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JUDAS Roger Stronstdd INTRODUÇÃO 1. Autoria Jesus foi o filho primogênito de Maria e José, seu pai adotivo (Lc 2.7). Até o começo do seu ministério a família cresceu, incluindo quatro irmãos mais jovens e um número não específico de irmãs. Marcos identifica os quatro irmãos de Jesus como: Tiago, José, Judas e Simão (Mc 6.3), presumivelmente listando-os do mais velho ao mais novo. Nesta lista de irmãos de Jesus, Mateus inverte a ordem de dois irmãos mais novos (Mt 13.55). O autor da carta que traz o nome de Judas identifica-se como “Judas, servo de Je sus Cristo e irmão de Tiago”. Entre os diversos Judas do Novo Testamento, este é o único que pode ser um dos quatro irmãos mais novos de Jesus. Nos primeiros dias do ministério pú blico de Jesus, sua família não o aceitava como o Messias. Certo dia, depois que uma grande multidão havia se reunido em torno de Jesus, seus familiares vieram para levá- lo, alegando que Ele estava fora de si (Mc 3.21). Apesar de seus parentes não po derem aceitar a opinião de outros mem bros da família, logo depois disto, a mãe dejesus e seus irmãos também vieram buscá- lo (Mc 3-31,32). Mais tarde, não crendo nEle, seus irmãos escarneciam-no dizendo que subisse a Jerusalém, à Festa dos Tabemáculos, para que ali realizasse milagres e se mostrasse ao mundo (Jo 7.1-5). Porém antes do Dia de Pentecostes, após a Páscoa dos Judeus durante a qual Jesus foi crucificado, a situação mudou; além dos apóstolos, “Maria, mãe de Je sus e... seus irmãos” são contados entre os 120 cristãos que estão constantemente em oração (At 1.14). Mais tarde, escre vendo à Igreja em Corinto, Paulo dá uma explicação a respeito da transição da in credulidade dos irmãos (Jo7.5) para sua fé (At 1.14). Escrevendo sobre a mani festação da ressurreição de Jesus, ele declara: “Depois, foi visto por Tiago” (1 Co 15.7). O Novo Testamento se man tém, de um modo impressionante, silen cioso sobre se Jesus apareceu ou não a Judas e aos outros irmãos. Independen te dejesus ter ou não aparecido a eles, a realidade de sua ressurreição transformou Judas e seus irmãos em crentes. Com o passar do tempo, Tiago se tornou um proeminente líder na Igreja que estava emjerusalém (At 15.12-21; G11.19; 2.9). Em contraste, nem Judas nem seus ou tros dois irmãos, José e Simão, são iden tificados fora dos Evangelhos. Contudo, como os outros apóstolos e como Pedro, Judas e seus irmãos viajaram por causa do evangelho (1 Co 9-5). Neste contex to de um ministério difundido, Judas es creve sua carta. Eusébio relata a tradi ção encontrada em Hegesipo, que diz ter o imperador Domiciano (81-96 d.C.) mandado executar dois netos de Judas por serem descendentes de Davi (Eusébio, H istória Eclesiástica, 3-19-1)- 2. Data e Local onde a Carta Foi Escrita Em sua saudação, Judas não dá pistas a respeito da data ou lugar onde a carta foi escrita. Alguns deduzem uma data tardia, mesmo pós-apostólica, a partir de duas afirmações de Judas: (1) Ele escreve so bre a “fé que uma vez foi dada aos san tos” (v.3). (2) Conclama seus leitores a lembrarem-se das palavras que “foram preditas pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristò” (v. 17). Mas estas afirmações não implicam necessariamente em uma data posterior. A fé que estava confiada aos santos é a mensagem do evangelho que foi desde o início dada aos discípu los, e por intermédio deles aos seus con vertidos. Além disso, a profecia apostóli ca a respeito dos escarnecedores dos úl timos dias (w. 17,18) não implica nem que os apóstolos estejam mortos, nem que uma 1807 JUDAS era futura tenha se iniciado, pois eles ensinaram que com o derramamento do Espírito Santo no Pentecostes, os últimos dias já haviam chegado (At 2.17). O problema da imoralidade na Igreja, que é o assunto tratado por Judas em sua carta, não foi um problema desenvolvi do mais tarde. Surgiu tão cedo quanto a época em que Paulo escreveu às igrejas da Galácia e de Roma, e continuou a ser um problema até o final do primeiro sé culo (Ap 3.4). Com base nessas observa ções, podemos concluir que Judas deve ter escrito sua carta durante seu ministé rio ativo. Se 2 Pedro tomou algo empres tado de Judas, então Judas deve ter escri to esta carta algum tempo antes do mar tírio de Pedro em Roma, durante o reina do de Nero. Judas também não dá nenhuma infor mação direta sobre os destinatários, ou o lugar onde a carta foi escrita. Mas sua carta pertence ao ambiente do judaísmo. Na turalmente, mas não certamente, isto es tabelece o lugar da escrita como sendo algum ponto da Palestina. Porém sabe mos a partir da primeira carta de Paulo aos coríntios, que Judas (e os outros ir mãos de Jesus) viajou por todo o Impé rio Romano (1 Co 9-5). Portanto, esta carta pode ter sido escrita de qualquer parte do império que fosse consistente com a at mosfera judaica expressa na carta de Judas. Uma vez que há um relacionamento lite rário entre Judas e 2 Pedro, sua origem pode ser a própria Roma, com sua gran de e mesclada comunidade judaica e ju- daico-cristã. 3· Destinatários Judas endereça sua carta “aos chamados, queridos em Deus Pai e conservados por Jesus Cristo” (v .l). Estes cristãos chama dos queridos e conservados são uma comunidade, ou comunidades de judeus que se converteram ao cristianismo. Os destinatários podem ser os próprios moradores da Palestina ou de uma parte do mundo da Diáspora, onde os judeus tinham aceitado a Jesus como o seu Cris to ou Messias. O ambiente judaico-cris- tão da carta é evidenciado pelo fato de estar enraizada no Antigo Testamento, e tervalorizado os escritos pseudo-epigráficos. Assim como a comunidade carismática que foi estabelecida emjerusalém a par tir do Dia de Pentecostes (At. 2.1-6.7), os destinatários de Judas também são uma comunidade carismática. Os apóstolos que lhes falaram são profetas (Jd 17,18). Em contraste, os falsos mestres em seu meio “não têm o Espírito” (v. 19). Apesar desta acusação contra os falsos mestres, Judas conclui que os apóstolos têm o Espírito; isto é, são os verdadeiros profetas. Além disso, sem qualquer explicação mais detalhada, Judas instrui seus leitores a orarem “no Espírito Santo” (v.20). Não explica o que quer dizer com esta instrução, pois sabe que faz parte da vida carismática da comunidade à qual escreve. 4. Ocasião e Propósito Entre a ocasião em que Judas primeira mente considerou escrever para o seu povo, e a época em que na verdade escreveu, toma conhecimento de que “se introdu ziram [secretamente] alguns... homens ímpios” (v.4). Judas identifica estes ho mens como “adormecidos” (v.8), uma palavra comumente empregada para pro fetas carismáticos (At 2.17; Jl 2.28). Pró ximo ao final de sua carta, Judas também observa que eles “não têm o Espírito” (v. 19). Estes indivíduos, então, são provavelmente (falsos) profetas itinerantes, que vieram aos destinatários da carta de Judas. Quaisquer que sejam suas alegações a fim de vali dar seus ministérios, fica evidente que são falsos profetas pelas observações de que “convertem em dissolução a graça de Deus e negam a Deus, único dominador e Se nhor nosso, Jesus Cristo” (v.4b). Assim, como os falsos mestres ou falsos profe tas de 2 Pedro, defendem uma libertina gem moral, que é nada menos do que uma negação moral dejesus. Neste contexto Judas escreve com três propósitos: (1) De um lado, os seus lei tores estão lutando pela fé que uma vez lhes foi entregue (v. 3) pelos verdadeiros profetas, os apóstolos (v.17). Por outro lado, devem rejeitar a “nova” revelação- sonho dos falsos profetas. (2) Judas tam JUDAS 1-2 bém pede aos seus leitores que perseve- rem na caminhada cristã (w . 17-21) e (3) Finalmente, conclama seus leitores apre servar outros em misericórdia (w .22,23). ESBOÇO 1. Destinatários (w . 1,2) 2. AAdvertência com Exemplos (w.3-l6) 2.1. A Razão da Advertência - A Infiltração de Homens ímpios (w.3,4) 2.2. A Lembrança de Julgamentos Passados (w. 5-7) 2.2.1. A Destruição daqueles que não Creram (v.5) 2.2.2. O Julgamento Celestial (v.6) 2.2.3. O Julgamento Cívico (v.7) 2.3. O Primeiro Conjunto de Traços do Caráter (w.8-10) 2.3.1. O Contraste com a Submissão dos Anjos à Autoridade (w.8,9) 2.3.2. Uma Marca Registrada: A Rebelião (v. 10) 2.4. Protótipos do Antigo Testamento (v. 11) 2.5. O Segundo Conjunto de Traços do Caráter (w.12,13) 2.5.1. A Primeira Metáfora - As Promessas Quebradas (v. 12) 2.5.2. A Segunda Metáfora - A Instabilidade (v. 13) 2.6. A Certeza do Julgamento (w l4-l6) 3. A Chamada à Perseverança (w. 17-23) 3.1. A Conscientização da Situação Atual (w. 17-19) 3.2. Exortações a Perseverar (w.20,21) 3.3. Evangelizar com Misericórdia (w.22,23) 4. Doxologia (w. 24,25) COMENTÁRIO 1. Destinatários (w . 1,2) Judas inicia sua carta com um formato padrão para as cartas do primeiro século: reme tente, destinatário, e bênção (At 15.23; 1 Pe 1.1). Judas identifica-se como “servo de Jesus Cristo” e não como seu irmão. Alguns comentaristas acreditam que isto demonstre humildade de sua parte, en quanto outros pensam que Judas deseja levar a verdade de que sua ligação de parentesco com Cristo, como meio-irmão, de maneira nenhuma lhe conferiu a pri mazia ou alguma posição de destaque. Na verdade, contudo, ele está adotando um termo que Pedro, João e Paulo também usam para se identificar. As três identificações dos destinatári os são significativas com relação ao res tante da carta. Judas dirige-se a eles como: (1) aos “chamados”, (2) aos “queridos em Deus Pai”, e (3) aqueles que são “conser vados por Jesus Cristo”. O chamado de Deus é para toda a humanidade (1 Pe 2.9). Judas está se referindo aqui a um chama do para a salvação, e não a um chamado específico para o ministério. Começa com esta qualificação, para distinguir seus leitores daqueles que negam o senhorio de Cris to através de atos libertinos. A realidade de serem amados por Deus é a base de seu chamado. Não é fundamentado em alguma obra que tenham feito anterior mente; o amor e a misericórdia de Deus estabelecem seu chamado. Mais tarde, ele os advertirá a “conservarem-se no amor [caridade] de Deus” (v.21). Finalmente, os leitores de Judas recebem a proteção di vina de Cristo, a garantia da salvação; a maior segurança para os cristãos é que o próprio Senhor os está guardando (SI 121.7; 1 Pe 1.5). Judas segue seu endereçamento com uma saudação que é, de fato, uma bên ção: “A misericórdia, e a paz, e a cari dade vos sejam multiplicadas”. Esta é di ferente das bênçãos características de Paulo, “graça a vós e paz...” (Fp 1.2; Cl 1.2), e de Pedro, “graça e paz vos se jam multiplicadas...” (1 Pe 1.2, 2 Pe 1.2). Judas inicia sua saudação com a pala vra “misericórdia”. A misericórdia de Deus, tão grande e incomparável, perdoa os nossos pecados. Este é um termo sig nificativo para o autor, pois aparece três vezes ao final desta pequena carta. Começando e terminando sua carta desta maneira, Judas deseja que seus leitores reconheçam e administrem misericór dia do princípio ao fim. Até mesmo as passagens obscuras que falam sobre o 1809 JUDAS 3-7 juízo devem ser lidas através das lentes da misericórdia. “Paz”, no Novo Testamento, é muito mais do que simplesmente uma ausên cia de guerra. É uma condição estabelecida de relacionamento. Considerando que todos nós estávamos em inimizade com Deus (isto é, em oposição a Deus) antes da conversão, os cristãos estão agora em um relacionamento de paz (isto é, de bem- estar) com Ele. A ordem das palavras aqui é importante: a misericórdia precede a paz na conversão do pecador. “Amor” completa a tríplice saudação. Está ligado à marca identificadora conti da no verso 1, “qüeridos em Deus Pai”. O amor caracteriza o relacionamento de Deus com o cristão e a vida abundante que o cristão deve experimentar. Paz e amor, juntamente com a miseri córdia, são pronunciados “em abundân cia” ou “multiplicadas”, sobre os destina tários. A vida cristã demonstra a bonda de de Deus através destas três qualida des. Na verdade, William de Langland em Piers P low m an escreveu: “Mas toda a maldade que o homem possa fazer ou pensar no mundo não é, para a misericórdia de Deus, mais do que um pedaço de carvão em brasa no oceano”. 2. A Advertência com Exemplos (w . 3-16) 2.1. A R azão d a Advertência — A Infiltração de H om ens ím pios Çvv.3,4) Judas identifica os destinatários de sua carta como “queridos”. Isto é importan te, pois o tom da carta adquire uma se veridade que não é comum nas cartas do Novo Testamento. Judas torna os seus leitores conscientes de uma carta que planejou escrever-lhes, mas foi interrom pido devido à urgência da situação atu al. Deste modo, a carta sobre a salvação que compartilhavam nunca entrou no cânon, ao passo que a carta mais urgen te, que Judas sentiu que deveria enviar, entrou. As circunstâncias atuais garanti ram uma carta poderosa, sucinta e de advertência. À medida que a carta pro gride, o leitor começa a entender a ne cessidade de Judas pela urgência. Judas exorta seus leitores a “batalhar pela fé”. Não há nenhuma dúvida de que esta é a mesma salvação a que tinha se referido. Judas classifica esta fé através da frase: “Que uma vez foi dada aos santos”. Esta qualificação é de grande importân cia. Enfatiza dois elementos principais da fé cristã: (1) Não há nenhuma nova reve lação em termos de cânon (isto é, a reve lação foi dada de uma vez por todas); (2) esta fé tem sido confiada aos crentes. No verso 4, Judas claramente estabele ce a motivação que está por trás desta carta: “Porque se introduziram alguns... homens ímpios”. A exortação é severa e franca. O acesso disfarçado destes heréticos na co munhão cristã não diminui a verdade so bre quem são. Fica claro que a condena ção destes tem sido estabelecida há mui to tempo. Estes homens são chamados de “ímpios”, pois “convertem em dissolução a graça de Deus”. É precisamente o fato de promoverem a libertinagem que concomitantemente faz que neguem ajesus Cristo como Senhor. Desta maneira são semelhantes aos falsos mestres de 2 Pedro (veja os comentários sobre esta carta). Em contraste com os falsos mestres mencionados em 2 Pedro, no entanto, Judas tem duas diferenças notáveis: (1) Enquanto Pedro observa estes indivíduos desde o início como “falsos mestres”, Judas sim plesmente os qualifica como “alguns”. (2) A segunda carta de F’edro é um aviso contra aqueles que p od er iam entrar na comu nhão da verdadeira fé (2 Pe 2.1). Mas em Judas, a infiltração já havia começado. Este fato colabora para a urgência e a lingua gem direta da carta de Judas. 2.2. A Lem brança de Juleam entos Passados (w.5-7) 2.2.1. ADestruição daqueles que não C reram (v. 5). Agora Judas continua a provar, a partir dos precedentes históri cos, que Deus não permitirá que este atual tipo de imoralidade e subversão continue. Como Pedro em sua Segunda Epístola, Judas 1810 JUDAS 6-7 lembra seus leitores que agora conhecem os seus ensinos (isto é, sobre a fé que de uma vez por todas lhes foi dada). À luz da grande salvação divina de Israel da escravidão do Egito, os leitores devem ter em mente que tal libertação não é uma garantia de segurança eterna. Na verda de, as pessoas que foram libertas (isto é, redimidas) da escravidão do Egito pelo poder de Deus, foram destruídas no de serto por sua incredulidade. Judas está claramente usando este exemplo para exortar seus leitoresde que, mesmo que certas pessoas tenham declarado sua fé em Cristo, se um estilo de vida contínuo de fé não estiver presente, a realidade do julgamento é iminente. Esta é a primeira prova das Escrituras. 2 .2 .2 .0 Julgam ento Celestial (v .6). Judas passa agora de sua segunda prova da história da salvação dos judeus, para o julgamento celestial dos anjos desobe dientes. Como em 2 Pedro, Judas se refe re ao conteúdo de 1 Enoque e a partes do Antigo Testamento para reforçar os seus exemplos. Talvez o uso que Judas faz do julgamento dos anjos tivesse o objetivo de demonstrar a imparcialidade dos atos justos de Deus. Certamente, se Deus não poupou aos anjos, que foram criados um pouco maiores que a raça humana, que oportunidade as pessoas terão se persis tirem no pecado e na incredulidade? Este assunto, no entanto, é mais pro fundo. Judas pesquisa a respeito deste motivo. Estes anjos “deixaram a sua pró pria habitação”, ou seja, “não mantiveram sua posição de autoridade”. Isto é importante, pois esta prova do precedente histórico demonstra um julgamento devido à rebelião. Os anjos rebeldes que Judas tem em mente não estavam contentes em permanecer na ordem ou domínio para os quais Deus os havia ordenado. Este conceito será desenvolvido com mais detalhes na pas sagem em que Judas se refere especifi camente à disputa entre Miguel e Sata nás (v.9). Estes anjos estão reservados na escuridão, esperando o julgamento do último dia. Observe que o método de restrição aos anjos é “na escuridão e em prisões eternas até ao juízo daquele grande Dia”. Judas quer mostrar aos seus leito res a gravidade do pecado da rebelião e da libertinagem. 2.2.3. OJulgamento Cívico (v.7). Judas une esta terceira prova das Escrituras ao julgamento dos anjos através da frase: “Assim como”. A ligação tem duas explicações possíveis: 1) A ligação pode ser de causa. Isto é, assim como “Sodoma, e Gomorra, e as cidades circunvizinhas” foram punidas por suas perversões e imoralidades, assim também os anjos foram mantidos em prisões. Se esta explicação estiver correta o pecado dos anjos pode ser a união sexual com as mulheres humanas (Gn 6.1-4). Esta explicação tem algum valor apesar do crescente conheci mento de Gênesis que parece interpretar “filhos de Deus” em Gênesis 6, não como seres angelicais, mas como uma linhagem de Sete. 2) A ligação entre os anjos rebeldes e Sodoma e Gomorra talvez seja melhor expressa pelo fato de ambas serem citadas como exemplos de punição pelo pecado e pela incredu lidade, com a violação específica da pu reza sexual citada no caso das cidades da planície. A ligação para os três exemplos é que cada um trata com a desobediên cia e a falta de fé. Além disso, cada um trata do julgamento inevitável que acon tece como resultado do pecado, com três pecados diferentes sendo listados: deso bediência, rebelião e imoralidade sexu al. Observe abaixo a lista de exemplos de precedentes históricos, julgamento e ra zão para o julgamento: Exemplo Julgamento Razão Libertação do Egito Destruição daqueles que não creram Incredulidade Anjos Trevas/ mantidos em cadeias Rebelião Sodoma e Gomorra Fogo eterno Imoralidade sexual/ perversão Com estes três exemplos, Judas agora começa a mostrar as semelhanças alarmantes do problema contemporâneo que seus leitores estão enfrentando. JUDAS 8-11 2.3· O Prim eiro Conjunto de Traços do Caráter (w . 8-10) 2 .3 .1 .0 Contraste com a Submissão dos Anjos à Autoridade (w .8 ,9 ). A chave para se entender os versos 8-10 está liga da à palavra “semelhantemente”. Isto as sinala o propósito de Judas para as três ilustrações que acaba de citar. Agora muda de “alguns” para “adormecidos” (isto é, profetas autoproclamados: veja na Intro dução o tópico “Ocasião e Propósito”). Estes homens têm três traços de caráter dominantes: Luxúria (“contaminam a sua carne”), rebelião (“rejeitam a dominação”) e irreverência (“vituperam as autoridades”) . Observe na lista abaixo como estes três traços de caráter estão em paralelo com aqueles exemplos de exortação sobre o julgamento. Razão (histórica) Incredulidade Rebelião Imoralidade Acusação (contemporânea) Rejeição de autoridade Difamação de seres celestiais Contaminação de sexual / perversão seus próprios corpos uso que Judas faz deste texto mostra que nem mesmo um arcanjo é autônomo,Isto é um contraste com aqueles anjos que agiram independentemente quando “não guardaram o seu principado, mas deixaram a sua própria habitação” (v.6). Os dois exemplos são dados para ilustrar os atos que são por natureza autônomos em relação à ordem estabelecida por Deus. Para re lacionar isto ao presente, Judas nos dá um rigoroso contraste; estes homens que falam abusivamente contra o que não entendem são completamente opostos à dependência de Deus, a quem profes sam servir. 2.3 .2 . Uma M arca Registrada: A Re belião (v .10). Como em 2 Pedro, Judas refere-se a estes indivíduos como “animais irracionais”. A marca registrada destes homens ímpios é seu desdém em relação à autoridade, isto é, agem de modo autô nomo. Toda igreja, toda instituição reli giosa, na verdade toda família, está pe nosamente ciente desta triste verdade: os problemas se originam do desprezo à autoridade. De fato, após constantes abusos, estes indivíduos não são mais humanos, porém animais — criaturas dirigidas pelo instinto. Para muitos, estes traços de caráter são bem familiares nos círculos de al gumas igrejas “modernas” em nossos dias. Basta olharmos para algumas das “tra palhadas” destes tele-evangelistas que pisam duramente na cabeça de Satanás, ou fingem competir com este em fren te às câmeras, para sermos surpreendi dos de quão perto chegamos do para lelo da descrição que Judas faz daque les que moralmente negam o senhorio de Cristo. Para mostrar o extremo a que estes in divíduos têm chegado, Judas cita que mesmo os anjos de mais elevada posi ção nunca entraram em uma disputa irreverente com Satanás (v.9). A referência de Judas à disputa entre Miguel e Sata nás pelo corpo de Moisés origina-se do livro apócrifo Assunção de Moisés- (cf. Testamento de Moisés). Mas este não é o significado completo da ilustração. O 2.4. Protótipos do Antigo Testamento (v. 11). Judas novamente usa um exemplo triplo de como estes homens pecadores têm agido. Na primeira tríade (w .5-7), es tabeleceu o fato irrevogável do julga mento sobre o pecado. Na tríade atual, Judas expõe a natureza do pecado de les. Observe na tabela a seguir como Judas habilmente escreveu o seu argumento a partir dos precedentes históricos. Cada tríade de exemplos está edificada sobre a anterior. Começa por uma maldição mencionada no Novo Testamento: “Ai deles”. De fato, assim como o Senhor pronunciou o julgamento para os escribas e fariseus incrédulos, Judas pronuncia a mesma maldição para estes homens maus. É aqui que Judas se alinha com a avaliação de Pedro destes homens como “falsos mestres”. Por esta razão, a seve- 1812 JUDAS 12-13 ridade do julgamento é ainda maior. Explica as ações deles através da prova das Escrituras: Exemplos Caim Corá (ou Coré) Balaão 1) “Entrarampelo caminho de Caim”. Caimfoi o primeiro homicida (Gn 4.1-9). Mais do que isto, foi invejoso e fugiu de qualquer res ponsabilidade por seu irmão, e, assim, re jeitou a lei natural de Deus contra o homi cídio. De acordo com Hebreus 11.4, Caim serve como exemplo de um homem sem fé. No caso dos falsos mestres, seguir o caminho de Caim implica em homicídio espiritual. Isto significa que eles mesmos não se con sideram responsáveis pelos atos de seus ir mãos. Na verdade, definitivamente, nâoexiste amor nesteshomens. 2) “Foram levados pelo engano do prêmio de Balaão”. Como em 2 Pedro, Judas usa os pecados de Balaão como exemplo do que estes homens são. Balaão foi um fal so profeta e um paradigma de falso mes tre, o que mostra o modus operandi dos sonhadores contemporâneos e dos falsos profetas. A referência explícita ao “prêmio de Balaão” aqui em Judas, e ao “prêmio da injustiça” em Pedro 2.15 (também em Ap 2.14) dão a idéia de atos motivados por ganância. O pecado de Balaão foi tão grave quanto o daqueles homens — o sincretismo. Isto é o que o torna tão sedutor, e por esta razão se introduziram sem serem notados. A ostensiva heresia poderia ter sido imedi atamente detectada. Mas estes homens penetraram secretamente na comunhão, e, de modo sedutor, espalharam seu sin cretismo licencioso oferecendo um cris tianismo que, na verdade, não é cristia nismo. A referência a Balaão vem de Nú meros 25, onde induziu os filhos de Isra el ao sincretismo (isto é, à união da ado ração a Jeová com a adoração a Baal). A Razão (histórica) Descrença Revolta Acusação (contemporânea) Rejeição à autoridade Difamação de seres celestiais Imoralidade sexual/ perversão/ próprios corpos Contaminação de seus porta de entrada ao sincretismo foi a “imo ralidade sexual” entre os homens de Is rael e as mulheres moabitas (Nm 25.1). Deste modo, os falsos mestres, movidos pela ganância, inclinaram-se aos erros de Balaão, introduzindo uma negação mo ral do senhorio de Cristo, enquanto ain da mantinham uma aparente ortodoxia. 3) “Pereceram na contradição de Corá”. Aqui está o ponto crucial da prova das Escritu ras quanto aos atos pecaminosos destes homens. O nome Corá é sinônimo de re volta contra a liderança nomeada e ungida (Nm 16.1 e seguintes). Este traço de cará ter se une à segunda tríade de ilustrações. Assim como Corá desejou ser independente dos líderes israelitas divinamente nomea dos, estes homens também desdenham dos seres celestiais que não agem de maneira autônoma. 2.5. O Segundo Conjunto de Traços do Carãter (w . 12,13) Judas então passa novamente a carac terizar os falsos mestres, desta vez usan do uma linguagem mais intensa e seve ra. Ao invés de alimentar o rebanho de Deus com a verdade, estes indivíduos, em sua ganância, alimentam-se a si mesmos (Ez 34.2). Como em 2 Pedro, Judas usa figuras médicas para estes homens: “Man chas em vossas festas de caridade” (v.12). Isto é, são máculas naqueles que vivem retamente. O sentido mais profundo de ko in on ia (“comunhão”) é a refeição co mum entre os crentes, uma festa de cari dade, ou banquete de amor. Judas enfatiza que estes indivíduos participam desta festa sem qualquer sentimento de consciência que os possa condenar. Estão ali por si próprios, alimentando-se a si mesmos. 2.5.1. A Prim eira M etáfora-A s Pro m essas Q uebradas (v .1 2 ). Judas traz então uma cadeia de metáforas relaci onadas. O primeiro par contém metá foras de promessas não cumpridas. As nuvens e as árvores de outono são me taforicamente usadas para transmitir a promessa. O lavrador olha para as nu vens esperando a chuva; o semeador olha 1813 JUDAS 14-23 para as árvores no outono esperando os frutos. No entanto, estas nuvens es tão sem chuvas, e estas árvores, sem frutos. Na verdade, estas árvores estão desar- raigadas — duplamente mortas — an tes de mais nada, estão mortas por não terem dado os frutos esperados; então, sendo desarraigadas, morrem desde a raiz. Isto é uma figura de promessa não cumprida; assim também estes homens são cheios de promessas vãs e vazias. 2.5.2. A Segunda M etáfora— Alns- tabilldade (v .13). O segundo par con tém metáforas de instabilidade. Ondas bravias do mar são instáveis para os ma rinheiros. Do mesmo modo, um marinheiro que delineia o seu curso por estrelas er rantes, com certeza perde-se no mar. Assim, estes homens são instáveis; os verdadei ros cristãos não podem colocar sua con fiança ou fé neles, pois, como estrelas errantes, desviarão a outros. 2.6. A Certeza do Ju lgam ento (vv. 14-16) Judas conclui esta parte dos traços do caráter dos falsos mestres, mostrando a inevitabilidade do julgamento. Isto é in teressante, pois Judas usa Enoque como seu modelo; diferentemente dos anjos que deixaram seu primeiro estado, Enoque, que foi trasladado por Deus por causa de sua fé (Gn 5.21-24), profetiza sobre a volta do Senhor com seus anjos para o julga mento. Judas está aqui citando o livro apócrifo de 1 Enoque. O objetivo desta citação é óbvio: o Senhor está voltando para julgar os infiéis. No verso 16, Judas oferece um conjunto final dos traços do caráter dos incrédu los, antes de retomar aos seus leitores cristãos. Afigura principal a respeito destes homens é que são descontentes. Sempre murmu rando e reclamando, nunca estão contentes. Assim, “as suas concupiscências” são a origem desta queixa. Com grande orgu lho envaidecem-se, enquanto lisonjeiam a outros apenas por interesses pessoais. Mais uma vez, é aterrorizador perceber que pessoas como estas estão presentes no círculo da Igreja de nossos dias. 3. A Chamada à Perseverança (w . 17-23) 3.1■ A C onscientização d a Situação Atual (vv. 17-19) Judas traz agora o círculo completo da carta. Mais uma vez, enfoca seus leitores como seus “amados”. Como em 2 Pedro, conclama-os a lembrarem-se das palavras que lhes “foram preditas pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo”. Na verda de, estes homens subversivos não deve riam ter passado desapercebidos pelos cristãos, pois sua presença na Igreja tinha sido predita pelos apóstolos (veja espe cialmente 2Tm 4.1; 2 Pe 3-3)· Infelizmente, a presença deles é um sinal “do último tempo”. É importante notar que Judas contrasta esses homens com os cristãos, destacando que “não têm o Espírito”. 3.2. Exortações a Perseverar (w.20,21) Judas contrasta as exortações que profere a seus amigos com a exposição dos ho mens incrédulos: Comunidade cristã Seus membros edificam-se em sua santíssima fé Oram no Espírito Santo Mantêm-se no amor de Deus Falsos mestres São homens que os dividem com heresias Não têm o Espírito Têm uma mente mundana Esta “santíssima fé” é a mesma fé com que Judas começa sua carta, exortando seus leitores a batalharem “pela fé que uma vez foi dada aos santos”. Então, acrescenta: “Orando no Espírito Santo”. Certamente estas palavras ecoam o conceito de Pau lo, de orar no Espírito (Ef 6.19). Judas não menciona explicitamente se está se refe rindo à glossolalia, ou a uma oração no Espírito, na língua nativa da pessoa. Contado, a ação do Espírito Santo é explícita. Judas prossegue, dando mais dois mandamen tos: “Conservai a vós mesmos na carida de de Deus”, e esperai pela “misericór dia de nosso Senhorjesus Cristo”. Observe 1814 JUDAS 24-25 novamente aqui o tema predominante da misericórdia e do amor (veja comentári os sobre o v. 2), Observe também a fór mula trinitária de Judas: Deus o Pai: Permaneçam no amor de Deus. Jesus Cristo: Esperem pacientemente o retomo de Cristo. Espírito Santo: Orem no Espírito, como o agente efetivo. 3-3 · Evangelizar com M isericórdia (vv.22,23) Os verdadeiros cristãos não devem somente esperar pela misericórdia do Senhor, mas devem também exercitar a misericórdia para com os outros. O cris tão deve acolher os duvidosos e os céti cos com misericórdia. Provavelmente Judas se recorde da reação misericordiosa do Senhor para com a dúvida de Tomé. De qualquer maneira, conclama os cristãos a serem misericordiosos com aqueles que estão em dúvida. Alguns, no entanto, não estão somente duvidosos; já estão no fogo. Certamente a referência de Judas ao fogo, nesta passagem,é figurada. Contudo, seu objetivo maior ainda é “salvá-los” de tal condenação eterna. Nos versos 22 e 23, a “misericórdia” é novamente citada como uma ferramenta para ganhar ou salvar estas pessoas. Judas faz alusão a Zacarias 3-1-7, onde as rou pas dejosué haviam sido manchadas. Aqui temos o testemunho bíblico para uma frase freqüentemente citada: “Ame os pecadores, odeie o pecado”. Devemos mesclar esta misericórdia “com temor”— temor de nossa própria vulnerabilidade e inclinação ao pecado. É somente pela misericórdia que os outros vêem a graça de Deus. 4. Doxologia (w .2 4 ,2 5 ) Judas finaliza sua carta com uma obser vação sobre esperança e certeza. A doxologia mostra como o cristão pode ter a certeza de sua salvação— é Deus quem nos guarda da queda. Na verdade, Deus deve ser louvado e exaltado por sua habilidade de guardar-nos de cair, e apresentar-nos em sua presença gloriosa sem máculas e com grande alegria. Tendo este conhecimen to, atribuímos a Deus, nosso Salvador, “glória e majestade, domínio e poder”. À luz desta verdade, podemos continuar a servi-lo até a sua volta. O ANTIGO TESTAMI:NTO NO NOVO ri:SI/\V1l;\TC) Μ ΛΙ ASM M O Ju d a s 9 Z acarias $ .2. A. re p re e n s ã o a S atan ás 1 8 1 5
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