to em sua trajetória, no qual se observa que as instituições não demonstram es- tar tão consolidadas quanto a sociedade esperava. Por isso, é fundamental enten- der a crise da democracia nacional e a Sociologia assume um papel central en- quanto instrumento teórico-metodoló- gico, no sentido de promover uma leitu- RA�E�UMA�COMPREENSÎO�MAIS�QUALIlCADAS� DA� REALIDADE�� SUPERANDO� SUPERlCIALIDA- des, subjetividades e estereótipos. Por meio da Sociologia entende-se o com- promisso com a pluralidade e o desejo que o debate sociológico contribua para uma visão mais objetiva, a partir das formas de linguagem e saberes socioló- gicos. A Sociologia, reconhecida como “ciência social que estuda a sociedade, ou, mais precisamente, conhecimento CIENTIlCO�DOS�FATOS�E�FENÙMENOS�SOCIAIS� como realidades que ocorrem dentro da sociedade”, se insere no debate, cada vez mais atual e necessário, em torno de temas como o processo politico brasi- LEIRO��CONTRIBUINDO�DE�MODO�QUALIlCADO� para a descrição, compreensão, inter- PRETA¥ÎO�E�EXPLICA¥ÎO�CIENTÓlCA� Nesses tempos de inquietações, de atitudes que afrontam a democracia e o Estado, com o país em transe, e passan- do por um momento curioso do ponto de vista sociológico, a Sociologia realça suas possibilidades na formação do pen- samento inteligente, criativo e de ideias. Existem vários aspectos que podem jus- TIlCAR� A� IMPORTÊNCIA� E� AS� RAZÜES� PARA� estudar Sociologia. Atualmente, em um ambiente convulsionado por mani- festações, crise política, torna-se cada vez mais importante aprimorar, quali- lCAR�� COMPREENDER� A� REALIDADE� SOCIAL� E� POLÓTICA�E�OS�FATORES�QUE�INmUENCIAM�OS� FENÙMENOS��O�mUXO�DE� INFORMA¥ÜES�E�A� comunicação. Mais informações na edi- ção 64 da revista Sociologia. A política, mais do que nunca, é parte do cotidiano. Está nos meios de comunicação, nas rodas de con- versa, na universidade e nas ruas. No cotidiano, o termo “política” é usado em diferentes acepções. Há aque- les que associam a certa habilidade nas relações sociais e para realizar conciliações, como, por exemplo, a pessoa chamada de muito política, quando, na verdade, é um indivíduo comunicativo e conciliador. Existe outro uso para a expressão política, que a relaciona a disputas partidá- rias, ou a reduz aos pleitos eleitorais. Frases como “este é um ano de po- lítica”, referindo-se aos anos em que há eleições, são análises restritas. Algumas pessoas dizem não gostar da atividade política e consideram-se indiferentes, desiludidas. Geralmen- te, limitam a política à corrupção, à roubalheira e aos desvios de conduta cometidos por aqueles que exercem cargos públicos eletivos. Contudo, etimologicamente, política designa, desde a Antiguidade, o campo da ati- vidade humana relativa à cidade, ao Estado, à gestão do espaço público, ao conjunto de cidadãos e às ações destes nessa esfera. Por isso, é um tema que deveria interessar a todos. Na Grécia Antiga, cidadãos guia- vam a cidade. Todavia, cabe ressaltar que no paradigma grego nem todos podiam ser considerados cidadãos. Mulheres, crianças, escravos e estran- geiros não participavam da vida na pó- lis. No entanto, todos os que gozavam de “cidadania” participavam politica- mente. Em contrapartida, a partir da Modernidade, as questões privadas passaram a ocupar espaço maior na vida das pessoas. Uma das consequên- cias é que a atividade política nas so- ciedades atuais, em termos gerais, caiu em descrédito. O resultado é que nas DEMOCRACIAS� CONTEMPORÊNEAS� HOUVE� avanços em relação aos direitos civis, mas retrocessos na participação polí- tica. Mais detalhes na edição 119 da revista &ILOSOlA. RENATO JANINE RIBEIRO Ser de esquerda é um estilo de vida e não apenas uma posição política ENTREVISTA Edimar Brígido aborda Ética e Estética no pensamento de Wittgenstein ENCAR TE DO PR OFESS ORReflex ão e práti ca 108 Com c urador ia de C arolin a Deso ti Fern andes e Tiago Brent am Pe rencin i Carol ina De soti Fe rnand es�Ï��GRAD UADA�EM �&ILOSOl� A� PELA�05# #AMPIN AS��0ESQU ISA�A�INm� UÐNCIA�A FRICANA�N A�FORMA¥Î O�DA�IDEN TIDADE�C ULTURAL�B RASILEIRA ��¡�EDITO RA�� REDATORA �E�PRODU TORA�CULT URAL�� Tiago Brent am Pe rencin i Ï�LICEN CIADO�E� BACHARE L�EM� &ILOSOl�A ��-ESTRE �EM�%NS INO�DE�& ILOSOl�A� PELA�5N ESP�E� PROFESSO R�DE�&ILO SOl�A�#O NTEMPOR ÊNEA�NA� &ACULDA DE� *OÎO�0AU LO�))�DE�- ARÓLIA� A busca p elo conhe cimento Uma discu ssão sobre a responsa bilidade do desenvolv imento científico p ela estrutu ração e mo dificações culturais n as sociedad es Da Filoso fia à Ciên cia Pela inters ecção entre diferentes domínios do saber dd 35 5/19/1 6 2:5 9 PM REFLEXÃO E PRÁTICA: Pode existir Ciência sem Filosofia? Submissão e violência contra a mulher: a necessidade de desnaturalizar elementos comuns desde a Grécia Antiga e que persistem na atualidade EXISTÊNCIA E DUALISMO Vida como experiência subjetiva radical que está fora do alcance da razão À ESPERA DE UM MILAGRE HANNAH ARENDT: a capacidade humana de agir impulsiona novos inícios na vida política ANO IX No 119 – www.portalcienciaevida.com.br A VOZ DO EDIÇÃO 119 - PREÇO R$ 9,80 FEMINISMO RICARDO DELLO BUONO VÊ A SOCIOLOGIA COMO FERRAMENTA DE LIBERTAÇÃO em sala de aula: apresente o Anarquismo, suas vertentes e seus personagens www.portalcienciaevida.com.br Game of Thrones Artigo analisa arquétipos políticos de uma das séries mais populares da televisão Estudo de caso A agricultura familiar e a qualidade de vida do trabalhador rural Mundo laboral Mudanças nas DPOm�HVSBªFT� do trabalho não alteraram radicalmente a lógica da exploração Friedrich Engels Resenha de Anti-Dühring, um dos trabalhos mais importantes do pensador Como a esquerda nacional encarou essa ideologia, confundindo-a com puro populismo TRABALHISMO Uma reflexão sobre o 8 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br MARCELA AMARAL AVELINO JACOBINA www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 9 A neurologista Marcela Amaral Avelino ressalta o grande DESAlO�DA�COMUNIDADE�CIENTÓlCA�PARA�CONSEGUIR�DIAGNOSTICAR� TRANSTORNOS�MENTAIS��EM�FUN¥ÎO�DA�HETEROGENEIDADE�DE�QUADROS� CLÓNICOS�QUE�OCORREM�EM�RELA¥ÎO�A�ESSES�DISTÞRBIOS E N T R E V I S T A O S�INÞMEROS�MISTÏRIOS�QUE�ENVOLVEM�A� MENTE�DAS�CRIAN¥AS�E�DOS�ADOLESCENTES� SÎO�CADA�VEZ�MAIS�INTENSAMENTE�ALVO� DE�PROFUNDO�ESTUDO�POR�PARTE�DA� .EUROLOGIA�0EDIÉTRICA��4EMAS�COMO�DISTÞRBIOS� DO�DESENVOLVIMENTO�E�DOS�TRANSTORNOS�MENTAIS� E�COMPORTAMENTAIS��DESENVOLVIMENTO�INFANTIL�� SUICÓDIO�ENTRE�ADOLESCENTES��DELINQUÐNCIA��DROGAS�� USO�ABUSIVO�DA�INTERNET��ENTRE�OUTROS��DESAlAM�AS� PESQUISAS�DOS�PROlSSIONAIS�QUE�ATUAM�NA�ÉREA� 3EGUNDO�-ARCELA�!MARAL�!VELINO�*ACOBINA��NEU- ROLOGISTA�DO�!MATO�)NSTITUTO�DE�-EDICINA�!VAN¥ADA�� NEM�SEMPRE�DIFERENCIAR�O�QUE�Ï�PRØPRIO�DO�DESEN- VOLVIMENTO�HUMANO�DO�PATOLØGICO�Ï�SIMPLES��h%��NA� MAIORIA�DAS�VEZES��OS�EXAMES�DIAGNØSTICOS�ACESSÓVEIS� NÎO�SÎO�CAPAZES�DE�ESTABELECER�UM�DIAGNØSTICO�DE� CERTEZA��.O�ÊMBITO�DOS�DISTÞRBIOS�DO�DESENVOLVI- MENTO�E�DOS�TRANSTORNOS�MENTAIS�E�COMPORTAMENTAIS� NA�INFÊNCIA�E�ADOLESCÐNCIA��FECHAR�DIAGNØSTICOS�E� ESTABELECER�TRATAMENTOS�SÎO�SITUA¥ÜES�BEM�MAIS� COMPLEXAS�DO�QUE�APARENTAMv��REVELA� -ARCELA�POSSUI�GRADUA¥ÎO�EM�-EDICINA�PELA� 5NIVERSIDADE�&EDERAL�DO�0IAUÓ������ �E�TÓTULO�DE� ESPECIALISTA�EM�.EUROLOGIA�E�.EUROLOGIA�0EDIÉTRICA� PELA�%SCOLA�0AULISTA�DE�-EDICINA��%0-�5NIFESP �� Neurologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira DE�0EDIATRIA��3"0 �E�.EUROLOGIA�PELA�!CADEMIA� "RASILEIRA�DE�.EUROLOGIA��!". ��2EALIZOU�MESTRADO� PELA�5NIFESP��!TUALMENTE��ALÏM�DE�NEUROLOGISTA� E�NEUROPEDIATRA�NA�#LÓNICA�!MATO�)NSTITUTO�DE� -EDICINA�!VAN¥ADA��EM�3ÎO�0AULO��Ï�PRECEPTORA� DA�RESIDÐNCIA�MÏDICA�DE�.EUROLOGIA�0EDIÉTRICA�DA� 5NIFESP��NEUROLOGISTA�E�NEUROPEDIATRA�DO�)NSTITUTO� DE�!SSISTÐNCIA�-ÏDICA�AO�3ERVIDOR�0ÞBLICO�%STADUAL� n�)AMSPE�E�NEUROLOGISTA�DO�(OSPITAL�DO�3ERVIDOR� 0ÞBLICO�-UNICIPAL�n�(30-�DE�3ÎO�0AULO� Lucas Vasques é jornalista e escreve nesta publicação. NÃO É NADA SIMPLES IDENTIFICAR O QUE É PATOLÓGICO Por Lucas Vasques AR QU IV O PE SS OA L �� psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br No âmbito dos distúrbios do desenvolvimento e dos transtornos mentais e comportamentais na infância e adolescência, fechar diagnósticos e estabelecer tratamentos são situações mais complexas do que aparentam O SUICÍDIO, AINDA SEGUNDO A OMS, É A TERCEIRA CAUSA DE MORTE ENTRE ADOLESCENTES. COMO A NEUROLOGIA OU A NEUROCIÊNCIA PODEM CONTRIBUIR PARA MINIMIZAR ESSE CENÁRIO? MARCELA:�.A�FAIXA�ETÉRIA�ADOLESCEN- TE��OS�PRINCIPAIS�FATORES�ASSOCIADOS�AO� RISCO�DE�SUICÓDIO�ESTÎO�RELACIONADOS�A� TRANSTORNOS�DE�PERSONALIDADE�OU�HU- MOR��QUE� INCLUEM�SINTOMAS�DEPRESSI- VOS��AUTO�E�HETEROAGRESSIVIDADE��PRE- DISPOSI¥ÎO�AO�ABUSO�DE�SUBSTÊNCIAS�E� COMPORTAMENTO� ANTISSOCIAL�� 'ERAL- MENTE�� OS� INDÓCIOS� DE� UM� DESFECHO� SUICIDA� APARECEM� EM� TEMPO� HÉBIL� para se evitar essa trágica consequ- ÐNCIA�� 3EJA� ATRAVÏS� DE� PEQUENAS�MU- DAN¥AS�NO�COMPORTAMENTO�OU�MESMO� DROGADI¥ÎO�� ESSES� ADOLESCENTES� MUI- TAS�VEZES�NOS�MOSTRAM�QUE�PRECISAM� de ajuda. É nesse ponto que a ciência DEVE� INTERVIR�� FAZENDO� DIAGNØSTICO� E� TRATANDO�ANTES�QUE�O�PIOR�ACONTE¥A� COMO DETECTAR SE CONDUTAS ANTIS- SOCIAIS, DELINQUÊNCIA E USO DE DRO- GAS, POR EXEMPLO, SÃO APENAS MANI- FESTAÇÕES INERENTES À ADOLESCÊNCIA, E POR ISSO PASSAGEIRAS, OU ESTÃO AS- SOCIADOS A DISTÚRBIOS DE COMPORTA- MENTO MAIS GRAVES? MARCELA:� %SSA� Ï� UMA� PERGUNTA� MUI- TAS� VEZES� DIFÓCIL� DE� SER� RESPONDIDA�� -AS�PARA�MINIMIZAR�A�CHANCE�DE�ERRO� E�DISTINGUIR�O�NORMAL�DO�PATOLØGICO�Ï� FUNDAMENTAL� UMA� AVALIA¥ÎO� GLOBAL� DO� ADOLESCENTE�� ¡� PRECISO� DETERMINAR� O� IMPACTO� DO� COMPORTAMENTO� NA� VIDA� DO� PRØPRIO� INDIVÓDUO� E� NA� DAQUELES� COM�QUEM�ELE�SE�RELACIONA��E�SE�ELE�TEM� CIÐNCIA� DISSO�� !LÏM� DO� SOMATØRIO� DE� OUTRAS� CARACTERÓSTICAS�� EMPATIA� �COLO- CAR SE�NO�LUGAR�DO�OUTRO �COSTUMA�SER� UMA�CARACTERÓSTICA�AUSENTE�NOS�FRANCA- MENTE�PATOLØGICOS� VIVEMOS NA ERA DE MUITA INFOR- MAÇÃO SIMULTÂNEA E COSTUMA-SE, INCLUSIVE, DIZER QUE A CRIANÇA SÓ FALTA NASCER FALANDO, POIS OS BEBÊS SÃO TOTALMENTE DIFERENTES DOS DA GERAÇÃO PASSADA. COMO A NEUROLO- GIA EXPLICA ESSE DESENVOLVIMENTO DO CÉREBRO INFANTIL? MARCELA: %STE�Ï�MAIS�UM�EXEMPLO�DE� QUE� OS� NOSSOS� GENES� E� CROMOSSOMOS� NÎO� SÎO� OS� ÞNICOS� DETERMINANTES� DO� QUE� SOMOS�� !S� CRIAN¥AS�� ATUALMENTE�� SÎO�PRECOCEMENTE�EXPOSTAS� A�UMA�GI- GANTESCA�MASSA�DE�ESTÓMULOS��DESDE�O� INTRAÞTERO��/�ESTILO�DE�VIDA�CONTEMPO- RÊNEO�Ï�EXTREMAMENTE�DIFERENTE�E�MAIS� ACELERADO� QUE� NA� ÏPOCA� DOS� NOSSOS� IMA GE NS : S HU TT ER ST OC K DADOS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) INDICAM QUE A PREVA- LÊNCIA MUNDIAL DE DISTÚRBIOS DO DE- SENVOLVIMENTO E DOS TRANSTORNOS MENTAIS E COMPORTAMENTAIS NA IN- FÂNCIA E ADOLESCÊNCIA CHEGA A 20%. A HETEROGENEIDADE DOS QUADROS CLÍ- NICOS E AS PECULIARIDADES DIAGNÓSTI- CAS REPRESENTAM UM DESAFIO PARA A PRÁTICA CLÍNICA? MARCELA:� 3IM�� !� HETEROGENEIDADE� DAS� MANIFESTA¥ÜES� CLÓNICAS� E� POSSÓ- veis etiologias desses transtornos nos DESAlAM� DIARIAMENTE�� ,IDAMOS� COM� ALTERA¥ÜES� TÎO�DIVERSAS� COMO�UM� LEVE� TIQUE�PRØPRIO�DA�INFÊNCIA�ATÏ�ALTERA¥ÜES� COMPORTAMENTAIS�MAIS� RARAS�� QUE� EN- VOLVEM� QUADROS� DEGENERATIVOS� E� PRO- GRESSIVOS�� .EM� SEMPRE� DIFERENCIAR� O� QUE�Ï�PRØPRIO�DO�DESENVOLVIMENTO�HU- MANO�DO�PATOLØGICO� Ï� TÎO� SIMPLES��%�� NA�MAIORIA�DAS�VEZES��OS�EXAMES�DIAG- NØSTICOS�ACESSÓVEIS�NÎO�SÎO�CAPAZES�DE� ESTABELECER�UM�DIAGNØSTICO�DE�CERTEZA�� .O� ÊMBITO� DOS� DISTÞRBIOS� DO� DESEN- VOLVIMENTO�E�DOS� TRANSTORNOS�MENTAIS� E�COMPORTAMENTAIS�NA�INFÊNCIA�E�ADO-LESCÐNCIA�� FECHAR� DIAGNØSTICOS� E� ESTA- BELECER�TRATAMENTOS�SÎO�SITUA¥ÜES�BEM� MAIS�COMPLEXAS�DO�QUE�APARENTAM� �� �I�� G ����� �G��`���I��\��������G�������� �G���G��� G�I�����b���G��G����Gh��9� �� ���������� ��������`����� G����Ë�I�G�G�\��G�G��G����Gh���I������G����G�� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 11 Vários estudos na literatura médica comprovam que, nos transtornos mentais e comportamentais, a genética não é a única responsável pelas manifestações clínicas. Fatores ambientais e sociais SÎO�MODIlCADORES� e causadores de psicopatologias A MICROCEFALIA, RECENTEMENTE, SE TRANSFORMOU EM UM FANTASMA PARA NOSSA SAÚDE PÚBLICA. É CORRETO DIZER QUE O ZIKA VÍRUS, AO ATINGIR O CÉRE- BRO DO FETO, PROVOCA UMA REAÇÃO INFLAMATÓRIA QUE PREJUDICA A MUL- TIPLICAÇÃO DAS CÉLULAS QUE ORIGINAM OS NEURÔNIOS E POR CONTA DESSA IN- FLAMAÇÃO O CÉREBRO NÃO ATINGE SEU TAMANHO NATURAL? MARCELA:� !S� ANÉLISES� DE� AUTØPSIAS� SUGEREM� QUE� O� VÓRUS� PROVOCA� INTENSA� DESTRUI¥ÎO� CELULAR� DIRETA�� RESULTAN- DO� EM�MORTE� NEURONAL�� CALCIF ICA¥ÜES�� GLIOSE� �CICATRIZES �E�DEGENERA¥ÎO�WAL- LERIANA� �DEGENERA¥ÎO� SECUNDÉRIA� DOS� TRATOS�NEURONAIS �� QUE�EXPLICAM�O�DÏ- F ICIT� DE� CRESCIMENTO� CEREBRAL�� (OUVE� INF ILTRADO� INF LAMATØRIO� NAS� AMOSTRAS�� PORÏM�MAIS�DISPERSO� MAS EXISTEM CAUSAS MAIS FREQUENTES PARA A MICROCEFALIA DO QUE O ZIKA VÍ- RUS. QUAIS SERIAM ESSAS CAUSAS E QUAIS AS FORMAS DE TERAPIA, UMA VEZ QUE SE TRATA DE UMA DOENÇA INCURÁVEL? MARCELA: !� MICROCEFALIA� PODE� RE- SULTAR� DE� INÞMERAS� CAUSAS� GENÏTICAS� E� AMBIENTAIS��OU�ATÏ�DA�COMBINA¥ÎO�DE- LAS�� %NTRE� ELAS�� ESTÎO� AS� SÓNDROMES� DE� 2ETT�� DE� #ORNELIA� DE� ,ANGE�� DE� #RI- DU #HAT�� DE� $OWN�� DE� 3ECKEL� E� DE� AVØS��4UDO�ISSO�REmETE�NA�EVOLU¥ÎO�DAS� NOSSAS� CRIAN¥AS�� ALTERA¥ÜES� HORMONAIS� E� MODIlCA¥ÜES� DO� AMBIENTE� UTERINO� EM�FUN¥ÎO�DA�VIDA�DA�MÎE��ADAPTA¥ÎO�Ì� MULTIPLICIDADE�DE�ESTÓMULOS�AMBIENTAIS� �DA�LUMINOSIDADE�ATÏ�O�INGRESSO�PRECO- CE�EM�ESCOLAS�E�CRECHES �ETC� EXISTEM CRIANÇAS CRUÉIS, OU SEJA, PO- DEMOS DIZER QUE UMA CRIANÇA PODE APRESENTAR TRAÇOS DE PSICOPATIA DES- DE MUITO PEQUENA? O QUE A NEUROLO- GIA FALA SOBRE ISSO? MARCELA:�3IM��0SICOPATIA�Ï�UM�TRANS- TORNO� PSIQUIÉTRICO� QUE� SE� CARACTERIZA� PELA� AUSÐNCIA� DE� CONSCIÐNCIA� MORAL�� ÏTICA� E� HUMANA�� EVIDENCIADA� POR� ATI- TUDES�DESCOMPROMISSADAS�PARA�COM�O� OUTRO�E�COM�AS�REGRAS�SOCIAIS��ALÏM�DE� DEF ICIÐNCIA� SIGNIF ICATIVA� DE� EMPATIA�� 0ODE� ACONTECER� EM� QUALQUER� IDADE�� -UITAS�VEZES��OS�SINTOMAS�SÎO�IGNORA- DOS�PELO�TEMOR�DE�SE�ASSUMIR�UM�DIAG- NØSTICO�TÎO�PRECOCEMENTE��%NTRETANTO�� DIVERSOS� SINAIS� SÎO� VISÓVEIS� JÉ� DESDE� MUITO� CEDO�� COMO� MALTRATAR� ANIMAIS� SEM� QUALQUER� REMORSO� OU� SENTIDO�� COMPORTAMENTO�EXTREMAMENTE�OPOSI- TOR�E� IMPULSIVIDADE�EXAGERADA��!TUAL- MENTE�� JÉ�SÎO�RECONHECIDAS�ALTERA¥ÜES� CEREBRAIS�EM�PSICOPATAS�QUE�JUSTIF ICAM� A�F ISIOPATOLOGIA�DA�PSICOPATIA� É MUITO DIFÍCIL DIAGNOSTICAR UMA PSICOSE INFANTIL, UMA VEZ QUE A CRIANÇA VIVE EM UM MUNDO NO QUAL A IMAGINAÇÃO NÃO TEM LIMITES, O QUE PODE SER CONFUNDIDO COM ALGUMA PSICOPATOLOGIA? MARCELA: #OMO� CITADO� ANTERIORMEN- TE�� MALTRATAR� ANIMAIS� PODE� SER� UMA� CARACTERÓSTICA� PRECOCE� DE� PSICOPATIA�� -AS� TORTURAR� UM� ANIMALZINHO� E� CHO- RAR�APØS�SER�ESCLARECIDO�DO�FEITO�Ï�UM� sinal de que esse ato pode ser apenas FRUTO�DA� INCAPACIDADE� INFANTIL�DE�PRE- VER�CONSEQUÐNCIAS��!TÏ�O�PERÓODO�PRÏ- ESCOLAR�� A� CRIAN¥A� GERALMENTE� TEM� PENSAMENTOS� CONCRETOS� E� POUCA� OU� NENHUMA�NO¥ÎO�DO�PERIGO��!SSIM��NÎO� Ï� INCOMUM� ACREDITAREM� QUE� PODEM� VOAR�OU�QUE�ALGUÏM�Ï�UM�SUPER HERØI� E� TEM� PODERES� MÉGICOS�� -AS� ESSES� PENSAMENTOS�SÎO�CONSTRUÓDOS�E�PODEM� SER� DESCONTRUÓDOS�� O� QUE� NÎO� OCORRE� DE� MANEIRA� TÎO� SIMPLES� NOS� QUADROS� DE� PSICOSE�� .ESSES� ÞLTIMOS�� AS� IDEIAS� DELIRANTES�SÎO�F IXAS�E�CONVENCÐ LOS�DA� IRREALIDADE�DE�ALGUMAS�COISAS�Ï�TAREFA� PRATICAMENTE�IMPOSSÓVEL� *� ��������������� G�I��G�hG� ���� �G��G��G����� ������ �����IG ��������G��� ����G����� ���I�I�������������G�G���G� �����G��G��G� �����^�����9� �� ��������Gb����� �� psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br 3MITH ,EMLI /PTIZ�� A� FENILCETONÞRIA� MATERNA�� O� CONSUMO�DE� CIGARRO�� ÉLCO- OL��DROGAS�OU�DE�ALGUNS�MEDICAMENTOS� DURANTE� A� GESTA¥ÎO�� DOEN¥AS� INFECCIO- SAS� �RUBÏOLA�� TOXOPLASMOSE�� CITOMEGA- LOVÓRUS�� VARICELA�� HERPES� ZOSTER�� ENTRE� OUTRAS �� INTOXICA¥ÎO� POR� METILMERCÞ- RIO�� EXPOSI¥ÎO� Ì� RADIA¥ÎO�� DESNUTRI¥ÎO� MATERNA�� MÉ FORMA¥ÎO� DA� PLACENTA�� TRAUMATISMO�CRANIOENCEFÉLICO�� E�HIPØ- XIA� GRAVE� PERINATAL�� /� OBJETIVO� MAIOR� DO� TRATAMENTO� Ï� A� REABILITA¥ÎO� �ESTI- MULAR� O� MAIOR� DESENVOLVIMENTO� POS- SÓVEL �E�CONTROLAR�AS�COMPLICA¥ÜES��!S- SIM�� A� TERAPIA� DEVE� SER� CONDUZIDA� POR� UMA�EQUIPE�MULTIDISCIPLINAR�COMPOSTA� POR�MÏDICOS�DE�DIFERENTES�ESPECIALIDA- DES� �NEUROPEDIATRAS�� OFTALMOLOGISTAS�� PEDIATRAS��lSIATRAS�ETC� ��lSIOTERAPEUTAS�� FONOAUDIØLOGOS�� TERAPEUTAS� OCUPACIO- NAIS�E�PSICØLOGOS��/�USO�DE�MEDICA¥ÜES� TAMBÏM� Ï� FREQUENTEMENTE� NECESSÉRIO� PARA�O�CONTROLE�DE�CRISES�EPILÏPTICAS�E� DAS�ALTERA¥ÜES�DE�COMPORTAMENTO� EM QUE MEDIDA AS DESCOBERTAS NO CAMPO DA NEUROLOGIA PEDIÁTRICA AVANÇARAM NO DIAGNÓSTICO E NO TRA- TAMENTO DOS TRANSTORNOS DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE? MARCELA: !TUALMENTE�� O� DIAGNØSTICO� DOS�4$!(� TEM� SIDO� FEITO� DE�MANEIRA� CADA� VEZ� MAIS� PRECOCE�� /� ESTUDO� DO� COMPORTAMENTO� E� DESENVOLVIMENTO� NORMAL�DA�CRIAN¥A��ALÏM�DOS�ESTUDOS�DE� IMAGEM� FUNCIONAIS�� AUMENTOU� EXPO- NENCIALMENTE� NOSSO� CONHECIMENTO� NA� ÉREA�� PERMITINDO� DIFERENCIAR� O� NORMAL� DO�PATOLØGICO�COM�MAIS�SEGURAN¥A��%�� UMA� VEZ� DISTINGUINDO OS�� Ï� POSSÓVEL� TRATAR� OS� CASOS� NECESSÉRIOS�� !LÏM� DAS� TERAPIAS� MEDICAMENTOSAS�� PODEMOS� CONTAR�COM�O�TRATAMENTO�NEUROPSICOLØ- GICO�DESSAS�CRIAN¥AS��QUE�CADA�DIA�MAIS� ENGLOBA�NOVAS�TÏCNICAS��%NTRE�AS�MEDI- CA¥ÜES�� ATUALMENTE� DISPOMOS� DE� UMA� DIVERSIDADE�AMPLA�DE�CLASSES�DE�DROGAS� E� FORMULA¥ÜES�COM�DIFERENTE� FARMACO- CINÏTICA� E� DIFERENTE� FARMACODINÊMICA�� QUE� PERMITEM� OTIMIZAR� O� BENEFÓCIO� E� MINIMIZAR�OS�EFEITOS�COLATERAIS� O CÉREBRO DAS PESSOAS QUE SOFREM DE TDAH FUNCIONA DE MANEIRA DIFE- RENTE? APRESENTA DIFERENÇAS MORFO- LÓGICAS? MARCELA:� 3ABE SE� QUE� O� 4$!(� TEM� UM� FORTE� COMPONENTE� HEREDITÉRIO�� !� PROBABILIDADE� DE� UMA� CRIAN¥A� TER� O� DISTÞRBIO� AUMENTA� EM� ATÏ� OITO� VEZES� SE� OS� PAIS� TAMBÏM� FOREM� ACOMETIDOS�� %NTRETANTO�� A� CAUSA� DO�4$!(� Ï�MUL- TIFATORIAL�� COM�COMPONENTES� GENÏTICOS� E� AMBIENTAIS�� %STUDOS� DEMONSTRAM� REDU¥ÎO� DO� VOLUME� DE� CERTAS� ESTRUTU- RAS� CEREBRAIS�� COM� PROPORCIONALMENTE� MAIOR�DIMINUI¥ÎO�DO�CØRTEX�PRÏ FRONTAL� ESQUERDO�NOS�ACOMETIDOS��/S�CIRCUITOS� PRÏ FRONTAIS ESTRIATO CEREBELAR� E� PRÏ- FRONTAIS ESTRIATO TÉLAMO�TAMBÏM�DIFE- REM�ENTRE�PESSOAS� COM�E� SEM�4$!(�� 3ABE SE�� AINDA�� QUE�HÉ� ALTERA¥ÜES� FUN- CIONAIS� ENVOLVIDAS�� EM� ESPECIAL� NAS� VIAS�DOPAMINÏRGICA�MESOCORTICOLÓMBI- CA�E�NORADRENÏRGICA�DO�locus ceruleus. A SUPERMEDICALIZAÇÃO DAS CRIANÇAS EM CASOS DE TDAH PODE NÃO SER A MELHOR SAÍDA? MARCELA: #OM�CERTEZAå�-UITOS�CASOS� PODEM�SER�RESOLVIDOS��INCLUSIVE��SEM�O� USO�DE�QUALQUER�MEDICA¥ÎO��/�4$!(� TEM� VÉRIOS� GRAUS� E� TAMBÏM� TEM� SIDO� ASSOCIADO� COM� DÏF ICITS� MOTIVACIONAIS� EM�ALGUMAS� CRIAN¥AS��%SSAS� TÐM�DIF I- CULDADE�PARA�MANTER�A�CONCENTRA¥ÎO�E� EXIBEM�COMPORTAMENTO�IMPULSIVO�POR� RECOMPENSAS� DE� CURTO� PRAZO�� .ESSES� SHU TT ER ST OC K O estilo de vida contemporâneo é mais acelerado que na época de nossos AVØS��)SSO�REmETE�NA� evolução das crianças: alterações hormonais E�MODIlCA¥ÜES�DO� ambiente uterino em função da vida da mãe, adaptação à multiplicidade de estímulos ambientais $�b���������G��� �����I��G��G��Ô�����^������� ��I� �9�I�����G���G�G��G���G����������������������� �9� I������G�������������������������� G ����G���G G www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 13 INDIVÓDUOS��O�REFOR¥O�POSITIVO�MELHORA� EFETIVAMENTE�O�DESEMPENHO�� SEM�USO� DE� QUALQUER� MEDICA¥ÎO�� %NTRETANTO�� EM� MUITOS� CASOS�� OS� PSICOESTIMULAN- TES� PODEM� SE� FAZER� NECESSÉRIOS� PARA� AUMENTAR� A� PERSISTÐNCIA� E� A� ATEN¥ÎO�� ALÏM� DE� MELHORAR� O� COMPORTAMENTO� TAMBÏM��#ONTUDO�� CADA� CRIAN¥A� Ï�DI- FERENTE� DA� OUTRA�� .UNCA� DEVE� SER� ES- QUECIDO� QUE� NEM� TODA� DESATEN¥ÎO� E� OU� HIPERATIVIDADE� Ï� 4$!(�� MUITAS� VEZES� FALTAM� APENAS� ESTÓMULO� E� ORGA- NIZA¥ÎO�FAMILIAR� EXISTEM INÚMEROS MITOS A RESPEITO DO FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO DO ADOLESCENTE, COMO A BUSCA PELO PRA- ZER IMEDIATO, NECESSIDADE DE RECOM- PENSAS POR MÉRITO, DIFICULDADE EM RESPEITAR LIMITES E REGRAS, POR EXEM- PLO. COMO A NEUROLOGIA ENXERGA EM QUE MEDIDA ESSAS CARACTERÍSTICAS DEVEM SER CONSIDERADAS NATURAIS OU INDÍCIOS DE PATOLOGIAS OU DISTÚRBIOS? MARCELA: !� ESTRUTURA� CEREBRAL� SOFRE� VISÓVEIS� MUDAN¥AS� DURANTE� A� ADOLES- CÐNCIA�� COMO� JÉ� COMENTADO� ANTERIOR- MENTE�� 0ROVA� DISSO� Ï� QUE� A� ESPESSURA� DA� SUBSTÊNCIA� CINZENTA� VARIA� NESSE� PERÓODO�� REF LETINDO� AS� ALTERA¥ÜES� QUE� OCORREM�EM�NÓVEL�MICROSCØPICO��!LÏM� DISSO��O�AMADURECIMENTO�DAS�CONEXÜES� CEREBRAIS� OCORRE� DE� MANEIRA� PROGRES- SIVA��MAS�EM�TEMPOS�DIFERENTES��£REAS� ENVOLVIDAS� EM� FUN¥ÜES� MAIS� BÉSICAS� AMADURECEM� PRIMEIRO�� AQUELAS� RELA- CIONADAS�� POR� EXEMPLO�� AO� PROCESSA- MENTO� DE� INFORMA¥ÎO� DOS� SENTIDOS� �TATO��VISÎO��AUDI¥ÎO�ETC� �E�NO�CONTROLE� DOS�MOVIMENTOS��!S�PARTES�DO�CÏREBRO� RESPONSÉVEIS�PELO�CONTROLE�DOS� IMPUL- SOS�E�PLANEJAMENTO�DO�FUTURO��ATIVIDA- DES� MAIS� COMPLEXAS� E� CARACTERÓSTICAS� DO�COMPORTAMENTO�ADULTO �ESTÎO�ENTRE� AS� ÞLTIMAS� A� AMADURECER�� /UTRA� EVI- DÐNCIA�DE�DIFEREN¥A�NO�FUNCIONAMENTO� CEREBRAL�ADOLESCENTE�Ï�QUE�AS�PARTES�DO� CÏREBRO�ENVOLVIDAS�EM�RESPOSTAS�EMO- CIONAIS�SÎO�TOTALMENTE�ATIVAS��OU�MES- MO�MAIS�ATIVAS�DO�QUE�EM�ADULTOS��EN- quanto aquelas envolvidas no controle Para minimizar as sequelas da microcefalia, a reabilitação MULTIPROlSSIONAL� precoce é fundamental. Ainda não temos MEDICA¥ÜES�ESPECÓlCAS� neuroprotetoras ou que possam estimular a regeneração neuronal DOS� IMPULSOS� AINDA� ESTÎO� CHEGANDO� Ì� MATURIDADE��4AL�MUDAN¥A�DE�EQUILÓBRIO� PODE�FORNECER�PISTAS�PARA�A�EXPLICA¥ÎO� ENTRE� UM� APETITE� JOVEM� POR� NOVIDADE� E� UMA� TENDÐNCIA� A� AGIR� POR� IMPULSO�� SEM�LEVAR�EM�CONTA�O�RISCO��%NTRETAN- TO��APESAR�DESSA�IMPULSIVIDADE�NATURAL�� EXISTE� UMA� LINHA� TÐNUE� QUE� SEPARA� O� NORMAL�DO�PATOLØGICO��MAS�ESSA�DIVISØ- RIA�NEM�SEMPRE�Ï�TÎO�NÓTIDA��DEPENDEN- DO� DA� REPERCUSSÎO� QUE� ESSAS� ATITUDES� DITAS�JUVENIS�TÐM�NA�VIDA�DO�INDIVÓDUO� O USO EXCESSIVO DA INTERNET PODE ALTERAR O FUNCIONAMENTO CEREBRAL DA CRIANÇA? MARCELA: 6ÉRIOS�ESTUDOS�TÐM�MOSTRA- DO� MODIF ICA¥ÜES� ESTRUTURAIS� �ATROF IA� NA� SUBSTÊNCIA� CINZENTA � E� FUNCIONAIS� �ALTERA¥ÜES� NAS� VIAS� NEURONAIS� DE� DO- PAMINA �EM�ADICTOS�EM�INTERNET�OU�JO- gos. !S�ÉREAS�AFETADAS�INCLUEM�O�LOBO� FRONTAL�� QUE� REGULA� AS� FUN¥ÜES� EXECU- TIVAS�� COMO� PLANEJAMENTO�� ORGANIZA- ¥ÎO� E� CONTROLE� DE� IMPULSOS�� 0ERDA� DE� VOLUME�CORTICAL�TAMBÏM�FOI�OBSERVADA� no striatum��QUE�ESTÉ�ENVOLVIDO�NAS�VIAS� DE� RECOMPENSA�E� SUPRESSÎO�DE� IMPUL- SOS�SOCIALMENTE�INACEITÉVEIS��4AMBÏM� HÉ�POSSÓVEIS� ALTERA¥ÜES�NA� ÓNSULA�� QUE� ESTÉ� LIGADA�Ì�NOSSA�CAPACIDADE�DE�DE- SENVOLVER� EMPATIA� E� COMPAIXÎO� PARA� COM� OS� OUTROS�� E� DE� INTEGRAR� SINAIS� F ÓSICOS� DE� EMO¥ÎO�� %M� SUMA�� O� USO� EXCESSIVO� DA� INTERNET� PARECE� PREJUDI- CAR� A� ESTRUTURA� E� FUN¥ÎO� DO� CÏREBRO�� COM� GRANDE� PARTE� DOS� DANOS� OCOR- RENDO� NO� LOBO� FRONTAL�� QUE� PASSA� POR� GRANDES�MUDAN¥AS�DESDE�A�PUBERDADE� ATÏ� MEADOS� DOS� ��� ANOS�� %M� GRANDE� PARTE�� DESDE� A� SENSA¥ÎO�DE�BEM ESTAR� AO� SUCESSO� ACADÐMICO�PROF ISSIONAL� E� HABILIDADES�DE�RELACIONAMENTO��EMPA- (�������G�������� ����IG����G��G���I��I��G��G9�I�����^� ������ ������9� �� ���9� ���������G� ��'G���9� �����¢ �¢��G�9� ��-�I������ ��-����¢'����¢*����9�����������G� 14 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br TIA�OU�COMPORTAMENTO�ANTISSOCIAL �DE- PENDEM�DO�BOM�FUNCIONAMENTO�DESSA� ÉREA�CEREBRAL� PROCEDE A AFIRMAÇÃO QUE AS MENINAS AMADURECEM MAIS CEDO DO QUE OS ME- NINOS E QUE O CÉREBRO MASCULINO E FEMININO POSSUEM DIFERENÇAS BIOLÓGI- CAS? EM CASO AFIRMATIVO, COMO ESSAS DIFERENÇAS INFLUENCIAM NOS ESTUDOS DA NEUROPEDIATRIA? MARCELA: -ATURIDADE�CEREBRAL�Ï�SINÙ- NIMO�DE�CAPACITA¥ÎO�PARA�DETERMINADA� ATIVIDADE� �DESENVOLVIMENTO� ADEQUADO� DE�VIAS�E�CONEXÜES�INTERNEURONAIS ��3E- GUNDO�ESTUDOS�RECENTES�� FOI�EVIDENCIA- DO�QUE� AS�MENINAS� TENDEM�A�OTIMIZAR� AS� CONEXÜES� CEREBRAIS� MAIS� CEDO� QUE� OS�RAPAZES��AMADURECENDO�MAIS�RÉPIDO� EM�ALGUMAS�ÉREAS�COGNITIVAS�E�EMOCIO- NAIS�DURANTE�A�INFÊNCIA�E�ADOLESCÐNCIA�� %SSA� hEVOLU¥ÎOv� RESULTA� DE� UMA� PODA� NEURONAL�� ONDE� CONEXÜES� REDUNDANTES� SÎO�hAPARADASv�E�OUTRAS�ESSENCIAIS�ESTA- BILIZADAS��!LÏM�DISSO��AS�MULHERES�TEN- DEM�A�TER�MAIS�CONEXÜES�ENTRE�OS�DOIS� HEMISFÏRIOS� DO� CÏREBRO�� $ESSA� FORMA�� CREDITA SE�A�ESSA�REORGANIZA¥ÎO�PREMA- TURA� A� CAPACIDADE� DE� O� CÏREBRO� FEMI- NINO�TRABALHAR�DE�FORMA�MAIS�ElCIENTE� E�� PORTANTO�� ALCAN¥AR� UM� ESTADO� MAIS� MADURO�PARA�O�PROCESSAMENTO�DO�MEIO� AMBIENTE� DE� MANEIRA� MAIS� PRECOCE�� .A� PRÉTICA�� Ï� COMUM� QUE� OS�MENINOS� SE�MOVIMENTEM�MAIS�NO�PERÓODO�PERI- NATAL� E� TENHAM� MELHORES� HABILIDADES� MOTORAS�GROSSEIRAS�� QUE�ENVOLVEM� FOR- ¥A� E� PRECISÎO�� %NTRETANTO�� AS� MENINAS� ADQUIREM�MATURIDADE� EMOCIONAL� E� AL- GUNS�HÉBITOS�MAIS� RAPIDAMENTE�� COMO� O�CONTROLE�DO�ESFÓNCTER��E�FALAM�ANTES�E� MELHOR�DO�QUE�OS�MENINOS��/�QUE�LEVA� Ì� DIFEREN¥A� DE� GÐNERO� AINDA� NÎO� ESTÉ� TOTALMENTE� CLARO� NO� MOMENTO� E� NEM� Um estudo sueco mostrou que homens homossexuais e mulheres heterossexuais têm características cerebrais semelhantes. %SPECIlCAMENTE��ESSAS� semelhanças estão no tamanho total do cérebro, na atividade e nas conexões da amígdala AS� INmUÐNCIAS�DO�MEIO� SÎO�CAPAZES�DE� ELIMINAR� ESSA� DIVERGÐNCIA�� #ONTUDO�� Ï� EVIDENTE� QUE� ESSA� DIFEREN¥A� DEVE� SER� VALORIZADA� NA� AVALIA¥ÎO� NEUROLØGICA� E� FUNCIONAL�DE�QUALQUER�INDIVÓDUO� AINDA EM RELAÇÃO A GÊNEROS, E ABOR- DANDO A QUESTÃO DA HOMOSSEXUALIDA- DE, PARA A NEUROPEDIATRIA É POSSÍVEL AVALIAR SE O FENÔMENO É BIOLÓGICO? DESDE MUITO CEDO A CRIANÇA PODE DESCOBRIR SUA HOMOSSEXUALIDADE? MARCELA: 5M� ESTUDO� SUECO� MOSTROU� QUE� HOMENS� HOMOSSEXUAIS� E� MULHERES� HETEROSSEXUAIS� TÐM� CARACTERÓSTICAS� CE- REBRAIS� SEMELHANTES�� %SPECIlCAMENTE�� ESSAS� SEMELHAN¥AS� ESTÎO� NO� TAMANHO� TOTAL�DO�CÏREBRO�E�NA�ATIVIDADE�E�CONE- XÜES� DA� AMÓGDALA�� /� MESMO� ACONTECE� ENTRE�HOMENS�HETEROSSEXUAIS�E�MULHERES� HOMOSSEXUAIS�� /UTRA� PESQUISA� QUE� ES- TUDOU�O�mUXO�SANGUÓNEO�NAS�AMÓGDALAS� OBSERVOU�QUE�EM�HOMENS�HOMOSSEXUAIS� E�MULHERES�HETEROSSEXUAIS�O�SANGUE�mUI� PRINCIPALMENTE�PARA�AS�ÉREAS�ENVOLVIDAS� COM� MEDO� E� ANSIEDADE�� ENQUANTO� QUE� EM� HOMENS� HETEROSSEXUAIS� E� MULHERES� HOMOSSEXUAIS� TENDIA� A� mUIR� PARA�OS� LO- CAIS� LIGADOS� ÌS� REA¥ÜES� DE� LUTA� E� FUGA�� !LÏM�DISSO��AO�AVALIAR�AS�DIFEREN¥AS�ANA- TÙMICAS�ENTRE�OS�HEMISFÏRIOS�CEREBRAIS��O� DIREITO�PARECE�SER�UM�POUCO�MAIOR�QUE� O� ESQUERDO� EM� HOMENS� HETEROSSEXUAIS� E� MULHERES� HOMOSSEXUAIS�� ENQUANTO� QUE�HAVIA�UMA�TENDÐNCIA�Ì�SIMETRIA�EM� HOMENS�HOMOSSEXUAIS�E�MULHERES�HETE- ROSSEXUAIS��%M�HOMENS�HOMOSSEXUAIS�E� MULHERES�HETEROSSEXUAIS�CONSTATARAM SE� TAMBÏM�MAIS�CONEXÜES�A�PARTIR�DA�AMÓG- DALA� ESQUERDA�� *É� EM�MULHERES� HOMOS- SEXUAIS�E�HOMENS�HETEROSSEXUAIS�HOUVE� MAIS� LIGA¥ÜES� A� PARTIR� DA� AMÓGDALA� DI- REITA��0ARA�A�EXISTÐNCIA�DESSAS�DIFEREN¥AS� ENTRE� O� CÏREBRO�HOMOSSEXUAL�E� O�HETE- ROSSEXUAL� JÉ� FORAM� AVENTADAS� DIVERSAS� TEORIAS��COMO�A�EXPOSI¥ÎO�PROLONGADA�Ì� TESTOSTERONA�E�OUTROS�HORMÙNIOS�MASCU- LINOS�OU�MESMO�ALTERA¥ÜES�GENÏTICAS��/� FATO�Ï�QUE��ATÏ�O�MOMENTO��NÎO�SABEMOS� A�REAL�CAUSA�DE�TAIS�DIFEREN¥AS�E�SE�JÉ�SE� NASCE�HOMOSSEXUAL�OU�NÎO� *�����GH������ ���������������I��G�hG���� ��G���G��P��G��I���������G�9����������G�G�����h������I����G�9� I������G�� G�����9����G���GhÔ����I�������� ���������� MOMENTO DO LIVRO Livro: Opala - A história do maior chevrolet brasileiro Número de páginas: 116 Editora: Escala Dos editores da revista Car and Driver À venda nas bancas e livrarias. Veja mais informações em www.escala.com.br Coordenação de Luiz Guerrero Durante 24 anos de produção, o Chevrolet Opala reinou sem concorrentes e se tornou obje- to de desejo de uma geração de motoristas e en- tusiastas. Suas linhas atraentes, especialmente na versão cupê, e sua versão esportiva, a SS, estabe- leceram novos padrões para a indústria brasileira. Pois é deste automóvel que trata este livro: das origens, cimentadas pelo Opel Rekord, até o dia ���GH�DEULO�GH�������TXH�PDUFRX�R�ÀP�GR�FLFOR�GH� um dos mais queridos automóveis já produzidos no Brasil. OPALA – A história do maior Chevrolet brasileiro, coordenada por Luiz Guerrero, é o quarto título da coleção Os Imortais, que anteriormente contou a história de outros marcantes automóveis como o FUSCA, o MUSTANG e a KOMBI, todos com capa em acabamento Premium e 116 páginas de histórias contadas em imagens e textos cheios de detalhes. Conheça toda a história deste automóvel e entenda por que o Opala foi o maior Chevrolet até hoje fabricado no País. 16 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br in foco por Michele Muller Playgrounds são ASSUNTO SÉRIO de funções psicomotoras, sensoriais e so- ciais. Trazem às crianças a oportunidade de praticarem o equilíbrio, a força, a aten- ção às diversas texturas, a lateralidade, a coordenação motora, a propriocepção (noção da localização espacial do próprio corpo) e as habilidades criativas e sociais. Para comprovar que a arquitetura do espaço faz toda a diferença na brinca- deira, os pesquisadores Anthony Susa e James Benedict (1994) realizaram um es- tudo, na década de 90, relacionando brin- cadeiras de faz de conta, criatividade e o design do playground. Para isso, testaram o “pensamento divergente” de 80 crianças enquanto brincavam em diferentes espa- ços. A conclusão foi de que os parquinhos CONTEMPORÊNEOS�SÎO�MAIS�ElCIENTES�NO�ES- tímulo à criatividade que os tradicionais. O estudo serviu de base para muitos projetos de arquitetura voltados a esse público e ou- tras pesquisas apontando a necessidade de UM�OLHAR�MAIS�PROlSSIONAL�SOBRE�AS�ÉREAS� construídas para estimular brincadeiras. Enquanto seguimos conformados com nossos velhos e abandonados escorregado- res de praça, em países em que ambientes de lazer são levados a sério e considerados parte fundamental do desenvolvimento infantil, a discussão (que nem chegou no "RASIL �ESTÉ�TÎO�AVAN¥ADA�QUE�ESTÎO�REVEN- do alguns de seus projetos mais modernos. O motivo: excesso de segurança. ESPAÇOS PÚBLICOS QUE PROMOVEM A SOCIALIZAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE FUNÇÕES FUNDAMENTAIS PARA A SAÚDE MENTAL DAS CRIANÇAS DEVERIAM RECEBER MAIS ATENÇÃO E MAIS INVESTIMENTOS DAS AUTORIDADES BRASILEIRAS A VIDA É CHEIA DE RISCOS E A INFÂNCIA É A FASE DE TREINAMENTO PARA REAIS DILEMAS QUE REQUEREM SEGURANÇA NA HORA DE AGIR. CRIANÇAS PRIVADAS DO CONTATO COM O PERIGO CRESCEM SEM CORAGEM D iante das opções tentadoras de diversão eletrônica, as crianças estão reduzindo drasticamente o tempo dedicado às aventuras nos espaços externos. Muitos pais parecem se preocupar com a participação excessiva dos ELETRÙNICOS�NO�DIA�A�DIA�DO�lLHO��MAS� SÎO� raros os que conseguem encaixar na rotina momentos de atividades livres em locais ESTIMULANTES��!�DIlCULDADE�EM�ADMINISTRAR� o tempo e, principalmente, a preocupação crescente com a segurança das crianças pode tornar conveniente esse interesse quase obsessivo delas pelas telas e botões. Uma pesquisa recente com 2 mil fa- mílias inglesas constatou que três em cada quatro crianças passam menos de UMA�HORA�DIÉRIA�BRINCANDO�EM�AMBIENTE� externo – um tempo menor de contato com luz solar que o garantido a detentos das prisões daquele país. A realidade das nossas crianças que vivem nas cidades GRANDES�NÎO�DEVE�SER�DIFERENTE��%�AQUI�HÉ� um agravante: temos menos alternativas interessantes de ambientes destinados a brincadeiras ao ar livre. A maioria dos nossos playgrounds públicos têm duas ou três atrações, não raramente mal conser- vadas. A arquitetura nos surpreende com tantas soluções belas e funcionais, mas até agora pouco trouxe para concorrer com OS� INEVITÉVEIS� ESCORREGADORES� E� BALAN¥OS� das praças brasileiras. Sem questionar a diversão que podem propiciar, sozinhos eles não representam um grande motiva- DOR�PARA�TIRAR�PAIS�E�lLHOS�DE�CASA� A necessidade de oferecer ambien- tes atraentes e repletos de estímulos em ESPA¥OS� PÞBLICOS� Ï� EVIDENTE� EM� VÉRIOS� lugares do mundo. Em muitos países, a comunidade têm à disposição parquinhos desenvolvidos por arquitetos especializa- dos nesse setor. Muitos são tão criativos e IRRESISTÓVEIS�QUE�DÉ�VONTADE�DE�VOLTAR�A�SER� criança para aproveitar a estrutura. Esses locais, quando bem arquitetados, não apenas servem de incentivo a passeios EM�FAMÓLIA�E�MENOS�HORAS�DE�SOFÉ��SÎO�PRO- jetados a partir da consciência da impor- tância do ambiente no desenvolvimento www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 17 IM AG EN S: M IC HE LE M IL LE R probabilidade de gerarem batidas, quedas e machucados. Os pais excessivamente protetores terão que rever seus conceitos e entender por que as ataduras do Menino Maluquinho foram essenciais para a for- mação de um jovem feliz e bem resolvido, conforme Ziraldo concluiu a história. Na década de 1940, muito antes de TERMOS� COMPROVA¥ÜES� CIENTÓlCAS� DA� IM- portância dos riscos que a brincadeira livre traz, o arquiteto dinamarquês Carl Sørensen criou um conceito de play- ground que foi espalhado por toda a Eu- ropa. Sua ideia era dar às crianças da cida- de as mesmas chances de viver aventuras que eram privilégio das que cresciam no interior. O Adventure Playground atual- mente conta com cerca de mil espaços em diversos países, inclusive Estados Unidos e Japão. Equipados com muitos pedaços de madeira e ferramentas de verdade, os parques trazem aos pequenos aventurei- ros a oportunidade de construírem seus próprios brinquedos, de subirem em cor- DAS��ÉRVORES�E�DE�SE�SUJAREM�BASTANTE� No Japão, a preocupação em expor crianças pequenas ao risco foi um dos principais fundamentos do projeto da escola construída por um dos arquitetos mais conceituados daquele país na atua- lidade. Takaharu Tezuka projetou a Fuji Kindergarten, em Tóquio, levando em consideração as necessidades naturais das crianças – inclusive de se aventurar. Na escola, em formato oval e sem a tradicio- nal separação física das salas de aula, elas têm total liberdade de explorar o ambien- te e passam a maior parte do tempo gas- TANDO�ENERGIA�NAS�ÉREAS�EXTERNAS��,É�ELAS� correm, em média, 4 quilômetros por dia e ganham naturalmente as habilidades psicomotoras que garantem seu desen- volvimento social e cognitivo. Nenhuma CRIAN¥A� Ï� CONSIDERADA� PROBLEMÉTICA� POR� NÎO� CONSEGUIR� lCAR� SENTADA� DENTRO� DE� uma sala. O arquiteto Takaharu Tezuca, em sua palestra do TED, destaca: “Crian- ças precisam de pequenas doses de peri- go. Nessas ocasiões elas aprendem a se ajudar. Isso é viver em sociedade. É oque estamos perdendo nos dias atuais”. Além de serem impedidas de brincar LIVREMENTE�� COMO� RESULTADO� DE� VÉRIOS� TI- pos de medo que as cidades grandes nos IMPÜEM��AS�CRIAN¥AS�PERDERAM�A�CONlAN- ça de seus pais. Em algum momento da história recente colocaram uma lente de aumento nas pequenas ameaças do dia a dia e resolveram que crianças são total- MENTE� IRRESPONSÉVEIS� E� DESPROVIDAS� DE� noção de perigo. Um dos fatores que mais pesam no es- tilo de vida das crianças modernas – seja NA� )NGLATERRA� OU� AQUI� n� ACABOU� INmUEN- ciando a criação dos espaços contempo- RÊNEOS� DE� BRINCADEIRA�� !lNAL�� ALGUMAS� sociedades, especialmente a americana, vivem sob ameaça constante de proces- sos, e qualquer atividade que envolva o público infantil corre sério risco de gerar insatisfações com consequências legais. Os medos e ansiedades dos adultos, desproporcionais aos verdadeiros riscos que a realidade traz, desconsideram a na- tureza da criança e mais prejudicam que protegem. O perigo, em pequenas doses DIÉRIAS�� Ï� PARTE� FUNDAMENTAL� DAS� BRINCA- deiras. Filhotes de espécies mais evoluídas se divertem correndo riscos, testando seu próprio comportamento diante de situ- ações perigosas simuladas nas pequenas lutas e aventuras de sua curta infância. E isso não ocorre por acaso, nem representa irresponsabilidade ou falta de noção, como MUITOS� PAIS� DE� lLHOTES� HUMANOS� ACREDI- tam. É parte do crescimento, do autoco- nhecimento e do conhecimento dos limi- tes do corpo e das necessidades do outro. A vida é cheia de riscos e a infância é a fase de treinamento para reais dilemas que re- querem segurança na hora de agir. Crian- ças privadas do contato com o perigo cres- cem sem coragem, dependentes, com altos níveis de ansiedade e sem noção de como lidar com situações sociais simples que não poderão ser evitadas pelos pais mais tarde. Portanto, além de modernos, criativos e cheios de estímulos, muitos playgrounds contemporâneos de países desenvolvidos estão sendo repensados para trazer um certo risco. Ou seja: voltam a ter cantos, pontas, superfícies duras, altura e mais Michele Muller é jornalista com especialização em Neurociência Cognitiva e autora do blog http://neurocienciasesaude.blogspot.com.br 18 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.brwww.portalcienciaevida.com.br psicopositiva por Lilian Graziano CONSIDERADA COMO CONDIÇÃO FUNDAMENTAL PARA A FELICIDADE GENUÍNA, A AUTENTICIDADE DEVE SER UMA BUSCA CONSTANTE. MAS, PARA ISSO, PRECISAMOS CONHECER OS SEUS IMPEDITIVOS A lata de azeite e os impeditivos da VIDA AUTÊNTICA (parte 2) aquela experimentada por um indiví- duo distante da sua própria verdade. No texto passado af irmei que se- riam quatro essas razões (má inten- ção, desconhecimento, falta de cora- gem e o “moedor de carne”), tendo discutido, naquela ocasião, apenas as duas primeiras. Começo este texto, portanto, falando sobre a terceira razão que poderia impe- dir que uma pessoa leve uma vida autên- tica: a simples e pura falta de coragem. !RISTØTELES�AlRMAVA��SABIAMENTE��QUE� a coragem é a principal das virtudes, vis- to ser necessária até para que o indivíduo seja ele mesmo. Concordo integralmente com o SÉBIO� lLØSOFO�� .O� ENTANTO�� VOU� ALÏM�� Tenho medo dos covardes quase tanto quanto dos maus caráteres. Isso por- que, considerando a bondade como característica da maior parte dos seres humanos (uma crença bastante discutí- vel, admito), creio ser no covarde que o mau caráter encontra sua principal fon- te de manobra. O covarde se corrompe por medo. Medo de perder a aprova- ção, o afeto, o conforto, o prestí- gio, não importa. É por medo que ele deixa de viver aqui- lo em que acredita, abre mão de seus valores e, P artindo da ideia de que a au- tenticidade é mais do que uma força pessoal, na coluna passa- da comecei a discorrer sobre a importância dessa característica para a chamada felicidade genuína. Mais do QUE�ISSO��AlRMEI�QUE��A�DESPEITO�DESSE� fato, existem algumas razões que cos- tumam condenar as pessoas a uma vida inautêntica. Uma vida que, agora acrescento, seria bastante discutível em termos de felicida- de, visto sua inerente ausência de sentido, uma vez que nenhuma anomia pode ser maior do que www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 19 Lilian Graziano é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área. graziano@psicologiapositiva.com.br SH UT ER ST OC K / A CE RV O PE SS OA L justamente por conta dessa fraqueza, torna-se perigoso. Se pensarmos na autenticidade como uma condição para uma vida feliz e considerarmos que é necessário cora- gem para sermos autênticos, a conclusão é clara: a felicidade exige coragem. E é triste saber que existem pessoas infelizes não pelas condições que cercam suas vi- das mas, antes de tudo, pelo medo que as impele a uma vida pela metade em que a extensão de seus discursos não vai além do volume vacilante de suas pala- vras. Além disso, vivemos em uma épo- ca em que imersos em uma avalanche de simulações (sociedade do espetáculo, al- guns diriam) ser autêntico e verdadeiro tornou-se um diferencial. Mas isso já é um outro assunto! A quarta razão que nos afasta da au- tenticidade é o que chamo de “moedor DE� CARNEv�� *É� DElNI� ESSA� EXPRESSÎO� EM� outros textos meus, portanto, dessa vez, serei breve. Chamo de moedor de carne esse ritmo alucinante em que vivemos que nos faz viver numa espécie de piloto automático e que nos distancia de tudo: das atividades que fazemos, das pessoas ao nosso redor e de nós mesmos. Os dias vão se acumulando uns sobre os outros, a vida vai passando e lá estamos nós dentro (?!) daquele enorme moedor de carne, muitas vezes ligados no 220 volts. E é assim que o moedor de carne se torna responsável por coisas como a lata de azeite. Antes que você me tome como louca, permita-me, caro leitor, que eu me explique. Durante boa parte da minha infân- cia e adolescência, brigava com minha mãe por causa das latas de azeite que tínhamos em casa (sim, porque naquela época o azeite era vendido em latas!). Nossas latas de azeite eram sempre me- lecadas e grudentas, o que me incomo- A AUTENTICIDADE É IMPOSSÍVEL SEM O AUTOCONHECIMENTO. TALVEZ POR ESSA RAZÃO ESSE ÚLTIMO SEJA A PEDRA ANGULAR DE TODO TRABALHO PSICOTERAPÊUTICO dava bastante. Eu tinha a plena convic- ção de que isso acontecia porque minha mãe fazia dois furos na lata (na época EU�DESCONHECIA�A�TEORIA�DOS�mUIDOS ��/� fato é que brigava com minha mãe to- das as vezes. Quando abria uma lata de azeite, eu fazia sempre um furo grande �RESOLVENDO� ASSIM� O� PROBLEMA� DO� mU- XO ��-INHA�MÎE�lCAVA� LOUCA��!LÏM�DE� fazer um outro furo na lata ainda en- lAVA�UM�PALITO�DE�DENTE�NO�FURO�QUE�EU� HAVIA�FEITO�A�lM�DE�DEIXÉ LO�MENOR��&OI� assim por muito tempo. Até que um dia EU�ME� CASEI�� lZ�MINHA� PRIMEIRA� COM- pra de supermercado e, claro, comprei minha lata de azeite. Quando cheguei em casa, peguei a lata e aconteceu: sem QUE�ME�DESSE�CONTA��lZ�DOIS�FUROS�NELAå� Lembro-me desse dia como se fosse hoje. Naquele momento meu cérebro, funcionando no piloto automático, me traíra, fazendo com que eu simplesmen- te seguisse a minha referência, ainda que isso fosse de encontro com minha crença e minha verdade. Para mim, a lata de azeite se tornou uma metáfora do que acontece quan- do estamos distantesde nós mesmos: traímos a nossa essência, deixamos de ser autênticos e, o pior, temos que arcar com uma vida, por assim dizer, um tan- to “melecada”. ANÚNCIO 1/3 20 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br psicopedagogia por Maria Irene Maluf Educando para o FUTURO DURANTE TODA A ESCOLARIDADE É POSSÍVEL APARELHAR GRADATIVAMENTE AS CRIANÇAS E JOVENS DE MODO A DESENVOLVER AS CHAMADAS HABILIDADES INTERPESSOAIS O homem é um ser social por natureza. Desde o momen- to de seu nascimento, in- dependentemente de onde viva, já se encontra inserido em um grupo social, que se amplia conforme cresce e começa a frequentar a escola, constituindo novas e crescentes rela- ções interpessoais. Tal rede de relações é estabelecida segundo características do indivíduo, do próprio grupo e da cultura vigente e vai sendo construída gradativamen- te no decorrer de toda vida e, embora os primeiros anos sejam primordiais nesse aprendizado, é preciso aprender a aprender como planejar novas situa- ções por toda a vida. Ninguém duvida que o maior ob- jetivo da educação seja criar a auto- nomia pessoal e social e que essa con- dição dependa em grande parte da formação acadêmica e depois prof is- sional, de cada pessoa. A constituição de um perf il prof issional que acom- panhe as mudanças, as demandas de um mundo laboral hiperativo, compe- titivo e exigente é uma urgência das últimas décadas, à qual ninguém se pode furtar. Paralelamente a isso, temos como certo que a formação do adulto capaz e autônomo, socialmente responsável, depende primordialmente da educação que recebe da família e da escolaridade que frequenta e que esta não se baseia mais na transmissão de valores e co- nhecimentos (de toda ordem) pratica- mente imutáveis, mas na necessidade DE�CRIAR�PESSOAS�COM�UM�PERlL�ADAPTA- tivo às rápidas mudanças sociais, cien- TÓlCAS�� MERCADOLØGICAS�� ETC�� !PRENDER� como se aprende, para aprender sem- pre, constitui um padrão de realidade à qual ninguém pode se furtar. Entretanto, além do imprescindí- vel respeito aos talentos naturais, há de se levar em conta que habilidades de toda ordem devem ser aprendidas a partir da pré-escola, visando o desen- volvimento de um novo perf il, que vai passo a passo evoluindo até alcançar condições ideais de atender as exigên- cias acadêmicas e, um dia, ser prof is- sionalmente competitivo. Capacidade de se adaptar a mu- danças, responder a desaf ios de modo organizado, coerente, ser capaz de trabalhar e resolver problemas junto a outras pessoas, demonstrar atitudes interpessoais de comunicação, lide- rança, domínio da tecnologia são im- prescindíveis para a vida social e para atender as demandas do mercado de trabalho do século XXI. No dia a dia é possível, por exem- plo, criar métodos e estratégias que objetivam desenvolver as chamadas habilidades interpessoais das crianças e jovens em idade escolar. Isso pode ser realizado mediante jogos e tarefas de grupo, onde é maior a valorização dos comportamentos que demons- trem capacidade de trocas de infor- mação ef icientes, empatia, atitudes de comando, controle da frustração, capacidade de suportar pressão, resi- liência e autonomia, entre outras. Segundo Eric Smith, pesquisador da Universidade de Stanford, o controle emocional gera atitudes mais adapta- TIVAS� EM� CASO� DE� MUDAN¥AS�� DESAlOS�� fracassos, estresse comuns na vida estu- dantil, e preparam para as vicissitudes DO�MUNDO�PROlSSIONAL�PRINCIPALMENTE�� Portanto, preparar as crianças e jo- VENS�PARA�ATENDER�A�ESSE�PERlL�DE�PRO- lSSIONAIS�QUE�A� SOCIEDADE�PRECISA�PARA� enfrentar as vicissitudes e os novos modelos do século XXI tornou-se um DESAlO�REALISTA�PARA�A�FAMÓLIA�E�A�ESCOLA�� E, evidentemente, bons professo- res que também tenham essa feição tornaram-se indispensáveis: antes de dominar o conteúdo ou ser um mes- tre na didática, o importante passou a ser sua habilidade interpessoal, ou seja, saber estabelecer um bom rela- cionamento com seus alunos, desen- volver empatia, criar o sentimento de pertencimento a um grupo. Isso tudo favorece as habilidades cognitivas e www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 21 Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É editora da revista Psicopedagogia da ABPp e autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br SH UT TE RS TO CK / A RQ UI VO P ES SO AL inf luencia de forma marcante no en- sino e na aprendizagem. Segundo revela uma importante pesquisa divulgada recentemente pelo Grupo Educacional Person (2015), re- alizada em 23 países, sobre as carac- terísticas mais valorizadas por alunos, pais, professores e responsáveis pelas políticas educacionais em cada nação, as coincidências foram muitas. Para os alunos brasileiros, a pa- ciência é a principal qualidade de um bom professor (13%) e saber se rela- cionar é o segundo quesito mais im- portante, seguido do prof issionalismo e habilidades didáticas. Inqueridos os familiares dos alu- nos, 14,2% indicaram o prof issionalis- mo, seguido do relacionamento e da paciência, como características-chave de um bom professor, o que não di- fere essencialmente do que pensam os próprios professores que agregam ainda a dedicação (9,8%). A pesquisa revelou que para os re- presentantes políticos se destaca outra ALÉM DO IMPRESCINDÍVEL RESPEITO AOS TALENTOS NATURAIS, APRENDER COMO SE APRENDE, PARA APRENDER SEMPRE, CONSTITUI UM PADRÃO DE REALIDADE DO QUAL NINGUÉM PODE SE FURTAR qualidade, mas em quarta posição, que está relacionada ao gerenciamento da sala de aula (8,4%), perdendo ape- nas para o relacionamento (12,2%), paciência (12,2%) e dedicação (10,7%). Tais habilidades fazem com que a criança, no encontro e vivência com seus pares, conheça seus próprios sentimentos, suas reações emocionais FRENTE�AO�COTIDIANO�E�SEUS�DESAlOS��SEU� MODO� DE� PENSAR� E� REmETIR� SOBRE� ISSO�� Portanto, oportunizar o desenvolvi- mento das habilidades socioemocio- nais dos professores é importante para melhorar a aprendizagem acadêmica e para ajudar a desenvolver as mesmas habilidades nas novas gerações. 22 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br sexualidade Por Giancarlo Spizzirri IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K E AR QU IV O PE SS OA L A SEXUALIDADE É MUITO MAIS QUE O ATO SEXUAL. MUITOS FATORES PODEM INFLUENCIAR NOSSO COMPORTAMENTO. FALAR SOBRE O ASSUNTO, MESMO ANTES DA PUBERDADE, É UMA TAREFA ÁRDUA DADA A DIVERSIDADE DAS CONDUTAS HUMANAS A FASE das descobertas de SI MESMO habitualmente descrito como início da vida sexual. Não é incomum nos per- guntarem com que idade começamos a vida sexual – entretanto a sexualida- de humana é muito mais do que o ato sexual em si. As primeiras práticas e atividades sexuais durante a adolescência in- f luenciam nossas emoções e, por con- seguinte, nossas relações. Com frequ- ência ouvimos relatos de pessoas que foram reprimidas durante a adolescên- cia, e de como essa repressão as in- f luenciou de forma negativa em com- portamentos futuros; por outro lado, também são frequentes os relatos de indivíduos que não receberam qual- quer orientação e/ou foram criados em ambientes considerados permis- sivos, que também sofrem durante a vida adulta em seus relacionamentos. Portanto, chegar em um denominador do que seja adequado ao pensarmos na educação durante, e até mesmo antes da puberdade,é uma tarefa árdua dada a diversidade das condutas humanas. Em relação às mudanças f ísicas que acompanham esse período, algu- mas considerações merecem desta- que. É na adolescência (para alguns em fases precoces, para outros em fases posteriores do desenvolvimento – durante esse período) que se obser- vam nas meninas o aparecimento do broto mamário e na sequência o de- senvolvimento das mamas, da pilosi- dade pubiana e axilar, da genitália e a primeira menstruação, que recebe o nome de menarca. Nos meninos ve- rif icam-se aumento dos testículos e posteriormente o surgimento dos pe- los pubianos, assim como o aumento do tamanho do pênis. Essas mudanças f ísicas são velozes, e muitas vezes po- dem gerar conf litos. De certa maneira é como se o psiquismo não acompa- nhasse a intensidade do aumento dos hormônios, responsáveis por essas al- terações. Com frequência o adolescen- te pode não reconhecer o seu próprio corpo, sentimentos de inconformidade são comuns, entre eles: sentir-se esqui- sito, atrapalhado, atribulado, ansioso, frustrado, uma vez que nem sempre a imagem corporal reproduzirá aquela que foi idealizada. Além desse corpo em mudança, que rapidamente vai perdendo as caracte- rísticas infantis, é nesse período que as sensações oriundas de por quem sen- timos atração sexual irão se tornando mais evidentes, e então mais dúvidas e A adolescência é uma fase do desenvolvimento, que geralmente ocorre dos 10 aos 19 anos de idade. Para a Organização Mundial da Saúde, a puberdade se distingue por mudan- ças envolvidas com particularidades f ísicas (por exemplo, pela inf luência dos hormônios no desenvolvimento das características sexuais secundá- rias), emocionais, relacionais, entre outras. Com a maturação das gônadas (ovários e testículos), a função repro- dutora passa a se constituir uma pos- sibilidade; além do mais, é nessa fase que as práticas sexuais ganham outra dimensão, e normalmente costumam ser mais empreendidas, como a mas- turbação, brincadeiras e jogos com a f inalidade de gratif icação sexual. En- tretanto, não podemos resumir esse período somente como sendo o qual novas práticas sexuais são exploradas; ele é também um momento importan- te de interação dos adolescentes com seus pares, família e sociedade. Segundo diversos estudos, é nesse período, geralmente após os 14 anos, que ocorrerá a primeira atividade se- xual com outra pessoa. Para muitos, esse momento constitui um marco, www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 23 NA ADOLESCÊNCIA, AS MUDANÇAS FÍSICAS SÃO VELOZES E PODEM GERAR CONFLITOS. É COMO SE O PSIQUISMO NÃO ACOMPANHASSE A INTENSIDADE DO AUMENTO DOS HORMÔNIOS, RESPONSÁVEIS POR ESSAS ALTERAÇÕES ABORDAGEM�OPORTUNA�E�ESPECÓlCA�SOBRE� o tema. Além do mais, determinadas práticas sexuais são encorajadas de- pendendo do sexo do nascimento. Para os garotos adolescentes, a masturbação parece ser mais aceita socialmente do que para as garotas. Ao pensarmos em desigualdades, esse fato pode consti- tuir um prejuízo para as adolescentes na exploração e melhor entendimento das reações do próprio corpo. Após a avalanche de hormônios que acarretam as mudanças f ísicas, um pouco mais adiante, as sensações e as emoções perceberão o impacto dessas alterações. Chega-se então na fase das grandes paixões, de sensa- ções como: o meu mundo acabou se meu amor não for correspondido; as- sim como das grandes causas, como: Giancarlo Spizzirri é psiquiatra doutorando pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP. receios podem acompanhar essa fase. Como é um período de novas desco- bertas, nem sempre as brincadeiras sexuais com pessoas do mesmo sexo IRÎO� REmETIR� EM� ORIENTA¥ÎO� SEXUAL� HO- mossexual na idade adulta. Aliás, os fatores que determinam a orientação sexual são complexos e merecem uma eu tenho razão, os outros é que não me compreendem, e assim por diante. Diante do exposto, o adolescente ain- da tem de lidar com questões cruciais que dizem respeito a sua integridade f ísica, como as doenças sexualmente transmissíveis, uso de bebidas alcoóli- cas, rivalidades entre grupos etc. Além do mais, se esses adolescentes não fo- ram bem instruídos sobre os métodos contraceptivos e preventivos, a possi- bilidade de uma gravidez indesejada e/ou doenças transmissíveis pelo con- tato sexual torna-se concreta. Portan- to, quanto mais os adolescentes forem aconselhados de maneira adequada, tanto mais serão capazes de tomar de- cisões apropriadas, que implicarão em mais satisfação em um período da vida do qual guardamos lembranças. 24 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br EQUÍVOCOS da profissão supervisão Por Ricardo Wainer A SUPERVISÃO E O PROCESSO DE AUTOCONHECIMENTO DO TERAPEUTA PERMITEM A PREVENÇÃO SIGNIFICATIVA DE ALGUMAS OCORRÊNCIAS QUE SURGEM DE SENSAÇÕES DESCONFORTÁVEIS COM O PACIENTE OU POR PENSAMENTOS DE INCOMPETÊNCIA COM O CASO O TERAPEUTA POSSUI A DESAFIADORA TAREFA DE AJUDAR O PACIENTE E PODE ENCONTRAR OBSTÁCULOS NO CAMINHO, COMO SEUS PRÓPRIOS ESQUEMAS MENTAIS DESADAPTATIVOS O segundo erro é a utilização pelo terapeuta de mecanismos de hipercom- pensação, de forma a evitar sentimentos desagradáveis vinculados a seus EIDs. Nesse tipo de ocorrência, o que se vê é o terapeuta agindo de um modo extremo, seja através de condutas agressivas (de ataque), de controle excessivo ou ainda se autoengrandecendo em relação ao paciente. Assim, um paciente narcisis- ta, que ativa o esquema de fracasso e/ ou de privação emocional do terapeuta, pode sofrer um “ataque” do terapeuta, por meio de depreciação ou mesmo de- monstrações de inveja. Evidentemente, esse tipo de situação usualmente tem o término da terapia como desfecho. Tem-se também uma falha de mesma natureza da anterior, mas com sentido oposto. A conduta do psicoterapeuta em se subjugar ao paciente através de con- dutas permissivas, como alongamento do tempo da sessão, permissividades em relação a faltas e/ou não cumprimento de combinações (horários, pagamentos, tarefas de casa etc.), indica que os EIDs do paciente ativaram EID de subjugação do terapeuta, que acaba por assumir esse papel passivo como uma forma primiti- va de obter afeto-consideração ou de não ser visto como defeituoso. A quarta situação a ser monitorada é a conduta de criticar o paciente. Talvez o mais iatrogênico de todos os quatro erros indicados, pois reapresenta ao pa- CIENTE�UMA�FORMA�DE�hmASHBACKv�DE�SEU� PASSADO�COM�lGURAS�DE�AUTORIDADE�DIS- funcionais e as quais ele, provavelmente, (EIDs)¹ e/ou da repetição de estilos dis- funcionais de enfrentamento (que his- toricamente serviram para aliviar situ- ações de abuso ou emoções negativas). O primeiro desses equívocos é o terapeuta se desconectar do paciente durante a sessão, entrando no modo de enfrentamento disfuncional chamado “protetor desligado”, segundo a terapia do esquema. É uma forma de resistên- cia automática e inconsciente (na maio- ria das vezes), em que o terapeuta pode INTERAGIR�E�INTERVIR�DE�MODO�SUPERlCIAL�� desconexo, racionalizando (dando “dis- cursos teóricos”) ou mesmo apresen- tando sentimentos de tédio, chateação E�DESCONFORTO��.ÎO�RARO��PODE�lCAR�COM� o pensamento em questões pessoais ou ainda falar sobre assuntos banais com o paciente (“conversa entre amigos”). A ocorrência desse tipo de erro indica, na maioria das vezes, que o paciente encontrava-se no mesmo modo “prote- tor desligado” e, ao invés de “trazê-lo de volta” para o setting terapêutico, o terapeuta é que vai para a “periferia” do foco da sessão.A complexidade e sutilezas do processo psicoterápico podem lCAR�OCULTAS�NUMA�ANÉLISE�SU- PERlCIAL� E� INGÐNUA�� %NTRETAN- to, olhando-se para além do aparente, desnuda-se uma rede intricada de rela- ções entre conhecimentos e experiên- cias emocionais de diversos momentos cronológicos do indivíduo, que culmi- nam na projeção das muitas facetas do self de cada ser humano. Para obter sucesso em sua empreita- da, o clínico necessita, para além de seus conhecimentos teóricos e técnicos, um saber sempre atualizado de seus esquemas mentais mais primitivos, bem como de seus modos de enfrentamento que são ativados quando suas necessidades emocionais não são satisfeitas (o que pode ocorrer a qualquer momento, inclusive na relação terapêutica). Dentre os erros mais freqüentes que se apresentam na prática psicoterápi- ca temos quatro deles que tipicamente aparecem como resultante da falta de consciência do terapeuta sobre seus pró- prios esquemas mentais desadaptativos www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 25 SH UT TE RS TO CK / AC ER VO P ES SO AL Ricardo Wainer é doutor em Psicologia, especialista em Terapia do Esquema, com treinamento avançado pelo New York Schema Institute, e supervisor credenciado pela International Society of Schema Therapy. Pesquisador em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental e em Ciências Cognitivas. Professor titular da Faculdade de Psicologia da PUC–RS. Diretor da Wainer Psicologia Cognitiva. TA�A� IDENTIlCAR�AS�PISTAS�E�SINAIS�DE�QUE� um EID determinado está ativado. Após isso, auxiliá-lo a conscientizar-se so- bre qual modo de enfrentamento adota quando tal EID está ativado. Pode usar o “protetor desligado” e se desconectar dos sentimentos negativos que a sessão está lhe ativando. Pode ainda hipercom- pensar ou subjugar-se. E, não menos da- noso, lidando com a situação através da crítica e punição. de alguns questionários e pela própria análise dos casos em que o terapeuta DEMONSTRA� MAIORES� DIlCULDADES�� ±S� vezes isso pode se dar por sensações desconfortáveis com o paciente ou por pensamentos de incompetência com o caso. Em outros, paradoxalmente, por um interesse muito aumentado pelo caso, com ações incomuns de afeto com o cliente. O supervisor deve levar o terapeu- as traz dentro de si como “vozes críti- cas”. A atitude de criticar pode assumir duas formas. Uma delas é a atitude de exigir mais e mais do paciente, sendo hi- perdemandante com o mesmo e fazendo com que este se sinta sempre em falta ou sendo punitivo com o paciente, através de ironias, xingamentos ou gritos. Ou- tra maneira desse modo crítico se mani- festar é pela livre permissão do terapeu- ta de falas e atitudes autodepreciativas do próprio paciente, do tipo, “não presto para nada”, “nada do que faço tem valor” ou outras ainda piores. A supervisão e o processo de auto- conhecimento do terapeuta permitem a PREVEN¥ÎO�SIGNIlCATIVA�DESSAS�OCORRÐN- cias. Obtém-se isso através, inicialmen- te, da detecção dos EIDs do terapeuta, o que pode ser obtido por meio do uso Referências ¹Young, J. E.; Klosko, J. S.; Weishaar, M. E. Terapia do Esquema: Guia de Técnicas Cognitivo- comportamentais Inovadoras, 2008. 26 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICOLOGIA JURÍDICA Questõe s éticas e técnicas do psicó logo A atua ção do profiss ional na Perícia Psicol ógica n o âmbito judicia l e esp ecialme nte nas Varas de Fam ília deve s er com preend ida por suas e specifi cidade s e se mostra muito diferen te das exigên cias na área c línica Por A ndreia Calça da www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 27 Andreia Calçada é psicóloga, psicoterapeuta, ludoterapeuta, pós-graduada pela UERJ em Psicopedagogia Clínica, especialista em Psicologia Clínica e Psicopedagogia, com especialização em Neuropsicologia pelo IPUB. Tem experiência em Equipe Psiquiátrica e Avaliação Psicológica e é pós-graduada e especializada em Psicologia Jurídica. Autora dos livros Falsas acusações de abuso sexual – o outro lado da história, Falsas acusações de abuso sexual e a implantação de falsas memórias, Perdas irreparáveis – alienação parental e falsas acusações de abuso sexual e é coautora do livro Guarda compartilhada – aspectos psicológicos e jurídicos. SH UT TE RS TO CK Éstá cada vez mais clara a necessida-de que os psicólogos e outros pro-fissionais têm de compreender a diferença existente entre a atuação profissional do psicólogo na área clínica e a atuação do psicólogo no meio jurídico, especialmente na perícia psicológica. A atuação do psicólogo tem sido cada vez mais solicitada no meio forense, principalmente no que tange à avaliação de crianças e adolescen- tes em litígios familiares e em Varas de Família. As perícias psicológicas podem ocorrer também em Varas Criminais e ligadas ao Trabalho, mas em sua maioria ocorrem nas vinculadas à Famí- lia. O momento atual pelo qual passam as famí- lias traz em seu bojo uma série de mudanças que a reboque geram conf litos. A família mudou. Do núcleo tradicional, pai, mãe e filho, temos hoje mães que são chefes de família, pais que cuidam de filhos, famílias homoafetivas e famílias for- madas por filhos de vários casamentos dos par- ceiros. Normal, portanto, que novas demandas surjam e que o Judiciário seja procurado para resolver os conf litos decorrentes. Processos de guarda, convivência, partilha de bens, entre ou- tros, nos quais, muitas vezes indevidamente, as crianças são envolvidas. Consequentemente, o psicólogo é solicitado para avaliações. Em função disso, o número de processos contra esse profissional nos CRPs e CFP aumentou muito nos últimos anos. Visando estabelecer diretrizes, o CRP elaborou um docu- mento denominado “Referências técnicas para a atuação do psicólogo em Varas de Família”, bem como a Resolução 8/2010, que regula a atuação dos psicólogos peritos e assistentes técnicos atu- antes no Judiciário. Além da Resolução 7/2003, que regulamenta o manual de documentos decor- rentes de avaliação psicológica (entre eles os lau- dos e pareceres). O objetivo foi a proteção de fa- mílias e profissionais, já que esses últimos, muitas vezes, se envolvem na seara do conflito, servindo como arma para os atores. É um lugar de difícil atuação, que demanda clareza por parte do psicó- logo sobre qual o seu lugar e a sua importância. A perícia psicológica em Varas de Família, segundo Silva (2015), “é uma avaliação/investiga- ção psicológica realizada por perito psicólogo, de- terminada pelo juiz, com o objetivo de verificar a relação entre pais e filhos (ou de quem está pedin- do a guarda), seus vínculos, os processos mentais e 28 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br PSICOLOGIA JURÍDICA �+��I�����G�� I����I�È�I�G����������Ô�� O Conselho Federal de Psicologia (CFP) fun- ciona como uma autarquia de direito públi- co, que tem a missão de orientar, fiscalizar e disciplinar a profissão de psicólogo, zelar pela observância dos princípios éticos, além de co- laborar para o desenvolvimento da Psicologia como ciência e profissão. Tem sede no Distrito Federal e sedes regionais (Conselhos Regionais – CRP) nas capitais de 17 estados brasileiros. tologia, utilização de testes e dinâmica familiar. A redação do laudo ou relató- rio pericial exige também formas espe- cíficas de escrita fundamentais para a exposição do que foi avaliado. O diagnóstico pericial tem quali- dade de conclusão científica e não per- manece, apenas, no conhecimento do psicólogo
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