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ENSINO, INTERDISCIPLINARIDADE E AVALIAÇÃO Marta Cattani Vargas¹ Os educadores precisam analisar o contexto educativo para a determinação de paradigmas que promovam o equilíbrio e as necessidades do mundo globalizado. Essa busca visa a contextualização onde Tal situação configure um contexto novo, não há como negar nem recusar. E que obviamente exige reequacionamentos por parte dos educadores, não está em questão. Mas o que cabe aqui é uma atenção cerrada a essa especificidade do momento histórico, não se deixando levar nem por uma atitude de mera anatematização moralizante ou saudosista, nem por um deslumbramento alienante. O que me parece exigido pelo momento é uma postura de análise detida e de vigilância crítica. (SEVERINO, 2007, p. 32) Preocupados com a necessidade de reflexão, com o desenvolvimento do pensamento crítico e com a construção de um conhecimento significativo e integrado dos discentes, deve-se atentar para a existência da superespecialização das áreas das ciências e a fragmentação dos diferentes saberes que dificulta o desafio na determinação de novos parâmetros. Morin (2005, p. 11) ressalta a importância, de um ensino educativo atual capaz de “transmitir não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa condição e nos ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre”. Buscando justificar a importância de um saber contextualizado observada a realidade dos alunos, recorremos ao autor que nos fala do saber disciplinado, ... é a visão de mundo fragmentada, é o esfarelamento da existência, é a perda da unidade universal. Surge, dessa forma, a ciência como tal, multiplicada em reinos. Surgem a filosofia, a arte e a religião. Cada qual seguindo o seu caminho, desencontradas, antagônicas muitas vezes, retalhando o mundo e a integridade humana... (FERREIRA, 2005, p.21) As instituições educacionais devem promover um ensino integrador onde cada docente domine sua área do conhecimento e socialize esse saber na prática coletiva, dialogando e contribuindo num planejamento interdisciplinar. De acordo com Japiassu (1976, p. 82), “o trabalho verdadeiramente interdisciplinar é muito árduo e sua realização extremamente difícil”, já que exige uma aproximação das diversas disciplinas e “uma tomada de consciência coletiva das questões em jogo” (JAPIASSU, 1976, p. 92). Na tentativa de conceituar interdisciplinaridade, recorremos a Fazenda (2005) que defende a necessidade duma atitude e de um pensar interdisciplinar por que, ¹ Professora de Física e de Metodologia Científica da Faculdade América do Sul, Novo Cabrais, Mestre em Educação em Ciências e em Matemática – PUC/RS. No projeto interdisciplinar não se ensina, nem se aprende: vive-se, exerce- se. A responsabilidade individual é a marca do projeto interdisciplinar, mas essa responsabilidade está imbuída do envolvimento – envolvimento esse que diz respeito ao projeto em si, às pessoas e às instituições a ele pertencentes (FAZENDA 2005, p. 17). Muitas são as dificuldades encontradas pelos professores que recorrem ao trabalho interdisciplinar, pois a adoção dessa prática exige mudança de postura. Dessa forma, “a orientação pelo enfoque interdisciplinar para orientar a prática pedagógica implica em romper hábitos e acomodações, implica em buscar algo novo e desconhecido” (LÜCK, 1995, p. 88). Alguns entraves precisam ser enfrentados para colocar em prática o trabalho interdisciplinar: a capacidade, segurança e domínio do educador que o propicia a interagir com os colegas e com outros saberes, na construção de uma competência do grupo e uma ação pessoal e individual que o leva da teoria à prática. Fazenda (2002, p. 16) afirma que “a pesquisa interdisciplinar parte do velho, analisando-o em todas as suas potencialidades. Negar o velho é uma atitude autoritária que impossibilita a execução de uma didática e de uma pesquisa interdisciplinar”. A prática interdisciplinar do saber é a face subjetiva da coletividade política dos sujeitos. Em todas as esferas de sua prática, os homens atuam como sujeitos coletivos. Por isso mesmo, o saber, como expressão da prática simbolizadora dos homens, só será autenticamente humano e autenticamente saber quando se der interdisciplinarmente (SEVERINO, 2007, p. 40). Ao promover a interação na busca de uma educação essencialmente transformadora e crítica, a interdisciplinaridade objetiva contextualizar o processo educativo por meio da mudança de práticas pedagógicas, integrando as diferentes áreas do conhecimento por meio da socialização dos saberes dos protagonistas que definem o currículo escolar visando a aprendizagem significativa dos discentes. Ressalta-se O conceito de interdisciplinaridade fica mais claro quando se considera o fato trivial de que todo conhecimento mantém um diálogo permanente com outros conhecimentos, que pode ser de questionamento, de confirmação, de complementação, de negação, de ampliação, de iluminação de aspectos não distinguidos (BRASIL, 2000, p.75). A importância da interdisciplinaridade na adoção de novas posturas, na produção do novo e no aproveitamento da realidade dos discentes, fica evidente quando Viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em vez, de acordo com o momento, tomar a própria prática de abertura ao outro como objeto de reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente. A razão ética da abertura, seu fundamento político, sua referência pedagógica; a boniteza que há nela como viabilidade ao diálogo (FREIRE, 1996, p.153). Diante da dificuldade de praticarmos a interdisciplinaridade na ação pedagógica de modo sistemático, recorremos ao que expõe Flickinger (2010, p.46), “o discurso sobre cooperação interdisciplinar às vezes assume o caráter de moda, cuja razão de ser nem sempre fica clara para os envolvidos”. Cabem ainda as palavras de Nadja Hermann ao prefaciar a obra de Dalbosco (2011, p.13), enfatizando a relevância “de uma educação que pense seus pressupostos para que a ação pedagógica se liberte de reducionismos que a entendam equivocadamente”. As possibilidades de acompanhar o andamento do processo educativo, para redirecionar as diretrizes, redefinir metas, atualizando o projeto de ensinagem é defendido por Paulo Freire: “Ao ser produzido, o conhecimento novo supera outro que antes foi novo e se fez velho e se dispõe a ser ultrapassado por outro amanhã” (FREIRE, 1996, p. 31). A disposição do educador em atuar na composição interdisciplinar requer coragem para abandonar a zona de conforto e acreditar no planejamento cooperativo, onde [...] o relacionamento entre as disciplinas parece-me marcado por uma estrutura que permite não apenas descobrir o entendimento específico de cada um quanto ao tema a ser tratado, mas também motivar a autorreflexão sobre os próprios olhares restritos que delimitam seu questionamento. (FLICKINGER, 2010). Segundo Sant’Anna (1995, p. 13), “[...] tanto educadores quanto educandos reconhecem o significado de valorar, os resultados ou suas expectativas, seja qual foi o aspecto de vida em que estejam envolvidos”. Uma avaliação só é produtivamente possível se realizada como um dos elementos de um processo de ensino e de aprendizagem que, estejam claramente definidos por um projeto pedagógico. Do mesmo modo, as alterações no processo de avaliação poderão conduzir a uma transformação de ensino (RABELO, 1998, p. 21). A relação entre avaliação e interdisciplinaridade é entendida como um processo contínuo, pois a avaliação da aprendizagem do aluno é preocupação constante dos estudiosos da avaliação; todavia, ainda é entendidacomo parte isolada do processo de aprendizagem. Professores e alunos sistematicamente questionam e são questionados sobre os instrumentos, parâmetros, necessidade e complexidade do processo avaliativo. Visando uma mudança de postura sobre nossa prática didático-pedagógica realizamos reflexão sobre essa prática com a intenção de que os alunos aprendam mais e melhor. Para atingir esse objetivo precisamos tratar a avaliação escolar para contemplar os sujeitos como construtores do conhecimento no processo de formação dos saberes. Uma das possibilidades de ressignificar a avaliação como forma de estimular a aprendizagem é segundo Ivani Fazenda, termos o olhar voltado para a subjetividade dos sujeitos, para a prática e experiência, para a necessidade do autoconhecimento, para o diálogo com o outro, para uma atitude interdisciplinar que alcance uma dimensão humana para o saber-ser. A abordagem de avaliação vinculada ao processo de aprendizagem, observado o projeto pedagógico e o contexto escolar relaciona o compromisso das pessoas envolvidas no processo diante da coerência da metodologia aplicada e a forma com que se avalia. É preciso sensibilidade, boa vontade, disponibilidade e formação adequada para poder entender o processo interdisciplinar, para desenvolver a criação e imaginação que possibilitem uma atitude interdisciplinar. A interdisciplinaridade necessita de comunicação, conhecimento, interação, diálogo e é um movimento que se aprende praticando, a partir da organização das disciplinas, num programa de reuniões de estudo que promove transformação e mudança do grupo social. Os princípios, que fundamentam a teoria interdisciplinar e da avaliação, são humildade, coerência, espera, respeito e desapego. Humildade para perceber o erro e sabedoria para trabalhar com esse erro; coerência entre aquilo que se ensina com o que e para que se avalia; espera, porque os resultados devem respeitar o ritmo dos alunos no processo; respeito às novas formas de conhecimento e às individualidades do aluno e desapego da forma tradicional de ensino e de avaliação. Para Fazenda (2003, p.38), a interdisciplinaridade se fundamenta pelo sentido de ser, de pertencer e de fazer. “A ação do educador será a de decifrar com o educando as coisas do mundo das quais ambos são participantes”. Reforça ainda que A interdisciplinaridade pressupõe basicamente uma intersubjetividade, não pretende a construção de uma superciência, mas uma mudança frente ao problema do conhecimento, uma substituição da concepção fragmentada para a unitária do ser humano (FAZENDA, 2002, p.40). A interdisciplinaridade nos possibilita diferentes olhares, um direcionado ao ser humano em contato com outro ser humano, quando nos falam da intersubjetividade, através da qual a parceria se efetiva e, o outro movimento foca o ser humano diante do conhecimento e dos saberes da humanidade, etapa marcada pela fragmentação desse conhecimento, do entendimento do ser humano e da vida. O processo avaliativo tem a função identificadora da realidade educacional enquanto o fazer interdisciplinar propicia um olhar pontual do cotidiano escolar, das possíveis parcerias entre docentes, alunos, entre a teoria e formas de conhecimento. Analisando essas possibilidades, enfatizamos que um olhar interdisciplinar é Um olhar de dentro para fora e de fora para dentro, para os lados, para os outros. Um olhar que desvenda os olhos e, vigilante, deseja mais do que lhe é dado ver. Um olhar que transcende as regras e as disciplinas, olhar que acredita que só existe o mundo da ordem para quem nunca se dispôs a olhar! Um olhar inflado de desejo de querer mais, de querer melhor, um olhar que recusa a cegueira da consciência (GAETA, 2002, p. 224). Um olhar que nos permite desvendar os caminhos do processo de avaliação do sistema de ensino, que transpõe regras, determinações e disciplinas segmentarizadas para buscar na parceria a possibilidade da construção de uma aprendizagem significativa. A Interdisciplinaridade considera que conceitos de uma disciplina podem produzir novas abordagens e visões sobre velhos problemas de outras disciplinas. Segundo Fazenda (2008), a interdisciplinaridade caracteriza-se por ser uma atitude de busca, de inclusão, de acordo e de sintonia diante do conhecimento. Logo, torna-se explícito a ocorrência de uma globalização do conhecimento, onde, há o fim dos limites entre as disciplinas. A interdisciplinaridade busca a (re)construção do conhecimento consolidado frente à situação do saber fragmentado. Essa busca é materializada na interação entre ensino e pesquisa e em práticas e reflexões como a integração de conteúdos. REFERÊNCIAS BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio: bases legais. Brasília: MEC, 2000. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2013. DALBOSCO, Cláudio Almir. Educação natural em Rousseau: das necessidades da criança e dos cuidados do adulto. São Paulo: Cortez, 2011. FAZENDA, Ivani Catarina. Arantes. Integração e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou ideologia. 5. ed. 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