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2 oficina Oficina Língua Portuguesa IV Autora Profª Daniela Vitor Ferreira 3 oficina LÍNGUA PORTUGUESA IV – Escrita de textos acadêmicos Sumário Aula 1 Academia e importância do texto acadêmico Aula 2 Aspectos formais de textos acadêmicos Aula 3 Leitura e desconstrução de um texto acadêmico Aula 4 Aspectos do conteúdo teórico do texto acadêmico Aula 5 Estratégias discursivas do texto acadêmico Aula 6 Procedimento textual introdutório Aula 7 Aspectos de organização discursiva 4 oficina Introdução Caro estudante, Seja bem-vindo! As três oficinas anteriores proporcionaram, respectivamente, a oportunidade de aprender a respeito de: revisão dos principais conteúdos de ortografia e gramática tratados no ensino médio; melhoria da competência de leitor de textos científicos e técnicos; elaboração de resumo e resenha. Esta oficina, a quarta, tem como objetivo o entendimento a respeito dos textos acadêmicos e sua elaboração. Atenção às dicas da teoria e execução desses textos, pois esse conhecimento pode significar seu diferencial no mercado de trabalho, que é extremamente competitivo. É importante ressaltar que, apesar da sequência sugerida, as oficinas são independentes e poderão ser cursadas segundo o seu interesse. Aproveite para aprender e aperfeiçoar seus conhecimentos, tanto de leitor quanto de futuro autor de textos acadêmicos. Bons estudos! Aula 1: Academia e importância dos textos acadêmicos O entendimento a respeito da origem da Academia é essencial para o estudo dos aspecos formais e elaboração dos textos acadêmicos, pois proporciona elementos relevantes a aprendizagem acerca da estrutura e organização desse tipo de produção. Origem da Academia Academus é um personagem da mitologia grega A academia cresceu. Temos agora universidades. 5 oficina Academia vem da palavra grega Academia, do grego antigo Ακαδήμεια. É o nome dado, no Ocidente, a várias instituições direcionadas para o ensino, para a promoção de atividades artísticas, literárias, científicas e físicas, sobretudo universitárias. A Academia original provém de uma escola fundada por Platão, filósofo grego, em 387 a.C. Essa escola ficava num jardim, próximo a Atenas, onde o filósofo ensinava de modo informal os jovens sobre filosofia, matemática, música, astronomia e legislação. A escola possuía uma biblioteca e uma residência. Esse jardim, onde Platão pretendeu reunir diversos campos do saber, teria pertencido a Academus – um herói ateniense da guerra de Troia (século XII a.C.) – e, por isso era chamado Academia. Essa escola pode ser entendida como a primeira Universidade. No Brasil, a universidade mais antiga é a Universidade de Manaus (Amazonas, 1909). Nas Academias, ou seja, nas Universidades, é sempre solicitada a escrita de textos acadêmicos. Desta forma, é imprescindível ter conhecimento a respeito de como um texto acadêmico deve ser estruturado, além de entender todos os componentes necessários para realizar esta atividade. Texto Acadêmico O texto acadêmico, normalmente utilizado nas universidades, caracteriza-se pelo objetivo de veicular o resultado de uma investigação científica, filosófica ou artística. Deve ser um texto crítico, suficientemente argumentado e preocupado com a clareza e a objetividade. 6 oficina O universitário, estudante do ensino superior, tem o dever social de compartilhar com as demais pessoas seus conhecimentos, não só os específicos, mas também os de cultura geral. Daí a grande necessidade de intensa leitura dos autores clássicos, da literatura, dos teóricos e de atualidades. Para isso, o estudante acadêmico deve opinar sobre temas de relevância social e argumentar solidamente sobre seu posicionamento crítico. É importante lembrar que talvez um de seus textos traga importantes e necessárias mudanças na área social ou ambiental, por isso precisa ser consistente. Para escrever um texto com qualidade é necessário ler muito, vários autores, inclusive com visões até antagônicas para que seu posicionamento e argumentos sejam sólidos. É necessário estabelecer um elo entre a academia e a sociedade. O texto acadêmico é escrito em linguagem formal, com conteúdo devidamente fundamentado para que seus interlocutores não tenham dúvidas ao lê-lo. Para tanto, a forma estética é tão importante quanto o conteúdo. Não há regras absolutamente rígidas para escrever um texto acadêmico, mas a tradição acadêmica acabou delimitando as formas típicas de expressar diversas modalidades de textos acadêmicos. O posicionamento crítico de um acadêmico, resultado de várias leituras e expresso numa pesquisa ou atividade acadêmica, pode ser veiculado de diferentes formas. Algumas delas são: 1. Livro: forma clássica de registro e divulgação da produção acadêmica. Contém capítulos, 7 oficina coletâneas, sínteses, enfim, uma apresentação sistemática do conhecimento de uma determinada área, num determinado momento. Existem, também, os livros denominados didáticos. São organizados de outra maneira, mas são igualmente utilizados em uma universidade, (chamados Livros-Textos). 2. Artigo: é uma forma mais ágil de comunicação para a ciência e suas pesquisas. São encontrados em periódicos e revistas especializadas. São textos menores com o objetivo de explorar pontos mais específicos de pesquisadores. 3. Outros: teses, dissertações, monografias, ensaios, relatórios de pesquisa, trabalhos de formação de cursos, que são textos mais específicos, com objetivos mais restritos que, não necessariamente, se destinam à publicação. Aula 2: Aspectos formais de textos acadêmicos Os textos acadêmicos são muito solicitados na graduação. Para que sejam textos bem escritos, é essencial que se entenda a respeito de sua estrutura e elaboração. O início do texto deve conter as seguintes informações de identificação: a) Título do trabalho, subtítulo (se necessário), nome completo do autor/ universitário e seu registro geral de matrícula, assim como semestre e ano do trabalho. b) Disciplina, nome do professor, série, curso, instituição. c) Local e data. Para outras informações visuais, acesse o link disponível em: http://www.google.com.br/search?q=pr%C3%A9-textuais%20e%20p%C3%B3s%20 textuais%20de%20TCC%20modelos%20imagens&ie=utf-8&oe=utf-8&aq=t&rls=org.mozilla:pt- BR:official&client=firefox-a&source=hp&channel=np Acesso em: 17 ago. 2012. 8 oficina A seleção de aspectos formais dependerá do tipo de texto solicitado. De forma geral, são considerados os seguintes aspectos formais: • Introdução: é apresentado o assunto. Informa-se o tema e a linha de pesquisa; anuncia-se a ideia básica e delimita-se o foco, ou seja, é contextualizada a problemática que envolve as questões do trabalho. Esta apresentação inicial deve ser realizada de forma clara, objetiva e rica em detalhes, contendo as razões de ordem teórica ou prática que justificam a realização da pesquisa. • Notas: utilizadas para comentários e referências. Podem ser acrescentadas no rodapé da página, se necessário. • Referências: lista das obras citadas, de acordo com as normas da ABNT. • Glossários: aparecem, principalmente, em livros didáticos e tem a função de auxiliar a compreensão dos termos técnicos utilizados no trabalho em questão. Para os artigos, especificamente, há outros aspectos formais relevantes: • Resumo: antecede o “corpo” do trabalho e é independente do artigo, ou seja, deve conter um conjunto de informações que permita, ao leitor, inteirar-se do artigo antes de lê-lo, inclusive para definir as opções de leitura. Tornou-se comum também aparecer em outras línguas, especialmente em inglês (abstract). • Palavras-chave: lista de mais ou menos seis palavras que são designadas para o leitor obter noções básicas a respeito do artigo. • Citações:em um texto acadêmico devem-se indicar claramente todas as citações feitas. Há dois casos a considerar: a) Se a citação for pequena (algumas palavras, ou frases curtas): é recomendável que seja feita no próprio parágrafo em que está sendo comentada, entre aspas (simples ou duplas). Exemplo: No seu livro Metafísica, Aristóteles afirmou que “todos os homens têm, por natureza, o desejo de conhecer”. b) Se a citação for extensa: deve-se colocá-la em parágrafo especial, sem aspas, porém identado, ou seja, deslocado para a direita. Costumeiramente, utiliza-se também um tipo menor que do restante do texto. Por exemplo, utiliza-se fonte tamanho 10, se o texto estiver 9 oficina com tamanho 12 e/ou um espaçamento mais apertado. Exemplo: Na seção IV, parte 1, de seu livro An Enquiry concerning Human Understanding, Hume compara a filosofia natural com a filosofia moral de forma eloquente: A mais perfeita filosofia da espécie natural apenas detém por algum tempo nossa ignorância, assim como a mais perfeita filosofia da espécie moral ou metafísica serve talvez apenas para revelar porções mais vastas dessa mesma ignorância. Assim, o resultado de toda filosofia é a constatação da cegueira e debilidade humanas, com a qual nos deparamos por toda parte apesar de nossos esforços para evitá-la ou dela nos esquivarmos. • Uso de aspas: as aspas podem ser simples (‘ ’), duplas (“ ”) ou francesas (« »). Em um texto acadêmico, as aspas podem realizar as seguintes funções: a) Marcar citações: se houver citação dentro de citação, devem-se usar aspas simples para a interna e duplas para a externa (ou vice-versa). b) Marcar sentidos não literais: como ironias, neologismos, ênfases, estrangeirismos. • Uso de itálicos e outros estilos: O itálico é utilizado, principalmente, para: • Ênfase Exemplo: A presença às aulas é fundamental para o bom acompanhamento do curso. A verdade das premissas não é condição necessária para a validade do argumento. • Menção: opcionalmente às aspas. • Palavras estrangeiras Exemplos: Copiar websites é comum. A decisão foi adiada sine dia. Oeufs tout court, disse o gourmet entendido do assunto. • Destaques: utilizado para destacar tópicos. • Negrito: em certos sistemas de referências, utiliza-se para marcar os volumes de periódicos. 10 oficina Exemplo: Philosophy of Science 44: 1-42, 1977. Além disso, é utilizado quase que exclusivamente para destaque. Seu uso no meio dos parágrafos, entretanto, é condenável por sobrecarregar a aparência do texto. ü Maiúsculas: são utilizadas para os sobrenomes dos autores, em alguns sistemas de referências. Em artigos e livros, podem ser utilizados para destacar o título e seções. Não devem ser empregadas para destacar palavras no meio dos parágrafos, assim como acontece para a utilização do negrito. Além disso, empregam-se letras maiúsculas no início de parágrafos para identificar siglas e nomes próprios. Demais explicações a respeito dos aspectos formais de textos acadêmicos, você pode encontrar em: CHIBENI, Silvio Seno. O Texto Acadêmico. Disponível em: <http://www.unicamp.br/~chibeni/ textosdidaticos/textoacademico.pdf>. Acesso em: 1 jul. 2012. Aula 3: Leitura e desconstrução de um texto acadêmico O artigo abaixo foi desconstruído para a percepção das estratégias discursivas e argumentativas empregadas pelo autor. Trata-se de um texto acadêmico, teórico, a respeito de um assunto que interessa a todos os seres humanos: a capacidade de comunicação e linguagem. Há um texto explicativo para cada parágrafo, com o intuito de facilitar essa percepção, que pode ser lido em paralelo ou após a leitura final do artigo. BENVENISTE, E. (1966) Problemas de linguística geral I. 4 ed. Capítulo 5, Comunicação animal e linguagem humana, pp. 60 a 67, Campinas, SP: Pontes, 1995. (1) Aplicada ao mundo animal, a noção de linguagem só tem crédito por um abuso de termos. Sabemos que foi impossível até aqui estabelecer que os animais disponham, mesmo sob uma forma rudimentar, de um modo de expressão que tenha os caracteres e as funções da linguagem humana. Falharam todas as observações sérias praticadas sobre as comunidades animais, todas as tentativas postas em prática mediante técnicas variadas para provocar ou controlar uma forma qualquer de linguagem que se assemelhasse a dos homens. Não parece que os animais que emitem gritos variados manifestem, no momento dessas emissões vocais, comportamentos dos quais possamos inferir que se transmitem mensagens “faladas”. As condições fundamentais de uma comunicação propriamente linguística parecem faltar no mundo dos animais, mesmo superiores. 11 oficina (2) A questão apresenta-se de forma diferente para as abelhas ou, pelo menos, devemos encarar o fato de que possa vir a apresentar-se. Tudo leva a crer – e o fato se observa há muito tempo – que as abelhas têm um modo de comunicar-se. A organização prodigiosa das suas colônias, as suas atividades diferenciadas e coordenadas, a sua capacidade de reagir coletivamente diante de situações imprevistas, fazem supor que têm aptidões para trocar verdadeiras mensagens. A atenção dos observadores dirigiu-se particularmente para a maneira pela qual as abelhas são avisadas quando uma dentre elas descobre uma fonte de alimento. Uma abelha operária colhedora, encontrando, por exemplo, durante o voo uma solução açucarada por meio da qual cai numa armadilha, imediatamente se alimenta. Enquanto se alimenta, o experimentador cuida em marcá-la. A abelha volta depois à sua colmeia. Alguns instantes mais tarde veem-se chegar ao mesmo lugar um grupo de abelhas entre as quais não se encontra a abelha marcada e que vem todas da mesma colmeia. Esta deve haver prevenido as companheiras. É realmente necessário que estas hajam sido informadas com precisão, pois chegam sem guia ao local, que se encontra, frequentemente, a grande distância da colmeia e sempre fora da sua vista. Não há erro nem hesitação na localização: se a primeira escolheu uma flor entre outras que poderiam igualmente atraí-la, as abelhas que vêm após a sua volta se atirarão a essa e abandonarão as outras. Aparentemente, a abelha exploradora indicou às companheiras o lugar de onde veio. Mas de que modo? (3) Esse problema fascinante desafiou por muito tempo os observadores. Deve-se a Karl von Frisch (professor de Zoologia na Universidade de Munique), pelas experiências que realiza há uns trinta anos, o haver estabelecido os princípios de uma solução. As suas pesquisas fizeram conhecer o processo da comunicação entre as abelhas. Observou, numa colmeia transparente, o comportamento da abelha que volta depois de uma descoberta de alimento. É imediatamente rodeada pelas companheiras no meio de grande efervescência, e essas estendem na sua direção as antenas para recolher o pólen de que vem carregada, ou absorvem o néctar que vomita. Depois, seguida das companheiras, executa danças. É este o momento essencial do processo e o próprio ato da comunicação. A abelha entrega-se, de acordo com o caso, a uma de suas danças diferentes. Uma consiste em traçar círculos horizontais da direita à esquerda, depois da esquerda à direita sucessivamente. A outra, acompanhada por uma vibração continua do abdômen (wagging-dance, “dança do ventre”), imita mais ou menos a figura de um 8: a abelha voa reto, depois descreve uma volta completa para a esquerda, novamente voa reto, recomeça uma volta completa para a direita, e assim por diante. Após as danças, uma ou mais abelhas deixam a colmeia e partem diretamente para a fonte que a primeira havia visitado, e depois de saciar-se, voltam à colmeia onde, por sua vez, se entregam às mesmas danças, o que provoca novas partidas, de modo que depois de algumas 12 oficina idas e vindas, centenas de abelhas já acorreram ao local onde a primeira descobriuo alimento. A dança em círculos e a dança em oito evidenciam-se, pois, como verdadeiras mensagens pelas quais a descoberta é assinalada à colmeia. Faltava encontrar a diferença entre as duas danças. K. von Frisch pensou que versasse sobre a natureza do alimento: a dança circular anunciaria o néctar, a dança em oito, o pólen. Esses dados, com a sua interpretação, apresentados em 1923, são hoje noções correntes e já vulgarizadas1. 1Compreende-se que hajam suscitado vivo interesse. Mesmo demonstradas, porém, não nos permitem falar de uma verdadeira linguagem. (4) Esses aspectos estão agora completamente renovados pelas experiências que Karl von Frisch realizou depois, ampliando e retificando as suas primeiras observações. Tornou-as conhecidas em 1948 em publicações técnicas e, resumidas muito claramente, em 1950, num pequeno volume que reproduz conferências feitas nos Estados Unidos2. Após milhares de experiências de uma paciência e de uma engenhosidade verdadeiramente admiráveis, conseguiu determinar a significação das danças. A novidade fundamental consiste em que se reportam não, como ele o havia inicialmente pensado, à natureza do achado, mas a distância que separa esse achado da colmeia. A dança em círculo anuncia que o local do alimento deve ser procurado a pequena distância, num raio de cem metros aproximadamente ao redor da colmeia. As abelhas saem então e se espalham ao redor da colmeia até que a tenham encontrado. A outra dança que a operária colhedora executa, vibrando e descrevendo oitos (wagging-dance), indica que o ponto está situado a uma distância superior, além de cem metros e até seis quilômetros. Essa mensagem comporta duas indicações distintas – uma sobre a distância, outra sobre a direção. A distância está implícita pelo número de figuras desenhadas num tempo determinado; varia sempre na razão inversa da sua frequência. Por exemplo, a abelha descreve nove a dez “oitos” completos em quinze segundos quando a distância é de cem metros, sete para duzentos metros, quatro e meio para um quilômetro, e dois somente para seis quilômetros. Quanto maior é a distância, mais lenta é a dança. Quanto à direção em que se deve procurar o achado, é o eixo do “oito” que assinala, em direção ao sol; segundo se incline para a direita ou para a esquerda, esse eixo indica o ângulo que o local da descoberta forma com o sol. As abelhas são capazes de orientar-se mesmo com o tempo encoberto, em virtude de uma sensibilidade particular à luz polarizada. Na prática, há ligeiras variações de uma abelha a outra ou de uma colmeia a outra, na avaliação da distância, mas não na escolha de uma ou de outra dança. Esses resultados são o produto de aproximadamente quatro mil experiências, que outros zoólogos, a princípio céticos, repetiram na Europa e nos Estados Unidos, e finalmente confirmaram3. Temos agora o meio de nos assegurarmos de que é mesmo a dança, nas suas duas modalidades, que serve às abelhas para informar às companheiras sobre os seus achados e guiá-las por meio de 1 Assim Maurice Mathis, Le peuple des abeilIes, p. 70: “O doutor K. von Frisch havia descoberto o comportamento da abelha fisgada à sua volta à colmeia. Segundo a natureza do achado a explorar, mel ou pólen, a abelha fisgada executará sobre os bolos de cera uma verdadeira dança de demonstração, girando em circulo para uma substância açucarada, descrevendo oitos para o pólen”. 2 Karl von Frisch, Bees, their vision, chemical senses and language, Ithaca, N.Y., Cornell University Press, 1950. 3 Ver a introdução de Donald R. Griflin ao livro de K. Von Frisch, p. VII. 13 oficina indicações sobre a direção e a distância. As abelhas, percebendo o odor da colhedora ou absorvendo o néctar que engoliu, descobrem além do mais a natureza do achado. Empreendem por sua vez o seu voo e atingem com certeza o local. O observador pode, a partir daí, segundo o tipo e o ritmo da dança, prever o comportamento da colmeia e verificar as indicações transmitidas. (5) A importância dessas descobertas para os estudos de psicologia animal não precisa ser sublinhada. Gostaríamos de insistir aqui sobre um aspecto menos visível do problema em que K. von Frisch, preocupado em descrever objetivamente as suas experiências, não tocou. Estamos, pela primeira vez, em situação de especificar com alguma precisão o modo de comunicação empregado numa colônia de insetos; e pela primeira vez podemos imaginar o funcionamento de uma “linguagem” animal. Pode ser útil assinalar de leve aquilo em que ela é ou não é uma linguagem, e o modo como essas observações sobre as abelhas ajudam a definir, por semelhança ou por contraste, a linguagem humana. (6) As abelhas mostram-se capazes de produzir e de compreender uma verdadeira mensagem, que encerra inúmeros dados. Podem, pois, registrar relações de posição e de distância; podem conservá-las na “memória”; podem comunicá-las, simbolizando-as por diversos comportamentos somáticos. O fato notável consiste, inicialmente, em que manifestam aptidão para simbolizar: há mesmo uma correspondência “convencional” entre seu comportamento e o dado que traduz. Essa correspondência é percebida pelas outras abelhas nos termos em que lhes é transmitida e se torna em motor de ação. Até aqui encontramos, nas abelhas, as próprias condições sem as quais nenhuma linguagem é possível a capacidade de formular e de interpretar um “signo” que remete a uma certa ‘“realidade”, a memória da experiência e a aptidão para decompô-la. (7) A mensagem transmitida contém três dados, os únicos identificáveis até aqui: a existência de uma fonte de alimento, a sua distância e a sua direção. Esses elementos poderiam ordenar-se de maneira um pouco diferente. A dança em círculo indica simplesmente a presença do achado, determinando que esteja a pequena distância. Funda-se sobre o princípio mecânico do “tudo ou nada”. A outra dança formula verdadeiramente uma comunicação; desta vez, é a existência do alimento que está implícita nos dois dados (distância, direção) expressamente enunciados. Veem- se aqui muitos pontos de semelhança com a linguagem humana. Esses processos põem em ação um simbolismo verdadeiro embora rudimentar, pelo qual dos objetivos são transpostos em gestos formalizados, que comportam elementos variáveis e de “significação” constante. Além disso, a situação e a função são as de uma linguagem, no sentido de que o sistema é válido no interior de uma comunidade determinada e de que cada membro dessa comunidade tem aptidões para empregá-lo ou compreendê-lo nos mesmos termos. (8) As diferenças são, porém, consideráveis e ajudam a tomar consciência do que caracteriza realmente a linguagem humana. A primeira, essencial, está em que a mensagem das abelhas 14 oficina consiste inteiramente na dança, sem intervenção de um aparelho “vocal”, enquanto não há linguagem sem voz. Daí surge outra diferença, que é de ordem física. A comunicação nas abelhas, não sendo vocal, mas gestual, efetua-se necessariamente em condições que permitem percepção visual, sob a luz do dia; não pode ocorrer na obscuridade. A linguagem humana não conhece essa limitação. (9) Uma diferença capital aparece também na situação em que se dá a comunicação. A mensagem das abelhas não provoca nenhuma resposta do ambiente, mas apenas uma certa conduta, que não é uma resposta. Isso significa que as abelhas não conhecem o diálogo, que é a condição da linguagem humana. Falamos com outros que falam, essa é a realidade humana. Isso revela um novo contraste. Porque não há diálogo para as abelhas, a comunicação se refere apenas a um certo dado objetivo. Não pode haver comunicação, se refere apenas a um certo dado objetivo. Não pode haver comunicação relativa a um dado “linguístico”; não só por não haver respostas, sendo a resposta uma reação linguística a outra manifestação linguística; mas também no sentido de quea mensagem de uma abelha não pode ser produzida por outra que não tenha visto ela mesma os fatos que a primeira anuncia. Não se comprovou que uma abelha vá, por exemplo, levar à outra colmeia a mensagem que recebeu na sua, o que seria uma forma de transmissão ou de retransmissão. Vê-se a diferença da linguagem humana em que, no diálogo, a referência á experiência objetiva e a reação à manifestação linguística se misturam livremente, ao infinito. A abelha não constrói uma mensagem a partir de outra mensagem. Cada uma das que, alertadas pela dança da primeira, saem e vão alimentar-se no ponto indicado, reproduz quando volta a mesma informação, não a partir da primeira mensagem, mas a partir da realidade que acaba de comprovar. Ora, o caráter da linguagem é o de propiciar um substituto da experiência que seja adequado para ser transmitido sem fim no tempo e no espaço, o que é o típico do nosso símbolo e o fundamento da tradição linguística. (10) Se considerarmos agora o conteúdo da mensagem, será fácil observarmos que se refere sempre e somente a um dado, o alimento, e que as únicas variantes que comporta são relativas a dados especiais. É evidente o contraste com o ilimitado dos conteúdos da linguagem humana. Além disso, a conduta que significa a mensagem das abelhas denota um simbolismo particular que consiste num decalque da situação objetiva, da única situação que possibilita uma mensagem, sem nenhuma variação ou transposição possível. Ora, na linguagem humana, o símbolo em geral não configura os dados das experiências, no sentido de que não há relação necessária entre a referência objetiva e a forma linguística. Haveria muitas distinções para fazer aqui sob o aspecto do simbolismo humano, cuja natureza e cujo funcionamento foram pouco estudados. A diferença, porém, subsiste. Um último caráter da comunicação das abelhas a opõe fortemente às línguas humanas. A mensagem das abelhas não se deixa analisar. Não podemos ver senão um conteúdo global, ligando-se a única diferença à posição espacial do objeto relatado. É impossível, porém, decompor esse conteúdo nos seus elementos formadores, nos seus “morfemas”, de maneira a 15 oficina fazer corresponder cada um desses morfemas a um elemento do enunciado. A linguagem humana caracteriza-se justamente aí. Cada enunciado se reduz a elementos que se deixam combinar livremente segundo regras definidas, de modo que um número bastante reduzido de morfemas permite um número considerável de combinações - de onde nasce a variedade da linguagem humana, que é a capacidade de dizer tudo. Uma análise mais aprofundada da linguagem mostra que esses morfemas, elementos de significação, se resolvem, por sua vez, em fonemas, elementos articulatórios destituídos de significação, ainda menos numerosos, cuja reunião seletiva e distintiva fornece as unidades significantes. Esses fonemas “vazios”, organizados em sistemas, formam a base de todas as línguas. Está claro que a linguagem das abelhas não permite isolar semelhantes constituintes; não se reduz a elementos identificáveis e distintivos. (11) O conjunto dessas observações faz surgir a diferença essencial entre os processos de comunicação descobertos entre as abelhas e a nossa linguagem. Essa diferença resume-se no termo que parece-nos o mais apropriado para definir o modo de comunicação empregado pelas abelhas; não é uma linguagem, é um código de sinais. Todos os caracteres resultam disso: a fixidez do conteúdo, a invariabilidade da mensagem, a referência a uma única situação, a natureza indecomponível do enunciado, a sua transmissão unilateral. É, no entanto, significativo o fato de que esse código, única forma de “linguagem” que se pôde até hoje descobrir entre os animais, seja próprio de insetos que vivem em sociedades. É também a sociedade que é a condição da linguagem. Esclarecer indiretamente as condições da linguagem humana e do simbolismo que supõe não é o menor interesse das descobertas de K. Von Frisch, além das revelações que nos trazem sobre o mundo dos insetos. É possível que o progresso das pesquisas nos faça penetrar mais fundo na compreensão dos impulsos e das modalidades desse tipo de comunicação, mas o haver estabelecido que ele exista, qual é e como funciona, já significa que veremos melhor onde começa a linguagem e como se delimita o homem4. Primeiro parágrafo: há a apresentação do posicionamento do produtor do texto, Emile Benveniste, que é a de a noção de linguagem não pode ser aplicada ao mundo animal. Este parágrafo traz implícito o fato de haver pessoas que já denominaram a comunicação animal como se fosse linguagem, posição com a qual o autor não concorda. Segundo parágrafo: o autor imagina que algum leitor possa pensar diferentemente dele (a linguagem se aplicaria ao reino animal não humano) e, por isso, já inicia neste parágrafo uma possível argumentação deste contra-argumento generalizado entre muitas pessoas de que os 4 [1965] Para uma visão de conjunto das pesquisas recentes sobre a comunicação animal e sobre a linguagem das abelhas em particular, ver um artigo de T. A. Sebeok, publicado em Science, 1965, p. 1006 ss. 16 oficina animais não racionais também teriam linguagem. A redação do texto deixa de ser linear. O produtor do texto, aos poucos, derruba possíveis argumentos contrários a seu posicionamento inicial e real, que é o seguinte: “Aplicada ao mundo animal, a noção de linguagem só tem crédito por um abuso de termos”. O autor faz isso referindo-se a uma experiência realizada com abelhas, na qual verificou- se comunicação de uma com outras a respeito das coordenadas do pólen. Terceiro parágrafo: como o produtor do texto referiu-se a uma experiência com abelhas, neste parágrafo, resgata a experiência científica seguida por Karl Von Frisch (professor de Zoologia da Universidade de Munique), descrevendo-a minuciosamente. Em todo artigo acadêmico, especialmente aqueles que serão expostos ao público, as comprovações científicas empregadas dão consistência à argumentação do produtor do texto. É importante observar que no último período, final do parágrafo, o autor emprega um elemento concessivo-opositivo (mesmo – porém), que lhe permite remontar a seu posicionamento inicial, ou seja, manter a coesão e a coerência. Veja: “Mesmo demonstradas, porém, não nos permitem falar de uma verdadeira linguagem”. O posicionamento inicial é de que o termo linguagem não pode ser aplicado aos animais não racionais. Quarto parágrafo: este é o maior parágrafo por ser aquele em que são detalhadas as experiências realizadas para demonstrar que os animais poderiam possuir linguagem. Muitas experiências demonstraram que “temos agora o meio de nos assegurarmos de que é mesmo a dança [...] que serve às abelhas para informar às companheiras [...] guiá-las [...] sobre a direção e a distância.” Note-se que, aparentemente, este parágrafo é um reforço da tese contrária (os animais têm linguagem) ao posicionamento do autor (a noção de linguagem não pode ser aplicada ao mundo animal). Quinto parágrafo: o produtor do texto evidencia o significado da experiência com as abelhas, isto é, o ser humano poderia especificar, com alguma precisão, o modo de comunicação empregado numa colônia de insetos. E, pela primeira vez, imaginar o funcionamento de uma “linguagem” animal. O termo “linguagem” continua a ser empregado entre aspas quando se refere a animais (reforço da tese/posicionamento inicial do autor). Indica para o próximo parágrafo a possibilidade de se referir a diferenças/semelhanças entre a linguagem humana e a “linguagem” dos animais. É importante notar que o autor do texto, aos poucos, disponibiliza “pistas” para que o leitor não se perca e o texto lido não seja uma obra impenetrável, hermética aos leitores. Sexto parágrafo: o autor expressa a capacidade da abelha de produzir e compreender mensagens, de registrar relaçõesde posição e de distância, de conservar registros de “memória”, de comunicar esses registros por meio de comportamentos somáticos. O autor entra no aspecto da simbolização: correspondência “convencional” entre o comportamento (no caso das abelhas, a dança) e o dado 17 oficina que a traduz (a posição e a distância). Observa-se novamente o uso de aspas nas palavras que contém a tese/posicionamento do autor. Sétimo parágrafo: resgata o processo de comunicação entre as abelhas e aponta os seguintes dados de semelhança com a linguagem humana: - Uso de um simbolismo verdadeiro, embora rudimentar. - Transmissão de dados objetivos em gestos formalizados, que comportam elementos variados de “significação” constante. - Validade do sistema no interior de uma dada comunidade. - Capacidade de cada membro da comunidade entender e empregar o sistema nos mesmos termos. Nesse momento do texto, o leitor poderia estar surpreso com a tese do autor, que é a de que não há linguagem além da humana. Isto porque até este parágrafo, o autor parece estar defendendo o posicionamento contrário ao seu. Oitavo parágrafo: o conectivo, porém, neste parágrafo, já é uma preparação para o leitor de que uma argumentação forte sobre o posicionamento/tese inicial (Aplicada ao mundo animal a noção de linguagem só tem crédito por um abuso de termos) virá, e realmente isso ocorre quando o autor apresenta as diferenças de ordem física entre os seres humanos e as abelhas das experiências. A mensagem das abelhas é uma dança sem a intervenção de um aparelho vocal e, além disso, é uma mensagem limitada à luz do dia, ou seja, é uma reação ao dado físico. A linguagem humana não conhece essa limitação. Nono parágrafo: neste parágrafo, o autor argumenta definitiva e inequivocamente sua tese/ posicionamento do primeiro parágrafo (Aplicada ao mundo animal a noção de linguagem só tem crédito por um abuso de termos) ao apontar as seguintes diferenças, sob o aspecto da comunicação, com relação a mensagem das abelhas: 1. Refere-se apenas a um dado objetivo; não pode ser reproduzida por outra abelha que não tenha visto ela mesma os fatos da experiência. A linguagem humana, ao contrário, reprocessa informações, não opera só a partir de relação direta com o dado objetivo da experiência. Em outras palavras, a linguagem humana tem capacidade de transmissão e de retransmissão. 2. Não conhece o diálogo, que é a condição fundamental da linguagem humana; o ser humano refere-se a signos; a referência à experiência objetiva e a reação à manifestação linguística se misturam livremente. 3. A abelha apresenta reação, que é uma conduta em referência a um dado objetivo. 18 oficina 4. O ser humano apresenta uma resposta linguística à outra manifestação linguística, portanto, simbólica. É a possibilidade de construção de mensagem a partir de outra mensagem. O autor apresenta as primeiras pistas para a conclusão do conceito de linguagem, o que significa uma retomada importantíssima para a defesa da tese/posicionamento inicial. O caráter da linguagem é o de propiciar um substituto da experiência que seja adequado para ser transmitido infinitamente no tempo e no espaço, o que é típico do nosso simbolismo e é o fundamento da tradição linguística. Décimo parágrafo: o autor continua a explanar diferenças entre a linguagem humana e a comunicação animal, sob a perspectiva de conteúdo das mensagens: • Abelhas: conteúdo restrito; há relação necessária entre a referência objetiva e a simbolização. • O simbolismo das abelhas é o decalque de uma situação objetiva, sem variação ou transposição possível, enquanto que o simbolismo dos humanos é ilimitado, não havendo relação necessária entre a referência objetiva e a forma linguística (símbolo). Décimo primeiro parágrafo: este parágrafo apresenta, como última distinção, porém não menos fundamental, que não existe possibilidade de análise das mensagens das abelhas. Isso porque as mensagens não são segmentáveis, não possuem possibilidades combinatórias, não se reduzem a elementos identificáveis e distintivos, ou seja, a mensagem das abelhas não permite variabilidade, só apresenta um conteúdo global. A linguagem humana, no entanto, apresenta grande variedade, redução a elementos identificáveis e distintivos, possibilidades combinatórias, enfim, capacidade de dizer tudo o que se quiser (transmissão e retransmissão ao infinito). A “linguagem” das abelhas é tão somente um sistema de sinais; somente os seres humanos possuem linguagem no sentido global. Fonte: http://www.sempre tops.com/estudo/funcoes-da-linguagem/ Acesso em: 17 ago. 2012. 19 oficina Exercícios de leitura e compreensão 1. Levando em consideração que o texto acadêmico veicula alguma investigação científica, é possível afirmar que: a) O texto “Comunicação animal e linguagem humana” não é acadêmico, por ser tendencioso e, continuamente, defender a tese, já ultrapassada, de que a linguagem é única e exclusivamente humana. b) Émile Benveniste, o produtor do texto, não recorreu a outros autores para corroborar seu posicionamento/tese. c) Para o produtor do texto, o que torna a linguagem exclusivamente humana é sua infinita capacidade de transmissão e retransmissão. d) A experiência citada de Karl Von Firsch não teve repercussão na época por não se tratar de uma experiência que tenha seguido os protocolos científicos necessários. e) Tanto a linguagem humana como a comunicação animal são dependentes do dado físico e da luz exterior. 2. Escreva dois argumentos, utilizados por Karl Firsch, a respeito de ações das abelhas que provam que podem se comunicar. 3. Escreva dois argumentos que justifiquem, para Émile Benveniste, a seguinte afirmação: “a noção de linguagem não pode ser aplicada ao mundo animal”. Aula 4: Aspectos do conteúdo teórico do texto acadêmico Neste módulo há a leitura e desvendamento de dois textos acadêmicos que enfocam o mesmo assunto: a vida. Além disso, há também o levantamento a respeito de aspectos de conteúdo teórico, convergente e/ou divergente; de estratégias discursivas empregadas pelos produtores para organização de seus respectivos textos. 20 oficina Texto 1 DAVIES,P. O quinto milagre: em busca da origem da vida. Capítulo 1. São Paulo: Companhia das Letras, 2001 (pp 34-40). O que é vida? – capítulo I do livro O quinto milagre O que é a vida? Antes de atacar o problema da sua origem, é importante ter uma ideia clara do que é vida. Há cinquenta anos, muitos cientistas estavam convencidos de que o mistério da vida estava prestes a ser resolvido. Os biólogos reconheciam que a chave estava entre os componentes moleculares dentro da célula. Àquela altura, os físicos tinham dado passos notáveis que elucidavam a estrutura da matéria no nível atômico, e parecia que logo esclareceriam igualmente o problema da vida. A agenda foi estabelecida pela publicação do livro de Erwin Schrödinger, What is life?, em 1944. Os organismos vivos, assim pareciam na época, acabariam se revelando nada mais que máquinas elaboradas com partes microscópicas que podiam ser estudadas usando as técnicas da física experimental. Uma investigação cuidadosa fundamentou essa visão. A célula viva está de fato apinhada de máquinas em miniatura. Tudo o que se fazia necessário era um manual de montagem e o problema estaria resolvido. Hoje em dia, entretanto, a imagem da célula como apenas um mecanismo muito complicado parece bastante ingênua. Sem dúvida, a biologia molecular obteve sucessos deslumbrantes, mas os cientistas ainda não sabem apontar exatamente o que separa um organismo vivo de outros tipos de objetos físicos. Tratar os organismos tem-se mostrado um método muito frutífero, sem dúvida alguma, mas é importante não ficar hipnotizado pelo seu charme simplista. A explicação mecanicista é umaparte importante da compreensão da vida, mas não é toda a história. Permita-me dar um exemplo surpreendente de onde reside o problema. Imagine jogar para o ar um pássaro morto e um pássaro vivo. O pássaro morto vai aterrissar com uma pancada surda, previsivelmente, a alguns metros de distância. O pássaro vivo pode acabar empoleirado, improvavelmente, numa antena de televisão no outro lado da cidade, ou no galho de uma árvore, em cima de um telhado, uma cerca viva ou um ninho. Seria difícil adivinhar de antemão o lugar exato. Como físico, estou acostumado a pensar a matéria como algo passivo, inerte e insensível como um torrão de terra, reagindo apenas quando pressionada por forças externas – como quando o pássaro morto cai ao chão sob a força da gravidade. Mas as criaturas vivas têm, literalmente, uma vida própria. É como se contivessem uma faísca interior que lhes dá autonomia para que possam 21 oficina (dentro de certos limites) fazer o que desejam. Até as bactérias fazem o que querem de forma restrita. Essa liberdade, essa espontaneidade, implica que a vida desafia as leis da física, ou os organismos vivos apenas aproveitam essas leis para seus próprios fins? E de onde vem esses “fins”, num mundo aparentemente governado por forças cegas e sem propósito? Essa propriedade da autonomia, ou autodeterminação, parece tocar o aspecto mais enigmático que distingue os seres vivos dos não vivos, mas é difícil saber qual é sua origem. Que propriedades físicas dos organismos vivos lhes conferem autonomia? Ninguém sabe. Autonomia é uma característica importante da vida. Mas há muitas outras, inclusive as seguintes: Reprodução, Metabolismo, Nutrição, Complexidade, Organização, Crescimento e Desenvolvimennto, Conteúdo de informação, Emanharamento hardware/ software, Permanência e mudança. (...) É óbvio que não há resposta para a pergunta de Schrödinger: o que é vida? Nenhuma qualidade definidora simples distingue o vivo do não vivo. É talvez bom que assim seja, porque a ciência apresenta o mundo natural como uma unidade. Qualquer coisa que introduz uma cunha entre os domínios do vivo e do não vivo corre o risco de nos predispor à crença de que a vida é mágica ou mística, em vez de algo inteiramente natural. É um erro procurar uma linha divisória nítida entre os sistemas vivo e não vivo. Não se pode eliminar os enfeites e identificar um núcleo irredutível da vida, como uma molécula particular. Não se pode dizer que existe molécula viva, apenas um sistema de processos moleculares que, tomados coletivamente, pode ser considerado vivo. Posso resumir essa lista de qualidades afirmando que, de um modo geral, a vida parece envolver dois fatores cruciais: o metabolismo e a reprodução. É o que podemos observar em nossas próprias vidas. Os atos mais básicos de todo ser humano são: respirar, comer, beber, excretar e fazer sexo. As primeiras quatro atividades são necessárias para o metabolismo, enquanto a última é necessária para a reprodução. É duvidoso se considerarmos viva, no pleno sentido do termo, uma população de entidades com metabolismo, mas sem reprodução; ou com reprodução, mas sem metabolismo. O autor desenvolve cada uma das caraterísticas que cita a respeito dos organismos vivos. Para saber mais, leia o capítulo 1 da obra citada. 22 oficina Texto 2 (EL-HANI, Charbel Nino; VIDEIRA Antonio Augusto Passos (org.). O que é vida? Para entender a biologia do século XXI. Capítulo 8 (PP.187-188) Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2000). Entropia e vida: a questão do tempo linear Henrique Lins de Barros A morte é destino de todos os seres vivos. A vida é, assim, um fenômeno efêmero e, além disso, aberto. Mesmo o mais solitário indivíduo de qualquer espécie está em permanente contato com sua vizinhança, recebendo informações e modificando o meio. A integração de um ser vivo com o meio é um processo dinâmico, no qual as mudanças produzidas pelo organismo alteram as propriedades físico-químicas do sistema. Dessa forma, as noções de interior e exterior de um ser vivo perdem parcialmente o sentido, pois um depende do outro, em um processo de interação no qual o exterior também possui uma história e uma evolução temporal. No entanto, as escalas mudam. Todas as espécies estão destinadas à extinção, assim como cada indivíduo está condenado a morrer. Nesse imbricado contexto, torna-se difícil construir fronteiras entre o que é um organismo e o que constitui o ambiente externo. O que permite à vida persistir são os mecanismos de seleção que fazem com que variantes novas possam aparecer. Campos externos, períodos de claro e escuro, variações periódicas de temperatura, marés e outros fatores físicos são elementos essenciais para a compreensão de como uma espécie particular adapta-se. O protagonista escondido dessa história é o tempo. O tempo linear que evolui e se propaga e que resiste a qualquer tentativa de conceitualização. Aqui chegamos a um dos pontos mais importantes do estudo da vida. Resume-se em uma pergunta que pode parecer ingênua, mas que esconde uma quantidade enorme de implicações. Ela é simplesmente: o que é a vida? Ou seja, por mais elaborada que seja a biologia e o estudo dos seres vivos, não sabemos definir um conjunto de propriedades que nos diga, a priori, se um determinado sistema é vivo ou não. Utilizaremos a proposta de John Maynard Smith (1986) que, como vários outros, está preocupado com as possibilidades de vida fora do ambiente terrestre que as viagens espaciais permitem imaginar. “Como vamos decidir se algo está vivo? ...Creio haver duas propriedades relevantes: 1- Ainda que a forma dos organismos vivos permaneça constante, os átomos ou moléculas que os constituem variam constantemente, ou seja, existe um metabolismo. 23 oficina 2- As diferentes partes dos organismos têm funções, quer dizer, as partes contribuem para a sobrevivência e reprodução do todo. As pernas são para caminhar, o coração é para bombear o sangue em todo o corpo, e as abecas cobertas de plumas do dente-de-leão ajudam a dispersão da semente.” Embora na formulação proposta por Smith possamos ficar pensando somente na vida dos animais ou vegetais (pois ele faz uso de órgãos como pernas, coração e plumas de uma flor), sua proposição é geral e aplica-se a todos os reinos, incluindo células procariotas. Assim, podemos perceber que um dos aspectos mais importantes de um ser vivo, essencial para a preservação da vida, é a troca de material em todos os níveis, mantendo, entretanto, as funções. Essa característica é rara em outros sistemas físicos e não devemos ignorá-la para que possamos tentar entender, com base na termodinâmica, os processos biológicos. Outro aspecto que deve ser logo enfatizado é o caráter orgânico que, como a palavra indica, está relacionado com a vida. Não existe vida de partes, embora possamos ter partes isoladas capazes de realizar processos bioquímicos comuns em sistemas vivos. Nossa imediata conclusão é a de que não devemos esperar resultados sempre positivos se dedicarmos nosso estudo a partes isoladas de sistemas vivos, pois a vida parece ser um imperativo do todo, que só pode ser compreendida nas suas relações com o meio extracelular. Retomando: Após as duas leituras, há alguns dados sobre a organização do texto acadêmico que podem ser levantados e discutidos. É preciso lembrar que um texto acadêmico, como o próprio nome diz, circula em academias/ universidades, lugares de produção e transmissão do conhecimento e não apenas da informação. O texto revela informações, mas essas informações precisam de reflexão para serem transformadas em conhecimento. É nesse sentido que os textos “O que é vida?“ e “Entropia e vida: a questão do tempo linear” serão aproximados. Modos de organização dos textos A questão da vida é o assunto abordado nos textos. Por esse motivo,é encontrada a seguinte questão: o que é vida? Esta é uma questão retórica, ou seja, uma questão que o próprio autor utiliza para enfatizar o que considera essencial em sua produção e que depois será respondida por ele. Uma questão retórica pode ajudar a escrever um texto acadêmico, mas não é obrigatória. O texto acadêmico admite o uso da primeira ou da terceira pessoa, desde que seja mantida a objetividade. O texto “O que é vida?“ é totalmente objetivo. O autor tece comentários a respeito do julgamento realizado pelos biólogos, há algum tempo, sobre o entendimento do significado da vida. Além disso, ressalta o fato de que este mistério permanece e não é redutível a uma explicação mecanicista. 24 oficina Para proporcionar ao leitor mais elementos que permitam o entendimento do texto, o autor ressalta que, para ele, a matéria é algo inerte. Além disso, exemplifica que, ao contrário da matéria, a vida não é inerte. A vida é um sistema dinâmico e, por isso, fora do alcance da compreensão da completude de sua natureza. Desta forma, o produtor do texto revela humildade científica, mesmo em sua posição de físico, quando busca compreender a função dos organismos vivos sob as leis da biologia. Em seguida, o autor retoma a questão da retórica. Este tipo de questão é essencial no desenvolvimento do fluxo do pensamento e, desta forma, na organização do texto. Exemplo: Que propriedades físicas dos organismos vivos lhes conferem autonomia? A resposta é surpreendente: Ninguém sabe. Há um momento no texto, em que o autor atribui um conjunto de características aos organismos vivos. A intenção é realizar uma organização, de certa forma didática, com separação, identificação e explicação a respeito das propriedades físicas dos organismos vivos. Trata-se de um recurso, dentro da organização do texto acadêmico, para facilitar a leitura e compreensão das ideias expostas pelo autor. Por este motivo, é fundamental reler tais informações que foram elaboradas para auxiliar o entendimento do assunto proposto. A conclusão apresentada no texto “O que é a vida?” refere-se a uma qualidade simples, que é a definição do que é vivo e não vivo. Embora o texto seja científico e acadêmico, o autor deixa clara sua visão, inclusive utilizando julgamento de valor: é talvez bom que assim seja. Mostrar a necessidade de questionamentos e continuidade de pesquisas é uma característica marcante nos textos científicos. No texto “Entropia e vida: a questão do tempo linear”, embora discuta também a respeito do que é vida, o produtor do texto assume uma perspectiva mais filosófica e familiar, comum ao pensamento de qualquer leitor. A morte, única certeza sobre o destino das pessoas, não é argumentável. Talvez o autor tenha iniciado dessa forma para poder contrapor o fato de que ninguém tem certeza diante do significado da vida. Além de tratar da morte, o autor acrescenta a ideia de que a vida é efêmera e aberta, ou seja, o contato entre os indivíduos e o meio em que vivem é inevitável. Desse modo, o produtor do texto cria um caminho textual para chegar à questão, também retórica: o que é vida? Para isso, recorre também a John Maynard Smith para discutir as propriedades dos seres vivos. Ao apresentar as dificuldades relacionadas à definição do significado da vida, o autor objetiva proporcionar elementos que auxiliem o leitor a refletir sobre o assunto de forma mais profunda. Desta forma, pode-se notar que o texto acadêmico deve ser organizado de acordo com o que se deseja proporcionar ao leitor. 25 oficina Aula 5: Estratégias discursivas do texto acadêmico Ao escrever um texto acadêmico, o “diálogo” entre autores é comum e praticamente obrigatório. As ideias do produtor do texto devem estar em consonância com os temas em circulação, com as propostas de outros teóricos. Por este motivo, é importante que se aprenda a elaborar resenhas acadêmicas – assunto tratado na Oficina de Língua Portuguesa III – que são extremamente úteis quando se organiza um trabalho acadêmico, pois permitem exatamente essa linguagem dialógica, mostrando que o produtor do texto não tirou suas ideias do nada, nem está trabalhando com opinião própria sem fundamentação teórica. No texto “Entropia e vida: a questão do tempo linear”, o autor discute a respeito do que é vivo ou não vivo, que é a proposta citada, e apresenta sua própria conclusão. Desta forma, pode-se dizer que o texto tem começo (a morte), desenvolvimento (o que é vida) e conclusão (... a vida parece ser um imperativo do todo...). É interessante observar que ideia de conclusão do autor utiliza como recurso o procedimento metodológico de analisar a vida como um todo orgânico e não como partes. Isso leva à conclusão de que realmente não há uma definição fechada sobre o que é vida. Escrever é um ato de responsabilidade. Quando expressa suas ideias no papel, o autor coloca no mundo algo novo, ou seja, contribui de algum modo para que haja os mais diversos tipos de transformações. O texto acadêmico é ainda mais responsável com relação ao impacto das transformações que pode proporcionar ao mundo. Como já mencionado, seu objeto é a divulgação de uma investigação científica, teórica ou de campo, mas sempre com a intenção de produzir e divulgar conhecimento. Por isso mesmo, deve ser resultado de pesquisa; escrito de forma ordenada, com preparação de um roteiro anterior; e apresentação de argumentos consistentes. Não se esperam respostas aos enigmas fornecidos pelos fenômenos do universo, mas sim a tentativa de equacioná- los e dar continuidade às pesquisas. Exercícios de leitura e compreensão 1. Nos textos “O que é vida? Para entender a biologia do século XXI” e “O quinto Milagre - Em busca da origem da vida” há uma discussão teórica sobre a definição da vida. Comparando os dois textos, assinale o que é correto deduzir da leitura. I. No texto “O que é vida? Para entender a biologia do século XXI”, escrito por um biólogo, além do enfoque científico, há uma preocupação social e até íntima com o assunto. No texto “O quinto Milagre – Em busca da origem da vida”, o autor, que é 26 oficina físico, posiciona-se de forma mais objetiva e menos filosófica. II. Os dois autores tratam a respeito do significado da vida, porém sob perspectivas diferentes: o que é vida social e o que é vida biológica. III. O dois autores corroboram suas respectivas posições, por meio de citações de autores e de suas obras. IV. Os dois autores utilizam exemplos para ilustrar seus posicionamentos. a) Só a I está correta. b) Todas estão corretas. c) Só a I, II e III estão corretas. d) Só a II, III e IV estão corretas. e) Só a I, III e IV estão corretas. 2. Assinale a alternativa correta: a) O autor do texto “O que é vida? Para entender a biologia do século XXI” utiliza a primeira pessoa do singular. b) O autor do texto “O quinto Milagre – Em busca da origem da vida” utiliza uma “conversa” com o leitor, que pode ser reconhecível em alguns tempos verbais. c) O autor do texto “O que é vida? Para entender a biologia do século XXI” chega a uma conclusão imediata. d) Ambos o autores consideram difícil, em seu campo, responder à pergunta proposta ”o que é vida?”, mas respondem. e) O autor do texto “O quinto Milagre – Em busca da origem da vida” utiliza a primeira pessoa do plural. 3. Nos textos “O que é vida? Para entender a biologia do século XXI” e “O quinto Milagre – Em busca da origem da vida”, os autores empregam estratégias bem nítidas de escrita de textos acadêmicos. Comparando os dois textos, assinale o que é correto deduzir da leitura. I. Os autores recorrem a outras obras para corroborarem seus posicionamentos; trabalham, portanto, com citações – elemento praticamente obrigatório em textos acadêmicos e científicos. II. Os textos teóricos estudados contêm argumentos sólidos, justificados27 oficina racionalmente por seus autores. III. Os textos lidos possuem uma introdução, apresentando um posicionamento, um desenvolvimento argumentado, explanando com consistência o posicionamento inicial e uma conclusão não necessariamente definitiva. IV. Ambos os textos possuem linguagem formal e os autores utilizam-se da norma culta para expressarem suas opiniões. a) Todas as alternativas estão corretas. b) Só a I e a II estão corretas. c) Só a II e III estão corretas. d) Só a III e IV estão corretas. e) Só a I e IV estão corretas. 4. Assinale a(s) alternativa(s) que contenha(m) texto(s) coerente(s) com a dificuldade em definir a respeito do mistério do significado da vida. Tome como base a leitura dos dois textos de estímulo e apoio. I. De acordo com os pesquisadores Henrique Lins de Barros e Paul Davies, respectivamente renomados biólogo e físico, a definição do fenômeno da vida permanece um mistério, pois organismos vivos são complexos e não podem ser reduzidos a uma explicação reducionista. II. O que é vida? Como defini-la? Como a vida se originou? Como ocorre a evolução? Existirá vida em outras regiões do universo? Será possível criar vida no computador? Muitos especialistas se reúnem para discutir esses fatos, mas até hoje as respostas não parecem ser tão fáceis de serem encontradas. III. Uma parte poderia ser considerada viva? A vida não pode ser considerada a não ser em seu todo, como fenômeno complexo, que só pode ser compreendida nas suas relações com o meio extracelular (BARROS, 2001, p. 188). IV. Os organismos vivos são complexos e tem, literalmente, uma vida própria, uma centelha que desafia as leis da física. Paul Davies, físico e escritor, não se detêm diante dos desafios dessa questão e em seu livro “O quinto milagre – Em busca da origem da vida”, onde questiona tais aspectos físicos e biológicos. V. O núcleo irredutível da vida, à semelhança do átomo, pode ser identificado pelos físicos desde que a física einsteiniana desvendou as possibilidades de fissão do átomo. É a vida, possivelmente, um conjunto imbricado de elétrons e nêutrons. a) Todas as alternativas estão corretas. 28 oficina b) Só a I e a II estão corretas. c) Só a II e III estão corretas. d) Só a I, III e IV estão corretas. e) Só a I e IV estão corretas. Aula 6: Procedimento textual introdutório Esta aula trata da análise do procedimento textual introdutório de um determinado assunto, por meio da introdução ao assunto “Direitos Humanos”. Há também a leitura e desconstrução de textos acadêmicos sobre os direitos humanos, conceitos, aplicação e desrespeitos com o objetivo de ampliar o repertório do leitor sobre tal conteúdo. Além disso, apresenta identificação de estratégias discursivas de organização de textos sobre o assunto, mesmo que sejam de diferentes gêneros, que circulam na academia/universidade. Por meio dessa análise, serão tratadas as melhores estratégias para produção de textos acadêmicos. Texto 1 O que são Direitos Humanos? Disponível em: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Direitos sexuais, direitos reprodutivos e métodos anticoncepcionais/ Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/ arquivos/pdf/cartilha_direitos_sexuais_2006.pdf. Acesso em: 24 ago. 2012. Os Direitos Humanos são direitos fundamentais da pessoa humana. Esses direitos são considerados fundamentais porque, sem eles, a pessoa não é capaz de se desenvolver e de participar plenamente da vida. O direito à vida, à alimentação, à saúde, à moradia, à educação, o direito ao afeto e à livre expressão da sexualidade estão entre os Direitos Humanos fundamentais. Não existe um direito mais importante que o outro. Para o pleno exercício da cidadania, é preciso a garantia do conjunto dos Direitos Humanos. Cada cidadão deve ter garantidos todos os Direitos Humanos, nenhum deve ser esquecido. Respeitar os Direitos Humanos é promover a vida em sociedade, sem discriminação de classe social, de cultura, de religião, de raça, de etnia, de orientação sexual. Para que exista a igualdade de direitos, é preciso respeito às diferenças. 29 oficina A igualdade racial entre homens e mulheres é fundamental para o desenvolvimento da humanidade e para tornar reais os Direitos Humanos. Saiba mais! Direitos Humanos A entrevista abaixo, com Vincent Défourny, representante da Unesco em nosso país, aborda as contradições da teoria e prática dos Direitos Humanos no Brasil. Vale lembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos comemora em 2008 o seu sexagésimo aniversário. Teoria e prática dos Direitos Humanos no Brasil Por Luis Pellegrini Entrevista disponível em: <http://www.terra.com.br/revistaplaneta/edicoes/427/ artigo77131-1.htm>. Acesso em: 14 set. 2012 Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Esses são apenas alguns excertos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948. O momento era propício para a promulgação de um documento do gênero. Na memória de todos ainda permanecia bem fresca a lembrança dos horrores cometidos durante a Segunda Guerra Mundial. Era preciso delinear balizas bem definidas a respeito dos direitos e deveres de todas as pessoas, indivíduos e sociedades, pais de família e detentores do poder. A Declaração Universal dos Direitos Humanos é, nesse sentido, a síntese do que de melhor foi elaborado pela consciência ética da humanidade até aquela data. O resumo de tudo que foi mastigado e digerido pelos filósofos e todos os demais gêneros de pensadores ao longo das eras. Seus termos aí estão, hoje, à disposição de todos os interessados. Basta procurá-los no site da ONU, em português: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-os-direitos-humanos/ Acesso em: 27 ago. 2012. 30 oficina Mais difícil é encontrar lugares onde esses direitos sejam devidamente respeitados. A cada instante, no Brasil e no mundo, alguém comete alguma infração contra os direitos humanos, alguém é vítima desses deslizes. A humanidade, como um todo, ainda está longe de possuir uma consciência clara o bastante desses direitos para respeitá-los e para fazer com que eles sejam respeitados. Aproveitando as comemorações dos 60 anos de promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, PLANETA foi procurar, em Brasília, o representante da Unesco no Brasil, Vincent Défourny. Apaixonado pelo tema – que é uma das principais bandeiras de atuação da Unesco no Brasil e no mundo –, Défourny disseca, nesta entrevista, a questão dos direitos humanos na atualidade brasileira. Para ele, existe uma séria defasagem entre os ideais apresentados na declaração e a realidade social do País. PLANETA – Há 60 anos, as Nações Unidas proclamaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A Unesco, desde o primeiro momento, se engajou na sua defesa e se transformou quase num braço da ONU para a questão dos direitos humanos. Vincent Defourny – A Declaração Universal dos Direitos Humanos é, sem dúvida, uma das matrizes do trabalho das Nações Unidas e da Unesco. É muito interessante lembrar o contexto em que ela foi elaborada, há 60 anos, logo após os horrores que caracterizaram a Segunda Guerra Mundial. O mundo vivia um momento difícil, no qual se buscava uma redefinição dos eixos e das bases éticas que deviam ser declaradas invioláveis. Era necessário recriar uma noção dos direitos fundamentais de todos os seres humanos,baseados nos conceitos gerais da igualdade. Mas, 60 anos depois de proclamada, a declaração ainda precisa ser trabalhada e implementada. Ela implica um plano de trabalho e uma agenda para todos aqueles que se preocupam com uma justiça social maior e com a igualdade entre as diferentes pessoas. No caso do Brasil, a declaração adquire uma relevância muito grande porque muitos dos seus artigos não têm sido aplicados a Vincent Défourny, representante da Unesco no Brasil. 31 oficina todos os brasileiros. O que podemos verificar aqui é uma defasagem entre os ideais apresentados na declaração e a realidade social do país. De um lado, temos no Brasil um país que assinou a declaração e que, teoricamente, a assume, mas que, de outro lado, ainda carece da sua real implementação. Um sociólogo à frente da Unesco no Brasil Vincent Défourny nasceu na Bélgica, em 1959. É doutor em comunicação pela Universidade Católica de Louvain; tem licenciatura em comunicação social pela mesma universidade; possui diploma para o ensino de ciências sociais e formação universitária de base em ciências econômicas, políticas e sociais. De 2002 até abril de 2006, foi redator-chefe da Unesco para web, sendo responsável pela reformulação e unificação da linguagem do site (em processo) da Unesco. Nesse período foi redator-chefe da revista Correio da Unesco. Assumiu a direção interina do escritório da organização no Brasil em maio de 2006, sendo confirmado no posto pelo diretor-geral, em 22 de agosto de 2007. P – O que a Unesco tem feito concretamente para eliminar ou pelo menos reduzir essa dicotomia entre a teoria e a prática dos direitos humanos no Brasil? R – Estamos desenvolvendo vários projetos e ações nesse sentido, muitos dos quais embutidos no âmbito de ações internacionais similares da Unesco. Alguns desses projetos começarão neste ano e terão continuidade no futuro. Eles culminarão ao redor de 10 de dezembro, data oficial do aniversário da declaração. O Dia Mundial da Filosofia, 10 de novembro, também dará particular relevância à filosofia sobre os direitos humanos. Desde agora, já estamos trabalhando com parceiros, entre eles as redes das faculdades brasileiras de filosofia e as escolas que se preocupam em promover seminários, conferências e outras atividades. Um bom jeito de celebrar a filosofia é convidar as pessoas a pensar na lógica da filosofia. Isso não está reservado só aos que se graduaram nessa disciplina, mas sim a todos os que se interessam pela arte do pensamento e da reflexão, inclusive as crianças. Publicaremos uma tradução para o português de um excelente estudo comparativo sobre as diferentes formas de se ensinar filosofia, desde a escola maternal até a universidade. E, é claro, vamos inserir nesse documento algo sobre o ensino dos direitos humanos. 32 oficina Também estamos negociando com a Imprensa Oficial de São Paulo a impressão de cartazes, que serão colocados em todas as salas das mais de seis mil escolas de São Paulo sobre o tema da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O objetivo é deixar nas paredes das escolas as ideias da declaração. P – Ou seja, plantar na mente das crianças o germe da ideia de direitos humanos, e deixar que essa semente germine com o tempo. R – Exato. Com a vantagem de que é relativamente barato confeccionar esses cartazes. Eles permanecerão meses e meses nas paredes das escolas. As crianças poderão lê-los a toda hora, e inclusive aprender a refletir sobre seus direitos no dia a dia da escola. No Brasil, existe uma defasagem entre os ideais apresentados na declaração e a realidade social do país P – Na sociedade brasileira ainda é muito pequena a consciência dos direitos e dos deveres. A grande massa da nossa população nem sequer sabe que existe uma Carta Universal dos Direitos Humanos, nem que existe no país uma Constituição Nacional que estipula com clareza os direitos e os deveres do cidadão. É muito importante, portanto, esse trabalho de formiga, como o que você acaba de descrever, no qual se planta desde cedo uma semente na cabeça da criança para que ela a desenvolva ao longo do tempo e, um dia, produza frutos. R – O Brasil é um Estado de Direito. O que falta em grande medida é a real implementação dos direitos, e essa tarefa não deve ser deixada apenas para os políticos de Brasília. É responsabilidade 33 oficina de todos nós. É preciso desenvolver a consciência de que, se meu comportamento no cotidiano for justo e correto, já estou colaborando para que os direitos humanos sejam realmente implantados. É preciso que em todos os momentos de nossas vidas, nas salas de aula, nos locais de trabalho e em casa, esses direitos se tornem realidade prática. Sabemos que a violência e a violação dos direitos humanos começam em casa, entre os jovens, os adultos, dentro da escola, no trabalho. P – Muitos estrangeiros, que moram ou visitam o Brasil, se espantam “porque o brasileiro não reclama”. É espoliado pelos impostos, achacado pelos juros, roubado na fila do supermercado, nos ônibus e metrôs. No entanto, todos ficam quietos, passivos. É como se nós, brasileiros, não tivéssemos consciência de que temos direitos e que um deles é o de reclamar e cobrar quando somos vítimas de uma injustiça. R – É verdade. Dizem que existe no Brasil uma cultura da não reclamação. Mas temos de ir com muito cuidado. Acho importante que as pessoas cobrem os seus direitos, que lutem para que eles sejam reconhecidos. Mas, em países que possuem uma noção muito desenvolvida de direito, – os Estados Unidos, por exemplo – essa lógica, se levada ao extremo, termina criando uma grande quantidade de problemas que conduzem à jurisdição da vida cotidiana. Você não pode tocar ou fazer um carinho numa criança sem correr o risco de ser acusado de abuso sexual. E tudo se resolve com advogados e em tribunais. É muito importante tentar equilibrar esse discurso. Posso e devo lutar pelos meus direitos, mas é meu dever me responsabilizar pela implementação desses direitos. No que diz respeito ao Brasil, concordo que para a maioria dos cidadãos a consciência dos direitos é muito fraca e tem de ser desenvolvida. Mas há sinais animadores, como a implementação da Lei Maria da Penha, sobre os direitos das mulheres, por exemplo. Essa lei assinala uma mudança interessante, pois o poder constituído diz às mulheres: “Vocês têm direitos.” P – Outro sinal animador é a promulgação de leis relacionadas à igualdade racial no Brasil. Uma terra arrasada. Que futuro estamos preparando para nossas crianças? Elas têm direito a herdar um planeta habitável. 34 oficina R – Sem dúvida, mas, por enquanto, são leis muito pouco implementadas. Existe por exemplo a Lei nº 10.639, de 2003, que obriga o ensino da cultura e da história africanas nas escolas, mas temos uma extrema escassez de material didático específico. Onde estão os livros e o material didático sobre história e cultura da África? Onde estão os professores realmente preparados para tratar do tema? Exercício de leitura e compreensão 1. Responda as questões abaixo, após leitura do texto: BANCO MUNDIAL. Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial de 2011. Disponível em: <http:// www.teleios.com.br/wp-content/uploads/2011/04/Relatorio-Desenvolvimento-Mundial-2011_ Resumo.pdf>. Acesso em: 14 set. 2012. Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial de 2011 Visão geral - Abril de 2011 BANCO MUNDIAL O Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 2011 examina disciplinas e experiências extraídas de todo o mundo para oferecer algumas ideias e recomendações práticas sobre como transpor os conflitos e a fragilidade e assegurar o desenvolvimento. As principais mensagens são importantes para todos os países — de renda baixa, média e alta — bem como para as instituições regionais e globais. Em primeiro lugar,a legitimidade das instituições é a chave para a estabilidade. Quando as instituições do Estado não protegem adequadamente os cidadãos, elas não evitam a corrupção nem fornecem acesso à justiça; quando os mercados não oferecem oportunidades de trabalho; ou quando as comunidades já não têm coesão social — a probabilidade de conflitos violentos aumenta. Nos estágios iniciais, os países muitas vezes precisam recuperar a confiança da população na ação coletiva básica antes mesmo que se possa transformar as instituições. As vitórias preliminares — ações capazes de gerar resultados rápidos e tangíveis — são fundamentais. Segundo, é essencial investir em segurança cidadã e empregos para reduzir a violência. Mas existem grandes lacunas estruturais na nossa capacidade coletiva para apoiar essas áreas. Há lugares onde os Estados frágeis podem buscar ajuda para construir um exército, mas ainda não dispomos de recursos semelhantes para criar forças policiais ou sistemas de correção. Precisamos dar mais ênfase aos projetos preliminares de criação de empregos, especialmente por intermédio do setor privado. 35 oficina O Relatório apresenta percepções sobre a importância da participação das mulheres nas coalizões políticas, reforma da segurança e da justiça e empoderamento econômico. Terceiro, o confronto efetivo desses desafios significa que as instituições precisam mudar. Os órgãos internacionais e parceiros de outros países devem adaptar seus procedimentos para poderem responder com agilidade e rapidez, a uma perspectiva de longo prazo e maior poder de permanência. A assistência precisa ser integrada e coordenada; os fundos fiduciários de múltiplos doadores demonstraram ser úteis no alcance desses objetivos ao mesmo tempo em que diminuem o ônus dos novos governos com pouca capacidade. Precisamos de uma melhor conexão entre os órgãos humanitários e os órgãos de desenvolvimento. E precisamos aceitar um nível maior de risco: se as legislaturas e os inspetores esperarem somente os bons momentos e se limitarem a punir os fracassos, as instituições se afastarão dos problemas mais difíceis e se sufocarão em procedimentos e comitês para evitar a responsabilidade. Este Relatório sugere algumas ações específicas e maneiras de medir os resultados. Quarto, precisamos adotar uma abordagem em camadas. Alguns problemas podem ser tratados no nível nacional, mas outros precisam ser abordados no âmbito regional, tais como os mercados em desenvolvimento que integram áreas de insegurança e o compartilhamento de recursos para formular a capacidade. São necessárias algumas ações de âmbito global, tais como a geração de novas capacidades para apoiar a reforma da justiça e a geração de empregos; a criação de parcerias entre os países produtores e países consumidores para conter o tráfico ilegal de drogas; e a ação para reduzir as tensões causadas pela volatilidade dos preços dos alimentos. Quinto, ao adotar essas abordagens, precisamos ter consciência de que o panorama global está mudando. As instituições regionais e os países de renda média estão desempenhando um papel maior. Isso significa que devemos prestar mais atenção às trocas sul-sul e sul-norte e às recentes experiências de transição dos países de renda média. Os riscos são elevados. Um conflito civil custa a um país em desenvolvimento típico cerca de 30 anos de crescimento do PIB e os países que enfrentam crises prolongadas podem perder mais de 20 pontos percentuais no combate à pobreza. É fundamental para a segurança e o desenvolvimento globais que encontremos maneiras eficazes de ajudar as sociedades a escaparem de novos ataques ou de ciclos repetidos de violência — mas, para tanto, é preciso reformular o pensamento inclusive sobre como avaliamos e administramos o risco. Qualquer uma dessas mudanças deve estar fundamentada num roteiro claro e iniciativas 36 oficina fortes. Espero que este Relatório ajude outras pessoas e nós mesmos a desenhar esse roteiro. Robert B. Zoellick Presidente Grupo Banco Mundial Assinale (V) para as afirmações verdadeiras e (F) para as afirmações falsas sobre a organização geral do texto. a) ( ) Pode-se afirmar que a introdução deste texto inicia-se em “O Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 2011 examina disciplinas... “e termina em “...para as instituições regionais e globais”. b) ( ) O autor não optou por organizar seus argumentos em forma de enumeração, o que facilitaria a leitura. c) ( ) A disposição dos argumentos parte de ações concretas – segurança, trabalho, justiça, emprego, parceria entre os países, observância dos níveis de regionalização, nacionalização e internacionalização - para a noção abstrata de consciência da mudança de valoração das relações entre os países. d) ( ) Pode-se afirmar que o desenvolvimento/argumentação deste texto se inicia em “Em primeiro lugar, a legitimidade das instituições é a chave para a estabilidade...” e termina em “...Isso significa que devemos prestar mais atenção às trocas sul-sul e sul-norte e às recentes experiências de transição dos países de renda média”. e) ( ) Um dos argumentos, utilizados pelo autor, diz respeito à melhoria das relações de parcerias e países produtores e países consumidores. No caso das drogas, por exemplo, esta atitude mitigaria a violência. f) ( ) Na introdução, o autor apresenta o assunto sobre o qual tem algum posicionamento; no desenvolvimento, o autor utiliza argumentos que substanciem este posicionamento; na conclusão, o autor propõe alternativas para que se tentem soluções para o problema discutido no texto. Aula 7: Aspectos de organização discursiva Nesta aula serão explicados os mecanismos enunciativos, ou seja, estratégias que o autor utiliza para organizar o texto e provocar determinados efeitos de sentido. São eles: modalização e intertextualidade; metacomentário; utilização de pronomes e de sua relação com a esfera de locução do produtor do texto; leitura e compreensão de texto. 37 oficina Modalização: quando um autor escreve um texto e argumenta sobre um posicionamento em relação a um determinado assunto, pode organizar seu texto de modo mais ou menos assertivo, ou seja, mostrar o grau de certeza que quer ou não expressar (efeito de sentido), com palavras mais ou menos taxativas. Dessa forma, pode-se dizer que: a) Palavras/texto mais assertivo: é sustentável e está fadado ao sucesso. b) Palavras/texto menos assertivo: verbo poder ao invés de dever, verbo parecer no lugar de ser; empregar o futuro do pretérito; utilizar a expressão “se fosse” para indicar hipóteses e não certezas; empregar palavras como talvez, possivelmente, provavelmente. Intertextualidade: referências a outros autores ou obras são comuns em textos científicos/ acadêmicos. Quando um texto é escrito, pressupõe-se que o autor organizou esse produto com base no conhecimento de mundo que possui, aliado às leituras que realizou ao longo de sua vida. A intertextualidade aparece na superfície do texto marcada como uma citação, entre aspas, por verbos dicendi (verbos de dizer), itálico, sublinhado. Além disso, pode-se dizer que a intertextualidade é uma forma de diálogo com outros textos, autores, obras, conhecimento de mundo; que se estabelecem de forma implícita. Quando um autor descreve a respeito da necessidade de quem vive em um paraíso, por exemplo, o simples fato de empregar o conceito de paraíso estabelece uma relação intertextual com a tradição da ideia de paraíso que a maioria das pessoas tem, e que é originária do conteúdo da Bíblia. Metacomentário: quando um autor escreve um texto, muitas vezes precisa explicar suas próprias palavras; ou seja, explicar novamente e de outra forma algo que já havia mencionado no texto. Esta explicação aqui realizada, por exemplo, é um metacomentário. Normalmente, o metacomentário é precedido das expressões isto é,
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