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biologia molecular - 1 - Leishmanioses Revisão do Diagnóstico Laboratorial e Introdução da Reação em Cadeia da Polimerase 1. Introdução As Leishmanioses englobam um espectro de doenças parasitárias causadas por protozoários do gênero Leishmania que são endêmicos em 88 países da América, África, Europa e Ásia. São estimados 1,5 milhão de casos novos de Leishmaniose Cutânea e 500 mil casos novos de Leishmaniose Visceral a cada ano, com letalidade de 10,7% dos pacientes, apesar da existência de tratamento eficaz (1,2). São zoonoses que têm como vetor um mosquito do grupo dos flebótomos e seus reservatórios incluem roedores, cães, outros animais e seres humanos infectados. Os cães são os reservatórios mais importante em áreas urbanas (3). O quadro clínico nas infecções pelas diversas espécies de Leishmania é determinado pela patogenicidade do parasita e resposta imune celular do hospedeiro (vide quadro 1). Quadro 1 (3,4,5,6) Leishmaniose Visceral Complexo Donovani: L. chagasi*; L. donovani L. infantum; L. archibaldi Leishmaniose Tegumentar Americana L. amazonensis*; L. guyanensis* L. braziliensis*; L. panamensis L. peruviana; L. Lainsoni L. shawi; L. naiffi; L. mexicana L. venezuelensis; L. colombiensis Leishmaniose mucocutânea L. braziliensis* (*) Leishmanias prevalentes no Brasil. No Brasil, a Leishmaniose Visceral ou Calazar (LV) tem como principal agente a Leishmania chagasi. Apresenta período de incubação de 10 dias a 24 meses e produz um amplo espectro de síndromes clínicas, desde quadros assintomáticos até a forma clássica que é caracterizada pela tríade: febre, hepatoesplenomegalia e pancitopenia. A associação com infecção pelo HIV é descrita principalmente na Europa, podendo ocorrer recorrência da Leishmaniose anos após a cura em imunodeprimidos. A LV evolui para o óbito em 1 a 2 anos na ausência de tratamento (1,5). A Leishmaniose Tegumentar Americana (LT) apresenta período de incubação de duas semanas a dois anos após a picada do flebótomo infectado. Manifesta-se, inicialmente, como pápula que evolui para úlcera de bordas salientes, pouco exsudativa e com fundo granuloso e indolor. A forma cutânea difusa caracteriza-se por lesões nodulares em todo o corpo. As manifestações mucosas (LM) representam um fenômeno de hipersensibilidade com destruição do tecido cartilaginoso, das mucosas nasal e oral, sendo conhecida como Espúndia, Nariz de Tapir ou de Anta (4,6). biologia molecular - 2 - 2. Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial pode ser feito diretamente através do exame parasitológico direto, por meio de métodos imunológicos (reação intradérmica e sorologia) e, mais recentemente, através de métodos moleculares de amplificação do ácido nucléico (PCR). O diagnóstico laboratorial é de extrema importância por se tratar de doença potencialmente letal, cujo tratamento utiliza drogas (antimônio pentavalente e anfotericina) de elevada toxicidade e custos (1,3). Tradicionalmente, utiliza-se para o diagnóstico da LT a pesquisa direta do parasita nas lesões e o teste intradérmico (Reação de Montenegro). Na LV o diagnóstico laboratorial é baseado na sorologia (imunofluorescência ou ELISA) e na pesquisa direta do parasita na medula óssea. Entretanto, como revisaremos a seguir, nenhum destes métodos pode diagnosticar ou afastar de forma isolada a infecção em todos os pacientes. Neste cenário, a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) surge como uma grande ferramenta para o clínico no diagnóstico da LV e LT. 2.1. . Exame parasitológico Na LV, o exame direto é baseado na pesquisa da Leishmania em aspirado de medula óssea ou do baço. Apesar da maior sensibilidade da punção esplênica (95%), trata-se de um procedimento mais invasivo e que pode complicar com hemorragia. Dessa forma, a punção de medula óssea é mais utilizada, apresentando sensibilidade de 70%. Nas formas subclínicas a sensibilidade é menor que 10%. No sangue periférico, as formas amastigotas são visualizadas em apenas 30% dos pacientes com Calazar (1,2,5). Na LT, realiza-se o exame direto da biópsia ou do raspado de borda da úlcera. Todavia, a positividade é bastante variável. As formas amastigotas são mais abundantes nas formas iniciais da doença, tornando-se raras na lesões antigas (após um ano). Lesões muito contaminadas também contribuem para diminuição da sensibilidade do método. As úlceras causadas por L. brasiliensis têm poucos parasitas, ao contrário da L. amazonensis que causa parasitismo mais abundante. De um modo geral, a sensibilidade nas lesões de pele varia de 50% a 80%. Nas biópsias de mucosa, raramente se evidencia o parasita. Acrescenta-se que os parasitas desaparecem das lesões cutâneas logo após instituída a terapêutica antimoniacal (4,6). 2.2. Reação De Montenegro O teste de hipersensibilidade tardia à Leishmania (Reação de Montenegro) mostra uma separação das formas clínicas em dois pólos distintos, dependendo da resposta imunitária celular do paciente. No pólo negativo estão os pacientes com a forma anérgica da doença: Calazar e a Leishmaniose Cutânea Difusa. No outro pólo estão os pacientes que têm forte reação de Montenegro e apresentam úlceras cutâneas únicas ou manifestações mucosas. Desta forma, a Reação de Montenegro está indicada para o diagnóstico da LT, mas não para a LV (6,7,8,9). A leitura da reação é realizada 48 horas após a aplicação intradérmica da suspensão de formas promastigotas no antebraço. É considerada positiva a reação cuja enduração é maior ou igual a 5 mm (6,9). Em portadores de LT, a positividade da Reação de Montenegro varia de 85% a 97%. No entanto, nas infecções causadas pela L. amazonensis a sensibilidade é de apenas 51%. Na fase inicial da infecção (trinta primeiros dias), em imunodeprimidos e nos quadros disseminados a reação é mais comumente negativa. Em áreas endêmicas, mais de 25% das pessoas sadias podem ter reações positivas (6,9). biologia molecular - 3 - 2.3. Sorologia A sorologia (Imunofluorescência e ELISA) é extensamente utilizada no diagnóstico da LV, sendo mais comumente utilizados antígenos de Leishmania do Complexo Donovani (10). Na LT, a imunofluorescência é pouco sensível, sendo positiva naqueles pacientes com lesões extensas, múltiplas e nas mucosas (4,11,12). A sorologia, utilizando antígeno de Leishmania do Complexo Donovani, mostra sensibilidade de 80% a 98%, com especificidade de 91%. Em pacientes imunodeprimidos a sensibilidade é mais baixa (50%) (13,14). Em pacientes com LV é comum a ocorrência, na imunofluorescência, de títulos acima de 1:400, embora título maior ou igual a 1:40 seja considerado critério de diagnóstico laboratorial pela vigilância epidemiológica (3,4,15). Entretanto, em pacientes com títulos baixos (1:40) é importante afastar a possibilidade de falso-positivos por reações cruzadas que são descritas na Doença de Chagas, Tuberculose, Hanseníase, Histoplasmose, Paracoccidiodomicose, Esquistossomose, Toxoplasmose, Malária e presença de fator anti-nuclear (1,3,4,16). Na avaliação desses pacientes com títulos baixos, a repetição em nova amostra, após 2 a 4 semanas, é útil no esclarecimento diagnóstico. O teste de ELISA com antígenos purificados de Leishmania Complexo Donovani tem se mostrado bastante sensível na LV, com sensibilidade e especificidade comparáveis ou superiores à imunofluorescência (3,5,10,17,18). É importante lembrarmos que a sorologia pode permanecer positiva anos após o tratamento da LV. Assim, um teste positivo na ausência de quadro clínico não indica necessidade de tratamento (3,5). Queda nos títulos após o tratamento pode ser observada, não sendo, porém, critério de cura (19). 2.4. Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) Vários estudos têm demonstrado que a PCR é altamente específica e mais sensível doque os métodos microbiológicos clássicos utilizados para o diagnóstico da LV. A utilização da PCR permite a detecção do parasita com uso de sondas específicas de forma não invasiva, através da amplificação do cinetoplasto da Leishmania sp. e Leishmania donovani, podendo ser utilizado no diagnóstico da LV e LT. A PCR pode ser utilizada em qualquer amostra biológica incluindo pele, sangue, biópsia de linfonodo e medula óssea (5,6,20,21). O Instituto de Patologia Clínica Hermes Pardini dispõe além da pesquisa direta da leishmania e sorologia: Leishmania sp. e Leishmania Complexo donovani, PCR Amostra: 5-10 ml Sangue total (EDTA). Medula óssea (o que conseguir aspirar). Exsudato da borda da lesão (borda da lesão). Punção esplênica e hepática. Material de biópsia (borda de lesão, fígado, linfonodo, etc.) Obs.: parasitas são mais abundantes em lesões mais recentes. Condições de envio: Colher em tubo ou frasco estéreis. Lesão: não usar medicação tópica nas 48 h que antecedem o exame. Soro: congelado. Sangue: refrigerado. Exsudato: manter a lâmina à temperatura ambiente. Biópsia: solução fisiológica estéril, congelar imediatamente e enviar em gelo seco até 48 horas após coleta. biologia molecular - 4 - Método: São realizadas duas reações de amplificação. A primeira define a presença do DNA do cinetoplasto da Leishmania sp (qualquer espécie). A segunda é específica para o Complexo Donovani. Valor de Referência: Amostra negativa para Leishmania sp. Amostra negativa para Leishmania do Complexo Donovani Limitação: Reações falso-negativas podem ocorrer quando a quantidade de DNA está abaixo da sensibilidade de detecção do teste ou na presença de inibidores da PCR na amostra. 3. Referências 1. Pearson RD, Souza AQS, Jeronimo SMB. Leismania species: Visceral, Cutaneous and Mucosal Leishmaniasis. In: Mandell. Principles and Practice of Infectious Diseases. 5th. 2000: 2835-7. 2. Pearson RD, Queiroz Souza A. Leishmaniasis. Cecil Textbook of Medicine. 21 ed. 2000; 1959- 63. 3. Brasil. Fundação Nacional de Saúde. Leishmaniose visceral. Guia de Vigilância Epidemiológica. 2003; 527-39. 4. Brasil. Fundação Nacional de Saúde. Leishmaniose Tegumentar Americana. Guia de Vigilância Epidemiológica. 2003; 503-524. 5. Badaró R, Duarte MIS. Leishmaniose Visceral. In: Veronesi R, Focaccia R. Tratado de Infectologia. 2 ed. 2002; 1254-79. 6. Falqueto A, Sessa PA. Leishmaniose Tegumentar Americana. In: Veronesi R, Focaccia R. Tratado de Infectologia. 2 ed. 2002; 1241-53. 7. Sampaio RNRS, de Paula CDR. Leishmaniose tegumentar americana no Distrito Federal. Revista Sociedade Brasileira Medicina Tropical. 1999; 32: 523-28. 8. Loureiro CCP, Dadalti P, Gutierrez MCG, et al. Leihsmaniose: métodos diagnósticos. Folha méd. 1998; 117: 131-4 . 9. Amato Neto V, De Marchi CR, Guimarães MC, et al. Evaluation of the possible influence of Montenegro’s intradermal reaction on a serological assay for the diagnosis of American cutaneous leishmaniasis. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo. 1996; 51: 217-9. 10. Badaro R, Reed SG, Carvalho EM. Immunofluorescent antibody test in american visceral Leishmaniasis: sensitivity and specitifity of different morphological forms of two species. Am J Trop Med HYg. 1983; 32: 480-4. 11. Guimarães MCS, Celeste BJ, Franco EL. Diagnostic performance indices for immunofluorescent tests and enzyme immunoassays of leishmaniasis sera northern and north-eastern Brazil. 12. 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Leishmanioses Revisão do Diagnóstico Laboratorial e Introdução da Reação em Cadeia da Polimerase
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