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O MÍNIMO EXISTENCIAL COMO LIMITE À APLICAÇÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS

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1 
 
O MÍNIMO EXISTENCIAL COMO LIMITE À APLICAÇÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL 
AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS 
 
THE “MINIMUM FOR EXISTANCE” AS A LIMIT TO THE APPLICATION OF THE “RESERVE OF THE 
POSSIBILITIES” THEORY IN THE CONTEXT OF FUNDAMENTAL SOCIAL RIGHTS. 
 
Juliana Tiemi Maruyama Matsuda 
Advogada da União 
 
Helida Maria Pereira 
Advogada da União 
 
Luciana Camila de Souza 
Advogada da União 
 
RESUMO: O presente trabalho analisa a relação entre eficácia dos direitos sociais, reserva do 
possível e mínimo existencial. Para isso, apresenta as teorias interna e externa, construídas 
acerca da legitimidade das restrições aos direitos fundamentais sociais, ressaltando a 
necessidade de os limites serem submetidos ao controle de constitucionalidade e 
proporcionalidade. Especial atenção é conferida a uma dessas restrições, qual seja, a reserva 
do possível, mostrando-se seus antecedentes históricos e a visão das teorias interna e externa 
a respeito. Em um segundo momento, passa a analisar a garantia do conteúdo essencial, 
inclusive as teorias acerca do seu objeto (teorias objetiva e subjetiva) e do seu valor (teorias 
absoluta e relativa). Em seguida, aborda o conceito do mínimo existencial no contexto dos 
direitos fundamentais sociais, e relaciona-o com a garantia do conteúdo essencial, concluindo 
que ambos exercem a importante função de servir como parâmetro para a aferição da 
proporcionalidade das restrições que o Estado, sob o argumento da reserva do possível, impõe 
à eficácia dos direitos fundamentais sociais. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Direitos fundamentais sociais. Eficácia. Restrições. Reserva do possível. 
Garantia do conteúdo essencial. Mínimo existencial. Proporcionalidade. 
 
ABSTRACT: This study presents an analysis of the relationship between effectiveness of social 
rights, the “under reserve of the possibilities” clause and the “minimum for existance”. For 
that reason, it presents the internal and external theories, about the legitimacy of restrictions 
on fundamental social rights, highlighting that the limits have to be submitted to the control of 
constitutionality and proportionality. Special attention is given to one of this restrictions, which 
is the “under reserve of the possibilities” clause, showing its historical background and what 
the view of the internal and external theories about it. In a second step, it analyzes the 
“security of essential content”, including theories about its object (objective and subjective 
theories) and its value (absolute and relative theories). Then, deals with the concept of the 
“minimum for existance” in the context of fundamental social rights, and relates it to the 
“security of essential content”, concluding that both have the important function of serving as 
a parameter for measuring the proportionality of the restrictions that the State, under the 
argument of the “reserve of the possibilities”, imposes to the effectiveness of fundamental 
social rights. 
 
KEYWORDS: Fundamental social rights. Effectiveness. Restrictions. Under reserve of the 
possibilities clause. Security of essential content. Minimum for existance. Proportionality. 
 
2 
 
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 Limites aos direitos 
fundamentais; 2Reserva do possível; 2.1 Antecedentes 
históricos; 2.2 Reserva do possível sob o ponto de vista das 
teorias interna e externa; 3 Garantia do núcleo essencial;3.1 
Objeto de proteção do núcleo essencial; 3.1.1 Teoria 
objetiva; 3.1.2 Teoria subjetiva; 3.2 Valor de proteção do 
núcleo essencial; 3.2.1 Teoria absoluta; 3.2.2 Teoria 
relativa; 4 O mínimo existencial no contexto dos direitos 
fundamentais sociais; 5 Conclusão; Referências. 
INTRODUÇÃO 
A Constituição de 1988 elencou a dignidade da pessoa humana como um dos 
fundamentos da República Federativa do Brasil (v. artigo1º, inciso III, da CF), além de indicar, 
no artigo 3º, seus objetivos fundamentais, in verbis: 
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; 
II - garantir o desenvolvimento nacional; 
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e 
regionais; 
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, 
idade e quaisquer outras formas de discriminação. 
Outrossim, incluiu os direitos sociais (como o direito à saúde, à educação, à moradia e à 
assistência social) na categoria dos direitos fundamentais (Título II da CF), os quais são 
dotados de eficácia imediata, nos termos do artigo 5º, § 1º1, da CF. 
Todos esses fatores foram importantes ferramentas para a concretização dos aludidos 
fundamentos e objetivos da nossa República Federativa. 
A categoria dos direitos sociais, classificada pela doutrina como a 2ª geração dos direitos 
fundamentais (em oposição aos de 1ª geração, relacionados com a liberdade individual frente 
ao Estado), demanda atuações positivas por parte do Estado, o que, por sua vez, exige o 
dispêndio de recursos. Como estes são finitos, acabam se tornando um limite à concretização 
dos direitos sociais. 
Ao mesmo tempo, a conscientização da população acerca de seus direitos e o 
fortalecimento das instituições destinadas a assegurá-los (como, por exemplo, o Ministério 
Público) tornaram comum o ajuizamento de ações judiciais nas quais se demandam 
prestações materiais a serem oferecidas pelo Estado, com o objetivo de efetivar os direitos 
sociais previstos no texto constitucional. 
Nesse contexto, passou-se a fazer alusão, no Brasil, ao argumento da reserva do 
possível, o qual se originou na jurisprudência alemã, na década de 1970. Tal conceito 
introduziu, nas discussões acerca do dever do Estado de implementar os direitos sociais, a 
preocupação com a sua disponibilidade orçamentária. 
De um lado, a teoria da reserva do possível vem resolver um problema real, 
correspondente ao fato de que os recursos financeiros do Estado são finitos; de outro lado, se 
interpretada à risca, equivale ao esvaziamento da efetividade dos direitos sociais, contrariando 
o § 1º do artigo 5º do texto constitucional, que determina a aplicação imediata dos direitos e 
garantias fundamentais. 
A fim de harmonizar esses dois aspectos, a doutrina criou a garantia do núcleo essencial, 
para relativizar a teoria da reserva do possível. Em linhas gerais, essa garantia representaria 
 
1 Artigo 5º 
 § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. 
3 
 
um conteúdo mínimo dos direitos sociais que não poderia sofrer restrições por parte do 
Estado, nem sob o argumento da indisponibilidade financeira. Apesar de a legislação brasileira 
não definir o que seja o conteúdo essencial, em nossa opinião, o princípio da dignidade 
humana oferece parâmetros seguros para eleger quais direitos podem integrar tal conceito. 
Nesses termos, o conteúdo essencial seria a porção do direito fundamental que não poderia 
ser suprimida nem restringida, sob pena de impossibilitar ao seu titular o desfrute de uma 
vida com dignidade. 
Essa foi uma breve introdução ao tema versado no presente trabalho, que inicia tratando 
dos limites aos direitos fundamentais e das teorias a respeito, apresentando a reserva do 
possível como um desses limites. 
Em seguida, aborda-se o assunto da reserva do possível, seus antecedentes históricos e 
as teorias interna e externa. 
Depois, faz-se a relação entre reserva do possível e a garantia do núcleo essencial, 
explicando-se que esta última se constitui em importante parâmetro para assegurar a 
observância do princípio da proporcionalidade na restrição aos direitos fundamentais.O 
trabalho aborda, ainda, as teorias acerca do objeto e valor de proteção da garantia do núcleo 
essencial. 
Na sequência, apresentam-se noções preliminares acerca do mínimo existencial, 
situando-o no contexto dos direitos fundamentais sociais, e questiona-se acerca da 
possibilidade de identificá-lo com o núcleo essencial dos direitos fundamentais sociais. Por fim, 
faz-se referência à função que esse conceito desempenha como parâmetro para aferição da 
proporcionalidade das restrições que o Estado impõe aos direitos sociais, sob o argumento da 
reserva do possível. 
Como se vê, o tema do presente trabalho é a relação entre a eficácia dos direitos 
fundamentais, a reserva do possível e o mínimo existencial. Para o seu desenvolvimento, 
foram utilizadas pesquisas doutrinárias e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. O 
seu objetivo é demonstrar que é possível, através da garantia do mínimo existencial, 
compatibilizar a efetividade dos direitos sociais com a teoria da reserva do possível. 
1 - LIMITES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 
O tema a ser abordado no presente trabalho tem relação com as situações de restrição 
aos direitos fundamentais, razão pela qual se afigura importante apresentar as teorias 
construídas pela doutrina acerca da legitimidade de tais restrições. 
A teoria interna preconiza a inexistência de restrições legítimas a direitos fundamentais, 
considerando como “limites conceituais” ou “limites imanentes” as eventuais delimitações 
traçadas pela norma jurídica a esses direitos. Assim, se uma determinada ação ofende valores 
não protegidos pela norma, tal ação não poderá ser tachada de “restrição”, já que respeitou os 
limites imanentes do direito fundamental. Se ultrapassar esses limites, não será simplesmente 
uma restrição a direito fundamental, mas sim, violação. 
Um dos principais representantes dessa corrente doutrinária é o jurista alemão Friedrich 
Müller. 
Ana Carolina Lopes Olsen2 critica a aludida teoria, sob o argumento de que ela pode 
propiciar abusos dos poderes constituídos frente aos direitos fundamentais, já que aqueles, 
sob o pretexto de traçar os limites conceituais da norma jusfundamental, podem adequá-la 
aos seus interesses. 
Já a teoria externa admite a existência de restrições legítimas a direitos fundamentais, 
derivadas da necessidade de compatibilizar os direitos de todos os indivíduos. Essas restrições 
podem ser normas jurídicas ou atos jurídicos, e estão submetidas ao controle dos poderes 
estatais constituídos, aos quais incumbe verificar se aqueles limites encontram guarida no 
 
2 Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008. p. 123. 
4 
 
texto constitucional, bem como se respeitam o princípio da proporcionalidade. Se atenderem a 
esses requisitos, a restrição será considerada legítima. 
A partir da análise das duas concepções acima apresentadas, verifica-se que elas 
divergem quanto ao fato de considerar os limites aos direitos fundamentais como inerentes à 
sua própria concepção (teoria interna) ou como acontecimentos externos e posteriores à sua 
consagração (teoria externa). Inobstante tal divergência, a conclusão mais importante que 
deflui de ambas as correntes é o fato de que existem limites incidentes sobre os direitos 
fundamentais, sejam esses limites impostos concomitantemente à previsão constitucional da 
norma jusfundamental, sejam limites surgidos posteriormente, como imposições da vida em 
sociedade. 
Ao nosso ver, a crítica apresentada por Ana Carolina Lopes, acima referida, não leva à 
conclusão de que a teoria externa melhor resguardaria os direitos fundamentais face aos 
abusos do poder público. Isso porque as interpretações feitas por este, acerca dos direitos 
fundamentais, não estão necessariamente imunes ao controle de constitucionalidade e 
proporcionalidade, ainda que tenham sido apresentadas como mera delimitação normativa 
desses direitos, e não como restrições aos mesmos (conforme preconiza a teoria interna). Por 
outro lado, a teoria externa pode ser suscetível aos abusos do poder público, na medida em 
que este pode impor restrições desproporcionais aos direitos fundamentais. 
Como se vê, o importante para a preservação dos direitos fundamentais é que os limites 
a eles impostos sejam submetidos ao controle de constitucionalidade e proporcionalidade, 
pouco importando se são considerados “limites imanentes”ou “restrições”. 
Acerca dessa conclusão, duas observações se fazem pertinentes: 
A primeira é o fato de que os limites às normas jusfundamentais não precisam, 
necessariamente, ter previsão expressa no texto constitucional. Pelo contrário, podem existir 
limites não previstos de forma literal na Constituição, os quais, ainda assim, deverão observar 
requisitos oriundos do sistema constitucional, como o princípio da proporcionalidade e a 
garantia do núcleo essencial, razão pela qual se diz que estarão sujeitos ao controle de 
constitucionalidade. 
A segunda observação é a de que se deve entender como “limite” ou “restrição” tanto a 
supressão de direitos fundamentais titularizados por determinado indivíduo, como a omissão 
do poder público em implementar as prestações que a norma jusfundamental previu em favor 
dos cidadãos. 
Um dos limites impostos às normas jusfundamentais consiste na reserva do possível, 
que será a seguir analisado. 
2 - RESERVA DO POSSÍVEL 
A reserva do possível é um argumento ocasionalmente utilizado nas respostas do Estado 
às demandas judiciais cujo objeto é o adimplemento de prestações previstas em normas que 
conferem aos cidadãos algum direito fundamental social. Objetiva adequar essas pretensões 
às possibilidades financeiras do Estado. 
Não há consenso na doutrina e jurisprudência acerca da natureza da reserva do possível, 
ou seja, se constitui-se em um princípio, cláusula, postulado ou, ainda, condição de realidade. 
O conhecimento de seus antecedentes históricos pode auxiliar na compreensão de seu 
significado. 
2.1 – ANTECEDENTES HISTÓRICOS 
Tradicionalmente, a teoria da reserva do possível nos é apresentada como uma criação 
do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha que, no ano de 1973, ao julgar uma ação em 
que se impugnava a limitação de vagas no ensino superior de medicina, decidiu não ser 
possível garantir o acesso universal ao ensino superior, pois não haveria recursos 
5 
 
orçamentários suficientes. Tal precedente foi denominado numerus clausus I (BVerfGE 33, 
303, de 1973). 
Olsen3 apresenta o contexto sócio-político e econômico no qual a invocação dessa teoria 
se tornou frequente: o período pós-Segunda Guerra Mundial, ou seja, a segunda metade do 
século XX, no contexto da globalização e do neoliberalismo, época em que passa a haver 
prevalência do aspecto econômico sobre as demais aspectos da vida em sociedade, exercendo 
influência, inclusive, sobre o sistema político e o jurídico. 
Luís Fernando Sgarbossa4, por sua vez, apresenta a reserva do possível como uma 
tradução moderna do princípio medieval do secundum vires ou nec ultra vires, registrado nos 
anais do II Concílio de Tours, ocorrido na cidade francesa de mesmo nome, no ano de 576 
d.C, nos seguintes termos: “Ut unaquaeque civitas pauperes et egenos incolas alimentis 
congruentibus pascat secundum vires”5. 
A época em que foi julgado o citado precedente do numerus clausus I correspondia a um 
período em que o número de estudantes universitários na República Federativa Alemã 
praticamente dobrara. No entanto, as estruturas das universidades não acompanharam o 
crescimento dessa demanda, razão pela qual as leis passaram a instituir o sistema do 
numerus clausus comocritério para admissão nessas instituições, impondo uma limitação das 
vagas no ensino superior de medicina. 
No precedente alcunhado de numerus clausus I, a Corte Constitucional Alemã decidiu 
que aquelas leis que adotavam esse critério eram compatíveis com o texto constitucional, pois 
não seria possível garantir acesso universal ao ensino superior, diante da escassez dos 
recursos orçamentários. Recusou, dessa forma, a tese de que o Estado seria obrigado a criar a 
quantidade suficiente de vagas nas universidades públicas, para atender a todos os 
candidatos. Decidiu, outrossim, que o direito à liberdade de escolha da profissão, assegurado 
pelo texto constitucional alemão, não abrangia o direito irrestrito do cidadão de exigir vaga 
para o curso que escolhesse. Não seria razoável assegurar esse direito caso isso demandasse 
do Estado esforços tão intensos que implicassem em prejuízo para outros programas sociais 
ou políticas públicas. 
Transcreveremos, a seguir, interpretações feitas por alguns doutrinadores acerca desse 
julgamento: 
Tais noções foram acolhidas e desenvolvidas na jurisprudência do Tribunal 
Constitucional Federal da Alemanha, que, desde o paradigmático caso numerus 
clausus, versando sobre o direito de acesso ao ensino superior, firmou 
entendimento no sentido de que a prestação reclamada deve corresponder 
àquilo que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade. Com efeito, 
mesmo em dispondo o Estado de recursos e tendo o poder de disposição, não 
se pode falar em uma obrigação de prestar algo que não se mantenha nos 
limites do razoável6. 
Em síntese essencial, levadas em consideração as circunstâncias do caso 
concreto, o Tribunal Constitucional Alemão decidiu pela impossibilidade de 
declarar a inconstitucionalidade das leis de Hamburgo e da Baviera que 
estabeleciam o numerus clausus, bem como afirmou a inexistência de um 
direito subjetivo individual à vaga no curso e na universidade de livre escolha do 
candidato a partir da norma contida no artigo 12, 1, da Grundgesetz, fixando a 
decisão entendimento no sentido de que o cidadão somente exigir da sociedade 
(e do Estado) aquilo que dela possa racionalmente esperar, no marco do Estado 
 
3 OLSEN; Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: 
Juruá, 2008. p. 175-183 
4 Crítica à teoria dos custos dos direitos. v 1. Reserva do possível. Porto Alegre: S.A. Fabris, 2010, p. 128-133 
5 Tradução: “toda comunidade deve nutrir convenientemente seus habitantes pobres ou necessitados, na proporção 
de seus recursos” 
6 SARLET, Ingo Wolfgang; FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Reserva do possível, mínimo existencial e direito à 
saúde: algumas aproximações. In: SGARBOSSA, Luís Fernando. Crítica à teoria dos custos dos direitos. v 1-Reserva 
do Possível. Porto Alegre: S.A. Fabris, 2010, p. 138. 
6 
 
Social, como visto, essência mesma do construto da reserva do possível.7 
(grifou-se) 
Portanto, verificou-se que o Estado Alemão estava fazendo ou tinha feito tudo 
que estava ao seu alcance a fim de tornar o ensino superior acessível. Exigir 
mais, para o fim de satisfação individual de cada cidadão, obrigando o Estado a 
negligenciar outros programas sociais, ou mesmo comprometer suas políticas 
públicas, não se mostra razoável. 
A questão central, entretanto, não parece ter sido financeira, enquanto escassez 
absoluta de recursos, mas sim dizia respeito à razoabilidade com que a alocação 
destes recursos poderia ser demandada. Mesmo que o Estado dispusesse dos 
recursos, segundo a reserva do possível instituída pelo tribunal alemão, não se 
poderia impor a ele uma obrigação que fugisse aos limites do razoável, tendo 
em vista os fins eleitos como relevantes pela Lei Fundamental. Não se poderia 
exigir o comprometimento de programas vinculados à satisfação de outros 
interesses fundamentalmente protegidos, para o fim de tornar o acesso ao 
ensino superior possível a absolutamente todos os indivíduos que assim o 
quisessem. Fazê-lo, seria colocar a liberdade individual muito acima dos 
objetivos comunitários, comprometendo e deturpando a própria noção de 
Estado Social.8 (grifou-se) 
Posteriormente, dois outros julgamentos do Tribunal Constitucional Federal Alemão se 
tornaram célebres ao reafirmar o postulado da reserva do possível. São eles: 
a) a decisão alcunhada como “decisão das universidades” ou Hochschul-Urteil (BverfGE 35, 
79), proferida no ano de 1973, na qual o Tribunal definiu que o direito à participação de diversos 
setores em órgãos colegiados das universidades deveria ser condicionado à reserva do possível, 
compreendida como aquilo que se revela razoável o indivíduo esperar da sociedade; 
b) o precedente conhecido como numerus clausus II (BverfGE 43, 291), do ano de 1977, no 
qual foram analisados alguns diplomas normativos que regulamentavam condições de acesso ao 
ensino superior. Decidiu-se que o direito subjetivo de escolher a profissão e o local de formação 
devem estar condicionados aos requisitos de admissão previstos para cada universidade e ao que o 
indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade. Verifica-se, portanto, que houve uma remissão à 
ideia transmitida pela cláusula da reserva do possível. 
Atualmente, no Brasil, o argumento da reserva do possível é frequentemente suscitado 
em julgados que versam sobre políticas públicas de implementação de direitos fundamentais 
sociais. Nesses casos,o Estado busca se eximir da responsabilidade pela efetivação desses 
direitos, ou limitá-los, argumentando que não dispõe de recursos financeiros suficientes para 
tanto. Compete ao Judiciário, então, decidir se essa escassez de recursos constitui-se em fator 
que justifica a implementação deficiente daqueles direitos sociais. Nos tópicos seguintes do 
presente trabalho, mostrar-se-á que essa decisão judicial deverá ser tomada com base no 
princípio da proporcionalidade e na noção de “mínimo existencial”. Na jurisprudência do 
Supremo Tribunal Federal, os casos mais frequentes em que se apresenta essa questão 
versam sobre direito à saúde (artigo 196 da CF), à educação (artigo 205 da CF) e proteção 
dos direitos da criança (artigo 227 da CF). 
2.2 – RESERVA DO POSSÍVEL SOB O PONTO DE VISTA DAS TEORIAS INTERNA E 
EXTERNA 
Pode-se analisar a reserva do possível como uma restrição aos direitos fundamentais, 
sob o ponto de vista da teoria interna ou da teoria externa. 
De acordo com a teoria interna, a reserva do possível seria um limite imanente à norma 
jusfundamental. Assim, para a delimitação normativa de cada direito fundamental social, seria 
 
7 SGARBOSSA, Luís Fernando. Crítica à teoria dos custos dos direitos. v 1, Reserva do Possível. Porto Alegre: S.A. 
Fabris, 2010, p. 139-140 
8 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: 
Juruá, 2008, p. 219 
7 
 
sempre levada em consideração a escassez de recursos estatais, que é o fator determinante 
da invocação da reserva do possível. 
Nesse contexto, se existirem recursos financeiros suficientes para dar efetividade à 
pretensão demandada por um jurisdicionado, pode-se concluir que este é titular do direito 
pleiteado. Se, por outro lado, inexistirem esses recursos, não será viável a realização prática 
da pretensão demandada, razão por que se poderia concluir que esta não estaria dentro do 
âmbito normativo do direito social, não merecendo proteção jurídica, de acordo com o 
entendimento preconizado pela teoria interna. 
Exemplificando, se um indivíduo ingressar com demanda judicial pleiteando o 
fornecimento de um medicamento que cure determinadadoença, para a qual a Medicina ainda 
não descobriu a cura, o atendimento do pedido será impossível. De acordo com a teoria 
interna, a pretensão apresentada pelo demandante não estaria dentro do âmbito normativo do 
direito à saúde. 
Dando um outro exemplo, agora envolvendo a escassez de recursos financeiros estatais, 
imagine-se uma ação judicial por meio da qual se pleiteia a implementação de uma política 
pública de saúde. Caso o Estado não tenha recursos financeiros para atender ao pedido, 
concluir-se-ia que essa política pública não está abrangida no âmbito normativo do direito 
subjetivo invocado como causa de pedir. A situação narrada demonstra claramente a 
utilização da reserva do possível como limite imanente do direito subjetivo, ou seja, como 
fator que delimita os próprios contornos do direito. 
Ana Carolina Lopes Olsen9 se opõe a essa visão, usando os mesmos argumentos com os 
quais critica a teoria interna, apresentados no Capítulo 1. Para ela, de acordo com esse ponto 
de vista, as situações que se consideram incluídas na esfera de proteção do direito social 
seriam fruto de uma escolha, que estaria fora do controle de legitimidade e 
constitucionalidade. Por consequência, os poderes públicos encarregados de definir a 
destinação dos recursos orçamentários poderiam agir com grande discricionariedade, ao fazer 
a delimitação normativa do direito social, definindo o que está incluído dentro desses limites. 
Isso enfraqueceria o sistema de proteção dos direitos fundamentais. 
Conclui a autora que a limitação da reserva do possível não nasce com o direito 
fundamental, mas sim, é consequência das opções políticas realizadas pelos poderes públicos. 
Para ela, assim, a reserva do possível deve ser considerada um elemento externo à 
norma de direito fundamental, que é o que preconiza a teoria externa das restrições. Não 
seria possível definir, de forma abstrata, as prestações que estariam abrangidas por 
determinado direito. Isso só poderia ser definido no caso concreto, comparando a pretensão 
apresentada com os recursos materiais disponíveis. E essa ponderação seria passível de 
controle, mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade, razão pela qual a teoria 
externa seria a que melhor preserva os direitos fundamentais. O seguinte trecho ilustra bem o 
pensamento da doutrinadora: 
(…) A escassez de recursos poderia impedir a exigibilidade de um direito 
fundamental social, mas, para tanto, o Judiciário, perante o qual esta 
exigibilidade foi reclamada, terá ao seu alcance o mecanismo da ponderação, a 
partir da proporcionalidade, a fim de averiguar que escassez de recursos é esta, 
se é contornável ou não, se as razões que determinaram a escolha alocativa de 
recursos em prejuízo deste direito são efetivamente adequadas, necessárias e 
proporcionais em sentido estrito. (…)10 
Conforme já expusemos no Capítulo 1, em nossa opinião, a escolha pela adoção da 
teoria externa ou interna não é o fator determinante da garantia dos direitos fundamentais. 
Afinal, a interpretação que, segundo a teoria interna, o poder público realiza para delimitar 
tais direitos também deve ser submetida aos controles de constitucionalidade e 
proporcionalidade, assim como os elementos limitadores externos, na visão da teoria externa. 
 
9 Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008; p. 190-192 
10 op. cit, p. 195 
8 
 
Repetindo o que já dissemos, a condição determinante para a preservação dos direitos 
fundamentais é que os limites a eles impostos, como a aplicação da reserva do possível, 
sejam submetidos ao controle de constitucionalidade e proporcionalidade, pouco importando 
se são considerados “limites imanentes”ou “restrições”. 
Em outras palavras, os poderes públicos (Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) 
deverão justificar por que consideraram um bem mais importante que outro, destinando os 
recursos financeiros disponíveis à sua satisfação. 
Essa ponderação, realizada quando se emprega o argumento da reserva do possível, 
encontra uma importante baliza na garantia do núcleo essencial, na medida em que esta 
objetiva assegurar a observância do princípio da proporcionalidade. 
 Assim, apresentaremos, na sequência, a denominada garantia do núcleo essencial. 
3 - GARANTIA DO NÚCLEO ESSENCIAL 
Entende-se como “núcleo essencial” a parcela do conteúdo da norma jusfundamental 
que não pode ser restringida pelo Estado. A garantia do núcleo essencial, ou do conteúdo 
essencial, refere-se, por decorrência, à proteção desse conteúdo mínimo. 
Martin-Retortillo1 refere-se ao conteúdo essencial dos direitos fundamentais como 
“garantia dos direitos e liberdades frente à atividade legislativa de limitação dos mesmos”, ou 
seja, como o “limite dos limites”, ou ainda como “uma fronteira que o legislador não pode 
ultrapassar, delimitando um terreno que a Lei que pretende limitar/regulamentar um direito 
não pode invadir sem incorrer em inconstitucionalidade”. 
Tal garantia foi prevista expressamente na Constituição Alemã; na Constituição 
Portuguesa de 1976 e na Constituição Espanhola, nos seguintes artigos: 
Constituição Alemã: 
Art. 19.2. Em nenhum caso um direito fundamental poderá ser afetado em sua 
essência. 
Constituição Portuguesa de 1976: 
Art 18.3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir 
carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a 
extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais. 
Constituição Espanhola: 
Art. 53.1. Os direitos e liberdades reconhecidos no Capítulo II do presente Título 
vinculam todos os poderes públicos. Somente por lei, que em todos os casos 
deve respeitar seu conteúdo essencial, poderão ser regulados esses direitos e 
liberdades. (grifou-se) . 
Com o objetivo de elucidar o conceito de núcleo ou garantia essencial, a doutrina 
concebeu teorias acerca do seu objeto e valor. 
3.1 OBJETO DE PROTEÇÃO DO NÚCLEO ESSENCIAL 
3.1.1 TEORIA OBJETIVA 
Versando sobre o objeto da proteção, a teoria objetiva preconiza que o objeto de 
proteção da garantia do núcleo essencial é a norma jurídica, e não o direito subjetivo, 
admitindo que este seja suprimido no caso concreto, desde que permaneça válido como regra 
objetiva, perante os demais indivíduos. Assim, o conteúdo essencial de um direito 
 
1 MARTIN-RETORTILLO BAQUER, Lorenzo. OTTO y PARDO, Ignacio de. Derechos fundamentales y Constitución. 
Madrid: Civitas, 1988, p. 125-135.In: MELO, Sandro Nahmias. A Garantia do Núcleo Essencial dos Direitos 
Fundamentais. Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo, v. 43, p. 82-97, abril/jun 2003 
9 
 
fundamental deve ser definido com base no significado que este possui para a vida de toda a 
sociedade. 
Virgílio Afonso Silva2 critica esse enfoque, sob o seguinte argumento: 
Embora esse enfoque faça sentido, é fácil perceber que ele não oferece 
praticamente proteção alguma além daquelas que já decorrem 
automaticamente da ideia de cláusulas pétreas. Para casos individuais ou 
mesmo para casos gerais em que a restrição não põe em risco o direito 
fundamental em seu sentido 'para o todo social', mas pode implicar total 
eliminação em situações concretas, o enfoque objetivo não oferece proteção 
alguma. Por isso, deve ser complementado por um enfoque subjetivo. 
3.1.2 TEORIA SUBJETIVA 
Diversamente, para a teoria subjetiva, o bem tutelado pela mencionada garantia é o 
direito subjetivo do indivíduo. Dessa forma, a limitação a um determinado direito fundamental 
deve ser analisada em relação ao seu titular, enão em relação a toda a coletividade. É 
esclarecedora a observação feita por Virgílio Afonso da Silva3: 
Contra esse enfoque subjetivo seria possível argumentar que em vários casos concretos 
é possível que nada reste de um direito fundamental, sem que isso deva ser considerado como 
algo a ser rechaçado. Exemplos não faltam: pena de morte (no Brasil, em caso de guerra 
declarada) elimina por completo o direito à vida daquele que é condenado; qualquer pena de 
reclusão elimina por completo a liberdade de ir e vir do condenado (mesmo que com 
determinada limitação temporal); a desapropriação elimina por completo o direito à 
propriedade daqueles que têm seus imóveis desapropriados. Com base nisso, aqueles que 
defendem em enfoque meramente objetivo argumentam que o enfoque subjetivo não teria 
como lidar com tais situações, enquanto a resposta a partir de uma dimensão objetiva seria 
clara: em nenhum desses casos o conteúdo essencial desses direitos, em sua função para a 
vida social, foi atingido. 
Ana Maria D'Ávila Lopes relata que o enfoque subjetivo é o aceito pela maioria dos 
doutrinadores11. 
Ainda no tocante à preferência pela teoria objetiva ou subjetiva, compartilhamos do 
entendimento de Luís Fernando Sgarbossa, que defende a necessidade da conjugação entre as 
duas visões: 
Sustenta-se, aqui, portanto, a conjunção das teorias objetiva e subjetiva, tendo 
em vista que não faz sentido a manutenção de uma garantia institucional, 
meramente objetiva, intangível em seu núcleo, cuja dimensão subjetiva seja 
franqueada, ainda que motivadamente, mesmo em sua essência. Tal 
interpretação é, em nosso juízo, insubsistente em face da teleologia do instituto 
jurídico dos direitos fundamentais: objetivando à concreta proteção da pessoa, 
nada significa sua dimensão objetiva dissociada da dimensão subjetiva. A 
pretensão de tal dissociação é insubsistente do ponto de vista de uma teoria 
jusfundamental coerente e consistente12. 
3.2 VALOR DE PROTEÇÃO DO NÚCLEO ESSENCIAL 
As teorias absoluta e relativa visam a analisar se o núcleo essencial é um valor relativo 
ou absoluto, ou seja, se sua delimitação depende ou não da confrontação com outros direitos. 
 
2 Direitos Fundamentais. Conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo, Malheiros, 2009, p. 186 
3 Op. cit. p. 186-187 
11 A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de Informação Legislativa. Brasília, ano 41, nº 
164, out/dez 2004, p. 8 
12 SGARBOSSA, Luís Fernando. Crítica à teoria dos custos dos direitos. Volume 1 –Reserva do Possível. Porto Alegre: 
S.A. Fabris, 2010, p. 294-295 
10 
 
3.2.1 TEORIA ABSOLUTA 
De acordo com essa concepção, o núcleo essencial refere-se a um conteúdo delimitado 
de forma abstrata, o qual, se restringido, afetaria o próprio direito como um todo. Trata-se, 
portanto, de um valor absoluto, intangível. Nem mesmo a proteção de outro bem 
constitucional justificaria a restrição dessa porção mínima. 
Para Vieira de Andrade13, o núcleo essencial constitui-se em um valor mínimo inatacável, 
um limite absoluto representado pela “dignidade do homem como ser livre”. Para Jorge 
Miranda14, por sua vez, “o conteúdo essencial tem de ser entendido como um limite absoluto 
correspondente à finalidade ou ao valor que justifica o direito”. 
Ana Carolina Lopes Olsen15 apresenta críticas à teoria absoluta, alegando que ela gera 
insegurança jurídica, na medida em que não determina a quem incumbiria a tarefa de definir o 
conteúdo essencial de cada direito, nem os parâmetros para essa definição. A teoria, 
outrossim, fragilizaria os direitos fundamentais, pois, ao proteger somente o núcleo essencial, 
autoriza que a parte do direito fora desses limites possa sofrer a atividade restritiva dos 
poderes constituídos. 
Claudia Drews16 propõe a subdivisão da teoria absoluta em teoria absoluta dinâmica e 
teoria absoluta estática. 
a) teoria absoluta dinâmica 
De acordo com essa concepção, o conteúdo essencial pode ser modificado com a 
passagem do tempo, não sendo, portanto, imutável. A palavra “absoluta”, nesse contexto, 
significa apenas a não suscetibilidade a relativizações em face da necessidade de dar 
prevalência a outros direitos. 
b) teoria absoluta estática 
O conteúdo essencial, para os adeptos da teoria absoluta estática, é intangível e 
imutável, ou seja, não sujeito a mudanças impostas pelo decurso do tempo, oriundas da 
evolução da sociedade. 
 Virgílio Afonso da Silva17 menciona a opinião de Claudia Drews, no sentido de que deve 
ser adotada a teoria absoluta dinâmica, pois o texto constitucional, incluindo os direitos 
fundamentais nele previstos, precisam se adaptar às novas necessidades que surgem com a 
evolução da vida real da sociedade. Afinal, a vida real não é algo estático, mas sim, dinâmico, 
que, com o tempo, sofre alterações no padrão e estilo de vida, nas necessidades, nos valores. 
Assim, seria necessário que o direito, incluindo os direitos fundamentais, acompanhasse tais 
alterações. 
Não obstante, o mesmo autor diverge da interpretação de Claudia Drews. Para ele, é 
inegável a necessidade de adaptação das normas aos novos valores surgidos com a evolução 
da sociedade, sendo isso um requisito indispensável para a manutenção da eficácia normativa. 
Todavia, não seria somente a característica da elasticidade ou dinamicidade o fator decisivo 
para comparar as teorias estática e dinâmica. 
Com efeito, o citado doutrinador afirma que o fator decisivo é a definição de qual o 
tamanho da parcela do direito fundamental que será definido como seu conteúdo essencial. 
Afinal, o que a teoria estática considera imutável é o núcleo essencial, e não o direito 
fundamental como um todo. E o núcleo essencial é apenas parcela da norma. Se o tamanho 
dessa parcela for grande, a capacidade da norma jusfundamental de adaptação à realidade 
 
13 Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008; p. 154-155 
14 „MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo IV. Direitos Fundamentais. Coimbra: Coimbra, 1993. In: 
TONIN, Marta Marília. op. cit. p. 97. 
15 Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008; p. 154-155 
16 Die Wesensgehaltgarantie des artigo 19 II GG, Baden-Baden: Nomos, 2005, pp. 65 e 66. In: SILVA, Virgílio Afonso 
da. Direitos Fundamentais. Conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo, Malheiros, 2009, p. 188-196 
17 Direitos Fundamentais. Conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo, Malheiros, 2009, p. 189-191 
11 
 
será menor. Ao contrário, se essa parcela for pequena, mesmo que considerada 
absolutamente imutável (como o faz a teoria absoluta estática), restará ainda grande parte da 
norma jusfundamental que poderá acompanhar com mais facilidade a evolução social. 
Podemos melhor explicitar esse raciocínio através do exemplo dos crimes de “posse 
sexual mediante fraude” (revogado pela Lei nº 12.015/2009) e de “rapto violento ou mediante 
fraude” (revogado pela Lei nº 11.106/2005), previstos na redação original do Código Penal 
(Decreto-Lei nº 2.848/1940). 
Essa era a redação original do tipo de posse sexual mediante fraude, previsto no artigo 
215 do Código Penal: 
Art. 215 - Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude: 
 Pena - reclusão, de um a três anos. 
 Parágrafo único - Se o crime é praticado contra mulher virgem, menor de 18 
(dezoito) e maior de 14 (catorze) anos: 
 Pena - reclusão, de dois a seis anos. (grifo da autora) 
E a redação original do artigo 219, que previa o crime de “rapto violento ou mediante 
fraude”, era a seguinte:Art. 219 - Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude, 
para fim libidinoso: 
 Pena - reclusão, de dois a quatro ano. (grifo da autora) 
Ambos os tipos penais previam a figura da “mulher honesta”, conceito que fazia algum 
sentido na época em que eles foram escritos (ano de 1940), mas que se tornou inapropriado e 
destituído de sentido com o decurso do tempo e com as mudanças de valores por que passou 
a sociedade brasileira. 
A título de ilustração, citaremos os comentários feitos por Guilherme de Souza Nucci18 
acerca do obsoletismo da expressão: 
Mulher honesta: não basta a condição de mulher para ser sujeito passivo, 
exigindo-se seja ela honesta. Com a devida vênia dos que pensam em sentido 
contrário, nada mais antiquado e passível de eliminação do sistema penal. Aliás, 
foi a proposta da Comissão Revisora presidida pelo Min. Cernichiaro. 
Honestidade – elemento normativo do tipo – é, em matéria de liberação dos 
costumes, termo quase impossível de ser definido. E, quando se consegue 
pode-se chegar ao absurdo de punir alguém pela simples relação sexual 
conseguida com uma mulher inexperiente em relação à própria sexualidade, o 
que, por si só, não deve ser considerado um desvalor passível de repressão 
penal. Diz Hungria ser honesta a mulher de conduta irrepreensível, sob o ponto 
de vista da moral sexual, ou seja, aquela que 'ainda não rompeu com o 
minimum de decência exigido pelos bons costumes. (…) Desonesta é a mulher 
fácil, que se entrega a uns e outros, por interesse ou por mera depravação' 
(Comentários ao Código Penal, v. 8, p. 150). seria honesta, atualmente, a 
mulher que tomasse a iniciativa da conquista e investisse sobre os parceiros, 
exatamente como faz o homem com relação à mulher? Seria honesta a mulher 
que apreciasse o sexo, exatamente como sempre se incentivou o homem a 
fazer, trocando de parceiro várias vezes? Se a resposta for afirmativa, fruto 
natural da liberação sexual, não há, de fato, razão para a existência do tipo 
penal do artigo 215, que somente poderia ter em vista proteger exceções. De 
outra parte, se a resposta for negativa, está-se diante de um impasse, pois a 
interpretação valorativa do termo inserido no tipo penal demonstra seu 
descompasso com a realidade. Enfim, cremos não ser mais cabível falar em 
'posse sexual da mulher honesta mediante fraude'. De outra parte, se a razão 
da existência do tipo penal do artigo 215 é proteger a vítima que, 
fraudulentamente, entrega-se a uma pessoa, crendo estar mantendo relação 
sexual com outra (ex: à noite, invadindo o quarto o quarto da vítima, que foi 
dormir após excessos cometidos durante uma festa, o sujeito faz-se passar por 
 
18 Código Penal Comentado. 3. ed rev. atual e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 650-651 
12 
 
seu marido, usando suas roupas, seu perfume e deitando-se no leito de luz 
apagada, para conseguir manter com ela relação sexual), o correto seria 
proteger qualquer pessoa – e não somente a mulher honesta -, além de deixar 
bem claro tal intento no tipo, como fez o Código Penal português: 'Quem, 
aproveitando-se fraudulentamente de erro sobre a sua identidade pessoal, 
praticar com outra pessoa cópula, coito anal ou ato sexual de relevo é punido 
com pena de prisão de até 2 anos (artigo 167)'. Por que um prostituta não 
poderia – apesar de não ser considerada 'mulher honesta' – ser vítima desse 
tipo de crime? Afinal, ela pode ser casada, ter conduta sexual regrada no 
recanto de seu lar e também ser enganada. (...)” 
 
Apesar desse descompasso entre a letra da lei e a realidade social, a expressão 
permaneceu expressa no Código Penal até 29/03/2005, quando foi publicada a Lei nº 11.106, 
que alterou a redação do artigo 215 e revogou o artigo 219, ambos do Código Penal. 
Com o advento dessa lei, o artigo 215 do Código Penal passou a ter o seguinte teor: 
Art. 215. Ter conjunção carnal com mulher, mediante fraude: (Redação dada 
pela Lei nº 11.106/2005) 
Pena - reclusão, de um a três anos. 
Parágrafo único - Se o crime é praticado contra mulher virgem, menor de 18 
(dezoito) e maior de 14 (catorze) anos: 
Pena - reclusão, de dois a seis anos. 
Excluiu-se, assim, a obsoleta expressão “mulher honesta” da legislação penal brasileira. 
Ressalte-se que, posteriormente, o artigo 215 do Código Penal foi novamente alterado 
pela Lei nº 12.015, de 07/08/2009, que alterou o seu nomen iuris e lhe conferiu a seguinte 
redação: 
Violação sexual mediante fraude 
artigo 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, 
mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de 
vontade da vítima: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. 
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem 
econômica, aplica-se também multa. 
O objeto jurídico dos crimes previstos nos artigos 215 e 219, em suas redações originais, 
era a liberdade, no aspecto da liberdade sexual. O direito à liberdade está positivado no caput 
do artigo 5º do texto constitucional brasileiro19. É, sem dúvida, um direito fundamental, tanto 
que está previsto em dispositivo inserido no Capítulo II da Constituição, intitulado “Dos 
Direitos e Garantias Fundamentais”. 
A evolução da sociedade brasileira e a mudança de seus valores gerou a necessidade de 
alteração dos mencionados tipos penais. Isso porque o próprio conteúdo do bem jurídico por 
eles protegido (direito à liberdade, na vertente da liberdade sexual) havia sofrido alterações. 
Em 2005, quando a redação da lei foi alterada, a liberdade sexual não poderia mais ser 
tutelada pelo Estado da mesma forma como era tutelada no ano de 1940, quando os aludidos 
tipos penais entraram em vigor. Com efeito, “proteger a liberdade sexual da mulher honesta” 
poderia fazer algum sentido em 1940, mas não mais no ano de 2005, quando nem mais se 
sabia ao certo o conceito de mulher honesta. 
Nesse contexto, seria importante identificar o núcleo essencial do direito fundamental à 
liberdade sexual. 
 
19 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos 
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à 
propriedade, nos termos seguintes: (…)” (destacou-se) 
13 
 
Retomando as explanações feitas anteriormente, a teoria absoluta estática considera 
imutável esse conteúdo essencial, o qual não poderia, portanto, ser adaptado aos novos 
valores sociais. A teoria absoluta dinâmica, por sua vez, admite que o conteúdo essencial de 
cada direito seja modificado com o passar do tempo. À primeira vista, a primeira teoria 
(estática) seria inadequada, pois impossibilitaria a mudança dos tipos penais acima 
mencionados, os quais continuariam fazendo menção à indefinível figura da “mulher honesta”. 
No entanto, o que Virgílio Afonso da Silva20 objetiva demonstrar é que não é somente a 
característica estática ou dinâmica da definição do conteúdo essencial o fator decisivo para se 
avaliar a capacidade de adaptação das teorias às mudanças sociais. E, de fato, nos exemplos 
acima citado, dos crimes de rapto e de posse sexual mediante fraude, o mais importante é 
definir se o elemento “mulher honesta” integrava ou não o núcleo essencial do direito 
fundamental à liberdade sexual. Caso esse elemento não fizesse parte do núcleo, ele poderia 
ser suprimido, adaptado ou substituído, sem maiores complicações, independentemente da 
teoria que se adotasse. A opção entre a teoria estática e a dinâmica somente adquiriria 
relevância na hipótese de se considerar que o elemento “mulher honesta” compõe o conteúdo 
essencial – aí sim,a segunda teoria ofereceria maior capacidade de adaptação à realidade. 
Para melhor compreensão, comparemos duas situações. Na primeira, adota-se a 
perspectiva da teoria absoluta estática, e não se inclui o item “mulher honesta” no conteúdo 
essencial do direito à liberdade sexual. Na segunda, sob a perspectiva da teoria absoluta 
dinâmica, faz-se essa inclusão. Verifica-se que, seria mais fácil eliminar o elemento “mulher 
honesta” na primeira situação, apesar da característica estática do núcleo essencial, e não na 
segunda. Ou seja, nesse exemplo, a teoria estática apresentou maior capacidade de 
adaptação às mudanças da sociedade. 
Portanto, ao nosso ver, tem razão o citado doutrinador. Por isso, a capacidade de 
adaptação às mudanças evolutivas da sociedade não é um fator que possa ser utilizado para 
fazer prevalecer uma teoria sobre a outra. 
3.2.2 - TEORIA RELATIVA 
A teoria relativa preconiza que o conteúdo essencial de cada direito fundamental é 
determinado por meio de uma ponderação entre os outros direitos e princípios que estejam 
em conflito, no caso concreto. Não é possível, portanto, delimitar, a priori, o conteúdo 
essencial de determinado direito fundamental. 
Outrossim, ainda que delimitado esse conteúdo essencial, ele não será um valor 
absoluto, imutável, podendo variar em cada caso concreto. 
De acordo com esse entendimento, as restrições aos direitos fundamentais podem existir 
sem afetar seu conteúdo essencial, desde que respeitem o princípio da proporcionalidade. E a 
observância desse princípio poderá ser aferida através do sopesamento entre os valores em 
conflito. Se um direito for restringido para fazer prevalecer um direito de maior relevância, no 
caso concreto, terá havido respeito à proporcionalidade e, por consequência, o núcleo 
essencial do direito restringido terá sido preservado. 
A doutrina pátria diverge acerca da preferência por uma ou outra teoria. 
Ana Maria D'Ávila Lopes 21, embora não se posicione expressamente em favor de uma ou 
outra visão, explica que a teoria relativa oferece pouca proteção ao direito fundamental 
individual quando este esteja em conflito com um interesse estatal, já que este prevaleceria 
sobre aquele. Segundo ela, a teoria absoluta, por outro lado, oferece proteção constante ao 
conteúdo essencial do direito fundamental. 
No entanto, essa conclusão da aludida doutrinadora somente seria verdadeira se 
considerássemos que, na ponderação entre interesse estatal e direito individual, o primeiro 
 
20 Loc cit. 
21 A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de Informação Legislativa. Brasília, ano 41, n. 
164, out/dez 2004, p. 8 
14 
 
sempre seria julgado o mais importante. E, em nossa opinião, esse resultado não é, 
necessariamente, uma constante. O critério da proporcionalidade deverá ser utilizado, em 
cada caso concreto, para se eleger qual dos dois deverá prevalecer. 
Ademais, com relação à afirmação de que a teoria absoluta ofereceria proteção 
constante ao conteúdo essencial do direito fundamental, podemos questioná-la, expondo a 
opinião de Ana Carolina Lopes Olsen22, já apresentada anteriormente, que critica essa teoria, 
alegando que ela gera insegurança jurídica, na medida em que não determina a quem 
incumbiria a tarefa de definir o conteúdo essencial de cada direito, nem os parâmetros para 
essa definição. A teoria, outrossim, fragilizaria os direitos fundamentais, pois, ao proteger 
somente o núcleo essencial, autoriza que a parte do direito fora desses limites possa sofrer a 
atividade restritiva dos poderes constituídos. 
Olsen23 adota a teoria relativa, sob o argumento de que permite identificar, em cada 
direito fundamental, um núcleo de maior relevância, que só poderia ser restringido mediante 
fortes argumentos que demonstrassem a necessidade de dar prevalência aos outros bens 
jurídicos ou valores em conflito. E a admissibilidade dessa restrição só poderia ser definida no 
caso concreto, pois “definições a priori mostram-se arbitrárias e fatalmente incompletas”. 
Aduz a autora, acerca da visão relativa: “Apesar desta maleabilidade, ela não deixa o direito 
fundamental desprotegido, pois os critérios de proporcionalidade deverão sempre ser 
satisfeitos quando o Estado pretende restringir o âmbito normativo de um direito 
fundamental” 
É interessante citar a comparação que a referida doutrinadora faz entre o núcleo 
essencial e o sistema de controle de constitucionalidade vigente no ordenamento pátrio. 
Segundo ela, a teoria do núcleo essencial soma-se à ação direta de inconstitucionalidade 
(artigo 102, I, “a”, CF), à ação declaratória de constitucionalidade (artigo 102, I, “a”, CF), à 
ação de descumprimento de preceito fundamental (artigo 102, §1º, CF), à inclusão dos 
direitos fundamentais dentre as cláusulas pétreas (artigo 60, §4º, IV, CF) e ao princípio da 
supremacia da Constituição, a fim de gerar uma presunção de intangibilidade das normas 
jusfundamentais. 
Confira-se: 
Nestas condições, é possível afirmar que as normas de direitos fundamentais 
gozam de presunção de intangibilidade – a não ser que o próprio constituinte 
disponha em contrário – contra a a qual a intervenção do Estado só pode se 
insurgir se imbuída de grave justificação, apresentada sob a forma de 
argumentação racional, que demonstre o maior peso de outros princípios em 
conflito, bem como a proporcionalidade da restrição. 
(…) 
No caso dos direitos fundamentais sociais a prestações, em que esta atividade 
do legislador mostra-se mais constante, a garantia do núcleo essencial fornece 
um parâmetro a mais de controle da constitucionalidade, onerando os 
intérpretes das normas jusfundamentais com uma carga de argumentação 
supletiva sempre que sua intervenção buscar, de alguma forma, atingir o 
conteúdo mais essencial previsto na norma, aquele que o caracteriza, que 
justifica sua existência no ordenamento jurídico. (grifo da autora)24 
Utilizando a mesma comparação entre os mecanismos de controle de constitucionalidade 
e a garantia do núcleo essencial, Ana Maria D'Ávila Lopes pergunta: 
Se, por meio do controle de constitucionalidade, é possível defender os direitos 
fundamentais dos excessos do Legislativo, questiona-se, então, qual é o sentido 
da garantia do conteúdo essencial?25 
 
22 Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008; p. 154-155 
23 Ibidem. p. 155-156 
24 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: 
Juruá, p. 157 
25 A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de Informação Legislativa. Brasília, ano 41, n. 
15 
 
A autora responde citando a conclusão de Otto y Pardo26, segundo a qual o sentido da 
garantia do núcleo essencial seria a relativização dos direitos fundamentais, seja pela 
perspectiva da teoria relativa, seja da absoluta. Segundo a teoria relativa, o núcleo essencial é 
formatado de acordo com os valores em conflito, deixando evidente, com isso, que se permite 
a relativização do direito fundamental. Já na teoria absoluta, a existência de um conteúdo 
mínimo, irredutível, em cada direito fundamental, também demonstraria, a contrario sensu, a 
sua relativização, já que toda a porção que não pertence a esse núcleo essencial poderia 
sofrer restrições. Conclui a doutrinadora: 
O pensamento de Otto y Pardo tem provocado interessantes discussões a 
respeito da relativização dos direitos fundamentais em virtude da incorporação 
da garantia do conteúdo essencial em um sistema no qual já existe o controle 
de constitucionalidade das leis. Adoutrina e a jurisprudência têm 
predominantemente aceito a relativização, só que não sob o ponto de vista 
negativo, mas, justamente, com a afirmação da historicidade e da exigência da 
constante atualização de um direito. Nesse sentido, a garantia do conteúdo 
essencial não apenas aceita a possibilidade da limitação, mas também a 
regulação de um direito fundamental, com a finalidade de permitir que possa 
ser efetivamente exercido, mas sempre que não seja desnaturalizado. Essa 
garantia, junto com os princípios da ponderação dos bens e da 
proporcionalidade, constitui um mecanismo indispensável na realização dos 
direitos fundamentais, os quais não são direitos absolutos mas também não 
são, nem muito menos, instrumentos da arbitrariedade do legislador. 
 
4 - O MÍNIMO EXISTENCIAL NO CONTEXTO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS 
Não se encontra na legislação brasileira um conceito de mínimo existencial; tampouco 
existe unanimidade na doutrina acerca do tema. 
É interessante citar a observação feita por Antônio Augusto Cançado Trindade, com o 
objetivo de demonstrar que também no âmbito do Direito Internacional ainda não existe um 
consenso acerca do conteúdo concreto do mínimo existencial: 
É significativo que já se comece hoje a considerar o que constituiria um “núcleo 
fundamental” de direitos econômicos, sociais e culturais. Há os que, como a 
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, argumentam que tal núcleo 
seria constituído pelos direitos ao trabalho, à saúde e à educação. Em recentes 
reuniões internacionais de peritos também se tem referido, como possíveis 
componentes daquele núcleo, aos chamados “direitos de subsistência” (e.g., 
direito à alimentação, direito à moradia, direito aos cuidados médicos e direito à 
educação). Os debates apenas têm início, e certamente se prolongarão no 
decorrer dos próximos anos neste início do novo século.27 
Inobstante a inexistência de consenso, pode-se identificar pontos em comum nas 
diversas definições de mínimo existencial, apresentadas pelos doutrinadores, como a relação 
com prestações materiais que assegurem condições mínimas de sobrevivência, com respeito à 
dignidade humana. 
Essas prestações materiais que asseguram condições mínimas de sobrevivência estão 
positivadas, no direito brasileiro, sob o título de “Direitos Sociais”, no Capítulo II (artigos 6º a 
11) do Título II (“Dos direitos e garantias fundamentais”) da Constituição da República 
Brasileira de 1988, abrangendo o direito à educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, 
segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos 
desamparados, dentre outros. 
 
164, out/dez 2004, p. 13 
26 OTTO Y PARDO, Ignácio de. La regulación del ejercicio de los derechos y libertades. Madri: Cuadernos Civitas, 
1988. In: LOPES, Ana Maria D'Ávila. Idem, p.13. 
27 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, v I. Porto Alegre: 
Sergio Antonio Fabris Editor, 1997, p. 493. In: SGARBOSSA, Luís Fernando. Crítica à teoria dos custos dos direitos. 
v 1 Reserva do Possível. Porto Alegre: S.A. Fabris, 2010, p. 307 
16 
 
Na classificação doutrinária que divide os direitos fundamentais em gerações ou 
dimensões, os direitos sociais correspondem aos direitos de 2ª geração, cujo objetivo é 
assegurar a igualdade social material, através de prestações positivas por parte do Estado. 
Podemos dizer que a definição de direitos sociais acima apresentada, qual seja, os 
direitos previstos nos capítulos 6º a 11 da Constituição da República, corresponde a um 
conceito formal. 
De outro lado, a partir da análise das características comuns dos direitos sociais, Vidal 
Serrano Nunes Junior apresenta uma definição que podemos designar como conceito material 
de direitos sociais: 
Fincados nestes pressupostos, podemos conceituar direitos sociais como o 
subsistema dos direitos fundamentais que, reconhecendo a existência de um 
segmento social economicamente vulnerável, busca, quer por meio da 
atribuição de direitos prestacionais, quer pela normatização e regulação das 
relações econômicas, ou ainda pela criação de instrumentos assecuratórios de 
tais direitos, atribuir a todos os benefícios da vida em sociedade.28 (grifo da 
autora) 
Verifica-se que todos os direitos sociais previstos no Capítulo II do Título II da 
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 buscam assegurar a dignidade na vida 
dos jurisdicionados. Essa relação com o princípio da dignidade da pessoa humana justifica a 
caracterização dos direitos sociais como “fundamentais”. 
Como se disse acima, as diversas definições doutrinárias de mínimo existencial 
apresentam, em comum, a relação com as prestações materiais que assegurem condições 
mínimas de sobrevivência, as quais estão previstas, no texto constitucional brasileiro, como 
“direitos sociais”. Daí a razão por que o mínimo existencial é estudado, na doutrina, e assim 
também será, no presente trabalho, dentro do contexto dos direitos fundamentais sociais. 
Dentre as diversas conceituações de “mínimo existencial” apresentadas pela doutrina, 
interessante é a explanação feita por Vicenzo Demetrio Florenzano29, por representar uma 
tentativa de relacionar esse conceito com uma norma positivada no direito brasileiro, qual 
seja, o artigo 7º, IV, da CF, que dispõe: 
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que 
visem à melhoria de sua condição social: 
(…) 
IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a 
suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, 
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com 
reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua 
vinculação para qualquer fim; (grifo da autora) 
Ingo Wolfgang Sarlet sugere a utilização do princípio da dignidade humana como 
parâmetro para a identificação do mínimo existencial: 
Neste contexto, cumpre registrar que o reconhecimento de direitos subjetivos a 
prestações não se deverá restringir às hipóteses nas quais a própria vida 
humana estiver correndo o risco de ser sacrificada, inobstante seja este o 
exemplo a ser referido. O princípio da dignidade da pessoa humana assume, no 
que diz com este aspecto, importante função demarcatória, podendo servir de 
parâmetro para avaliar qual o padrão mínimo em direitos sociais (mesmo como 
direitos subjetivos individuais) a ser reconhecido. Negar-se o acesso ao ensino 
fundamental obrigatório e gratuito (ainda mais em face da norma contida no 
artigo 208, § 1º, da CF, de acordo com o qual se cuida de direito público 
subjetivo) importa igualmente em grave violação ao princípio da dignidade da 
 
28 NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. A Cidadania Social na Constituição de 1988 – Estratégias de Positivação e 
Exigibilidade Judicial dos Direitos Sociais. São Paulo: Verbatim, 2009, p. 70. 
29 Justiça Social, mínimo social e salário mínimo: uma abordagem transdisciplinar. Revista de Informação Legislativa. 
Brasília, ano 42, n. 165, p. 47, jan/mar 2005. In: OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. 
Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008, p. 316 
17 
 
pessoa humana, na medida em que este implica para a pessoa humana a 
capacidade de compreensão do mundo e a liberdade (real) de autodeterminar-
se e formatar a existência, o que certamente não será possível em se mantendo 
a pessoa sob o véu da ignorância. 30(grifo da autora) 
LuísFernando Sgarbossa menciona a importante distinção entre “mínimo vital ou 
fisiológico” - as condições imprescindíveis para a manutenção da vida em termos biológicos – 
e “mínimo sociocultural” - as condições que propiciam a inserção do indivíduo na vida social. 
Segundo o autor, um conceito de mínimo existencial não pode se resumir ao mínimo vital, 
mas sim, abranger os dois aspectos, já que a simples existência da vida biológica não 
assegura ao indivíduo uma existência digna.31 
No mesmo sentido, Sarlet32 ressalta que o mínimo existencial não diz respeito apenas às 
condições de sobrevivência física do indivíduo, mas também às condições que preservem a 
dignidade humana: 
Tomando-se o exemplo do direito à educação, poder-se-á sempre afirmar que 
negar, em face de argumentos como o da ausência de recursos, até mesmo o 
acesso ao ensino fundamental não chega a comprometer a existência do 
indivíduo. A resposta a esta indagação, contudo, passa pelo princípio da 
dignidade humana, que indubitavelmente pressupõe um certo grau de 
autonomia do indivíduo, no sentido de ser capaz de conduzir a sua própria 
existência, de tal sorte que a liberdade pessoal (…) constitui exigência 
indeclinável da própria dignidade. Neste sentido, não restam dúvidas de que 
manter o indivíduo sob o véu da ignorância absoluta significa tolher a sua 
própria capacidade de compreensão do mundo e sua liberdade (real) de 
autodeterminação e de formatar sua existência. O princípio da dignidade da 
pessoa humana pode vir a assumir, portanto, importante função demarcatória, 
estabelecendo a fronteira para o que se convenciona denominar de padrão 
mínimo na esfera dos direitos sociais.(grifo da autora) 
Já Ricardo Lobo Torres, expressando a indefinição do conceito, observa que: 
Carece o mínimo existencial de conteúdo específico. Abrange qualquer direito, 
ainda que originariamente não-fundamental (direito à saúde, à alimentação, 
etc.), considerado em sua dimensão essencial e inalienável. Não é mensurável, 
por envolver mais os aspectos de qualidade que de quantidade, o que torna 
difícil extremá-lo, em sua região periférica, do máximo de utilidade (maximum 
welfare, Nutzenmaximierung), que é princípio ligado à ideia de justiça e de 
redistribuição de riqueza social. Certamente esse mínimo existencial, “se o 
quisermos determinar precisamente, é uma incógnita muito variável”.33 
 
Na opinião desse autor, o mínimo existencial não é um valor, nem um princípio jurídico, 
mas sim, uma regra jurídica, e coincide com o conteúdo essencial dos direitos fundamentais: 
 
O mínimo existencial não é um valor nem um princípio jurídico, mas o conteúdo 
essencial dos direitos fundamentais. 
Nada obstante está impregnado pelos valores e princípios jurídicos os mais 
relevantes. 
O mínimo existencial não é um valor, por não possuir a generalidade e a 
abstração de ideias como as de liberdade, justiça e igualdade. Além disso, o 
 
30 Justiça Social, mínimo social e salário mínimo: uma abordagem transdisciplinar. Revista de Informação Legislativa. 
Brasília, ano 42, n. 165, p. 47, jan/mar 2005. In: OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. 
Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008, p. 316 
31 Crítica à Teoria dos Custos dos Direitos. v 1, Reserva do Possível. Porto Alegre: S.A. Fabris, 2010, p. 308. 
32 Op. cit, p. 353. In: OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do 
possível. Curitiba: Juruá, 2008, p. 332 
33 TORRES, Ricardo Lobo, O Mínimo existencial como conteúdo essencial dos direitos fundamentais. In: C. P. De 
Souza Neto e D. Sarmento (org). Direitos Sociais. Fundamentos, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de 
Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 313-339 
18 
 
mínimo existencial pode se traduzir, para a sua garantia, em regra jurídica, o 
que jamais acontece com os valores. Mas o mínimo existencial se deixa tocar e 
imantar permanentemente pelos valores da liberdade, da justiça, da igualdade e 
da solidariedade. 
O mínimo existencial também não é princípio jurídico, por não exibir as 
principais características dos princípios, que são as de ser objeto de ponderação 
e de valer prima facie. De feito, o mínimo existencial não pode ser ponderado e 
vale definitivamente porque constitui o conteúdo essencial dos direitos 
fundamentais, que é irredutível por definição e insuscetível de sopesamento. 
O mínimo existencial é regra, porque se aplica por subsunção, constitui direitos 
definitivos e não se sujeita à ponderação.34 (grifo da autora) 
Diante dessas ideias preliminares acerca do conceito de mínimo existencial, cabe 
questionar acerca da possibilidade de identificá-lo com o núcleo essencial dos direitos 
fundamentais sociais. 
Usualmente a doutrina identifica o mínimo existencial com o núcleo essencial dos direitos 
fundamentais sociais. Como exemplo, citamos Ricardo Lobo Torres, acima mencionado. 
Olsen35, no entanto, entende que essa correspondência não é uma constante, ou seja, 
nem todo direito fundamental social terá em seu núcleo um conteúdo equivalente ao mínimo 
existencial. Ela cita o direito à participação nos lucros do empregador, previsto como direito 
fundamental social no artigo 7º, XI, da Constituição Federal, cujo conteúdo essencial não 
poderia ser identificado com o mínimo existencial. Por outro lado, essa identificação é bastante 
clara no caso do direito à saúde. Portanto, para a autora, núcleo essencial de direito 
fundamental social e mínimo existencial são categorias distintas, mas que podem ter 
características e aplicações semelhantes. 
 Essa divergência, todavia, não possui maior relevância. Mais importante é saber 
que tanto a noção de mínimo existencial como a garantia do conteúdo essencial assumem 
importância nas situações em que o Estado utiliza o argumento da reserva do possível para 
impor restrições à efetivação dos direitos fundamentais sociais. Isso porque o mínimo 
existencial e o conteúdo essencial demarcarão a porção mínima que não poderá sofrer 
restrições, sob pena de inviabilizar a sobrevivência digna do titular do direito. 
Ao nosso ver, o mínimo existencial e o conteúdo essencial devem ser delimitados em 
cada caso concreto, utilizando-se do princípio da proporcionalidade. 
Assim, imaginemos uma situação em que o poder público, suscitando limitações 
relacionadas à reserva do possível, deixa de implementar integralmente determinado direito 
social em favor de um indivíduo. Ao tomar essa decisão, o Estado age com certo grau de 
discricionariedade, a qual, no entanto, é limitada pelo princípio da proporcionalidade. 
O princípio da proporcionalidade exigirá que a justificativa apresentada pelo Estado para 
restringir o direito social seja legítima e materialmente constitucional. Ou seja, o bem jurídico 
a que o Estado visou proteger quando recorreu à reserva do possível deverá ser mais 
relevante que a parcela do direito que sofreu a restrição. A proporcionalidade exigirá, 
também, que tenha sido protegido, ao menos, o mínimo existencial, sendo esse requisito 
denominado de “proibição da insuficiência”. 
Na seguinte passagem, Ana Carolina Lopes36 afirma a necessidade de submeter o 
argumento da escassez de recursos ao exame da proporcionalidade, no sentido da proibição 
da insuficiência: 
Portanto, o argumento da escassez de recursos deverá ser investigado a fundo 
quando confrontado com a realização de um direito fundamental social 
prestacional. A proporcionalidade em sentido de proibição de insuficiência 
 
34 Ibidem, p. 316 
35 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível.Curitiba: 
Juruá, 2008, p. 319 
36 Ibidem, p. 310 
19 
 
representa um valioso instrumento à disposição do Judiciário para que a 
atuação do Estado seja devidamente avaliada e ponderada, de modo a se 
proibir a negligência para com prestações determinadas pela Constituição. 
Portanto, há que se ponderar cuidadosamente o argumento da escassez (bem 
como o próprio argumento democrático e da macrojustiça) com a realização do 
direito fundamental social reclamado concretamente, de modo que somente por 
uma razão extremamente grave a efetividade do direito jusfundamental poderá 
ser temporariamente afastada. (grifo da autora) 
 
Em outro trecho de sua obra, a autora37 relaciona o exame da propocionalidade à 
garantia do mínimo existencial: 
Na seção anterior, foi demonstrado que a incidência da reserva do possível em 
relação aos direitos fundamentais sociais está sujeita à ponderação, 
especialmente mediante o exame da proporcionalidade no sentido da proibição 
da insuficiência. Assim, pode-se dizer que a norma de direito fundamental social 
pode ser restringida até o limite de suficiência da prestação material 
demandada, a fim de garantir a realização mínima pretendida. É justamente 
para garantir esta “realização mínima”que a noção de mínimo existencial 
assume especial importância na ponderação entre direitos fundamentais sociais 
e reserva do possível. (grifo da autora) 
 O Supremo Tribunal Federal tem utilizado a ideia do “mínimo existencial” para avaliar a 
proporcionalidade das condutas ou omissões do Estado consistentes em, sob o argumento da 
reserva do possível, restringir direitos sociais. Citamos, como exemplo: a) Decisão 
monocrática proferida pelo Min. Dias Toffoli, no julgamento do RE 491121, em 27/08/2010, 
publicado no DJe 174, data de divulgação 7/09/2010, data de publicação 20/09/2010, e; b) 
acórdão proferido no julgamento do RE 482611, Relator Min. Celso de Mello, julgado em 
23/03/2010, publicado em Dje-060, data de divulgação 06/04/2010, data de publicação 
07/04/2010. 
 
CONCLUSÃO 
O objetivo do presente trabalho consistiu, essencialmente, em demonstrar a relação que 
existe entre eficácia dos direitos fundamentais sociais, reserva do possível e mínimo 
existencial. 
Chegou-se à conclusão de que a noção de mínimo existencial adquire especial relevância 
nas situações em que é utilizado o argumento da reserva do possível para restringir a 
aplicação dos direitos fundamentais sociais. 
Vidal Serrano Nunes Junior ensina que a teoria da reserva do possível, considerada uma 
limitação à efetividade dos direitos sociais, só é aplicável aos direitos que estão fora do que 
ele denomina “mínimo vital”, equivalente ao mínimo existencial: 
Em conclusão, concatenando-se análise do direito positivo brasileiro aos 
pressupostos de realidade aos quais é aplicado, temos que a teoria da reserva 
do possível – em regra, evocada como argumento fazendário para objetar a 
realização de direitos essenciais à dignidade – é de aplicação excepcional, 
circunscrita a discussões atinentes à realização de direitos sociais que 
extrapolem o conceito de mínimo vital e que não estejam incorporadas por 
normas constitucionais atributivas de direitos públicos a seus destinatários 38 
Dirley da Cunha Junior, por sua vez, não admite que a efetividade dos direitos sociais 
fique condicionada à reserva do possível, haja vista o fato de essa construção teórica ter se 
 
37 OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos Fundamentais Sociais. Efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: 
Juruá, 2008, p. 326 
38 A Cidadania Social na Constituição de 1988 – Estratégias de Positivação e Exigibilidade Judicial dos Direitos Sociais. 
São Paulo: Verbatim, 2009, p. 29. 
20 
 
originado na Alemanha, onde as condições sociais em nada se assemelham às vigentes na 
sociedade brasileira, que sofre de inúmeras carências. Afirma o autor que recursos públicos 
sempre haverá, e o papel do Poder Judiciário é de promover a justa distribuição deles, 
destinando-os principalmente ao atendimento das necessidades vitais do homem, 
proporcionando-lhe condições de existência dignas39. Analisando as ponderações feitas por 
esse doutrinador, discordamos de sua afirmação no sentido de que os direitos sociais não 
podem ficar condicionados à reserva do possível. 
Em nossa opinião, conforme demonstrado ao longo do presente trabalho, é possível, 
através da garantia do mínimo existencial, compatibilizar a efetividade dos direitos sociais com 
a teoria da reserva do possível. Assim, aquela porção de cada direito fundamental social 
imprescindível à dignidade da pessoa humana não pode sofrer condicionamentos. Porém, 
existem as parcelas de cada um desses direitos sociais que, embora contribuam para a 
melhoria da qualidade de vida do indivíduo, não são imprescindíveis à sua dignidade, não 
compondo, portanto, o que a doutrina denominou de mínimo existencial. A estes pode ser 
aplicada a teoria da reserva do possível, condicionando a sua exigibilidade à existência dos 
recursos financeiros públicos necessários à sua efetivação. 
Em outras palavras, o mínimo existencial constitui-se em limite à aplicação da reserva 
do possível, ao delimitar a porção do direito fundamental que não pode ser restringida, nem 
mesmo sob o fundamento da inexistência de recursos financeiros suficientes, por ser 
imprescindível à preservação da dignidade do titular do direito. 
É importante ressaltar que a própria delimitação do mínimo existencial deve ser feita em 
consonância com o princípio da proporcionalidade, de forma que esse conceito abranja 
somente os bens imprescindíveis à preservação da dignidade da pessoa humana, cuja 
proteção não possa ser mitigada em nenhuma hipótese. Em outras palavras, o conceito de 
mínimo existencial deve contemplar apenas os direitos que, quando em confronto com 
quaisquer outros, sejam considerados mais relevantes. 
Concluindo, pode-se dizer que o mínimo existencial impõe um limite à aplicação da 
reserva do possível como restrição aos direitos fundamentais sociais. Em outras palavras, 
exerce a função de parâmetro para avaliar se determinada restrição a direito social, imposta 
pelo Poder Público, sob o argumento da reserva do possível, observou ou não o princípio da 
proporcionalidade. 
 Julgamos oportuno finalizar a presente exposição com as palavras de Luís Fernando 
Sgarbossa40,que sintetizam a conclusão acima apresentada: 
Reputa-se aqui que o mínimo existencial desempenha um papel análogo ao 
legitimamente desempenhado pela reserva do possível, no âmbito do Estado 
Social constitucionalizado, mas em sentido oposto. Explica-se: se, por uma lado, 
a reserva do possível representa, em sua configuração original (i.e., conforme o 
teor originário do precedente BverfGE 33, 303) um limite máximo ou teto para o 
Estado Social, excluindo pretensões exageradas e irrazoáveis, conforme já visto, 
por outro lado, o mínimo existencial desempenha o papel de um patamar 
mínimo ou piso para o Estado Social, excluindo a omissão estatal que 
comprometa a existência digna da pessoa. 
REFERÊNCIAS 
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na constituição portuguesa. Coimbra: 
Almedina, 1987. In: TONIN, Marta Marília. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista 
Jurídica – Faculdade de Direito de Curitiba. Curitiba, ano 14, n. 12, 1998 
 
39 CUNHA JUNIOR, Dirley da. A efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais e a Reserva do Possível. Leituras 
Complementares de Direito Constitucional: Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. 3. ed., Salvador: 
Juspodivm, p. 349-395, 2008. Material da 4ª aula da disciplina Teoria

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