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sobre o conceito de validade do direito

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CONCEITO E VALIDADE DO DIREITO: A POLÊMICA ENTRE ROBERT ALEXY E EUGENIO
BULYGIN SOBRE A PRETENSÃO DE CORREÇÃO DO DIREITO
CONCEPT AND VALIDITY OF LAW: THE DEBATE BETWEEN ROBERT ALEXY AND EUGENIO
BULYGIN ABOUT THE CLAIM OF CORRECTNESS IN LAW
Ilton Norberto Robl Filho
RESUMO
O artigo tem por objetivo enfrentar a polêmica entre Robert Alexy e Eugenio Bulygin sobre a relação
necessária entre direito e moral. Nesse debate, o tema da pretensão de correção do direito encontra-se no
centro da discussão. Desse modo, o artigo apresenta as principais ideais da filosofia do direito não positivista
de Alexy e sua vinculação com a moral correta, assim como as críticas formuladas por Bulygin acerca da
proposta jurídica do jusfilósofo alemão. Ao final, faz-se uma ponderação sobre a polêmica, observando que o
projeto Alexyano, estruturado na filosofia da linguagem, no pluralismo de valores e no discurso prático,
resiste aos ataques de Bulygin.
PALAVRAS-CHAVES: Direito, Moral, Não Positivismo, Alexy e Bulygin
ABSTRACT
The article has the purpose of analyze the polemic between Robert Alexy and Eugenio Bulygin about the
necessary nexus between law and morality. In this debate, the theme of claim of correctness in law is in the
center of the discussion. Thereby, the article shows the main ideas of the non positivist legal philosophy of
Alexy and the nexus with the correct morality as the Bulygin’s critics about Alexy’s legal concept. In the end,
is made an analysis about the polemic, showing that Alexy’s project, structured in the linguistic philosophy,
in pluralism of values and in the practical discourse, resists at Bulygin’s attacks.
KEYWORDS: Law, Morality, Non-Positivism, Alexy and Bulygin
 
1. Introdução
 
Na filosofia e na teoria do direito, um dos temas mais debatidos é a superação do positivismo
jurídico. Em verdade, das teses defendidas pelo juspositivismo, busca-se principalmente suplantar a
concepção de que inexiste uma relação necessária entre moral correta e direito, entre justiça e direito.
 Nesse importante debate contemporâneo, a obra de Robert Alexy possui um relevo especial. Em
verdade, o referido filósofo do direito alemão, em seus inúmeros artigos e livros, apresenta argumentos no
sentido de comprovar a existência de uma relação necessária entre moral correta e direito.
 Por óbvio, a defesa dessa vinculação necessária sofreu um conjunto substancial de críticas, em
virtude, entre outras razões, i) da complexidade do fenômeno jurídico, em especial na segunda metade do
século XX e no início do século XXI, ii) dos inúmeros conceitos e funções do direito, iii) das incontáveis
versões da racionalidade moral e iv) das várias propostas de relações entre direito e moral.
 Um conjunto feroz de críticas ao conceito de direito de Alexy foi formulado por Eugênio Bulygin,
prestigiado jusfilósofo da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires. A principal objeção de
Bulygin à tese alexyana da vinculação entre direito e moral encontra-se no conceito de pretensão de
correção.
 Desse modo, este artigo, na seção 2, desenvolverá a concepção de direito de Robert Alexy. Em razão
i) da relevância da sua proposta de pretensão de correção como elemento necessário do direito e responsável
pela relação entre direito e moral correta e ii) da crítica de Bulygin a esse conceito, no item 3 será
apresentada à pretensão de correção, na perspectiva do participante, conforme a formulação trazida na teoria
do discurso alexyana.
 A seção 4, por sua vez, será dedicada à polêmica Alexy-Bulygin, composta por uma série de artigos
desses autores sobre a tese da vinculação necessária entre direito e moral. Por fim, serão desenvolvidas, no
item 5, a título de conclusão, algumas ponderações acerca da concepção de direito de Robert Alexy e da
referida polêmica.
 
2. Conceito de Direito em Robert Alexy: uma Visão não Positivista do Fenômeno Jurídico.
 
 A principal obra de Robert Alexy que desenvolve de maneira ampla o seu conceito de direito é o
livro “Conceito e Validade do Direito” (Alexy, 2009). Corretamente, logo no início desse texto, o jusfilósofo
alemão assevera que a palavra direito possui inúmeros significados. Desse modo, ocorrem muitas polêmicas
sobre a concepção de direito em razão de questões semânticas, isto é, as características do fenômeno jurídico
são definidas de maneira bastante diferente por inúmeros teóricos.
 Assim sendo, Alexy deixa claro que seu conceito de direito necessariamente pressupõe o conceito de
validade (Alexy, 2009, p. 33). Em verdade, sua concepção do fenômeno jurídico inclui a compreensão da
validade social (existência de eficácia social), validade moral (existência e cumprimento da pretensão de
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 5563
correção) e validade jurídica em sentido estrito (conformidade com a autoridade jurídica).
 Ainda, sua teoria pressupõe a possibilidade da análise do direito por meio de diversas dicotomias,
sendo essas perspectivas: i) sistemas normativos jurídicos e sistemas de procedimentos jurídicos, ii)
perspectiva do observador e perspectiva do participante, iii) conexões classificatórias e conexões
qualificadoras e iv) contexto conceitualmente necessário e contexto normativamente necessário.
 No que se refere ao item i, são sistemas de procedimentos jurídicos aqueles ordenamentos que
instituem um conjunto de regras para a criação de normas, interpretação e aplicação. De outro lado,
constituem-se em sistemas normativos jurídicos aqueles que se preocupam em especial com o resultado da
utilização dos procedimentos jurídicos (Alexy, 2009, p. 29-30). Apesar de o conceito de direito desenvolvido
por Alexy ser relacionado com a concepção de sistema de procedimentos, em virtude da sua teoria da
argumentação jurídica e do seu caráter procedimental, em momento nenhum o jusfilósofo alemão
desconsidera o resultado da aplicação das regras da argumentação jurídica.
 Adota, no item ii, a proposta de Hart para compreensão do fenômeno jurídico, definindo perspectiva
do participante como aquela do partícipe do discurso racional jurídico (juízes, advogados, operadores do
direito e cidadãos) e perspectiva do participante como a visão de alguém que não realiza o discurso racional
jurídico e preocupa-se, de outro lado, em compreender o resultado dessa prática argumentativa (Alexy,
2009, p. 30-31).[1]
Existe, desse modo, uma profunda relação entre a perspectiva do participante e os sistemas de
procedimentos normativos e, no outro extremo, uma conexão entre a perspectiva do observador e os
sistemas normativos jurídicos. A diferença entre as referidas perspectivas é fundamental na análise da
pretensão de correção e suas consequências jurídicas, conforme se verá neste artigo.
 A dicotomia iii entre conexões classificadoras e conexões qualificadoras, também essencial na sua
análise das relações entre direito e moral e da pretensão de correção, afirma que, naquelas relações, quando
não há satisfação de determinados critérios morais as normas e os sistemas perdem sua característica jurídica.
De outro lado, se as normas e os sistemas jurídicos não satisfazem as conexões qualificadoras, apesar de não
perderem o caráter jurídico, possuem um defeito jurídico (Alexy, 2009, p. 31-32).
 Por fim, acerca do contexto conceitualmente necessário e do contexto normativamente necessário
(item iv), o primeiro afirma que há uma relação analítica e conceitualmente necessária entre direito e moral e
o segundo assevera que a conexão necessária entre direito e moral é a que alcança determinado objetivo,
como segurança jurídica ou que melhor resolve o problema da injustiça legal (Alexy, 2009, p. 25-26).
 Feitas essasrelevantes explicitações sobre o ferramental teórico utilizado para a compreensão do
fenômeno jurídico, pode-se voltar para a questão do conceito de direito.
 Alexy defende uma concepção de direito que postula uma relação necessária entre o direito e uma
moral correta no aspecto conceitual. Sendo assim, ele afasta-se da visão positivista[2] que defende inexistir a
referida concepção. Em outras palavras, o jusfilósofo alemão assevera que a validade do fenômeno jurídico
não é apenas composta da validade social e da validade jurídica em sentido estrito, pois o aspecto moral
(validade moral) também compõe esse critério.
 Observa-se que, assim como os positivistas jurídicos, a teoria não positivista de Alexy valoriza as
validades social e jurídica em sentido estrito. Desse modo, um sistema apenas é jurídico se possui,
globalmente, eficácia social (é observado pelos destinatários das normas e a não observância é punida) e, no
que diz respeito às normas individuais, elas somente adquirem validade jurídica em sentido amplo se forem
dotadas de um mínimo de eficácia ou da possibilidade de eficácia (Alexy, 2009, p. 105-108).
 Também, o conceito amplo de validade jurídica pressupõe a existência de validade jurídica em
sentido estrito, isto é, “uma norma é juridicamente válida se foi promulgada por um órgão competente para
tanto, segundo a forma prevista, e se não infringe um direito superior; resumindo: se foi estabelecida
conforme o ordenamento” (Alexy, 2009, p. 104). Portanto, a grade polêmica entre positivistas e a proposta
não positivista de Alexy encontra-se na incorporação da validade moral no conceito amplo de validade
jurídica.[3]
 A análise da relação entre direito e moral é trabalhada por Alexy com o auxílio dos pontos de vista
(perspectiva) do observador e do participante. Na leitura do jusfilósofo alemão, quando o observador analisa
apenas uma norma do sistema jurídico, não é relevante se a norma é justa (possui pretensão de correção) ou
não, pois ele visualiza principalmente a eficácia social.
 De outro lado, na compreensão dos sistemas jurídicos de maneira global, a questão da correção do
direito ganha relevo no ponto de vista externo. O exemplo trazido por Alexy versa sobre um sistema de
normas postas por bandoleiros e um sistema jurídico de dominadores. Se, de um lado, ambos os sistemas são
compostos por normas gerais, que garantem um mínimo de proteção à vida humana, à liberdade e à
propriedade privada, de outro lado, apenas o sistema dos dominadores é jurídico por formular a pretensão de
correção.
O ordenamento dos bandoleiros não formula qualquer pretensão de correção por admitir que o
sistema serve apenas para a opressão da maioria em prol da minoria. Já o sistema dos dominadores é jurídico
por mais que faticamente, em linhas gerais, possua como finalidade manter a opressão de alguns sobre
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muitos, pois afirma que o ordenamento almeja um fim superior como o desenvolvimento do povo, ou seja,
ocorreu a formulação de uma pretensão de correção (Alexy, 2009, p. 37-42).
 Desse modo, por mais que se analise o direito pela perspectiva do observador, mesmo assim se
constata a existência de uma relação necessária entre direito e moral correta. Essa relação é comprovada no
sistema jurídico como um todo e não na observação de uma norma individual, tratando-se de uma conexão
necessária classificatória, isto é, apenas é um sistema jurídico se um determinado ordenamento formula a
pretensão de correção.
 A vinculação entre direito e moral correta torna-se mais clara na perspectiva do participante. Nesse
ponto de vista pode entender-se na completude a tese defendida por Alexy, que assim é sintetizada:
O argumento da correção constitui a base dos outros dois argumentos, ou seja, o da
injustiça e o dos princípios. Ele afirma que tanto as normas e decisões jurídicas
individuais quanto os sistemas jurídicos como um todo formulam necessariamente a
pretensão à correção. Sistemas normativos que não formulam explícita ou implicitamente
essa pretensão não são sistemas jurídicos. Nesse sentido, a pretensão à correção tem uma
relevância classificadora. Do ponto de vista jurídico, sistemas que formulam essa
pretensão mas não a satisfazem são defeituosos. Nesse aspecto, a pretensão à correção
tem uma relevância qualificadora. Cabe a ela uma relevância exclusivamente
qualificadora quando se trata de normas jurídicas e de decisões jurídicas individuais. São
juridicamente defeituosas quando não formulam ou não satisfazem a pretensão à correção
(Alexy, 2009, p. 43).
 
 A apresentação das conexões necessárias entre direito e moral correta por meio da pretensão de
correção necessitam ser desenvolvidas, na perspectiva do participante, através i) da explicitação sobre a
relação entre pretensão de correção e justiça ou justiça como correção, ii) da tese do fenônemo jurídico ser
um discurso racional prático especial, iii) do argumento da injustiça extrema e iv) do argumento dos
princípios.
 
3. Pretensão de Correção Jurídica e Perspectiva do Participante
 
 A pretensão de correção, necessariamente, compreende uma pretensão de justiça (Alexy, 2001a,
p.114). Em verdade, para se entender a pretensão de correção jurídica é essencial analisar a questão da
justiça no pensamento de Alexy. Desse modo, uma importante chave de leitura para apreender essa relação
encontra-se no artigo “Justicia como Correción” (Alexy, 2003).
 Seguindo a proposta ética de Aristóteles[4] e São Tomás de Aquino no campo da justiça, o
jusfilósofo alemão assevera que o objeto da justiça é a distribuição de bens e honras e a compensação dos
danos (Alexy, 2003, p. 163). Desse modo, a justiça não compreende todo o projeto moral, e sim apenas as
questões que envolvem a distribuição e a compensação.
 A justiça é dividida em distributiva e em comutativa, aquela é composta por um sujeito que distribuiu
bens e honras para um conjunto de pessoas e esta é composta por três relações: i) ilícito e pena, ii) dano e
reparação (compensação) e iii) prestação e contraprestação (Alexy, 2003, p. 161).[5]
 A justiça não pode ser definida como qualquer forma de distribuição ou compensação, pois
representa uma maneira correta de realizar essas ações. Se a justiça implica necessariamente correção, as
distribuições e reparações necessitam ser justificadas e fundamentadas por meio de razões (Alexy, 2003, p.
163). Desse modo, a pretensão de uma justiça correta precisa da teoria do discurso para ser produzida,
justificada e fundamentada.[6]
 Nesse sentido, o jusfilósofo alemão demonstra como a fundamentação de normas morais pressupõe a
utilização de um discurso racional que se encontra para além das formulações das correntes emotivistas,
subjetivistas e relativistas,[7] de um lado, e das propostas racionalistas, objetivistas e absolutivistas, de outro
lado.
 As primeiras não compreendem que os juízos morais propõem um juízo de correção, porque
classificam as normas morais somente como decisões subjetivas e, muitas vezes, irracionais. As segundas
relacionam de maneira muito profunda os juízos morais com as estruturas dos juízos de fatos, sendo tal
conexão inadequada em virtude de não conceder o devido valor aos interesses dos sujeitos, às tradições e à
cultura. A teoria do discurso supera as falhas das referidas concepções por demonstrar que as normas morais
formulam a pretensão de correção e que se encontram abertas para os interesses e as tradições (Alexy, 2003,
p. 164).
 Para a realização desses fins, a teoria discursiva no âmbito argumentativo prático geral[8] incorpora
um conjunto substancial de regras que impõem umprocedimento específico na formulação de juízos
morais.[9] Sendo assim, trata-se de uma teoria procedimental, a qual assegura após o cumprimento de regras
discursivas, que as normas morais são corretas e justas. Entre essas regras, encontram-se “a não contradição,
a universalidade (no sentido de um uso coerente dos predicados utilizados), a claridade lingüística e
conceitual, a verdade empírica, a atenção pelas implicações, a ponderação.”[10]
 Ainda, a teoria do discurso geral impõe a liberdade e a igualdade nas práticas discursivas
intersubjetivas. Sendo assim, todos os falantes podem participar do discurso, problematizando e inserindo
asserções, além de expressar suas emoções e opiniões nos discursos, [11] direitos que não podem ser
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violados mediante coerções interna ou externa à argumentação racional.
 Como se observa pela rápida apresentação do discurso prático geral, há uma grande carga de
idealização do processo de argumentação, isto é, as normas morais gerais serão justas e corretas caso
cumpram as regras postas por um procedimento ideal. Em verdade, essa noção necessita ser vista como um
ideal regulativo, pois quanto mais as normas forem postas em conformidade com esse procedimento, mais
corretas e justas elas serão.[12]
 Esse ideal regulativo necessita do direito para tornar esses procedimentos realidades na vida
cotidiana e estabelecer métodos de resolução de conflitos de interesses, de tradições e de ideologias em um
tempo razoável. Desse modo, o direito é fundamental para a institucionalização das regras do discurso geral
e assim procede por meio da Constituição, das leis e dos precedentes judiciais.
Também, em especial pela garantia dos direitos fundamentais, há o estabelecimento de um pluralismo
de ideias que permite a todos os cidadãos a expressão dos seus pontos de vista, interesses e concepções na
formulação de normas. Ainda, por meio da institucionalização da razão prática, o direito cria um mecanismo
racional de análise dos interesses, tradições, ideologias e pontos de vistas de indivíduos e grupos, analisando
se eles possuem ou não pretensão de correção ou de justiça (Alexy, 2003, p. 168).
Sendo assim, por meio da institucionalização da razão prática na seara jurídica, é possível garantir
que determinadas visões morais equivocadas não serão concretizadas socialmente em virtude das limitações
jurídicas. Deve-se frisar que o resultado da argumentação jurídica não criará a única resposta certa em
determinada questão, e sim uma resposta possível, dentre tantas outras, dotada de pretensão de correção e
de justiça.[13]
Pode-se dizer, dessa maneira, que há uma relação dialética entre moral e direito, porque, de um lado,
a pretensão de correção e de justiça do direito é influenciada e parcialmente determinada pelo discurso
prático geral (moral) e, de outro lado, a moral procedimental (discurso prático geral) necessita da
institucionalização jurídica para tornar mais concreto o ideal moral. Esse ideal moral não defende um
conjunto substancial de valores, e sim um procedimento pelo qual os valores, as tradições e a cultura de
determinadas pessoas ou grupos são analisados, observando se formulam a pretensão de correção e de
justiça. Em outras palavras, a moral procedimental, após a concretização de suas regras, evita a criação de
normas pautadas em um projeto moral não correto e fundamentável racionalmente e chancela uma, entre
diversas, normas corretas e justas para determinado assunto.
Feitas essas importantes ponderações, volta-se para a questão da pretensão de correção e justiça
jurídicas analisando as normas e os sistemas jurídicos. Por meio da perspectiva do observador, já foi visto
que um sistema não é jurídico se não formular a pretensão de correção. Pode-se adicionar a essa afirmação, a
seguinte: a não formulação causa a perda do caráter jurídico (conexão classificadora), já o não
cumprimento[14] dessa pretensão torna-o deficiente juridicamente (conexão qualificadora), mas não acarreta
a perda do caráter jurídico (Alexy, 2009, p. 43).
Observa-se que na perspectiva do participante dos discursos racionais, que o direito é fundamental
para a institucionalização dos procedimentos da razão prática e é essencial na solução dos conflitos e na
estabilização social. Desse modo, se um sistema formula a pretensão de correção e de justiça (como, por
exemplo: o bem comum), não se pode dizer que esse sistema não é jurídico se não cumpre cotidianamente
essa pretensão. Claro que há um grave defeito, que deve ser sanado, mas o não cumprimento apenas afirma
que o sistema é deficiente.
De outro lado, um sistema é composto por um número substancial de normas (leis e precedentes
judiciais). Caso essas normas pertençam a um sistema que formulou uma pretensão de correção nos termos
da teoria do discurso, o sistema é jurídico e, por consequência, as regras e princípios que se encontram nesse
ordenamento também o serão.
No entanto, caso uma lei ou um precedente seja extremamente injusto, nos termos da fórmula de
Radbruch,[15] essa norma perde o seu caráter jurídico, pois não é possível tolerar a injustiça extrema em
qualquer lei ou decisão (Alexy, 2009, p. 75). Dito em outras palavras, em razão da necessidade do direito na
institucionalização da razão prática e na solução de conflitos, as normas que se encontram em um sistema
que globalmente formula uma pretensão de correção e justiça serão válidas a não ser que concretizem uma
injustiça extrema.[16] Caso as normas não formulem a pretensão de correção e justiça, mas não sejam
absurdamente injustas, ou quando elas formularem, porém não cumprirem a pretensão, serão
necessariamente defeituosas no âmbito jurídico (conexão qualificadora), mas não perderão o caráter jurídico
(conexão classificadora).
Por fim, sobre as conexões necessárias entre direito e moral, por meio da perspectiva do participante,
há o relevante papel dos princípios. É amplamente aceita por positivistas e não positivistas a tese da textura
aberta do direito formulada por Hart.[17]
A textura aberta do direito é definida por Alexy como “o caráter vago da linguagem do direito, a
possibilidade de contradições entre as normas, a falta de uma norma na qual a decisão possa ser apoiada e a
possibilidade de decidir até mesmo contra o enunciado de uma norma em casos especiais (Alexy, 2009, p.
83-84).” Nesses momentos, os positivistas em geral defendem a tese de que o aplicador do direito pode agir
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de maneira discricionária com base em argumentos fora do direito. Outra é a visão do jusfilósofo alemão na
suas teorias da justiça e dos princípios.
Em primeiro lugar, deve-se compreender o que Alexy entende por princípios e sua diferença em
relação às regras. As regras estabelecem direitos e deveres definitivos, seu método de aplicação é a
subsunção e, quando há regras contraditórias, ou uma regra é invalidade ou deve existir uma cláusula de
exceção[18]. De outro lado, os princípios formulam direitos e deveres prima facie, o método de aplicação é
a ponderação e no caso de conflito prevalece aquele com mais peso no caso (Alexy, 2000, p. 295-298; 2009,
p. 85).[19]
Em relação aos princípios, o jusfilósofo alemão afirma que todo ordenamento jurídico com um grau
mínimo de desenvolvimento possui princípios jurídicos (tese da incorporação), os quais incorporam
conteúdos morais corretos em virtude da formulação da pretensão de correção e justiça do ordenamento
(tese da correção) (Alexy, 2009, p. 86-97). Desse modo, Alexy afirma que os conteúdos morais corretos são
incluídosno ordenamento jurídico necessariamente por meio dos princípios, que são substancialmente
dotados de razões (conteúdos morais) e possuem formalmente característica jurídica (Alexy, 2009, p. 92).
Com a compreensão i) da relação entre pretensão de correção e justiça ou justiça como correção, ii)
da tese do fenônemo jurídico ser um discurso racional prático especial, iii) do argumento da injustiça extrema
e iv) do argumento dos princípios, pode-se analisar alguns exemplos criados por Alexy para comprovar a
existência da pretensão do correção no direito e que são fundamentais na polêmica Alexy-Bulygin: “(1) X é
uma república soberana, federal e injusta (Alexy, 2009, p. 44)”, “(2) X é um Estado justo (Alexy, 2009, p.
45)”, “(3) O réu é condenado à prisão perpétua, o que é incorreto (Alexy, 2009, p. 46)” e “(4) O réu é
condenado à prisão perpétua em virtude de uma interpretação incorreta do direito vigente (Alexy, 2009, p.
46)”.
A norma jurídica (1), artigo de uma hipotética constituição, em que a minoria domina a maioria, mas
quer ser sincera e deixar claro que o modelo de Estado adotado é injusto, tem um defeito jurídico, não
formular a pretensão de correção e de justiça. Conforme visto, se uma norma jurídica não formula a
pretensão de correção ela é dotada de um defeito jurídico.
Em verdade, a pretensão de correção é uma formulação que se encontra implícita, na maior parte das
vezes, nas normas jurídicas. É algo que não precisa ser formulado explicitamente pelo sistema jurídico e
pelas normas jurídicas.
De outro lado, quando explicitamente ocorre uma não formulação da pretensão de correção, observa-
se um grande absurdo no sistema ou nas normas individuais. Esse absurdo torna patente que há uma
contradição entre a pretensão de correção jurídica que necessariamente deve ser formulada e a pretensão de
não correção formulada explicitamente. A contradição entre um enunciado implícito e outro explícito chama-
se contradição performativa (Alexy, 2009, p. 46-47).
Há dessa forma uma contradição performativa no enunciado (1) e um defeito jurídico, e não apenas
um defeito técnico, uma imperfeição moral ou um defeito convencional. Explica-se.
Uma inadequação é o que Alexy define por defeito técnico e, apesar de o artigo ser inadequado, essa
característica não dá conta da imperfeição existente em seu todo.[20] Ele propõe outro exemplo, um artigo
que busca alterar uma monarquia estabelecida que, em linhas gerais, tem como função a opressão da maioria
pela minoria, estabelecendo um Estado republicano. Nesse novo exemplo hipotético, mesmo a monarquia
sendo um elemento opressor, a maioria possui grande carinho pelo monarca e o estabelecimento de um
Estado republicano será inadequado.
Com essas novas digressões, Alexy afirma que nos dois exemplos há um defeito técnico, no entanto a
inclusão de uma clausula de injustiça é um absurdo, já a clausula republicana não o é (Alexy, 2009, p. 44).
Desse modo, essa explicação não consegue compreender o todo.
Outra análise possível é assinalar a ocorrência de uma imperfeição moral. Alexy formula um terceiro
exemplo. Remover o argumento da injustiça implícito no enunciado (1) e estabelecer um artigo que, em certa
medida, retire um conjunto de direitos de alguns cidadãos em virtude da raça. Manter-se-ia o problema
moral, mas na visão de Alexy o enunciado (1) ainda assim possui algo de diferente em relação a esse novo
exemplo (Alexy, 2009, p. 45).
Não é somente um defeito convencional, ou seja, a violação de uma prática difundida, no exemplo
(1), da redação constitucional. Segundo Alexy, o enunciado “(2) X é um Estado justo” teria um defeito
convencional, pois não é da convenção da elaboração da constituição prescrever a justiça do Estado. De
outro lado, enquanto o defeito (1) é um absurdo, o (2) é uma simples redundância, pois a pretensão de
correção implícita já determina a justiça, não necessitando de uma formulação explícita (Alexy, 2009, p. 45).
Desse modo, nas palavras de Alexy:
Assim, o que resta é apenas um defeito conceitual. Aqui, essa expressão é empregada
num sentindo amplo, que também se refere a infrações de regras constitutivas dos atos de
fala, ou seja, a expressões lingüísticas como ações. Ao ato de legislação constitucional
está necessariamente vinculada uma pretensão à correção, que, nesse caso, é sobretudo
uma pretensão à justiça. Um legislador constitucional incorre numa contradição
performativa quando o conteúdo de seu ato constitucional-legislativo nega essa pretensão,
não obstante ele a formule com sua execução (Alexy, 2009, p. 45-46).
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 O exemplo (3) encontra-se em uma sentença judicial. Como esse enunciado é passível de diversas
interpretações, Alexy formula o enunciado “(4) O réu é condenado à prisão perpétua em virtude de uma
interpretação incorreta do direito vigente (Alexy, 2009, p. 46)” como uma das possíveis interpretações.
 Desse modo, o juiz não viola apenas preceitos sociais e o direito vigente, pelo menos em todos os
sistemas jurídicos que se possui conhecimento, quando reconhece que condenou alguém em razão de uma
hermenêutica errada (equivocada) do direito vigente. Esses motivos não explicam o absurdo da sentença,
pois é uma violação aos preceitos morais também o juiz, ao exercer as funções da magistratura, trajar trapos
(Alexy, 2009, p. 46-47).
Ainda, o juiz infringe o direito posto se o interpreta equivocadamente por mais que, subjetivamente,
acredite que sua interpretação é incorreta. No entanto, essas atitudes não se tratam de um absurdo, ao
contrário do enunciado (4).
 
4. Polêmica Alexy-Bulygin sobre a Pretensão de Correção Jurídica
 
 A polêmica Alexy-Bulygin começa com a publicação originalmente em 1993 do artigo “Alexy e o
Argumento da Correção” por Eugenio Bulygin (2001a). Este foca sua análise sobre a tese não positivista de
Alexy na relação entre direito e moral a partir da pretensão de correção.
 Na sua interpretação sobre o conceito alexyano de direito, Bulygin assevera que apenas as conexões
classificatórias são definitórias e conceituais. Desse modo, quando inexiste esse tipo de relação, não há uma
relação necessária entre direito e moral. De outro lado, uma conexão qualificatória é meramente fática e não
estabelece nenhuma relação necessária entre direito e moral (Bulygin, 2001a, p. 44).
 De acordo com Alexy, os sistemas que não satisfazem a pretensão de correção e as normas
individuais que não formulam ou não satisfazem a pretensão individual, desde que não contenham uma
injustiça extrema, são deficiente juridicamente, mas não deixam de ser direito. Sendo assim, na perspectiva
de Bulygin, inexiste qualquer relação necessária entre direito e moral nessas conexões classificatórias.
 Essa situação representaria uma contradição no pensamento de Alexy, pois ele assevera que há uma
relação necessária entre moral e direito não apenas no que diz respeito aos sistemas jurídicos globalmente,
mas também nas normas jurídicas e decisões judiciais isoladas (Bulygin, 2001a, p. 45).
Na visão de Bulygin, o jusfilósofo alemão ainda não fornece razões que poderiam demonstrar a
vinculação entre direito e moral por meio da pretensão de correção. De outro lado, apenas apresenta alguns
exemplos com o intuito de comprovar sua tese da vinculação (conexão necessária) entre direito e moral.
Desse modo, passa a analisar os exemplos formulados por Alexy.
No que se refere aos enunciados “(1) X é uma república soberana, federal e injusta” e “(2) X é um
Estado justo”, não há contradição no primeiro nem redundância no segundo. Como as normas jurídicas não
têm por função descrever algo, e sim prescrever condutas, essas normas jurídicas não possuem qualquer
sentido em razão denão ser possível, na perspectiva de Bulygin, prescrever a justiça de um Estado. Em
outras palavras, pode-se descrever se um Estado é ou não justo, mas não é possível dizer que um Estado
deve ser justo (Bulygin, 2001a, p. 46-48).
Também é possível interpretar esses enunciados como declarações políticas, corriqueiras nos textos
constitucionais. Nessa leitura, sem dúvida há um defeito no enunciado (1), mas não se trata de um defeito
analítico e conceitual, no significado, e sim uma falha política (Bulygin, 2001a, p. 48).
Sobre as decisões judiciais “(3) O réu é condenado à prisão perpétua, o que é incorreto” e “(4) O réu
é condenado à prisão perpétua em virtude de uma interpretação incorreta do direito vigente”, há também
ausência de sentido na sua formulação, já que as decisões judiciais formulam normas. Em uma sentença não
se afirma se algo é verdadeiro ou falso, e sim se ordena algo (Bulygin, 2001a, p. 49-50).
Assim sendo, Bulygin assevera “que Alexy não justificou suficientemente o argumento da correção.
Desse modo, a tese da vinculação carece de uma base sólida e parece ficar flutuando no ar.”[21]
Robert Alexy (2001b), por sua vez, publica originalmente em 1997, o artigo “A Crítica de Bulygin ao
Argumento da Correção”. Em relação à primeira crítica de Bulygin, o jusfilósofo alemão assevera que a
pretensão de correção possui um caráter duplo, ou seja, para uma relação adequada entre moral e direito,
deve-se tanto formular a pretensão de correção como a satisfazer (Alexy, 2001b, p. 63).
Desse modo, se os sistemas jurídicos não formulam a pretensão de correção, isso implica
necessariamente a perda do caráter jurídico. Ainda, se o ordenamento não satisfaz a referida pretensão,
necessariamente possui um defeito jurídico em virtude da relação entre direito e moral. Portanto, a ausência
da conexão classificatória necessariamente faz o sistema perder o seu caráter jurídico, já relações
qualificadoras necessariamente criam um defeito jurídico em razão do não cumprimento da vinculação entre
direito e moral.[22]
No que se refere à não satisfação da pretensão de correção nas normas jurídicas e decisões judiciais
isoladas, o raciocínio feito acima também é válido para explicar a existência de uma relação necessária entre
direito e moral que impõe um defeito jurídico e não apenas moral (Alexy, 2001b, p. 64-65). Há, ainda, o caso
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de as normas jurídicas e as decisões judiciais não formularem a pretensão de correção. Nesse caso, não é
possível, assim como nos sistemas jurídicos globalmente, asseverar que falta uma relação classificatória.
Se uma norma jurídica ou uma decisão judicial isolada não formula a pretensão de correção, mas se
encontra em um sistema que a formulou, esta norma ou decisão, como um parasita, “nutre-se” dessa
pretensão contida no ordenamento jurídico (Alexy, 2001b, p. 68). Assim sendo, nesses casos existe somente
a ausência de uma relação qualificadora.
Na situação parasitária descrita acima, observa-se com clareza o caráter institucional do direito,
sendo possível a pretensão de correção global do sistema ser transferida para uma norma que não a formula
em virtude da legalidade em conformidade com o ordenamento (validade jurídica em sentido estrito), eficácia
social (validade social) e, principalmente, devido ao caráter sistemático do direito (Alexy 2001b, p. 65).
Apresentadas essas respostas às primeiras críticas de Bulygin, Alexy passa às ponderações sobre seus
exemplos e as consequências retiradas dessas situações hipotéticas.
No que se refere ao enunciado (1), o jusfilósofo alemão assevera que a interpretação que essa norma
é uma declaração política equivocada não explica na totalidade o problema (Alexy, 2001b, p. 71-72). O que
Bulygin chama de declaração política equivocada, Alexy designa de defeito técnico.
Desse modo, este retoma a explicação apresentada acima sobre a instituição de um Estado
republicano em uma monarquia em que o rei é adorado. Tal ação trata-se de um defeito técnico. O enunciado
(1) é um defeito técnico e o estabelecimento da república nesse caso também, porém o primeiro é um
absurdo e o segundo não o é. Sendo assim, reafirma que apenas a não formulação da pretensão de correção
explicaria essa questão.
Ainda, defende a tese de que não é necessário prescrever que o Estado deve ser justo, pois se trata de
algo implícito em qualquer formulação de norma devido à pretensão de correção. De outro lado, rebate a
outra crítica de Bulygin que estabelecer a justiça ou injustiça do Estado é inútil por esses artigos não serem
prescritivos, e sim descritivos. Alexy assevera que esses artigos possuem sim um caráter prescritivo, pois
estabelecem princípios constitucionais, os quais devem ser seguidos pelos poderes legislativo, executivo e
judiciário (Alexy, 2001b, p. 75-76).
Às objeções de Bulygin sobre os exemplos (3) e (4), Alexy assevera que se deve fazer uma diferença
entre sentença em sentido amplo e sentença em sentido estrito. Esta, de fato, constitui-se em uma ordem,
uma prescrição, mas aquela é composta por diversos outros elementos como, por exemplo, nomes das partes
e do Tribunal, data e fundamentos da decisão (Alexy, 2001b, p. 80-81).
Portanto, é sim possível que o juiz faça uma afirmação como a de que ele interpretou
equivocadamente o direito posto. Sem dúvida, essa afirmação é um defeito jurídico, que além de ser uma
violação ao direito vigente, apenas pode ser bem compreendida se for observado que o magistrado, com esse
enunciado, afrontou a pretensão de correção.
Isso ocorre em virtude de que não se trata de um defeito jurídico qualquer, mas de um absurdo, fato
que demonstra a afronta ao ideal de correção e de justiça (Alexy, 2001b, p. 82). Há, novamente, uma
contradição entre a pretensão implícita de correção e a sua não formulação explicitamente.
Bulygin, mais uma vez, originalmente em 2000, publica artigo sobre a pretensão de correção no
pensamento de Alexy e, em especial, acerca dos argumentos trazidos na polêmica. Em primeiro lugar,
Bulygin assevera que não vislumbra, como o jusfilósofo alemão, que todos os sistemas jurídicos devem,
necessariamente, formular uma pretensão de correção sob pena de perderem o seu caráter jurídico (Bulygin,
2001b, p. 87).
Argumenta Bulygin que não é toda autoridade jurídica dotada da vontade de criar normas justas e cita
o caso dos Imperadores romanos Nero e Calígula para comprovar a sua tese (Bulygin, 2001b, p. 87). Ainda
afirma o jurista da Escola de Buenos Aires que a tese da vinculação necessária entre direito e moral de
Alexy, para possuir alguma plausibilidade, deveria provar a conexão entre direito e uma moral específica,
algo que na sua visão não se encontra na história (Bulygin, 2001b, p. 88).
Sobre o conceito de contradição performativa, Bulygin pensa que ele é muito confuso, dificultando
substancialmente o seu debate (Bulygin, 2001b, p. 91-92). Por fim, foca seu ataque na concepção de
necessidade utilizada por Alexy.
O jurista da Escola de Buenos Aires afirma que a ideia de conexão necessária entre direito e moral
não pode ser aceita, pois não se trata de uma conexão analítica (definitória). Não se trata de uma conexão
necessária no campo analítico, pois, conforme os exemplos de Nero e Calígula, a pretensão de correção não
é uma característica do direito.
No que se refere às conexões qualificadoras, asseverar que i) uma norma e decisão judicial que não
formula ou não cumpre uma pretensão de correção e que ii) um sistema que não cumpre uma pretensão de
correção são necessariamente deficientes é algo trivial. É “como dizer que as normas jurídicas deficientes são
deficientes.”[23]
Também, não se pode dizer que a vinculação entre direito e moral é logicamente necessária, porque
se algo é necessáriologicamente, deve ser sempre verdadeiro.[24] Na sua visão, já ficou demonstrado que
muitas vezes inexiste uma relação entre direito e moral.
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Ainda, poder-se-ia falar em necessidade normativa nos termos de Alexy, o que significaria que algo é
obrigatório. Normas que impõem uma obrigação como fechar a porta podem ser desobedecidas pelos
sujeitos objeto da ordem. Desse modo, mais uma vez, não se observa qualquer relação entre direito e moral
por meio do conceito de necessidade normativa, pois as normas podem ser desobedecidas e não há qualquer
vinculação entre os conceitos de necessidade e obrigação (Bulygin, 2001b, p. 92-93).
Novamente, Alexy (2001a), em 2000, publica um texto com o objeto de defender a sua teoria e
rebater os argumentos de Bulygin, sendo o artigo intitulado “Sobre a Tese de uma Conexão Necessária entre
Direito e Moral: a Crítica de Bulygin”.
O jusfilósofo alemão assevera que Bulygin formula três objeções a sua tese da relação necessária
entre direito e moral: i) inexistência da pretensão de correção jurídica, ii) mesmo que exista uma pretensão de
correção jurídica, não há uma vinculação entre direito e moral correta e iii) o argumento dos não positivistas
pautado na pretensão de correção cai em contradição (Alexy, 2001a, p. 97).
Sobre a inexistência da pretensão de correção, Alexy começa por esclarecer que inexiste qualquer
obscuridade no conceito de contradição performativa. Quando alguém formula uma pretensão de correção
com um ato, implicitamente, i) afirma que é correto, ii) garante que pode fundamentar (justificar) a correção
e iii) espera que os destinatários aceitem a referida pretensão (Alexy, 2001a, p. 99).
Desse modo, apenas levando em consideração o item i, observa-se que o enunciado (1), que propõe o
princípio da injustiça, entra em contradição com a afirmação implícita da correção de qualquer norma
jurídica. De outro lado, o enunciado (2), o qual prescreve explicitamente o princípio da justiça (correção), é
redundante, pois já se encontra formulado implicitamente (Alexy, 2001a, p. 100-101). Portanto, há uma
contradição no sentido clássico do termo no primeiro enunciado, porque um enunciado afirma e outro nega a
asserção (Alexy, 2001a, p. 101-102).
Sobre a não formulação da pretensão do Direito na época de Nero e Calígula, o jusfilósofo alemão
pensa que esses exemplos, em verdade, comprovam sua tese da relação entre direito e moral correta. Quando
Calígula e Nero formulavam decisões e normas isoladas sem realizar a pretensão de correção, esses atos
normativos, como parasitas, retiravam a pretensão de correção do sistema jurídico, o qual, segundo a história
do direito, nunca deixou de formular a pretensão de correção (Alexy, 2001a, p. 103-106).
Sobre a não vinculação entre direito e moral objetiva, Alexy afirma que a moral procedimental não se
compromete com um conjunto específico de valores hermeticamente fechados e completos. Em verdade, a
teoria do discurso procedimental possibilita, seguindo as regras do discurso, construir sistemas em geral e
normas e decisões judiciais isoladas que são corretas moralmente, pois podem ser justificadas racionalmente.
Sendo assim, não há qualquer relação entre direito e moral objetiva e não há razão para existir nos auspícios
da moral procedimental (Alexy, 2001a, p. 106-109).
Sobre a contradição no argumento da pretensão de correção formulada pelos não positivistas, Alexy
assevera que não existe essa contradição. Em linhas gerais, repete o argumento de que, em razão do caráter
institucional do direito e da segurança jurídica, um sistema que não satisfaz a pretensão de correção e normas
e decisões judiciais isoladas que não formulem ou satisfaçam a referida pretensão são deficientes
juridicamente. Isso não é uma trivialidade, pois as falhas morais deixam de ser apenas morais e também se
tornam jurídicas nos casos das conexões qualificatórias (Alexy, 2001a, p. 109-115).
 
5. Algumas Palavras a Título de Conclusão
 
 A proposta de vinculação entre direito e moral na obra de Robert Alexy é dotada de uma importância
ímpar no contexto jurídico contemporâneo. Pode-se verificar a veracidade da sua afirmação, observando uma
parte específica do seu pensamento: a teoria dos princípios.
A teoria dos princípios, apesar de todas as críticas, constitui-se em elemento fundamental na
discussão e na prática do direito contemporâneo. A partir da sua visão estruturante dos princípios, cria-se
uma vinculação necessária nos casos de textura aberta do direito entre o aplicador e o direito, buscando
mecanismos para a redução da discricionariedade e vinculando direito e moral correta. Nesses casos, deve
aquele que decide juridicamente (em última análise o poder judiciário e, em especial, atualmente, as cortes
constitucionais) seguir, por meio do princípio da proporcionalidade, as regras do discurso racional jurídico.
Em verdade, sua teoria discursiva do direito constitui-se em um mecanismo essencial para relacionar
direito e moral em tempos em que o pluralismo deve ser valorizado. Nas sociedades democráticas ocidentais,
defende-se, com razão, inúmeros conjunto de valores, os quais, muitas vezes, são antagônicos entre si.
Desse modo, por meio a teoria discursiva de Alexy, abre-se a possibilita de construção de um sistema
de criação, interpretação e aplicação de normas jurídicas com pretensão de correção em sociedades com
visões éticas substancialmente diferentes. Isso ocorre, pois as normas precisam ser fundamentadas por meio
de argumentos racionais e, em caso de contestação, devem ser discutidas de maneira plural.
Pode-se afirmar que esse modelo seria apenas válido em democracias consolidas. Tal asserção não é
verdadeira, já que, por se tratar de um modelo ideal, deve e pode ser buscado em qualquer forma de
governo. Quanto mais próximo do ideal, mais legítimo, racional e correto será o direito.
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Registra-se, ainda, que a forma como Alexy relaciona direito e moral por meio das conexões
classificatórias e qualificatórias é muito interessante e dotada de relevantes consequências práticas. Através
da relação entre conexão classificatória e o formulação da correção de pretensão pelo sistema jurídico
globalmente, o jusfilósofo alemão consegue estabelecer uma sólida base para justificar por qual razão alguns
sistemas dotados de eficácia social e um conjunto de normas gerais não podem ser chamados de direito. A
resposta é simples: não se pode chamar de direito um ordenamento de normas que não pretenda ser correto e
justo.
De outro lado, Alexy valoriza o papel do direito como estabilizador de conflitos, a segurança jurídica
e a necessidade do direito institucionalizar regras do discurso prático geral. Em razão dessas características e
questões, não se pode razoavelmente asseverar que o sistema que não satisfaz a pretensão de correção e as
normas e sentenças isoladas que não formulam ou satisfazem a referida pretensão não são jurídicas.
O que o jusfilósofo alemão faz com propriedade nesses casos é determinar que, além de uma falha
moral, há um defeito jurídico que necessariamente precisa ser sanado. Além disso, por meio do argumento da
injustiça extrema, trazido da obra de Radbruch, Alexy evita que uma norma ou decisão isoladamente
extremamente injusta seja considerada direito.
No que se refere especificamente à polêmica entre Alexy-Bulygin, trata-se de uma relevante discussão
que ajuda a compreender e esclarecer com mais precisão o projeto filosófico jurídico de Robert Alexy.
Acredita-se que as objeções trazidas por Bulygin não afetam substancialmentea teoria do jusfilósofo alemão.
Alguns exemplos corroboram essa assertiva.
Não há qualquer necessidade de relacionar o direito com um projeto moral específico para comprovar
a existência de uma conexão necessária entre direito e moral correta. Em verdade, ao longo da história, é
impossível observar a existência de um conjunto moral substancial e hermético que tenha sido defendido no
ocidente ou oriente. De outro lado, sem dúvida, há a necessidade de que as normas jurídicas sejam racionais
e passem por um controle de justificação que assegure a sua correção moral e jurídica.
Outro exemplo encontra-se na argumentação trazida por Bulygin sobre o conceito de contradição
performativa, enfatizando o seu caráter obscuro. Por meio dessa afirmação, Alexy pode tornar mais claro o
conceito de contradição performativa e a forma como ele se relaciona com a pretensão de correção.
Por óbvio, de outro lado, há reparos a serem feitos aos argumentos de Alexy. Por exemplo, não se
pode afirmar que prescrever o princípio da justiça seja uma redundância. Por óbvio, há o princípio implícito
de justiça nos ordenamentos jurídicos, pois para ser jurídico o ordenamento necessita formular a referida
pretensão.
De outro lado, em muitos países, como o Brasil, a formulação explícita de um princípio de justiça
ajuda substancialmente no seu reconhecimento e aplicação cotidiana pelas autoridades e, em especial, pelo
Poder Judiciário. No entanto, críticas como essa não afetam o cerne da teoria alexyana sobre a necessária
vinculação entre direito e moral correta.
Por fim, deve-se concordar com a leitura de Paula Gaido (2001, p. 15-16), a qual assevera que a
grande razão da polêmica é a utilização de diferentes significados para os mesmos significantes. Em outras
palavras, em razão dos pensamentos jurídicos e filosóficos de Alexy e Bulygin serem muito diversos, eles
definem um mesmo fenômeno ou conceito com significados completamente diversos. Essa questão fica
patente na ideia de necessidade.
Quando Bulygin pensa no conceito necessidade, trabalha com a ideia da lógica que algo é necessário
se sempre determinado fenômeno deve ocorrer sob certas circunstâncias. Desse modo, não há como se falar
em necessidade normativa, pois uma norma pode ser descumprida (a ação prescrita não é verdadeira –
seguida – sempre).
De outro lado, quando Alexy trabalha com o conceito de necessidade, procura demonstrar, por meio
da ideia de ato de fala, que necessariamente uma norma formula uma pretensão de correção de justiça. O
jusfilósofo alemão desenvolve esse pensamento em virtude da sua influência da filosofia analítica, possuindo
outro conceito de necessidade.
Esse desacordo também pode ser visto na ideia de contradição performativa, um conceito da teoria
do discurso, corrente filosófica adotada por Alexy. De outro lado, Bulygin, por seguir um conceito mais
tradicional ou estrito de lógica, não reconhece a contradição performativa como uma contradição no sentido
lógico.
 
6. Bibliografia
 
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São Paulo: Landy Editora, 2008.
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BULYGIN, Eugenio. La Pretensión de Corrección del Derecho: la Polémica Alexy/Bulygin sobre la
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GAIDO, Paula. Introducción. In: ALEXY, Robert; BULYGIN, Eugenio. La Pretensión de Corrección del
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HOBBES, Thomas. Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. Trad. João
Paulo Monteiro e Maria Nizza da Silva. São Paulo: Editora Nova Cultura, 2004.
HART, H. L. A. O Conceito de Direito. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2007.
LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo. Trad. Alex Marins, 2 ed., São Paulo: Martin Claret,
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RADBRUCH, Gustav. Leyes que No son Derecho y Derecho por Encima de las Leys. In: RADBRUCH,
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TOLEDO, Claudia. Introdução à Edição Brasileira. In: ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação
Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Fundamentação Jurídica. Trad. Zilda Hutchinson
Schild Silva, Rev. e Int. Claudia Toledo, 2 ed., 1 reimp., São Paulo: Landy Editora, 2008, p. 15-31.
 
[1] De acordo com a definição de Hart (2007, p. 98-99): “Quando um grupo social tem certas regras de conduta, este facto confere
uma oportunidade a muitos tipos de asserção intimamente relacionados, embora diferentes; porque é possível estar preocupado com
as regras, quer apenas como um observador, que as não aceita ele próprio, quer como o membro de um grupo que as aceita e usa
como guias de conduta. Podemos chamar-lhes de «os pontos de vista» respectivamente de «interno» e de «externo»”. Pode-se dizer
que a principal diferença entre a visão de Hart e Alexy sobre a perspectiva do participante (interna) é a concepção alexyana de que o
ponto de vista interno pressupõe a participação de um sujeito em um discurso racional jurídico. Em outras palavras, Alexy defende
que o direito é um caso especial do discurso prático geral conforme será visto infra, tese não desenvolvida por Hart.
[2] Acerca dos conceitos positivistas do direito, veja-se Alexy, 2009, p. 17-23. Para uma análise mais ampla do positivismo jurídico,
veja-se Bobbio, 2006 e Bronze, 2002, p. 279-416.
[3] Sobre o conceito de direito do jusnaturalismo, essa é a visão de Alexy (2009, p. 15): “Pergunta-se qual conceito de direito é
correto ou adequado. Quem pretende responder a essa pergunta deve relacionar três elementos: o da legalidade conforme oordenamento, o da eficácia social e o da correção material. Conforme os pesos entre esses três elementos é repartido, surgem
conceitos de direito completamente diferentes. Quem não atribui importância alguma à legalidade conforme o ordenamento e à
eficácia social e considera exclusivamente a correção material obtém um conceito de direito puramente jusnatural ou jusracional.” A
diferença entre o seu conceito de direito e o dos jusnaturalistas é que este não confere qualquer relevância à legalidade e à eficácia
social e, de outro lado, o conceito alexyano considera a validade social e a validade jurídica em sentido estrito. Deve-se discordar da
visão do jusfilósofo alemão sobre o jusnaturalismo nos termos postos no trecho acima. O jusnaturalismo considera a validade jurídica
em sentido estrito. Por exemplo, em Hobbes (2004), as normas jurídicas são válidas, depois do contrato social, quando postas pelo
soberano e, em Locke (2006), as normas jurídicas são aquelas postas pela autoridade competente após o contrato social (por óbvio,
em Locke, essas normas jurídicas criadas pelo Estado – logo são dotadas de validade jurídica em sentido estrito - devem seguir os
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critérios morais (validade moral), os direitos naturais). Ainda, os jusnaturalistas modernos também valorizam o âmbito da validade
social. Desse modo, poder-se-ia dizer que a diferença entre o conceito de direito de Alexy e o dos jusnaturalistas é que este
sobrevaloriza o papel da validade moral em detrimento da validade jurídica propriamente dita e da validade social. Já Alexy, apesar
de valorizar a validade moral, não a sobrevaloriza, pois concede grande ênfase à validade social e à validade jurídica em sentido
estrito como se verá infra.
[4] Sobre a justiça no pensamento do estagirita, veja-se Aristotle, 1983, p. 111-145.
[5] Um exemplo de justiça distributiva é a distribuição de cargos públicos a determinadas pessoas. Já na justiça comutativa, pode-se
formular, como exemplos, a sanção de prisão por alguém que cometeu um furto (item i), a compensação de um dano material em
razão de uma colisão de veículos (item ii) e o pagamento de salário pela realização de um trabalho (item iii). Para outros exemplos e
para a profunda relação existente entre as justiças distributiva e comutativa, veja-se Alexy, 2003, p. 161-162.
[6] Sobre a justificação racional e a justificação racional jurídica, argumentação jurídica, veja-se a principal obra de Alexy (2008)
nessa temática.
[7] Para uma análise do emotivismo na fundamentação de normas morais, veja-se Alexy, 2008, p. 62-70.
[8] A teoria discursiva do direito é um caso especial da teoria discursiva geral. Em verdade, a teoria discursiva, logo racional, geral
possibilita a fundamentação e justificação de normas em geral no âmbito moral, na seara da razão prática. A teoria discursiva do
direito, em virtude da sua institucionalização (leis, doutrina e precedentes judiciais), trata-se de um caso especial da argumentação
(razão) prática geral. Desse modo, antes do discursivo jurídico implementar suas regras específicas, deve seguir as regras gerais.
Importante ressaltar o que significa razão prática para Alexy: “deve-se esclarecer que a expressão razão prática em Alexy tem o
mesmo significado da expressão razão comunicativa cunhada após a reviravolta lingüística. Ela é prática porque voltada para a
práxis, para a ação, mas não como prescritiva a priori, no sentido kantiano, e sim a posteriori, conforme a Filosofia da Linguagem e,
dentro dela, a Teoria Consensual da Verdade, pois no seu conceito se insere a dimensão pragmática da Linguagem, abordando-se os
atos de fala também no seu aspecto ilocucionário. A razão prática, que é aqui o mesmo que razão comunicativa, representa a
racionalidade para o agir, racionalidade essa desenvolvida procedimentalmente no discurso, abrangendo, desse modo, tanto a esfera
das relações intersubjetivas quanto do sujeito e só assim formada. Portanto, para Alexy, a razão é discursiva (Toledo, 2008, p. 27).”
Para uma análise da tese alexyana do discurso jurídico como um caso especial da razão prática geral com a apresentação de um
conjunto de críticas aos seus fundamentos e de uma série de argumentos para sua defesa, veja-se Alexy, 1999, p. 374-384.
[9] A argumentação prática geral desenvolve-se por um conjunto específico de regras, classificadas em seis grupos: i) regras
fundamentais, ii) regras da razão, iii) regras da carga de argumentação, iv) formas de argumento, v) regras de fundamentação e iv)
regras de transição. Para a fundamentação e a explicação dessas normas, veja-se Alexy, 2008, p. 181-208. No que se refere à tabela
de regras e de formas, veja-se Alexy, 2008, p. 283-285.
[10] Tradução livre do seguinte trecho: “(...) la no contradicción, la universalidad (en lo sentido de un uso coherente de los predicados
utilizados), la claridad lingüística y conceptual, la verdad empírica, la atención por las implicaciones, la ponderación” (Alexy, 2003,
p. 165) 
[11] Regras da Razão 2.1. e 2.2. que compõem as regras do discurso prático geral. Veja-se Alexy, 2008, p. 283.
[12] Sobre a questão da idealização e da procedimentalização da teoria discursiva geral (razão prática geral) e a necessidade da
institucionalização jurídica, veja-se Alexy, 2003, p. 167.
[13] No que se refere à tese da única resposta na teoria discursiva do direito, veja-se Alexy, 2008, p. 299-300.
[14] O não cumprimento da pretensão de correção ocorre quando a pretensão é formulada, porém não é cumprida/efetivada
cotidianamente. Por exemplo, há um sistema jurídico justo, mas, na prática, esse sistema não concretiza o seu ideal de justiça.
[15] Nas palavras de Radbruch (1971, p. 13-14): “Podría resolverse el conflicto entre la justicia y la seguridad jurídica atribuyendo la
preferencia al Derecho positivo, que tiene la firmeza que le confieren su promulgación y la fuerza coactiva, y esto aun en el caso de
que fuera injusto o perjudicial, o bien, en el caso de que la justicia alcance un grado insoportable, cediendo la ley, en cuanto ‘Derecho
defectuoso’, ante la justicia. Es imposible establecer una línea más precisa de separación entre los casos en que estamos ante leyes
que no son Derecho y los otros en que, a pesar de su contenido injusto, las leyes continúan conservando su validez. Pero se puede
establecer con toda precisión otra línea divisoria: cuando ni siquiera se aspira a realizar la justicia, cuando en la formulación del
Derecho positivo se deja a un lado conscientemente la igualdad, que constituye el núcleo de la justicia, entonces no estamos so ante
una ley que establece un ‘Derecho defectuoso’, sino que más bien lo que ocurre es que estamos ante un caso de ausencia de Derecho”.
[16] Há a possibilidade de se formular diversos argumentos contrários a tese da (extrema) injustiça como i) argumento linguístico, ii)
argumento da clareza, iii) argumento da efetividade, iv) argumento da segurança jurídica, v) argumento do relativismo, vi) argumento
da democracia, vii) argumento da inutilidade e viii) argumento da honestidade, para a apresentação desses argumentos e para a defesa
da tese da extrema injustiça, veja-se Alexy, 2009, p. 49-75. Nas palavras de Alexy (2009, p. 75): “Se lançarmos um olhar sobre os
argumentos contrários e favoráveis ao argumento da injustiça relacionado a normas individuais, em sua versão fraca, da forma como
ele se encontra expresso na fórmula de Radbruch, constataremos que as razões que falam em seu favor são mais fortes que as
objeções. Todas as objeções poderiam, no mínimo, ser enfraquecidas a ponto de se chegar a uma paridade. Além disso, é possível
alegar razões para que se prefira o argumento da injustiça”. 
[17] No que se refere à textura aberta das normas, conforme a formulação de Hart, veja-se Hart, 2007, p.137-149. Em razão da tese
dos princípios formulada por Alexy e por Hart ser um positivista, há profundas diferenças entre a proposta de textura aberta em Hart e
em Alexy. Sobre a posição deste, veja-se Alexy, 2009, p. 30-31.
[18] Um exemplo de regra no ordenamento brasileiro é o artigo 5°, XLVII, “a”, da Constituição Federal brasileira, que estabelece um
direito fundamental e definitivo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Brasil de não serem condenados à morte. Essa regra
apenas não é aplicada nos casos excluídos pela cláusula de exceção, no exemplo dessa regra constitucional, “salvo em caso de guerra
declarada, nos termos do art. 84, XIX”.
[19] A teoria dos princípios de Alexy defende a resolução de colisão dos princípios por meio do princípio da proporcionalidade, que é
composto por três sub-princípios: adequação (observa se o meio empregado para atingir o fim prescrito por um princípio é adequado
para essa concretização), necessidade (se não há outro meio que atinja a finalidade do princípio mantendo intacto o direito garantido
prima facie pelo outro princípio em colisão) e proporcionalidade em sentido estrito (ocorrerá a ponderação, prevalecendo o princípio
com maior peso e importância no caso em apreço). No caso de constatação de uma colisão em virtude da resposta positiva aos sub-
princípios da adequação e da necessidade, necessariamente um dos princípios jurídicos vai causar a não aplicação parcial ou total do
outro princípio em colisão. Quanto maior a não aplicação de um dos princípios em colisão em virtude da relevância de outro para o
caso, maior deverá ser a importância do princípio vitorioso na colisão. Para críticas ao princípio da proporcionalidade e para resposta
a essas críticas, veja-se Alexy, 1993; 2000.
[20] Nas palavras de Alexy (2009, p. 44): “Poder-se-ia pensar que ele reside unicamente no fato de esse artigo ser inadequado. (...)
Tal defeito técnico existe na realidade, mas ainda não explica a imperfeição desse artigo.”
[21] Tradução livre do seguinte trecho: “que Alexy no ha justificado suficientemente el argumento de la corrección. De este modo, la
tesis de la vinculación carece de base sólida y parece quedar flotando en el aire (Bulygin, 2001a, p. 51).”
[22] De acordo com Alexy (2001b, p. 64): “Por consiguiente, entre la tesis que dice que los sistemas jurídicos formulan
necesariamente una pretensión de corrección, y la tesis que dice que la no satisfacción de esa pretensión solo tiene una relevancia
cualificatoria, no existe ninguna contradicción. Por el contrario: en el caso de la no satisfacción de la pretensión de corrección. La
cualificación del sistema jurídico como deficiente es necesaria. Por consiguiente, también la conexión cualificatoria es una conexión
necesaria.”
[23] Tradução livre do seguinte trecho: “como decir que las normas jurídicas deficientes son deficientes (Bulygin, 2001b, p. 91)”.
[24] Por exemplo, se o homem pertence ao filo dos mamíferos, para que essa afirmação seja logicamente necessária, todos os homens
necessariamente, sem exceção, devem ser mamíferos.
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 5573

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