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Conteúdo Metodologia e Prática do Ensino da Língua Portuguesa

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Conteúdo Metodologia e Prática do Ensino da Língua Portuguesa
Aula 1
O trabalho com a língua portuguesa sempre foi motivo de divergências, discussões e de problematização acerca dos conceitos, normas e práticas que devem ser estabelecidos como fundamentais no exercício de interação da língua e de seu aprendizado em sala de aula. A questão do trabalho com a gramática como norteadora dos princípios da língua e de suas implicações no desenvolvimento das práticas orais e de leitura e escrita na formação linguística do aluno torna-se complexa quando desconhecemos o sentido e o conceito de língua e linguagem.
Segundo os PCNS (2000):
“A importância e o valor dos usos da linguagem são determinados historicamente segundo as demandas sociais de cada momento. Atualmente exigem-se níveis de leitura e escrita diferentes e muito superiores aos que satisfizeram as demandas sociais até bem pouco tempo atrás – e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. Para a escola, como espaço institucional de acesso ao conhecimento, a necessidade de atender a essa demanda implica uma revisão substantiva das práticas de ensino que tratam a língua como algo sem vida e os textos como um conjunto de regras a serem aprendidas, bem como a constituição de práticas que possibilitem ao aluno aprender a linguagem a partir da diversidade de textos que circulam socialmente.” (p.30)
De acordo com os resultados da Prova Brasil e do Saeb, que avaliam a competência leitora dos estudantes brasileiros de 5º e 9º anos do ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio, menos de um terço dos alunos alcança o nível adequado de leitura e a produção escrita, o que é algo de grande preocupação.
Os índices brasileiros de repetência nas séries iniciais estão diretamente ligados à dificuldade que a escola tem de ensinar o aluno a ler e a escrever.
O professor atual domina as técnicas e teorias do ensino da língua além dos conteúdos a serem trabalhados, mas desconhece a relevância do conhecimento que garanta ao aluno os saberes linguísticos necessários para a sua participação social e cultural efetiva, garantindo ao aluno que saiba se comunicar que tenha acesso à informação de textos diversos, saiba defender diferentes pontos de vistas, produza conhecimento, construa sua própria visão de mundo.
Dentre os vários motivos para termos um quadro tão desolador, configura-se como aspectos negativos duas situações:
O não entendimento pelo professor que o objetivo do ensino da língua portuguesa é formar um cidadão com posicionamento crítico, responsável e construtivo a partir da utilização de sua língua materna nas várias situações sociais e culturais (formal e informal).
A má formação do professor no que se refere ao seu domínio da própria língua, demonstrando grande dificuldade não apenas em alfabetizar como também em promover e garantir o uso eficaz da linguagem.
Segundo Marchusi (2003):
“o aprendizado e o uso de uma língua natural é uma forma de inserção cultural e de socialização.” (p.18)
Pensar num professor ou futuro professor que:
Não leia
Não goste de literatura
Não tenha em seu cotidiano espaços para a leitura
Que não compre livros e nem os tenha em casa como uma pequena biblioteca particular
É perceber o quanto a língua portuguesa está dissociada de seu mundo, o quanto este professor não percebe que a leitura e outras formas de contato com a língua devem ser uma constante em sua vida.
Talvez muitas destas perguntas não sejam respondidas satisfatoriamente acerca do ensino e da aprendizagem da língua. Muitos de nós fomos apresentados à língua como se ela fosse algo dissociado de nós, como se fosse um corpo estranho que somente com a nossa inserção no espaço escolar é que tomaríamos conhecimento.
E mesmo assim, a sua apresentação se deu de forma destacada, diferenciada da língua falada e escrita do cotidiano.
O aprendizado da língua ocorreu, e ainda ocorre, como se existisse o “certo” e o “errado”, como se algumas práticas fossem consideradas deficientes e uma outra “língua” mais eficiente, social e culturalmente mais privilegiada tivesse que ser “aprendida” e o conhecimento da língua que você construiu desde seu nascimento fosse descartado para assimilar a língua de maior valor em razão de seu poder político e social.
Para que você entenda melhor os pressupostos citados, cabe a você, aluno, tentar responder a algumas questões e refletir:
Suas aulas de Português eram mais focadas no ensino da leitura e escrita ou da gramática?
O gosto pela leitura foi despertado por seu professor?
Ainda hoje, você possui práticas de leitura e escrita? Lê livros literários por seu próprio interesse?
Como foi a sua trajetória na aprendizagem em língua portuguesa no ensino fundamental?
Havia, na sua família, práticas de leitura? O livro se fazia presente no seu espaço familiar? Ouvia histórias  em casa?
Sente dificuldades na prática de leitura e escrita até hoje?
A prática de leitura de livros literários foi desenvolvida por seu professor? Havia espaços de leitura e contação de histórias?
Costuma comprar livros para você ou presentear amigos e familiares com livros?
Você se considera um leitor pleno? Lê livros com frequência?
O professor por ser falante da língua e na sua função ser capaz de produzir conhecimento, de formar consciência crítica e, por ser alguém que tem de ter o compromisso de propagar, mediar, divulgar a língua como arte, como veículo de engrandecimento do indivíduo na sua relação com o outro e com o mundo, precisa gostar de literatura e ter em seu cotidiano espaços para a leitura, comprar livros e os ter em casa como uma pequena biblioteca particular. A língua portuguesa não pode estar dissociada de seu mundo, pois a leitura e outras formas de contato com a língua devem ser uma constante em sua vida.
Segundo, por ser professor, por ser alguém que tem de ter o compromisso de propagar, mediar, divulgar a língua como arte, como veículo de engrandecimento do indivíduo na sua relação com o outro e com o mundo.
Outro objetivo é fazer você perceber outras possibilidade de propostas atuais de ensino da língua portuguesa, considerando as diretrizes dos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Segundo Antunes (2007):
“...a língua não pode ser vista tão simplesmente como uma questão, apenas, de certo e errado, ou como um conjunto de palavras que pertencem a determinada classe e que se juntam para formar frases, à volta de um sujeito e de um predicado. A língua é muito mais que isso tudo. É parte de nós mesmos, de nossa identidade cultural, histórica, social. É por meio dela que nos socializamos, que interagimos, que desenvolvemos nosso sentimento de pertencimento a um grupo, a uma comunidade. É a língua que nos faz sentir pertencendo a um espaço. É ela que confirma nossa declaração: Eu sou daqui. Falar, escutar, ler, escrever reafirma, cada vez, nossa condição de gente, de pessoa histórica, situada em um tempo e em um espaço. Além disso, a língua mexe com os valores. Mobiliza crenças. Institui e reforça poderes.” (p.22)
Se a escola e o professor pensassem mais sobre essa questão e buscasse alternativas do trabalho com a língua, considerando que a fala e a escrita são atividades comunicativas e práticas sociais situadas em contextos diversos, o ensino dela estaria mais centrado no uso real da língua. Devemos levar em conta que todos nós vamos incorporando a “normatividade da língua” ao nosso conhecimento intuitivo, pelo simples fato de estarmos constantemente expostos à convivência com os outros, às práticas sociais de leitura, escrita e oralidade, tanto de modo formal quanto informal.
O objetivo da escola no ensino da língua é ampliar, antes que limitar, as competências e habilidades no uso da língua.
Cabe ao professor:
Dinamizar
Diversificar
Estimular
Enriquecer o conhecimento da língua que o aluno já apresenta desde a sua chegada na escola
Ao professor cabe especializar-se cada vez mais no ensino de língua portuguesa, procurando conhecer a sua diversidade e complexidade em relação às variantes regionais.
Oprofessor deve tornar-se:
Um leitor efetivo de jornais
Revistas
Obras literárias
Ter acesso aos meios eletrônicos de informação
Além disso, o professor deve buscar todo e qualquer meio de prática da língua para que seja mais competente na aplicação de diferentes métodos e desenvolvimento das estruturas da língua, respeitando as dificuldades iniciais de seu aluno e não construindo preconceito com a produção oral e escrita inicial desse aluno, mas sim, estimulando este a conhecer a diversidade de contextos lingüísticos nos diferentes espaços sociais.
Em nosso curso de Conteúdo, Metodologia e Prática do Ensino de Língua Portuguesa, portanto, vamos destacar a importância de construir competências e habilidades em leitura e escrita, além de estimular o uso adequado da modalidade oral nas diversas situações cotidianas. Vamos destacar os conceitos de língua, linguagem e cultura, os mitos do ensino da língua portuguesa, o papel do professor e a sua formação no desenvolvimento de práticas discursivas.
Esperamos que este curso não seja apenas uma construção mecânica de conceitos, regras e métodos de ensino da língua portuguesa. Gostaríamos que este curso provocasse no futuro professor o questionamento sobre a construção do domínio da língua como meio de promover a melhora e o acesso dos saberes lingüísticos ao aluno.
Somente assim a escola estará contribuindo para o aperfeiçoamento pleno do indivíduo na construção de uma visão de mundo melhor e maior, preparando, desse modo, o olhar crítico, a capacidade de pensar e transformar a realidade cotidiana e se posicionar acerca dos debates de seu tempo.
Somente assim a escola estará contribuindo para o aperfeiçoamento pleno do indivíduo na construção de uma visão de mundo melhor e maior.
Aula 2- Lingua, linguagem e cultura
Desde os primórdios da existência humana, podemos vislumbrar os primeiros passos do ser humano na tentativa de estabelecer a comunicação de modo único, uniforme e especial a fim de que o diálogo e a interação entre os seres humanos fossem capazes de produzir sentido e entendimento. Na necessidade de o ser humano se fazer entender e transmitir uma ideia, a busca pela organização das palavras em frases estruturadas ocorre inicialmente com muito esforço e exercício de entendimento.
Primeiramente, o ser humano, para se comunicar, fez uso de:
Gestos
Expressões faciais e corporais
Sons 
Desenhos
Até que conseguisse produzir a palavra que dá sentido, que interage e estabelece um melhor e maior contato com o outro
Nesse sentido, a esse conjunto de representações que a atividade humana construiu através de uma organização de símbolos verbais ou não verbais, resultado do seu contato com o outro e de suas experiências com o objeto, dá-se o nome de Linguagem.
A linguagem se constrói através de símbolos e de signos que, ao longo de aspectos históricos, sociais e culturais, se organizaram dando sentido à comunicação humana.
Segundo Irandé (2009):
“A troca dos bens simbólicos, que constituem o patrimônio cultural dos grupos humanos, passa irremediavelmente pela mão dupla da interação verbal. Quer dizer, a linguagem é o suporte, a mediação pela qual tudo passa de um indivíduo a outro, de um grupo a outro, de uma geração a outra. E é também o meio pelo qual se criam e se instauram os valores que dão sentido a todas as coisas, inclusive ao próprio homem.” (p22).
Assim, o homem foi distanciando-se dos animais por ser capaz de se comunicar, de expressar sensações, emoções, sentimentos e ideias de modo organizado e, cada vez mais, coerente na interação com o outro.
Mas anterior ao conceito, à ideia de linguagem e de língua, devemos pensar na palavra, na palavra primeira que dá nome às coisas e a tudo aquilo que o homem confronta. É pela palavra que iniciamos os princípios da língua e pela palavra ainda livre, leve e solta é que a linguagem começa a se organizar e fazer sentido.
Segundo o escritor e poeta Bartolomeu Campos de Queirós, em sua obra, Para ler em silêncio, “... A palavra realizou o que anunciava e transformou a desordem em beleza e movimento.” (p.11)
E é a partir da palavra que o ser humano nomeia e constrói signos que são representações das coisas, dos objetos, da natureza que circunda a experiência e o cotidiano das pessoas.
Essa necessidade de estabelecer uma unidade de sentido para o que se pretendia falar se constitui na Língua em que cada membro de um determinado grupo busca se expressar de modo semelhante através de um conjunto de palavras que transmite uma ideia, uma organização, da expressão dos sentidos que o homem atribui às coisas.
Cabe ressaltar que a Língua não existe como uma unidade concreta. Na verdade, ela existe em razão da fala, da comunicação, da expressão que os seres humanos realizam através da interação entre uns com os outros.
Assim, também, devemos compreender que a Língua não é uma unidade única e particular dentro de uma mesma comunidade. Pensar em sua variedade, em sua transformação e diferenças em razão de processos sociais, culturais e históricos, torna-se relevante para entender que a língua, mesmo dando sentido a um determinado grupo, possui níveis de “falares” dos seus diversos contextos de uso.
Segundo Saussure (p.22): 
Considerando os aspectos iniciais, percebe-se que a língua é uma criação social, parte social da linguagem, “...exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la nem modificá-la; ela não existe senão em virtude duma espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade.”
Assim, pode-se entender por:
Linguagem: È a capacidade do ser humano de se comunicar, isto é, processo comunicativo pelo qual ocorre a interação social e depende da existência de pessoas para que se estabeleça.
Língua: É um conjunto de sinais (palavras) e de um sistema convencional organizado e  estabelecido pelo grupo social que se comunica e interage dentro de uma uniformidade de sentido e contexto.
Considerando tais aspectos, podemos observar que a língua é patrimônio social e cultural de cada sociedade. Cada comunidade se organiza através da unidade em que a língua se apresenta de modo que cada indivíduo se reconhece e interage por meio de códigos convencionados.
Segundo os PCNs (2000),
“Dessa perspectiva, a língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas.” (p.24)
Imaginar um povo sem língua, ou seja, sem uma unidade de signos e símbolos, é pensar na ausência de identidade, na desestruturação de ideias e regras sociais que possibilitam a organização de algum modo dos atributos que se impõem ao homem.
Desde que o homem se organizou em grupo, transformando-se numa sociedade para se preservar e construir um sentido para o grupamento de seres humanos, a língua passou a ser o meio de trajetória coletiva, um meio de interagir com o mundo e as coisas em torno dessa comunidade.
Perini (2006) afirma que,
“Cada língua é um retrato do mundo, tomado de um ponto de vista diferente, que revela algo não tanto sobre o próprio mundo, mas sobre a mente do ser humano. Cada língua ilustra uma das infinitas maneiras que o homem pode encontrar de entender a realidade.” (p. 52)
É através da língua, desse sistema particular de representações de signos de um mesmo espaço social e cultural que nós, seres humanos, selamos nossa adesão a um determinado grupo.
Você sabia
?
?
Nesse sentido, ao dominar a língua do ambiente no qual se está inserido social e culturalmente, o indivíduo se encontra, se percebe, atua e modifica os espaços que circula. Ao dominar os sistemas de signos de uma mesma língua, o ser humano constrói a sua identidade, o seu sentido de pertencimento e permanência na comunidade linguística. Isso garante a qualquer pessoa o seu acesso à informação, à produçãotambém de conhecimento e ao exercício da cidadania.
Ao ressaltarmos tal aspecto do indivíduo em relação à sua língua e à sua interação com o meio, lembramos de uma das mais importantes obras da literatura brasileira: Vidas secas, obra do fantástico Graciliano Ramos. A obra foi publicada em 1938 e trata da trajetória de retirantes de uma mesma família, fugindo da seca e buscando um local para viver. Seus personagens são brutos, rudes, quase animalizados pelas condições mínimas de sobrevivência no sertão nordestino. O livro é dividido em treze capítulos e nota-se, ao longo deles, a marca social dos sujeitos através da ausência da palavra, ou melhor, do silêncio que se constituem os personagens diante da miséria, do sofrimento e da incapacidade de dizer o que sente por não conseguir “arrumar as ideias na cabeça”. O enredo organiza-se em torno de seis personagens: Fabiano, a esposa Sinhá Vitória, o menino mais velho, o menino mais novo, o Soldado Amarelo e a cachorra Baleia. O personagem Fabiano se constitui pela carência da palavra ou, em alguns momentos, de poucas palavras. Na discordância de sua condição, muitas vezes, sons, grunhidos e gritos são o meio de expressão desse personagem que na dificuldade da linguagem se animaliza e se submete ao poder. “...não sabia falar [...] Não podia arrumar o que tinha no interior. Se pudesse...Ah! Se pudesse, atacaria os soldados amarelos que espancam as criaturas inofensivas.” (p. 36) Apesar disso, Fabiano e todos os personagens desejavam se constituir como possuidores de palavras, de oportunidades, de poder, de dizer o que sente em razão da opressão, da miséria e da angústia de se viver na incerteza.
O domínio da palavra, nessa obra, demonstra uma posição de poder, de ser parte de uma sociedade mais privilegiada das condições sociais, políticas e culturais de um grupo. Em contrapartida, a ausência da palavra, a inabilidade de fazer uso da sua própria língua constitui-se como alguém ausente, sem identidade, sem o caráter de pertencimento da sociedade e de suas atribuições nos níveis sociais, culturais e políticos.
Você sabia?
Fabiano era familiarizado com a comunicação gestual e sabia interagir com os indivíduos dentro do mesmo espaço social. Mas quando se tratava de se comunicar com palavras, de estruturar frases, de transmitir a sua discordância de algo, o seu posicionamento crítico com estranhos, Fabiano ficava confuso, inseguro, “monomudo”.
Você sabia?
Guimaraes Rosa, outro autor da literatura brasileira, gostava de falar sobre as pessoas que tinham dificuldades de expressar adequadamente a língua que falava.
Percebe-se, assim, que o domínio da linguagem, da palavra, é sinônimo de poder, de liberdade, de não ser excluído e nem oprimido por saber que a palavra é força, é a arte de construir ideias, conceitos e posições sobre si mesmo, a vida e o mundo. Não se é escravo, não se é miserável quando sabemos os sentidos das palavras, quando conhecemos os signos e símbolos que cada língua estabelece para as coisas e as pessoas.
Na obra em questão, Fabiano conhecia o seu mundo, conhecia as pessoas, mas não sabia articular o seu pensamento em palavras, não sabia externalizar conceitos sobre sua condição, muito embora, tinha noção de sua adversidade.
Saiba
Mais...Fabiano queria berrar para a cidade inteira, afirmar ao doutor juiz de direito, ao delegado, a seu vigário e aos cobradores da prefeitura que ali dentro ninguém prestava para nada. Ele, os homens acocorados, o bêbado, a mulher das pulgas, tudo era uma lástima, só servia para aguentar facão. Era o que ele queria dizer.” (p.36)
Com esta breve reflexão sobre o domínio da palavra e da língua a partir de um olhar da obra Vidas secas, nós, professores, devemos ter consciência de quanto é de fundamental importância o ensino da língua portuguesa nas escolas. E também de como a produção e o desenvolvimento de competências e habilidades da língua se fazem necessários na formação do indivíduo.
Segundo os PCNs (2000), 
“O domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos.” (p.23)
Dessa forma, cabe ao professor assumir que a língua possui um caráter político, histórico e sociocultural. Perceber que a língua movimenta-se continuamente, fazendo-se, construindo-se em novos e diferentes sentidos conforme o tempo e o espaço.
Ensinar língua portuguesa é muito mais do que regras gramaticais, do que formalização de frases e períodos, é com a exploração dos sentidos, dos símbolos diversos e dos espaços socioculturais que o indivíduo faz uso da língua.
Ensinar língua portuguesa é confrontar-se com a realidade social e cultural do país, perceber que a língua é um sistema que sofre constantes mutações e, conforme as necessidades do falante, ela se modifica para que a interação ocorra efetivamente.
Segue abaixo as palavras de Guedes (2006) com relação ao papel do professor no desenvolvimento das competências e habilidades em língua portuguesa:
“Do mesmo modo, não se propõe que a aula de português se transforme numa grande oficina de criação literária; pelo contrário, a aula de português vai  transformar-se no lugar em que todos assumirão sua palavra para dizer de si e de todos nós, vai transformar-se num lugar onde o reconhecimento de algum artista pelos artesãos seus leitores vai comprometer o reconhecido com o crescente nível de exigência dos artesãos-leitores que se aperfeiçoam com ele e, principalmente, em vez de dividir a turma entre a casta dos que têm misteriosos dons e, por isso, direito à fala, e dos que calam ante sua voz, vai atribuir ao artista o compromisso de na sua voz ecoar a voz de todos.” (p.56)
Aula 3- O conhecimento de mundo e a leitura 
Esta aula se propõe, inicialmente, a destacar a importância do conhecimento e da leitura de mundo. Portanto, vejo que é oportuno apresentarmos um texto do grande pedagogo Paulo Freire retirado de sua obra, A importância do ato de ler para que possamos refletir e nos posicionar a respeito de seu texto, além de ampliar nosso olhar diante do trabalho do professor com as práticas de leitura em sala de aula.
Vamos, a partir de trechos do texto, conversar um pouco sobre as práticas sociais de leitura através das experiências familiar e escolar, e depreender como o conhecimento de mundo se constrói ao longo das experiências de vida do indivíduo, fazendo o que Freire afirma sobre aprender a ler primeiro através da “leitura do mundo”, além de destacar o papel do professor como mediador e incentivador da leitura.
A Importância do ato de ler*
Paulo Freire
* Trabalho apresentado na abertura do Congresso Brasileiro de Leitura, realizado em Campinas, em novembro de 1981.
“Aceitei vir aqui para falar um pouco da importância do ato de ler.”
Me parece indispensável, ao procurar falar de tal importância, dizer algo do momento mesmo em que me preparava para aqui estar hoje; dizer algo do processo em que me inseri enquanto ia escrevendo este texto que agora leio, processo que envolvia uma compreensão crítica do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo.
A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto (grifo nosso).
Ao ensaiar escrever sobre a importância do ato de ler, eu me senti levado - eaté gostosamente - a "reler" momentos fundamentais de minha prática, guardados na memória, desde as experiências mais remotas de minha infância, de minha adolescência, de minha mocidade, em que a compreensão crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo.
Ao ir escrevendo este texto, ia "tomando distância” dos diferentes momentos em que o ato de ler se veio dando na minha experiência existencial. Primeiro, a “leitura” do mundo, do pequeno mundo em que me movia; depois, a leitura da palavra que nem sempre, ao longo de minha escolarização, foi a leitura da “palavramundo”.
Neste trecho inicial, notamos que aprender a ler é algo muito maior, muito mais complexo do que simplesmente a decodificação das palavras, da interpretação nua e crua das frases e períodos que compõem muitas vezes um texto.
Freire demonstra que ler é, antes de tudo, uma conquista realizada a partir da vivência, da troca que se faz com o mundo em suas mais diversas situações que o indivíduo deve confrontar-se. Antes de aprender a leitura escolarizada, a leitura que, muitas vezes, é condicionada por padrões que a sociedade e a escola determinam como cultura letrada, de prestígio, o indivíduo aprende a ler o mundo, aprende a olhar o mundo e as palavras sentidas e ouvidas antes da decodificação em conceitos gramaticais.
Muito do conhecimento de mundo, da capacidade crítica, da produção de conceitos que o indivíduo realiza advém de sua interação com os espaços sociais diversos e com o outro.
Ler é um processo de construção contínuo de nosso relacionamento com a realidade, e a forma como pensamos e transformamos essa realidade. Estar no mundo é viver a cultura, adentrar no conhecimento de mundo que é complexo e dinâmico, pois os valores de um grupo, de uma sociedade determinam muito o nosso conceito de vida, a nossa leitura de mundo.
Por esta razão, ler o mundo é conhecer os valores e ideias que circulam num espiral contínuo de uma determinada sociedade. Logo, é imprescindível entender que ler pressupõe não apenas decodificar esta realidade, mas sim, ser capaz de apropriar-se dos valores de uma determinada cultura e de pensar e produzir também conhecimento.
Antes da palavra dicionarizada, normatizada, o indivíduo descobre que a linguagem produzida pelo ser humano requer o valor simbólico de seus signos que determinam a interação e o entendimento dos usuários de uma língua.
Se penso e falo a palavra casa, você não apenas reconhecerá os sons que a formam por ser falante da mesma língua, como também, visualizará a ideia casa.
E mesmo que pensemos em diferentes estilos, tamanhos e lugares de uma casa, a ideia da palavra casa será sempre a mesma para cada indivíduo. Isso acontece porque houve um acordo estabelecido entre os falantes de uma mesma língua para determinar um valor, conceito e associação entre a palavra casa e a sua representação.
Se não houvesse este acordo, não haveria possibilidade de entendimento, não seríamos capazes de identificar a relação de uma palavra com a sua imagem. Ou seja, a linguagem ficaria prejudicada. A esse mecanismo que o ser humano estabelece como valor simbólico, as coisas e pessoas que circundam seu mundo dá-se o nome de signo.
Signo Liguístico:
Unidade de significação de tudo aquilo que há no mundo e se relaciona com o homem.
Mas também é relevante considerar que os signos carregam duas partes:
Significante - sequência sonora (o nome) Signo lingüístico
Significado - a ideia, o conceito que se tem do que se ouve. A ideia correspondente ao nome.    
Por exemplo, as palavras  não são meros nomes, elas representam a junção entre o nome e o seu significado (sentido). Quando dizemos: “carro, flor, chuva, amor .....", associamos o nome da palavra com a ideia e quando ouvimos, fazemos a mesma associação.
VEJA BEM  :
 
O conhecimento de mundo de cada um, a percepção da realidade, a cultura em que o indivíduo está inserido etc  são fundamentais  para  este indivíduo fazer a junção entre nome e sentido, pois quando há desconhecimento do nome, não é possível encontrar o sentido do que se ouve ou do que se lê.  O que se ouve ou se lê é compreendido quando  a junção entre o nome e o sentido ocorre.
EXEMPLO
Ao pensar na palavra amor, muitos teriam a ideia de uma relação entre namorados, marido e mulher, outros associariam a relação entre uma mãe e seus filhos, ou ainda alguém faria associação da palavra amor com a ideia de DEUS. Poderíamos também pensar no amor bandido, amor filial, amor traído, amor perdido, amor espiritual e em tantas outras leituras de mundo a partir dos diversos valores simbólicos e ideológicos que poderíamos associar a este signo.
Logo, a linguagem e a realidade estão intimamente interligadas na interação do indivíduo com o mundo através de sentidos convencionados ou diferentes a partir de processos que são social, cultural e historicamente mutáveis.  
A retomada da infância distante, buscando a compreensão do meu ato de “ler” o mundo particular em que me movia- e até onde não sou traído pela memória - , me é absolutamente significativa. Neste esforço a que me vou entregando, re-crio, e revivo, no texto que escrevo, a experiência vivida no momento em que ainda não lia a palavra. 
Vejo então na casa mediana em que nasci, no Recife, rodeada de árvores, algumas delas como se fossem gente, tal a intimidade entre nós – à sua sombra brincava e em seus galhos mais dóceis à minha altura eu me experimentava em riscos menores que me preparavam para riscos e aventuras maiores.
A velha casa, seus quartos, seus corredor, seu sótão, seu terraço – o sítio das avencas de minha mãe-, o quintal amplo em que se achava, tudo isso foi o meu primeiro mundo. Nele engatinhei, balbuciei, me pus de pé, andei, falei. Na verdade, aquele mundo especial se dava a mim como o mundo de minha atividade perceptiva, por isso mesmo como o mundo de minhas primeiras leituras.
Daquele contexto faziam parte igualmente os animais: os gato da família, a sua maneira manhosa de enroscar-se nas pernas da gente, o seu miado, de súplica ou de raiva; Joli, o velho cachorro negro de meu pai, o seu mau humor toda vez que um dos gatos incautamente se aproximava demasiado do lugar em que se achava comendo e que era seu “ estado de espírito”, o de Joli, em tais momentos, completamente diferente do de quando quase desportivamente perseguia, acuava e matava um dos muitos timbus responsáveis pelo sumiço de gordas galinhas de minha avó.
Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele contexto – em cuja percepção me experimentava e, quanto mais o fazia, mais aumentava a capacidade de perceber-se encarnavam numa série de coisas, de objetos, de sinais, cuja compreensão eu ia apreendendo no meu trato com eles nas minhas relações com meus irmãos mais velhos e com meus pais.
Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele contexto se encarnavam no canto dos pássaros – o do sanhaçu, o do olha-pro-caminho-quem-vem, o do bem-te-vi, o do sabiá; na dança das copas das árvores sopradas por fortes ventanias que anunciavam tempestades, trovões, relâmpagos; as águas da chuva brincando de geografia; inventando lagos, ilhas, rios, riachos.
Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele contexto se encarnavam também no assobio do vento, nas nuvens do céu, nas suas cores, nos seus movimentos; na cor das folhagens, na forma das folhas, no cheiro das flores – das rosas, dos jasmins -, no corpo das árvores, na casca dos frutos. Na tonalidade diferente de cores de um mesmo fruto em momentos distintos: o verde da manga-espada inchada; o amarelo esverdeado da mesma manga amadurecendo, as pintas negras da manga mais além de madura. A relação entre estas cores, o desenvolvimento do fruto, a sua resistência à nossa manipulação e o seu gosto. Foi nesse tempo, possivelmente, que eu, fazendo e vendo fazer, aprendi a significação da ação de amolegar.
Daquele contexto- o do meu mundo imediato – fazia parte, por outro lado, o universo da linguagem dos mais velhos, expressando as suascrenças, os seus gostos, os seus receios, os seus valores. Tudo isso ligado a contextos mais amplos que o do meu mundo imediato e de cuja existência eu não podia sequer suspeitar.
Os meus temores noturnos terminaram por me aguçar, manhãs abertas, a percepção de um sem-número de ruídos que se perdiam na claridade e na algazarra dos dias e que eram misteriosamente sublinhados no silêncio fundo das noites.
Na medida, porém, em que me fui tomando íntimo do meu mundo, em que melhor o percebia e o entendia na “leitura” que dele ia fazendo, os meus temores iam diminuindo.
Permitir que a criança e o jovem viva, constantemente, experiências ricas, produtivas, diversas e instigantes nas suas relações com o outro, com as coisas e o mundo, é torná-los mais sensíveis e produtores da palavra mundo, da leitura de mundo.
Viver sensações, emoções diferentes é promover na criança e no jovem a capacidade de externalizar seus pensamentos, de emitir opiniões, de produzir visões de mundo em razão de uma participação social mais efetiva.
 Neste momento do texto de Freire, percebe-se como o espaço familiar é de fundamental importância na construção do olhar, na percepção de mundo que se constrói a partir das experiências vivenciadas e dos registros que realizamos em nossa memória intuitiva e perceptiva.
O contexto social e as diversas implicações que se estabelecem em nosso mundo infantil e juvenil será registrado, organizado e armazenado em nossa memória e transformado em conhecimento. Como Freire afirma, “o texto”, “as palavras”, surgem antes no pensamento, na expressão de nossa fala acerca do que observamos do que na produção escrita e leitura formal que iremos mais tarde aprender.
Nesse sentido, a linguagem será cada vez mais elaborada, mais reflexiva, mais particular e percebida como processo de “ler o mundo”. Para isso, o ambiente precisa ser natural e rico em experiências.
Saiba
Mais
Assim, observa Eric H. Lennerberg:
“Desde que a criança seja rodeada de um ambiente falante, a linguagem se desenvolverá automaticamente, com uma rígida história de desenvolvimento, uma forma altamente específica de comportamento de generalização, e uma relativa dependência da história maturacional da criança.” (In. Chomsky et alii, 1970: 86-7)‏
Luft fortalece esta ideia quando diz,
“A linguagem da criança, quanto ao nível cultural e vocabulário, dependerá naturalmente do meio em que ela vive, dos modelos a que é exposta para liberar suas próprias capacidades.” (p.56)
Mas, é importante dizer, a “leitura” do meu mundo, que me foi sempre fundamental, não fez de mim um menino antecipado em 
homem, um racionalista de calças curtas. A curiosidade do menino não iria distorcer-se pelo simples fato de ser exercida, no que fui mais ajudado do que desajudado por meus pais. E foi com eles, precisamente, em certo momento dessa rica experiência de compreensão do meu mundo imediato, sem que tal compreensão tivesse significado malquerenças ao que ele tinha de encantadoramente misterioso, que eu comecei a ser introduzido na leitura da palavra. 
A decifração da palavra fluía naturalmente da “leitura” do mundo particular. Não era algo que se estivesse dando superpostamente a ele. Fui alfabetizado no chão do quintal de minha casa, à sombra das mangueiras, com palavras do meu mundo e não do mundo maior dos meus pais. O chão foi o meu quadro-neqro; gravetos, o meu giz. 
Eunice (a primeira professora) continuou e aprofundou o trabalho de meus pais. Com ela, a leitura da palavra, da frase, da 
sentença, jamais significou uma ruptura com a ‘leitura do mundo. Com ela, a leitura da palavra foi o leitura da “palavramundo”. 
Mais uma vez, notamos o quanto a família é importante na construção de estímulos à prática da língua. A família é o primeiro contato do indivíduo com a sua língua, com as palavras, e ter neste ambiente um local propício ao aprendizado adequado e rico da língua é de extrema relevância.
Continuando neste esforço de “re-ler” momentos fundamentais de experiências de minha infância, de minha adolescência, de minha mocidade, em que a compreensão crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo através de sua prática, retomo o tempo em que, como aluno do chamado curso ginasial, me experimentei na percepção crítica dos textos que lia em classe, com a colaboração, até hoje recordada, do meu então professor de língua portuguesa.
Não eram, porém, aqueles momentos puros exercícios de que resultasse um simples dar-nos conta de uma página escrita diante de nós que devesse ser cadenciada, mecânica e enfadonhamente “soletrada” e realmente lida. Não eram aqueles momentos “lições de leitura”, no sentido tradicional desta expressão. Eram momentos sem que os textos se ofereciam à nossa inquieta procura, incluindo a do então jovem professor José Pessoa.
Mais tarde, se percebe que a inserção do menino no espaço escolar, longe de afugentar das aulas de língua portuguesa, promoveu a sua proximidade com a língua em razão de Freire ter uma professora que respeitava a competência linguística que o aluno já trazia, além de provocar e valorizar o desenvolvimento de novas e complexas práticas de leitura e escrita.
Tudo isso contribuiu, ao longo do tempo, com a formação de Freire como professor de português. O seu papel no ensino da língua tem caráter inovador e crítico com relação às práticas costumeiras do ensino da língua e de suas regras. A leitura dos textos, e de algumas obras, tinha como critério avaliar as diferenças da língua produzida no país, como incentivar a leitura crítica, questionadora e formadora de opinião nos exercício pleno dos saberes linguísticos.
Algum tempo depois, como professor também de português, nos meus vinte anos, vivi, intensamente, a importância elo de ler e de escrever, no fundo indicotomizáveis, comos alunos das primeiras séries do então chamado curso ginasial. A regência verbal, a sintaxe de concordância, o problema da crase, o sinclitismo pronominal, nada disso era reduzido por mim a tabletes de conhecimentos que devessem ser engolidos pelos estudantes. Tudo isso, pelo contrário, era proposto à curiosidade dos alunos de maneira dinâmica e viva, no corpo mesmo de textos, ora de autores que estudávamos, ora deles próprios, como objetos a serem desvelados e não como algo parado, cujo perfil eu descrevesse.
Os alunos não tinham que memorizar mecanicamente a descrição do objeto, mas apreender a sua significação profunda. 
Só apreendendo-a seriam capazes de saber, por isso, de memorizá-la, de fixá-la. A memorização mecânica da descrição do elo não se constitui em conhecimento do objeto. Por isso, é que a leitura de um texto, tomado como pura descrição de um objeto, é feita no sentido de memorizá-la, nem é real leitura, nem dela portanto resulta o conhecimento do objeto de que o texto fala.
Creio que muito de nossa insistência, enquanto professoras e professores, em que os estudantes “leiam”, num semestre, um sem-número de capítulos de livros, reside na compreensão errônea que às vezes temos do ato de ler. Em minha andarilhagem pelo mundo, não foram poucas às vezes em que jovens estudantes me falaram de sua luta às voltas com extensas bibliografias a serem muito mais “devoradas" do que realmente lidas ou estudadas. Verdadeiras “lições de leitura" no sentido mais tradicional desta expressão, a que se achavam submetidos em nome de sua formação científica e de que deviam prestar contas através do famoso controle de leitura.
Em algumas vezes cheguei mesmo a ler, em relações bibliográficas, indicações em torno de que páginas deste ou daquele capítulo de tal ou qual livro deveriam ser lidas: "Da página 15 a 37".
A insistência na quantidade de leituras sem o devido adentramento nos textos a serem compreendidos, e não mecanicamente memorizados, revela uma visão mágica da palavra escrita. Visão que urge ser superada. A mesma, ainda que encarnada desde outro ângulo, que se encontra, por exemplo, em quem escreve, quando identifica a possível qualidade de seu trabalho, ou não,com a quantidade de páginas escritas. No entanto, um dos documentos filosóficos mais importantes de que dispomos, As teses sobre Feuerbach, de Marx, tem apenas duas páginas e meia...
Parece importante, contudo, para evitar uma compreensão errônea do que estou afirmando, sublinhar que a minha crítica a magicização da palavra não significa, de maneira alguma, uma posição pouco responsável de minha parte com relação à necessidade que temos, educadores e educandos, de ler, sempre e seriamente, os clássicos neste ou naquele campo do saber, de nos adentrarmos nos textos, de criar uma disciplina intelectual, sem a qual inviabilizamos a nossa prática enquanto professores e estudantes.
Continuando neste esforço de “re-ler” momentos fundamentais de experiências de minha infância, de minha adolescência, de minha mocidade, em que a compreensão crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo através de sua prática, retomo o tempo em que, como aluno do chamado curso ginasial, me experimentei na percepção crítica dos textos que lia em classe, com a colaboração, até hoje recordada, do meu então professor de língua portuguesa.
Creio desnecessário me alongar mais, aqui e agora, sobre o que tenho desenvolvido, em diferentes momentos, a propósito da complexidade deste processo. A um ponto, porém, referido várias vezes neste texto, gostaria de voltar, pela significação que tem para a compreensão crítica do ato de ler e, consequentemente, para a proposta de alfabetização a que me consagrei. Refiro-me a que a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitura daquele.
Na proposta a que me referi acima, este movimento do mundo à palavra e da palavra ao mundo está sempre presente. Movimento em que a palavra dita flui do mundo mesmo através da leitura que dele fazemos. De alguma maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”, quer dizer, de transformá–lo através de nossa prática consciente.
A palavra tijolo, por exemplo, se inseriria numa representação pictórica, a de um grupo de pedreiros, por exemplo, construindo uma casa. Mas, antes da devolução, em forma escrita, da palavra oral dos grupos populares, a eles, para o processo de sua apreensão e não de sua memorização mecânica, costumávamos desafiar os alfabetizandos com um conjunto de situações codificadas de cuja decodificação ou “leitura” resultava a percepção crítica que é cultura, pela compreensão da prática ou do trabalho humano, transformador do mundo. No fundo, esse conjunto de representações de situações concretas possibilitava aos grupos populares uma "leitura” da "leitura” anterior do mundo, antes da leitura palavra.
Paulo Freire 12 de novembro de 1981
Ensinar a língua portuguesa, para Freire, não era exatamente, a demonstração de um conjunto de conceitos, nomenclaturas, regras e exceções.
Ensinar a ler, a escrever e a falar era algo muito mais inerente ao ser humano, muito mais inerente a sua capacidade de transformar-se e de transformar o ambiente.
Ensinar a palavra não era um processo de dicionarização da mesma, mas a construção de saberes, de construção crítica da palavra dentro de um contexto e de uma realidade social, política e cultural do indivíduo.
Para Freire ensinar a ler, era garantir ao aluno seu acesso pleno ao exercício da cidadania direito inalienável de todos.
Aula 4- Linguistica e o ensino de língua portuguesa
Linguística:
A primeira seria o estudo da linguagem. Ciência que se ocupa do estudo da linguagem humana manifestada pelas diferentes línguas.
A segunda definição é o estudo da faculdade humana de linguagem e das línguas que existem ou existiram, historicamente.
Sendo assim, precisamos ter um breve histórico do campo da linguística.
Em seu ensaio “Erros de Escolares como Sintomas de Tendências do Português no Rio de Janeiro”, Mattoso afirmava que muitos dos erros e desvios na produção oral e escrita dos alunos, das escolas de ensino fundamental e médio, que eram observadas pelos professores não era nada mais do que mudanças e adaptações que a língua estava fazendo conforme as regiões e grupos distintos.
Saiba
Mais
Foi com Joaquim Mattoso Câmara Jr., linguista brasileiro, que os primeiros estudos sobre o ensino da língua ocorreram.
Pensar então na ideia do erro ou incapacidade do aluno de usar a sua língua era um equívoco. Assim, Mattoso sugeria que os professores começassem a se interessar pela diversidade linguística da língua em nosso país em razão de suas dimensões geográficas e práticas sociais e culturais tão particulares. Ao rever seu conceito de língua, os professores começariam a compreender melhor os procedimentos de ensino da língua materna.
Saiba
MaisRefazer a ideia de unidade da língua seria inicialmente confuso e complicado, pois ao longo de nossa história, a gramática sempre foi considerada um veículo norteador de nossa língua, ou seja, sempre foi caracterizada como padrão normativo de como as pessoas falantes do português deveriam se expressar corretamente.
Compreender um pouco a contribuição da linguística no estudo da língua torna-se fundamental para que a aprendizagem tenha sentido para o aluno e que o professor compreenda os meios pelos quais ele deve iniciar o estímulo ao aprimoramento da competência e habilidade no uso da língua.
Obviamente que toda língua necessita de normas que estabeleçam um padrão para que todos compreendam o que falamos ou escrevemos, pois sem um princípio norteador dessa produção todos não conseguiram se entender.
Gramática
Nesse sentido,poderíamos conceituar o termo como um conjunto de regras determinadas da língua de um mesmo povo a fim de estabelecer um único padrão oficial de produção oral e escrita dentro do conceito de “expressividade correta e elegante”.
Se consideramos este conceito de gramática como determinante da produção oral e escrita do falante, não saberíamos analisar as diferenças que ocorrem na língua em regiões diversas ou até mesmo entre os falantes num mesmo espaço.
Falando um pouco de história...
Em 1957, um grupo de estudiosos da língua, após estudos sistematizados, aprovaram em caráter de recomendação a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), e muitos compêndios de gramática que utilizavam a nomenclatura recomendada foram publicados na esteira desse processo.Baseado nisso, até o final do século XX, nas escolas, estudar língua portuguesa na verdade, consistia no estudo da gramática, no estudo de conceitos, regras e listas de exceções da língua através de frases ou períodos sem o menor sentido. Não havia o estudo ou análise de textos, de palavras que fizessem algum sentido ou remetessem a algum texto para o debate e a produção oral e escrita a partir do texto.
Estudar acentuação gráfica, ortografia, estudo das listas de verbos e a prática constante da análise sintática se faziam presente em frases desconexas. O objetivo na construção de frases ou períodos, ou até mesmo, na apresentação de trechos de parágrafos era exemplificar a aplicação das regras apresentadas pelo professor.
Assim, ao apresentar as regras e análise da língua, o falante que adentrava a escola percebia que aprender uma outra língua seria algo difícil por ser  esta “limpa, correta”, sem desvios ou erros como o professor apresentava em sala de aula.
Para que o aprendizado ficasse mais complicado, o professor de língua portuguesa apresentava textos do Barroco ou Arcadismo como primores da beleza da língua.
Além de falar de autores como Camões ou o Padre Vieira que tinham construções complexas e com uma linguagem cheia de duplo sentido.
Desse modo, a criança que chegava a primeira vez na escola percebia que esta existia apenas para apresentar, ensinar e fazer praticar o português culto. 
Notava também que a língua que ela trazia era ignorada e a diversidade não deveria ser fruto de estudo e manutenção porque definir uma pronúncia ou estruturapadrão era a regra.
Entretanto, para aqueles que estudam a língua, os linguistas, a língua não se confunde com frases soltas, com “seleção vocabular adequada” no comportamental verbal do dia a dia. Ao contrário, a língua é fruto de uma produção muitas vezes abstrata, subjetiva e diversa pelo contexto histórico, temporal, social e cultural. Cada comunidade possui um conhecimento socializado da língua que produz diversidade, mas também sentido e funcionalidade no uso da língua.
Estudar com o conceito de língua padrão seria um procedimento preconceituoso e inadequado. Afinal, estudar apenas os textos antigos, de escritores famosos, textos de produções acadêmicas e livros como determinantes de um padrão da língua seria desconsiderar toda a diversidade de produção oral e escrita nos lugares mais distantes de nosso país.
Percebe-se que os falantes de uma mesma língua gostam de compartilhar, de demonstrar sua riqueza e diversidade cultural. Os estudiosos perceberam que havia muito mais diversidade e variantes da língua do que a construção da ideia de uniformidade.
Como não perceber e não estudar o dialeto caipira, o jeito mineiro de se expressar, o modo ‘paulistês’, o ‘gauchês’, o falar do sertanejo, as gírias e chiados do carioca assim como tantas outras variedades regionais em nosso país.
Necessário perceber que, de acordo com as condições sociais, culturais, regionais e históricas em que a língua é usada, há variações que esta apresenta ao qual os estudiosos acabaram de nomear como variedades linguísticas.
Desse modo, estudar a língua por suas variedades deveria ser o modo mais comum e abrangente.
Painho
!
Tchê
!
Uai!
Estudar as diferenças e diversidades de produção oral da língua não deveria, então, se constituir meios de apontar algumas variedades como corretas e outras erradas, mas, sim, descrever suas características particulares e as regularidades presentes em cada variedade de modo que o conceito de “erro” seria, na verdade, uma diferença entre os diferentes sistemas linguísticos que convivem no mesmo país.
Aliás, cabia ao aluno apenas decorar as regras e exceções da língua através de sua norma e que assim seria capaz de compreender, falar e escrever corretamente e adequadamente. Mas o que notamos é que a gramática normativa descrevia e avaliava uma língua distante do texto, longe das diversas produções concretas, reais do cotidiano. Estudar o texto deveria ser o mais importante, perceber as diferenças de sentido para uma mesma palavra em razão de sua variante regional também tornaria a aula mais produtiva, mais próxima de uma realidade, além de promover ao aluno a compreensão de que os “falares” distintos são parte de um mesmo país, de um mesmo povo.
Por estas razões, a prática do ensino gramatical nas escolas começou a ser questionada em razão de que este ensino estava centrado em normas e padrões de prestígio determinados por um grupo socialmente distante da realidade regional e cultural do país.
O modo como o estudo da gramática se baseava nas salas de aula estava dicotomizado, ou seja, dividido em frases, expressões isoladas de uma realidade, de um contexto e que não traziam nada de relevante e significativo ao aluno.
Um exemplo muito simples dessa nossa diversidade regional é o caso do famoso pãozinho francês e como este é conhecido em diferentes lugares:
Rio Grande do Sul: cacetinho
Ceará: carioquinha
Interior do Nordeste: pão aguado
Região Norte: carequinha
Rio de Janeiro: pão de sal
Há na linguística duas correntes importantes que definiram o rumo do ensino de língua portuguesa em nosso país.
A primeira é conhecida como a linguística estruturalista que tinha como defensores o suíço Ferdinand de Saussure e o russo-americano Roman Jakobson que pensaram a língua como um sistema e o modo como o indivíduo realizava a aquisição da linguagem.
A segunda é conhecida como a gramática gerativa de Noam Chomsky que perdura até hoje.
As diferenças entre as linguísticas são grandes:
A linguística estruturalista alinhava seus conceitos sobre linguagem em bases behavioristas, sugerindo que a língua é assimilada por um processo indutivo, no qual a exposição constante a uma grande quantidade de dados era fundamental, ou seja, a língua era concebida como um objeto matemático, quanto mais interação, quanto mais envolvimento, mais assimilação e aprendizado efetivo.
Chomsky afirma que mesmo todo indivíduo, já possuindo essa capacidade inata de aprendizagem da língua, a aquisição da linguagem se dá dentro de um período e prazo determinado pelas condições do ambiente e, mais precisamente, na primeira infância.
Chomsky afirma que o aprendizado da linguagem deve ser baseado não apenas no aspecto social, mas principalmente na esfera do psicológico e do biológico. A produção da linguagem ocorre em razão de uma capacidade inata que é a mesma para todos os indivíduos da espécie humana. Logo, todos são capazes de aprender uma língua e se adaptar com as suas diferenças em razão dessa aptidão inata.
Por esta razão, podemos perceber que a uma criança com pouco mais de 3 anos já domina cerca de 5000 palavras do vocabulário da sua língua e produz frases com sentido (não estamos falando aqui de situações complexas e de expressões e palavras pouco comum no dia a dia).
É importante compreender que na infância os estímulos ao uso da língua permitem que a criança assimile rapidamente ou que até mesmo aprenda outro idioma com uma facilidade que não será mais a mesma na fase adulta.
Primeiro, a língua não é algo a ser ensinada no seu sentido normativo gramatical, mas, sim, deve-se dimensionar ao aprendizado da língua a partir de uma exposição constante de dados significativos da fala e da escrita em suas mais diversas situações e especificidades, demonstrando ao aluno que as práticas sociais da língua perpassam pela noção do uso funcional e de certas particularidades da cada grupo ou comunidade falante de uma mesma língua.
Não se trata aqui de afirmar o abandono do ensino da gramática, mas fazer uso dela como instrumento norteador para uma melhor adequação das práticas orais e escritas da língua em situações mais formais como, por exemplo, a linguagem técnica e a científica.
Nesse sentido, o professor de língua portuguesa, ao compreender que as crianças já são falantes de sua língua quando chegam à escola, deve redirecionar a especificidade do seu papel no ensino da língua materna.
Outra questão a ser estudada no campo da linguística é o do funcionalismo. A denominação “funcionalismo” se dá em razão de seu objetivo ser explicar as características formais da língua através das funções que exerce.
“Os estudos linguísticos também precisam ser considerados na linha da Sociolinguística e do Funcionalismo."
A Sociolinguística  considera a língua  em seu aspecto social, assinalando as variações..
Funcionalismo
Promover um estudo abrangente da língua com relação aos significados e competência para interagir em diversos aspectos da interlocução é um princípio do funcionalismo.
Essa concepção remota à chamada “Escola Linguística de Praga”, particularmente a seus representantes anteriores à Segunda Guerra Mundial e retomada na segunda metade do século XX.
O linguista inglês Halliday  demonstrou que qualquer sentença cumpre simultaneamente três funções, que ele chamou de:
Ideacional - Fornecer representações do mundo.
Interpessoal - Monitorar o fluxo de informação nova num contexto dado.
Textual - Instaurar diferentes formas de interlocução como perguntar, afirmar, ordenar, assumir graus diferentes de comprometimento em relação àquilo que se diz.
Um importante aspecto a considerar é o princípio de escolha. Para o funcionalismo, cada pessoa pode utilizar a língua de seu grupo social de uma maneira particular que, em alguns casos, pode se configurar a um estilo pessoal, personalizado, ou seja, o falante constrói seus enunciados, escolhendo simultaneamente em vários conjuntos de alternativas proporcionados pelo sistema linguístico.
EXEMPLO
Você, ao falar ou escrever, dá preferência a determinadaspalavras, expressões ou construções que se incorporam ao seu modo de usar a língua, seja em decorrência de sua comunidade mais próxima (família, grupo de amigos, ambiente de trabalho, escola etc.) ou por uma opção consciente, decorrente de suas leituras ou experiências linguísticas (ao produzir qualquer frase, escolhemos não apenas as palavras, mas também a construção gramatical, a entonação etc.).
O papel do falante e as particularidades da mensagem produzida por ele são fundamentais não apenas para se entender os motivos de certas escolhas, mas também para o estudo dos diversos gêneros textuais e do estilo.
Nota-se assim que a linguística é uma ciência teórica e descritiva, e a sua função não é apenas compreender o que é a língua, mas, sim, compreender as variantes que a linguagem produz na diversidade social, regional e histórica.
Compreender isso é permitir ao aluno não apenas conhecer estas diferenças, mas também respeitar e valorizar a diversidade regional e cultural de um país.
O ensino da língua portuguesa em nossas escolas não pode se caracterizar como opressor e repressor dessas diferenças. Não deve impor uma língua “livresca”, uma língua apenas produzida pela gramática.
Em uma obra de grande importância para o nosso estudo, Língua e Liberdade, de Celso Luft (2004), este afirma:
“O que me preocupa profundamente é a maneira de se ensinar a língua materna, as noções falsas de língua e gramática, a obsessão gramaticalista, a distorcida visão de que ensinar uma língua seja ensinar a escrever certo, o esquecimento a que se relega a prática da língua, e, mais que tudo: a postura opressora e repressiva, alienada e alienante desse ensino, como em geral de todo o nosso ensino em qualquer nível e disciplina. “(p. 12) 
Infelizmente, ainda há uma forte corrente de professores que pensam que o ensino de língua portuguesa deve ser estruturado através do aprendizado de um compêndio de regras que definem o funcionamento de determinada norma, além da exposição constante de exercícios de classificação e identificação de termos da língua.
É inegável que repensar o conceito de ensino da língua é fator primordial para que possamos dar sentido, relevância às produções orais e escritas advindas inicialmente dos alunos e, ao mesmo tempo, apresentar uma diversidade de gêneros textuais que circulam no dia a dia nos mais diferentes níveis de interlocução, sejam estes formais ou informais.
Olhar para a língua como construção de competência e habilidade aos saberes linguísticos no campo social, regional, cultural e histórico é permitir olhar para o aprendizado sob o ângulo do possível, do aceitável, do permitido, do diverso,  da simples e criteriosa imposição da correção e do que é gramaticalmente correto.
Alguns professores já perceberam que o ensino de língua portuguesa é muito mais do que ensinar gramática, mas, sim, ensinar as diversas possibilidades que a língua permite fazer uso e mostrar que o domínio da língua é promover a inserção e participação social efetiva do indivíduo em diferentes situações de exposição.
Apesar de todos os estudos da linguística, com o objetivo de demonstrar a realidade da diversidade da língua em nosso país e da percepção de alguns professores de sua importância no ensino da língua portuguesa, ainda notamos resistência de professores mais arraigados a questão da gramática normativa, assim como, de grupos socialmente de prestígio.
Além da mídia, falada ou escrita, que corrobora com a ideia de uniformidade linguística em detrimento de características e particularidades de cada região, estigmatizando as formas populares, tornando a língua um fator mais de exclusão social do que um instrumento de inserção e participação social efetiva na produção do conhecimento e ao exercício da cidadania.
Aula 5- Mitos da língua portuguesa e o preconceito lingüístico
Dentre os mitos que compõem o preconceito na nossa cultura, temos dois:
O primeiro diz que o “brasileiro não sabe português” e isso parece tão comum e verdadeiro quando se nota o alto índice de analfabetos em nosso país (cerca de 20 milhões de brasileiros) e ainda o de analfabetos funcionais (são alfabetizados, sabem ler e escrever, mas possuem extrema dificuldade de interpretação e de produzir textos próprios).
O outro afirma que “português é muito difícil”. Este mito surge porque na fala do brasileiro se percebe, em suas várias regiões, uma diversidade linguística muito grande que muitas vezes não é prevista ou aceita na gramática normativa da língua, pois não está inserida dentro da língua de prestígio. Logo, as diferenças e ou exceções são tratadas como erradas ou de difícil compreensão. Além disso, o “falar diferente” é visto como um empecilho para a ideia de uniformidade linguística que muitos gostam de apregoar.
Outra questão importante a considerar logo de início em nossa aula é a ideia do termo preconceito linguístico.
Por preconceito linguístico entende-se:
O julgamento negativo que é feito dos falantes em função da variedade linguística que utilizam.
De fato, tais mitos e o preconceito surgiram quando estudiosos da língua determinaram a necessidade de uma língua padrão ou uma norma culta que deveria permear as relações de comunicação tanto oral quanto escrita. Acontece que isso passou a considerar uma língua de prestígio social somente baseada na cultura livresca, em textos técnicos e científicos, além de práticas orais de grupos socioculturais favorecidos.
Uma das variantes que mais denota preconceito é a variante regional.  
Denominam-se variante regional as falas das diferentes regiões de um país. Assim, como este é diferente da fala dos Estados do Nordeste.
A fala do carioca é diferente da fala do paulista.
A fala nordestina é diferente da fala dos Estados do Sul.
Percebe-se assim que cada região geográfica possui diferenças linguísticas.
Apesar das distinções da fala dessas regiões, todos que nasceram e aprenderam a língua portuguesa são falantes de uma mesma língua, pois a ela  se caracteriza por uma estrutura de signos e significados semelhantes.
Logo, a diversidade regional não deve se caracterizar como impedimento na compreensão entre os falantes do mesmo país. Assim, não se pode produzir uma visão preconceituosa das diferenças de vocabulário e pronúncia.
Obviamente, qualquer país precisa construir uma unidade de entendimento e a língua deve ser e sempre será o meio mais adequado para que todos que residam no mesmo país possam se comunicar e se fazer entendido.
Logo, quando se pensa na língua como unidade padrão nas relações sociais e culturais de um povo, estabelecer uma forma, uma norma padrão deve ser o canal de interlocução mais usado e importante a todos os falantes. Mas, para isso, é necessário garantir o acesso aos saberes linguísticos em todos os níveis sociais de modo que o modelo de língua padrão estabelecido seja determinado com clareza a fim de que os grupos sociais a compreendam e empreguem adequadamente sem que se estabeleçam critérios de desvalorização de formas e usos da língua em diferentes grupos.
Na verdade, se entendermos que toda língua apresenta variações que são determinadas e condicionadas por aspectos sociais, culturais e regionais, não teríamos uma visão preconceituosa. Afinal, cada indivíduo ou grupo se expressa conforme o ambiente em que está inserido.
Sendo assim, todas as variedades representam sistemas linguísticos adequados para a expressão das necessidades comunicativas e cognitivas dos falantes.
Não se pode determinar uma variedade como a única correta e considerar as outras como desvios, vícios da norma padrão.
Saiba
MaisTal posição se faz relevante para que se entenda que, nos bancos escolares,  o ensino da língua portuguesa deve pressupor,  sim,  uma unidade padrão como critério de conhecimento e aprendizagem com o objetivo de fazer o falante adentrar nos espaços socioculturais de prestígio e ter acesso mais amplo aos textos científicos, acadêmicos, literários e culturais.
O aprendizado da língua deve ser baseadono uso que os diversos grupos sociais fazem da língua que circula na mídia oral e escrita, garantindo ao aluno o acesso aos diversos gêneros textuais, assim como, permitindo que saiba reconhecer e empregar a língua na circulação e elaboração de textos apropriados às interações profissionais e sociais ou na prática oral em situações:
Formais: Palestras, seminários, reuniões de trabalho e casamento.
Informais: Grupo de amigos em clubes, festas ou em situações de descontração e diversão.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de língua portuguesa declara:
“O problema do preconceito disseminado na sociedade em relação às falas dialetais deve ser enfrentado, na escola como parte do objetivo educacional mais amplo de educação para o respeito à diferença. Para isso e também para poder ensinar língua portuguesa, a escola precisa livrar-se de alguns mitos: o de que existe uma única forma “certa” de falar — a que se parece com a escrita — e o de que a escrita é o espelho da fala — e, sendo assim, seria preciso “consertar” a fala do aluno para evitar que ele escreva errado.
A questão não é falar certo ou errado, mas saber qual forma de fala utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. É saber coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa.
É saber, portanto, quais variedades e registros da língua oral são pertinentes em função da intenção comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar adequadamente, é produzir o efeito pretendido.” (p.31)
Essas duas crenças produziram uma prática de mutilação cultural que, além de desvalorizar a forma de falar do aluno, tratando sua comunidade como se fosse formada por incapazes, denota desconhecimento de que a escrita de uma língua não corresponde inteiramente a nenhum de seus dialetos, por mais prestígio que um deles tenha em um dado momento histórico.
É saber, portanto, quais variedades e registros da língua oral são pertinentes em função da intenção comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar adequadamente, é produzir o efeito pretendido.” (p.31)
Um aspecto importante a se considerar no ensino da língua portuguesa é que trazer para a sala de aula a diversidade linguística é reconhecer o valor das diferenças e a sua importância cultural na região na qual esta ocorre.
Veja dois exemplos bem interessantes de demonstração e valorização da língua considerada não padrão, mas que através da literatura de cordel e da música mostram a riqueza de nossa língua:
O POETA DA ROÇA
Sou fio das mata, cantô da mão grossa,
Trabáio na roça, de inverno e de estio.
A minha chupana é tapada de barro,
Só fumo cigarro de páia de mío.
Sou poeta das brenha, não faço o papé
De argummenestré, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola,
Cantando, pachola, à percura de amô.
Não tenho sabença, pois nunca estudei,
Apenas eu sei o meu nome assiná.
Meu pai, coitadinho! vivia se cobre,
E o fio do pobre não pode estudá.
Meu verso rastêro, singelo e sem graça,
Não entra na praça, no rico salão,
Meu verso só entra no campo e na roça
Nas pobre paioça, da serra ao sertão
Só canto o buliço da vida apertada,
Da lida pesada, das roça e dos eito.
E às vez, recordando a feliz mocidade,
Canto uma sodade que mora em meu peito.
Eu canto o cabôco com sua caçada,
Nas noite assombrada que tudo apavora,
Por dentro da mata, com tanta corage
Topando as visage chamada caipora.
Eu canto o vaquêro vestido de côro,
Brigando com o tôro no mato fechado
Que pega na ponta do brabo novio,
Ganhando lugio do dono do gado. 
Eu canto o mendigo de sujo farrapo,
Coberto de trapo e mochila na mão,
Que chora pedindo o socorro dos home,
E tomba de fome, sem casa e sem pão.
E assim, sem cobiça dos cofre luzente,
Eu vivo contente e feliz com a sorte,
Morando no campo, sem vê a cidade,
Cantando as verdade das coisa do Norte.
(ASSARÉ, Patativa do. Cante lá que eu canto cá. 3.ed. Petrópolis: Vozes, 1980.)
A Gíria É A Cultura Do Povo
Toda hora tem gíria no asfalto e no morro
porque ela é a cultura do povo
Pisou na bola conversa fiada malandragem
Mala sem alça é o rodo, tá de sacanagem
Tá trincado é aquilo, se toca, vacilão
Tá de bom tamanho, otário fanfarrão
Tremeu na base, coisa ruim não é mole não
Tá boiando de marola, é o terror alemão
Responsa catuca é o bonde, é cerol
Tô na bola corujão vão fechar seu paletó
“Toda hora tem gíria...
Se liga no papo, maluco, é o terror
Bota fé compadre, tá limpo, demorou
Sai voado, sente firmeza, tá tranquilo
Parei contigo, contexto, baranga, é aquilo
Tá ligado na fita, tá sarado
Deu bode, deu mole qualé, vacilou
Tô na área, tá de bob, tá bolado
Babou a parada, mulher de tromba, sujou
“Toda hora tem gíria...
Sangue bom tem conceito, malandro e o cara aí
Vê me erra boiola, boca de sirí
Pagou mico, fala sério, tô te filmando 
É ruim hem! O bicho tá pegando
Não tem caô, papo reto, tá pegado
Tá no rango mané, tá lombrado
Caloteiro, carne de pescoço, paga pau
Tô legal de você sete-um, gbo, cara de pau 
“Toda hora tem gíria...
A gíria é cultuta do popular
Se liga amizade
Tá certíssimo 
(Letra: Alves, Elis e Júnior)
Através desses textos, percebe-se que refletir sobre as formas e usos da língua portuguesa deve ser um processo contínuo de aumentar a eficiência do aluno na produção e interpretação dos textos orais e escritos, ampliando a sua fruição dos diversos gêneros textuais de modo que possibilite a sua capacidade crítica, sensível e inteligente no uso da língua.
Conhecer bem a língua em que se vive e pensa é investir no ser humano, investir na capacidade de se viver bem individual e socialmente.
Aula 6
Nesta aula, vamos chamar a atenção para o conceito de dialeto e destacar as diferenças dialetais em razão dos aspectos regionais e socioculturais. Vamos ressaltar a questão do certo, do errado e do diferente sob o ponto de vista dialetal na fala e na escrita. Em seguida, analisar o papel do professor no tratamento das diferenças dialetais na construção linguística do aluno.
É importante iniciar esta aula dizendo que todos nós, falantes da língua portuguesa no Brasil, possuímos diferenças na fala e, em algumas situações, até mesmo na escrita, em decorrência das questões geográficas, sociais, históricas, de grupos e familiares que irão determinar um estilo, um perfil no modo de falar de cada membro. Desse modo, cada brasileiro fala do jeito próprio da região onde vive, a nossa Língua Portuguesa é composta por vários dialetos.
Entende-se por dialeto não apenas as variações de pronúncia, vocabulário e gramática, pertencentes a uma determinada língua, mas também, as variedades regionais originadas das diferenças de região ou território, de faixas etárias, de sexo, de aspectos sociais, históricos e, também, estilísticas.
Segundo Cagliari (2003): “Todo falante nativo usa sua língua conforme as regras próprias de seu dialeto, espelho da comunidade linguística a que está ligado” (p. 18)1.
Ou seja, cada falante constrói e segue as regras próprias de sua comunidade linguística.
Para ilustrar o que citamos, segue o texto: Língua Brasileira, de Kledir Ramil. 
Lingua brasileira 
[...J O Brasil tem dessas coisas, é um pais maravilhoso, com o português como língua oficial, mas cheio de dialetos diferentes. 
No Rio de Janeiro é “e ai merrmãol CB, sangue bom!” Até eu entender que merrmão era “meu irmão” Levou um tempo. Para conseguir se comunicar, além de arranhar a garganta com o erre, você precisa aprender a chiar que nem chaleira velha: “vai rolá umasch paradasch ischperrtasch”. 
Na cidade de São Pauloeles botam um ‘9” a mais na frente do “n”: “ôcra meu! Tõ por deintro, mas não to inteindeindo o que eu tô veindo”. E no intenorrr falam um erre todo enrolado: “a Ferrrnanda marrrcô a porrrtelra”. Dá um nó na Língua. A vantagem é que a pronúncia deles no ingLês é ótima. 
Em Mins, quer dizer em Minas, eLes engolem letras e falam BeLzonte, Nossenhora, Doidemais da conta, sôl Qualquer objeto é chamado de trem. Lembrei daquela história do mineirinho na plataforma da estação. Quando ouviu um apito, falou apontando as malas: “Muié, pega os trem que o bicho tá vindo”. 
No Nordeste é tudo meu rei, bichinho, á xente. Pai é painho, mãe é mainha, vá é voinha. E pra você conseguir falar com o acento típico da região, é só cantar a primeira sílaba de quaLquer paLavra numa nota mais aguda que as seguintes. As frases são sempre em escaLa descendente, ao contrário do sotaque gaúcho.
Mas o Lugar mais interessante de todos é Florianópolis, um paraíso sobre a terra, abençoado por Nossa Senhora do Desterro. Os nativos tradicionais, conhecidos como Manezinhos da Ilha, têm o linguajar mais simpático da nossa língua brasileira. Chamam Lagartixa de crocodilinho de parede. Helicóptero é avião de rosca (que deve ser Lido rôschca). Carne moida é boi ralado. Se você quiser um pastel de carne precisa pedir um enveLope de boi raLado. Telefone público, o popular oreLhão, é conhecido como poste de prosa e a ficha de telefone é pastilha de prosa. Ovo eles chamam de semente de galinha e motel é Lugar de instantinho. [...] 
Ramil, Kledir. Tipo assim. Porto Alegre: RBS Publicações, 2003. p. 75-76. (Fragmento). 
Devemos considerar estas diferenças dialetais com o objetivo de não apenas buscar entender e aprender tais peculiaridades de cada grupo ou região, mas também, assumir uma postura de respeito e permitir que cada indivíduo fale do modo que é próprio ao grupo que pertence sem que a comunicação torne-se prejudicada pelo preconceito do interlocutor. O que deve ser considerado em questão é o valor da transmissão da informação e da compreensão desta no contexto estabelecido.
Um aspecto que também devemos mencionar com relação ao dialeto é referente ao estilo, ou a questão estilística que é determinada pelo contexto de uso da língua. Quanto maior o conhecimento ou domínio da língua, a produção do falante pode ser de modo coloquial ou formal conforme o ambiente inserido.
Por exemplo, em situações familiares ou em grupos de amigos, a linguagem coloquial seria a mais oportuna.
Já em grupos acadêmicos, reuniões empresariais, palestras técnicas e audiências jurídicas, por exemplo, a linguagem formal seria a mais apropriada.
Somente para ilustrar a questão da linguagem formal ou informal, veja abaixo o quadrinho de Calvin:
Neste quadrinho, podemos notar a irreverência do personagem Calvin que critica a forma pela qual o seriado policial apresenta a linguagem. Percebe-se o uso da língua de modo inadequado ao contexto (televisivo, seriado policial), assim como o seriado faz uso de uma linguagem fora da época e do cotidiano no qual Calvin está inserido.
Logo, devemos saber que, para cada momento, para cada espaço social, a fala deve ser produzida adequadamente ao contexto de modo que o interlocutor compreenda e possa ter sentido para a situação. Por isso, o conceito de certo, errado e diferente deve pressupor a relação do falante com os espaços sociais, regionais e os níveis formais e informais por ele inserido para que este use adequadamente a produção oral sem que estabeleça uma inadequação de sentido.
É preciso, para isso, que a escola seja o espaço da diversidade, do entendimento, do aprendizado dos diferentes modos de produção da fala em seus níveis sociais, regionais e históricos para que cada indivíduo, ao conhecer a linguagem própria de cada grupo, saiba que todos possuem uma riqueza em sua diferença e característica própria. Assim, mais do que aprender a falar a língua portuguesa, o aluno aprenderá a ser um falante competente e habilitado a transitar oralmente em todos os grupos sociais.
Pois, como Freire já dizia, um indivíduo pode até falar “pra mim fazer”, mas cabe à escola e ao professor apresentar também o nível formal da língua oral para que, mais tarde, este, ao estar em outros grupos de maior prestígio, possa ter o domínio da fala “para eu fazer”, entendendo deste modo que a língua e a sua produção têm um caráter também político e social, sem que este mesmo falante perca as suas origens e deixe de produzir “pra mim fazer” quando estiver de volta ao seu grupo.
Para aquele que aprende a língua portuguesa, as palavras devem ter a dimensão de liberdade de escolha e adequação conforme as necessidades de que o falante tenha para suprir a sua comunicação com o interlocutor. Fazer uso da palavra de modo que caiba ao falante a sua liberdade pressupõe domínio das estruturas e diversidades para que expresse seus pensamentos, ideias, sentimentos, sensações.
Para expressar-se de forma plena com todas as palavras, o indivíduo deve ser inserido ao mundo com toda liberdade, mas também, consciência e criticidade de modo a ser coerente e ter clareza na transmissão e construção das frases e ideias.
Afinal, de acordo com Luft (1993)1, a língua “não é propriedade privada de gramáticos ou linguistas, professores, doutores ou escritores” (p.66). LUFT, Celso Pedro. Língua e liberdade. Ática, 1993.
Logo, o falante nativo da língua não deve ser proibido, cerceado, ou policiado no uso das palavras. Nesse sentido, a escola não pode ser um espaço de repressão na fala do aluno. Ela deve, sim, considerar que o uso da língua e o aprendizado de outros níveis da língua, sejam eles, formais ou informais, pressupõem liberdade de expressão.
Em contrapartida, com relação à escrita, nós temos regras normativas padronizadas e que devem, sim, serem respeitadas e seguidas na construção de textos diversos, pois, num país de dimensões continentais como o Brasil e com tanta diversidade regional e social, se tivéssemos diferenças nos textos escritos, teríamos muita dificuldade de compreensão das informações, principalmente, em situações formais da língua, como por exemplo:
Livros didáticos, técnicos, literários (estes têm a liberdade de poder representar os espaços sociais, históricos e regionais de seus personagens);
Receituários, cartas e documentos de órgãos públicos e privados;
Além dos textos jurídicos e outras situações que requerem a produção formal da língua escrita.
“Para facilitar a leitura, a sociedade achou por bem decidir em favor de um modo ortográfico de escrever as palavras, independente dos modos de falar dos dialetos, mas que pudesse ser lido por todos os falantes, cada qual ao modo de seu dialeto” 
      
(Luiz Carlos Cagliari. 2003. 32)
Na verdade, ao estabelecer um padrão convencional para a escrita, não se pretendia e não devemos prever um cerceamento e controle social da língua e determinar o que é certo ou errado na fala e na escrita. Convencionou-se assim, na escrita, por uma questão de facilitar a todos os falantes uma forma de escrita que evite desentendimento, incoerência e inexatidão nas informações que se quer transmitir.
Nesse sentido, a escola tem um papel importante na definição das diferenças entre a produção oral e escrita. Ao professor cabe informar e apresentar ao aluno as diferenças entre a fala e a escrita, demonstrando que cada um pode sim produzir conforme a sua comunidade linguística na qual ele está inserido, mas que ao escrever deve saber que precisa obedecer uma regra – a da escrita – para não cometer erros de coerência e coesão que tornam o texto de difícil leitura e entendimento.
Devemos nos lembrar de que a forma de escrever precisa ser uniforme, homogênea, mesmo existindo tantas variedades linguísticas.
Para entender melhor tudo o que foi dito em nossa aula, finalizaremos com uma citação do professor e filólogo Celso Cunha. Clique no livro em destaque e confira.
Neste aula, você: 
- Compreendeu o conceito de dialeto e destacou as diferenças dialetais em razão dos aspectos regionais e socioculturais.- Aprendeu também o quanto é relevante o critério de adequação e uso da língua e sua repercussão sociocultural na aprendizagem da fala e da escrita.
- Assimilou também a importância de se compreender  a questão do certo, do errado e do diferente sob o ponto de vista dialetal na fala e na escrita. 
- Percebeu o papel do professor no tratamento das diferenças dialetais na construção linguística do aluno.
Aula 7
Nesta aula, vamos chamar a atenção para importância de trabalhar a leitura de gêneros variados de textos na formação do leitor competente. Vamos ressaltar a questão da diversidade de enunciados nas modalidades de usos da língua portuguesa. 
Em seguida, analisar o papel do professor na apresentação dos gêneros textuais.
Variedade de gêneros discursivos como objeto de ensino.
Ao tratarmos da questão dos gêneros discursivos, precisaremos iniciar a apresentação dessa aula com um texto extraído dos PCNs de língua Portuguesa a respeito da prática de produção de textos:
“Paro aprender o escrever, é necessário ter acesso à diversidade de textos escritos, testemunhar a utilização que se faz do escrita em diferentes circunstâncias, defrontar-se com os reais questões que a escrita coloca a quem se propõe produzi-la, arriscar-se a fazer como consegue e receber ajuda de quem já sabe escrever. Sendo assim, o tratamento que se dá ô escrita na escola não pode inibir os alunos ou afastá-los do que se pretende; ao contrário, é preciso aproximá-los, principalmente quando são iniciados “oficialmente” no mundo da escrita por meio da alfabetização. Afinal, esse é o início de um caminho que deverão trilhar para se transformarem em cidadãos da cultura escrita. 
Se o objetivo é formar cidadãos capazes de utilizar a escrita com eficácia, que tenham condições de assumir a palavra — também por escrito — para produzir textos adequados, é preciso organizar o trabalho educativo para que experimentem e aprendam isso na escola. É necessário, portanto, ensinar os alunos a lidar tanto com a escrita da linguagem — os aspectos notacionais relacionados ao sistema alfabético e às restrições ortográficas — como com a linguagem escrita — os aspectos discursivos relacionados ô linguagem que se usa para escrever. Para tanto, é preciso que, tão logo o aluno chegue à escola, seja solicitado a produzir seus próprios textos, mesmo que não saiba grafá-las, a escrever como lhe for possível, mesmo que não o faça convencionalmente. 
Quando se analisam as principais dificuldades de redação nos diferentes níveis de escolaridade, frequentemente se encontram narrações que “não contam histórias”, cartas que não parecem cartas, textos expositivos que não expõem ideias, textos argumentativos que não defendem nenhum ponto de vista. Além disso, e apesar de todas as correções feitas pelo professor, encontram-se também enormes dificuldades no que diz respeito à segmentação do texto em frases, ao agrupamento dessas em parágrafos e à correção ortográfica. Uma das prováveis razões dessas dificuldades para redigir pode ser o fato de a escola colocar a avaliação como objetivo da escrita.” (págs. 66 a 68) 
A partir deste texto, podemos perceber que a prática de produção de textos em sala de aula perpassa não somente pela valorização do que cada aluno produz, como também, pela importância em se valorizar a diversidade de gêneros discursivos que circulam tanto no nível formal quanto informal para que o aluno identifique as diferenças e aprenda que para cada contexto social, há um tipo, um estilo de texto escrito que deve se adequar ao momento.
A diversidade de textos escritos que circulam, antes de ser um empecilho e uma dificuldade para o professor em apresentar e elaborar atividades significativas ao aluno, deve ser um estímulo e uma fonte de pesquisa tanto da parte do professor como do aluno, pois ao longo do tempo tem surgido novas práticas textuais em nosso ambiente.
Um exemplo dessas novidades de gêneros textuais ou também chamados de gêneros digitais são os e-mails, blogs, os chats, os atuais tablets e tantas outras mídias que produzem a forma escrita num nível mais informal e com novas ou diferentes formas de se escrever. 
Com o advento da Internet, todos nós podemos acessar diversos tipos de informações através de janelas que se abrem denominadas homepages, dentro desta janela qualquer pessoa pode acessar textos, parágrafos, trechos, páginas, ou apenas palavras num processo que vai formando uma cadeia ou links que tecem o caminho para mais informações e vamos, assim, ampliando as informações num encadeamento de textos no qual denominamos a todo este processo de hipertexto. Ou seja, o hipertexto permite produzir e interpretar as informações de modo não linear, pois simultaneamente acessamos uma diversidade de textos a partir de um único e primeiro texto que foi o ponto de partida para esta série de operações e de interações pela Internet.
Aliás, nesses novos espaços, muito tem se discutido o nível e a forma de se escrever a língua portuguesa. Muitos gramáticos, estudiosos, professores, além de pessoas comuns criticam o formato e dizem que muitas crianças e jovens estão desaprendendo o “português”, pois escrevem de modo “errado”.
Se lembrarmos de nossas últimas aulas, a noção de certo e errado, e a questão dos níveis formais e informais dependem muito dos diversos contextos situacionais, assim como a capacidade de discernimento do falante da língua.
Devemos recordar que cada momento social de uma comunidade falante, as crianças e os jovens sempre inovam, criam e burlam, de modo criativo e diferente, as normas da língua. Sempre teremos inovações tanto na fala quanto na escrita, já que a língua é fruto dos aspectos sociais e geográficos que modificam-se ao longo do tempo.
O que devemos levar em consideração no trabalho com a produção de gêneros discursivos é criar condições necessárias e ambiente adequado para que os textos surjam em cada fase do aprendizado do aluno de modo que este possa construir a partir das diversas leituras de textos e da sua produção uma maior e melhor capacidade linguística e ter uma visão de mundo mais ampla e crítica.
Para tal fim, é necessário que o professor seja um leitor efetivo, que goste de ler e produzir textos, que estude e conheça os diversos gêneros textuais e saiba o lugar de cada um conforme a necessidade de comunicação. Este professor tem que ser um atuante pleno do que chamamos de “práticas de letramento”, ou seja, mais do que apenas alfabetizar por códigos e sinais gráficos de letras, palavras e através dos sons, ou ainda, de apenas transmitir as regras gramaticais na construção de frases e períodos, faz-se necessário a divulgação, apresentação e produção dos diversos gêneros textuais que circulam em nosso cotidiano. Gêneros estes que, muitas vezes, já fazem parte do mundo da criança e do jovem, e que somente cabe ampliar a produção, organizar as estruturas discursivas adequadas ao ambiente e  aumentar o olhar crítico e reflexivo na produção de textos autorais.
De acordo com Koch (2002: 53): 
O contato com os textos da vida cotidiana, como anúncios, avisos de toda a ordem, artigos de jornais, catálogos, receitas médicas, prospectos, guias turísticos, literatura de apoio à manipulação de máquinas, etc., exercita a nossa capacidade metatextual para a construção e intelecção de textos.(Grifos nossos). 
KOCH, Ingedore G. Villaça. Os gêneros do discurso e a produção textual na escola. Campinas: UNICAMP, [mimeo].
Nessa perspectiva, é função do professor, enquanto agente de letramento, criar situações de familiarização ou inserção dos alunos nas práticas de usos da escrita que informam ou integram esses mais diversos espaços ou situações interativas da vida diária.
Antes de continuarmos com a nossa aula, é relevante definirmos aquilo que é o tema de nosso assunto: Gêneros discursivos.
O escritor russo Mikhail Bakhtin foi o primeiro autor a fazer uso do conceito de “gênero” com o objetivo de definir todas as práticas orais e escritas da linguagem. Num de seus textos, Bakhtin apresentou aseguinte definição para os “gêneros discursivos”:
“Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua. Não é de se surpreender que o caráter e os modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas da atividade humana, o que não contradiz a unidade nacional de uma língua. O enunciado reflete as condições específicos e os finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operado nos recursos da lingua - recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais - mas também, e sobretudo, por sua construção gramatical. Esses três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual. Mas cada esfera de utilização do língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso.” (p. 279) 
Bakhtin, Mikhaft. Os gêneros do discurso. Estética da criação verbaL. 3. ed. Trad. Maria Ermantina Gatvâo G. Pereira. São PauLo: Martins Fontes, 1992. 
Desse modo, aprendemos que:
O termo discurso refere-se à relação entre os usos da (íngua e os fatores extralingüísticos presentes no momento em que esse uso ocorre. Ou seja, o gênero discursivo pressupõe uma interação por meio da Linguagem através de recursos presentes no cotidiano do usuário da Língua que faz uso daquilo que melhor se apresenta ao momento situacional. 
Os gêneros discursivos são estruturas padrões de composição de texto determinados pelo contexto em que são produzidos, pelo tipo de público a que se destinam, por sua finalidade, pelos espaços de circulação, além de outros aspectos. São exemplos de gêneros: 
revistas cientificas, histórias em quadrinhos, receitas de culinária, anúncios, documentos, contos, poesias, charges, bilhetes, cartas, e-mails, blogs entre outros. 
Para cada momento da comunicação, seja verbal ou escrito, o indivíduo precisa saber que há uma especificidade, um gênero discursivo que determina os contextos interacionais.
Os espaços sociais (família, clubes, escolas, parques, além de outros) promovem e estimulam a interação de gêneros discursivos específicos que devem ser estimulados e ampliados no espaço escolar. Ou seja, a produção de textos que permeiam estes ambientes deve sim fazer parte da vida escolar do aluno de modo que este perceba o quanto faz sentido ampliar o seu contexto de produção oral e escrita.
Cabe também à escola ampliar o horizonte discursivo do aluno, não apenas na leitura, mas também, estimulando a produção de textos com caráter jornalístico, científico, investigativo, literário, além de resenhas, resumos que podem ser produzidos a partir de textos similares. Para tanto, o professor deve ser um produtor de criticidade e formação destas leituras para que o aluno se familiarize e tenha competência e habilidade na diversidade de gêneros textuais.
Ainda com relação à produção do texto, deve-se entender que a palavra isolada, a oração pura e simples não formam um sentido, um enunciado, ou seja, não se constituem um ato comunicativo em si, pois para que tal ato ocorra é necessário que haja uma intencionalidade, tem que haver uma situação discursiva, uma resposta na interlocução para que as especificidades da palavra, da oração sejam carregadas de sentido e provoquem uma atitude, um enunciado concreto e completo.
Nesse sentido, quanto maior for o contato do aluno com os diferentes tipos de texto, quer sejam de situações informais do cotidiano, quer sejam de situações mais formais ou complexas (textos científicos, literários, teatro...) maior será a sua capacidade de identificar e de refletir sobre os mecanismos linguísticos e extralinguísticos que constituem o processo comunicativo.
Importante deixar claro que toda produção discursiva na escola não pode ser apenas um mero processo de avaliação e de atividades escolarizadas sem que se atinjam o objetivo maior que é o ato comunicativo pleno. Afinal, produzir linguagem significa produzir discursos que não podem ser compreendidos sem que se considerem  seus vínculos com a situação concreta de produção.
Assim, como iniciei nossa aula, também gostaria de finalizá-la com mais um trecho dos PCNs:
“Interagir pela linguagem significa realizar uma atividade discursiva: dizer alguma coisa a alguém, de uma determinada forma, num determinado contexto histórico e em determinadas circunstâncias de interlocução. Isso significa que as escolhas feitas ao produzir um discurso não são aleatórias, ainda que possam ser inconscientes, mas decorrentes das condições em que o discurso é realizado. Quer dizer: quando um sujeito interage verbalmente com outro, o discurso se organiza a partir das finalidades e intenções do locutor, dos conhecimentos que acredita que o interlocutor possua sobre o assunto, do que supõe serem suas opiniões e convicções, simpatias e antipatias, da relação de afinidade e do grau de familiaridade que têm, da posição social e hierárquica que ocupam. Isso tudo determina as escolhas do gênero no qual o discurso se realizará, dos procedimentos de estruturação e da seleção de recursos linguísticos. É evidente que, num processo de interlocução, isso nem sempre ocorre de forma deliberada ou de maneira a antecipar-se à elocução. Em geral, é durante o processo de produção que as escolhas são feitas, nem sempre (e nem todas) de maneira consciente. O discurso, quando produzido, manifesta-se linguisticamente por meio de textos. O produto da atividade discursiva oral ou escrita que forma um todo significativo, qualquer que seja sua extensão, é o texto, uma sequência verbal constituída por um conjunto de relações que se estabelecem a partir da coesão e da coerência. Em outras palavras, um texto só é um texto quando pode ser compreendido como unidade significativa global. Caso contrário, não passa de um amontoado aleatório de enunciados. A produção de discursos não acontece no vazio. Ao contrário, todo discurso se relaciona, de alguma forma, com os que já foram produzidos. Nesse sentido, os textos, como resultantes da atividade discursiva, estão em constante e contínua relação uns com os outros, ainda que, em sua linearidade, isso não se explicite. A esta relação entre o texto produzido e os outros textos é que se tem chamado intertextualidade. Todo texto se organiza dentro de determinado gênero em função das intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, as quais geram usos sociais que os determinam. Os gêneros são, portanto, determinados historicamente, constituindo formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura.” (págs. 20-21)
Nesta aula, você aprendeu:
- Compreendeu o conceito de gêneros discursivos.
- Aprendeu também  a importância de trabalhar a leitura de gêneros variados de textos na formação do leitor competente. 
- Assimilou também o papel do professor na apresentação dos gêneros textuais.
- Percebeu que o aprendizado da língua também se faz na diversidade de enunciados nas modalidades de usos da língua portuguesa.
Aula 8
Nesta aula, vamos chamar a atenção para o desenvolvimento das competências e habilidades a desenvolver na formação do leitor.
Destacaremos a importância das práticas de leitura na sociedade atual.
Vamos ressaltar o papel do professor na mediação das práticas de leitura.
Habilidades e competências no ensino da língua portuguesa
Ler em voz alta, ler em silêncio, ser capaz de carregar na mente bibliotecas íntimas de palavras lembradas são aptidões espantosas que adquirimos por meios incertos. Todavia, antes que essas aptidões possam ser adquiridas, o leitor precisa aprender a capacidade básica de reconhecer os signos comuns pelos quais uma sociedade escolheu comunicar-se: em outras palavras, o leitor precisa aprender a ler. 
(MANGUEL, 1997, p.85)
A citação de Manguel marca o início denossa aula que pretende discutir as competências e habilidades em leitura. Manguel nos informa que antes do indivíduo decodificar as palavras, antes de aprender as estruturas mais complexas da leitura, ele deve, primeiramente, inserir-se no mundo, na sua comunidade, no seu grupo de modo pleno efetivo, a fim de reconhecer as práticas de leitura como um caminho de compreensão e construção do olhar a partir da leitura de mundo que Freire falava e tratamos em nossas aulas.
No Dicionário Aurélio escolar da Língua portuguesa (2005, p.540), leitor é “aquele que lê ou que tem o hábito da ler, ledor”.
Por esta definição, notamos o quanto a prática da leitura deve tornar-se efetivamente uma presença constante na vida de todo e qualquer indivíduo, pois a leitura não é um processo apenas escolar, até mesmo porque, muitas das vezes, aprendemos a ler e começamos a ter contato com livros, revistas e outros meios de leitura antes mesmo de adentrarmos a escola.
Logo, dentro do espaço escolar, a figura do professor será de fundamental relevância na construção de práticas de leitura, pois não se pode imaginar que os procedimentos de leitura sejam apenas uma mera didatização e alfabetização de palavras e textos sem conexão com os espaços sociais que o aluno está inserido.
Nesta aula, pretendemos ter como base de nossa discussão os indicativos do MEC e do INEP no que se refere aos objetivos do ensino de língua portuguesa e as suas diretrizes com relação ao ensino das práticas de leitura.
Seguindo este princípio, o Ministério da Educação indica que o ensino de Língua Portuguesa deve voltar-se para a função social da língua como requisito básico para que o individuo ingresse no mundo letrado e possa construir seu processo de cidadania e integrar-se à sociedade como ser participante e atuante.
De acordo com os PCNs de língua portuguesa:
“O trabalho com leitura tem como finalidade a formação de leitores competentes e, consequentemente, a formação de escritores (Não se trata, evidentemente, de formar escritores no sentido de profissionais da escrita e sim de pessoas capazes de escrever com eficácia.), pois a possibilidade de produzir textos eficazes tem sua origem na prática de leitura, espaço de construção da intertextualidade e fonte de referências modelizadoras. A leitura, por um lado, nos fornece a matéria-prima para a escrita: o que escrever. Por outro, contribui para a constituição de modelos: como escrever.
A leitura é um processo no qual o Leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a Língua: características do gênero, do portador’, do sistema de escrita, etc. Não se trata simplesmente de extrair informação da escrita, decodificando-a Letra por Letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura propriamente dita. 
O termo “portador” está sendo utilizado aqui para referir-se a livros, revistas, jornais e outros objetos que usualmente portam textos, isto é, os suportes em que os textos foram impressos originalmente.
Qualquer Leitor experiente que conseguir analisar sua própria Leitura constatará que a 
decodificação é apenas um dos procedimentos que utiliza quando lê: a Leitura fluente envolve uma série de outras estratégias como seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível rapidez e proficiência². É o uso desses procedimentos que permite controlar o que vai sendo lido, tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, arriscar-se diante do desconhecido, buscar no texto a comprovação das suposições feitas, etc.
Uma estratégia de leitura é um amplo esquema para obter, avaliar e utilizar informação. As estratégias são um recurso para construir significado enquanto se lê. Estratégias de seleção possibilitam ao leitor se ater apenas aos índices úteis, desprezando os irrelevantes; de antecipação permitem supor o que ainda está por vir; de inferência permitem captar o que não está dito explicitamente no texto e de verificação tornam possível o “controle” sobre a eficácia ou não das demais estratégias. O uso dessas estratégias durante a leitura não ocorre de forma deliberada — a menos que, intencionalmente, se pretenda fazê-lo para efeito de análise do processo.
Um leitor competente é alguém que, por iniciativa própria, é capaz de selecionar, dentre os trechos que circulam socialmente, aqueles que podem atender a uma necessidade sua. Que consegue utilizar estratégias de leitura adequada para abordá-los de forma a atender a essa necessidade. Formar um leitor competente supõe formar alguém que compreenda o que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser atribuídos a um texto; que consiga justificar e validar a sua leitura a partir da localização de elementos discursivos.
Um leitor competente só pode constituir-se mediante uma prática constante de leitura de textos de fato, a partir de um trabalho que deve se organizar em torno da diversidade de textos que circulam socialmente. Esse trabalho pode envolver todos os alunos, inclusive aqueles que ainda não sabem ler convencionalmente.” (págs. 35-36)
Ler é um processo de emancipação. A experiência e o conhecimento adquiridos pelo indivíduo nas suas relações com o mundo são instrumentos necessários à compreensão do material escrito. O ato de ler é parte integrante e fundamental do ser humano. Quanto mais conhecimento textual o leitor tiver e quanto maior sua exposição a todo tipo de texto, mais fácil será a sua compreensão. Desse modo, a leitura é de suma importância, pois o indivíduo torna-se capaz de: compreender a mensagem; compreender-se na mensagem e compreender-se pela mensagem. Faz-se necessário que o ser humano se situe no mundo, que saiba diagnosticar a leitura como sendo um bem primordial à sua existência, pois apenas assim saberá se posicionar diante dos fatos.
O ato de ler se faz presente em todos os meios educacionais das sociedades letradas. É um ato imprescindível para a formação de um cidadão crítico, participativo e consciente de seu papel na sociedade. Apesar da leitura ser tão requisitada e estar presente em todas as propostas de enriquecimento na aquisição de experiências, ela ainda é pouco praticada e é grande fonte de inquietação no processo educacional brasileiro, tal como afirma o autor Ezequiel Theodoro, em seu livro Fundamentos Psicológicos para uma nova Pedagogia da Leitura.
O acesso à cultura se relaciona diretamente com o acesso ao livro, uma vez que o patrimônio cultural, histórico e científico da humanidade, encontra-se registrado por meio de escritos, e estes registros, como fonte de conhecimento, dão a possibilidade de promover discussões e reflexões, de mudança de hábitos e de vivenciarmos novas experiências, interagindo com o mundo à nossa volta.
Segundo Júlio Bueno, presidente da BR Distribuidora: “Cada vez mais o executivo tem que ter uma visão diversificada do mundo. Em muitos casos, as habilidades técnicas podem ser superadas pelas habilidades culturais e os livros são o motor deste conhecimento. A leitura de uma vasta bibliografia é tão importante quanto um grande conselheiro no processo decisório de qualquer executivo.” (em Notícias do Salão, edição especial         
- nº 2 – novembro de 2001).
Em contrapartida, o que observamos é uma sociedade voltada às informações televisivas e mediáticas, que são oferecidas, muitas vezes, de forma padronizada, impossibilitando o indivíduo a desenvolver um olhar mais crítico, diante dos problemas que assolam a sociedade em que convive. Por isso, a leitura tornar-se de fato uma atividade indispensável a qualquer área do conhecimento da vida de um ser humano. O ato de não ler acarreta a todos os indivíduos um processo de alienaçãoda herança cultural do seu país. Tornando-o um ser fora do contexto social, logo, limitado aos progressos oferecidos pela evolução política, econômica, social e cultural.
Devemos reconhecer que o leitor está sujeito às transformações, críticas, reflexões e manifestações de conhecimentos quando se propõe a ler. É necessário, desse modo, resgatar a importância e a necessidade da leitura, reconhecendo-a como essencial ao conhecimento, ao sucesso acadêmico e profissional, à interação, alargando experiências de vida de cada indivíduo. A leitura é, sem dúvida, o alicerce fundamental da humanidade.
A formação do leitor, ampliando seu acesso aos diversos tipos de textos presentes em nossa indústria cultural deve ser o  processo norteador das práticas escolares. É fundamental destacar a importância de trabalhar com a perspectiva de construção do sentido de cidadania com as crianças, jovens e adultos, por meio de atividades de reflexão crítica da realidade. Ao trabalhar a leitura como construção da inventividade e criticidade do indivíduo, permitimos que cada um possa construir a sua história de leitura através de outras leituras, pois acreditamos que ler é abrir janelas que ampliam as possibilidades de se conhecer mais e melhor a si mesmo e ao mundo.
O objetivo das práticas de leitura no espaço escolar é de buscar caminhos, de fazer a criança e o jovem experimentarem um contato diferente com a leitura, que proporcione prazer, alegria, reflexão, surpresa, emoção e tudo mais que os bons textos nos provocam. Em algumas pesquisas e projetos de leitura desenvolvidos em encontros com as crianças, jovens e adultos, percebemos que após o convívio com as variadas formas de expressão e motivados pela leitura, têm revelado sonhos, histórias de vida, drama e percepções. Como nos diz, Magda Soares (2003): “Letramento é, sobretudo, um mapa do coração do homem, um mapa de quem você é, e de tudo que você pode ser”.
A leitura literária, por exemplo, tem um importante papel na formação dos valores, conceitos e da afetividade do indivíduo, pois a cada obra ou texto lido e assimilado, vai se construindo algo de significativo. O universo do livro possibilita abrir estradas, desvendar mistérios, construir e realizar sonhos.
Partindo desse princípio, o professor tem um importante papel no processo de mediação da leitura como prazer, inventividade e formação do pensamento crítico. Segundo Marc Soriano (citado por Pires, 1976), “A leitura não é apenas uma técnica de informação e educação, é também um prazer - um dos raros que a humanidade inventou - um processo regulador que por uma série de identificações e compensações, nos permite uma adaptação mais rápida à sociedade, permanecendo nós mesmos. É uma conquista decisiva e insubstituível para a humanidade, como o fogo é e o erguer-se sobre os pés, que nos compete manter a todo o custo. Um homem que não Lê, que não se cultiva, que não utiliza plenamente seus dons, constitui um intolerável desperdício, é a mais preciosa energia que não foi empregada e ameaça ser perdida num mundo que tem tanta necessidade de se tornar melhor.” (p.137) 
PIRES, Nice. Crianças, jovens e a literatura. Fundação Getúlio Vargas, 1976. 
O que se discute é a formação do leitor que busca a leitura pelo prazer, pelo conhecimento e autoconhecimento, para a reflexão sobre o status quo, que busca novos horizontes, que forma e transforma uma consciência crítica do mundo, que através da leitura realiza viagens fantásticas no mundo imaginário, trazendo para o mundo exterior e concreto seus sonhos, anseios, medos. Um leitor capaz de escolher e decidir que obra deseja ler, quando começar e quando parar. Um leitor que tem a visão ampla do mundo e que tem um gosto variado e consciente do que há para ler.
Como afirma Lajolo (1997):
“Cada leitor, na individualidade de sua vida, vai entrelaçando o significado pessoal de suas leituras com os vários significados que, ao longo da história de um texto, este foi acumulando. Cada leitor tem a história de suas leituras, cada texto, a história das suas. Leitor maduro é aquele que, em contato com o texto novo, faz convergir para o significado deste o significado de todos os textos que leu. E, conhecedor das interpretações que um texto já recebeu, é livre para aceitá-las ou recusá-las, e capaz de sobrepor a elas a interpretação que nasce de seu diálogo com o texto.” (p.106) LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 3. ed. São Paulo: Ática, 1997.
As diretrizes que norteiam as provas de Língua Portuguesa do SAEB² e da Prova Brasil³ estão baseadas na questão da leitura, que requer a competência de apreender o texto como construção de conhecimento em diferentes níveis de compreensão, análise e interpretação. A proposta requer que o aluno tenha competência no uso da língua, de modo que saiba interagir, por meio de textos, em qualquer situação de comunicação.
Os testes do SAEB e da Prova Brasil apresentam o texto como a unidade significativa que indica, efetivamente, as competências e habilidades linguísticas relacionadas às situações cotidianas.
Entretanto, de acordo com os PCNs, tem-se criticado muito os critérios adotados nas escolas com relação ao ensino de língua portuguesa no que concerne às questões de leitura e escrita.
Entretanto, de acordo com os PCNs, tem-se criticado muito os critérios adotados nas escolas com relação ao ensino de língua portuguesa no que concerne às questões de leitura e escrita. Entre as críticas mais frequentes destacam-se:
A desconsideração da realidade e dos interesses dos alunos.
A apresentação de uma teoria gramatical inconsistente - uma espécie de gramática tradicional mitigada e facilitada.
O ensino descontextualizado da metalinguagem, normalmente associado a exercícios mecânicos de identificação de fragmentos linguísticos em frases soltas.
A  excessiva escolarização das atividades de leitura e de produção de texto.
O uso do texto como expediente para ensinar valores morais e como pretexto para o tratamento de aspectos gramaticais.
A excessiva valorização da gramática normativa e a insistência nas regras de exceção, com o consequente preconceito contra as formas de oralidade e as variedades não padrão.
Nota-se, assim, que o aprendizado da língua deve nortear a representação do mundo no qual cada um de nós está inserido, como também, envolver através de todas as áreas do conhecimento as práticas de leitura com objetivo de formar leitores competentes.
A escola deve apresentar a leitura como foco central, propondo atividades diárias que seduzam o aluno e desenvolva gradativamente sujeitos críticos, capazes de investigar, articular e descobrir os caminhos do mundo. O convívio com práticas sociais de leitura permitirá ao aluno ampliar seu conhecimento de mundo através da diversidade de textos que propiciará um universo de referências e familiaridade crescente com expressões culturais e científicas cada vez mais complexas.
Segundo Kleiman (2000), é importante sim desenvolver estratégias de leitura na escola. Pois estas são formas de abordar o texto a partir da compreensão que o leitor faz do texto. As respostas que o aluno constrói, os resumos, as resenhas, as paráfrases, além de destacar e sublinhar palavras ou expressões são formas de desenvolver as habilidade linguísticas.
Entretanto, Kleiman(2000) afirma que o desenvolvimento de estratégias cognitivas e metacognitivas são importantes para o desenvolvimento das competências e habilidades em leitura. Tais estratégias destacam-se do seguinte modo:
As metacognitivas seriam o desenvolvimento consciente da leitura, através da qual o aluno saberá informar o quanto entendeu ou não o texto ou qual a importância da leitura daquele texto para o momento.
Já as cognitivas seriam o desenvolvimento inconsciente a partir de uma leitura que busca atingir um objetivo do texto, tenta depreender de modo implícito o que o texto subentende. As inferências sobre o texto são parte deste processo.
Nesse sentido, percebe-se que alguns alunos apresentam melhordesempenho em uma situação de leitura do que em outra, o que justifica a inclusão de diversos tipos de textos nas estratégias de leitura.
Segundo Kleiman(2000), para formar leitores devemos ter paixão pela leitura. A autora apresenta a ideia que o autor francês Bellenger faz sobre a leitura:
“Em que se baseia a leitura? No desejo. Esta resposta é uma opção. É tanto o resultado de uma observação como de uma intuição vivida. Ler é identificar-se com o apaixonado ou com o místico. É ser um pouco clandestino, é abolir o mundo exterior, deportar-se para uma ficção, abrir o parêntese do imaginário. Ler é muitas vezes trancar-se (no sentido próprio e figurado). É manter uma ligação através do tato, do olhar, até mesmo do ouvido (as palavras ressoam). As pessoas leem com seus corpos. Ler é também sair transformado de uma experiência de vida, um apelo, uma ocasião de amar sem a certeza de que se vai amar. Pouco a pouco o desejo desaparece sob o prazer.” (BELLENGER, Lionel. Os métodos de leitura. p.17)
Por isso, o professor deve propiciar este ambiente de paixão, de desejo pela leitura. O professor deve ser o mediador de uma leitura que pressupõe a construção de sentido da diversidade de gêneros textuais que circulam na sociedade.
Conforme os PCNs de língua portuguesa (1998):
“Procurando desenvolver no aluno a capacidade de compreender textos orais e escritos e de assumir a palavra, produzindo textos em situações de participação social, o que se propõe ao ensinar os diferentes usos da linguagem é o desenvolvimento da capacidade construtiva e transformadora. O exercício do diálogo na explicitação, contraposição e argumentação de ideias é fundamental na aprendizagem da cooperação e no desenvolvimento de atitudes de confiança, de capacidade para interagir e de respeito ao outro. A aprendizagem desses aspectos precisa, necessariamente, estar inserida em situações reais de intervenção, começando no âmbito da própria escola.”
PCNs de Língua Portuguesa – Terceiro e Quarto ciclos do Ensino Fundamental.
Neste aula, você: 
- Compreendeu a relevância no  desenvolvimento das competências e habilidades a desenvolver na formação do leitor. 
- Aprendeu também a importância das práticas de leitura na sociedade atual. 
- Assimilou as diretrizes com relação ao ensino da leitura em língua portuguesa conforme INEP. 
- Percebeu o papel do professor na mediação das práticas de leitura.
Aula 9
Nesta aula, vamos chamar a atenção para a prática de produção textual em sala de aula, destacando estratégias para o desenvolvimento da habilidade da escrita. Vamos ressaltar a questão do conhecimento do assunto, preparação das ideias e sua elaboração. Em seguida, analisar o papel do professor na construção do texto pelo aluno e a importância da autocorreção das ideias para a sua reescrita.
“ Escrever é escutar a palavra e registrar o que ela nos pede. É a palavra que nos inscreve.”
 (Bartolomeu Campos de Queirós, 2007 – p.53)
Quando pensamos na produção textual, muitas vezes, nós professores, temos dúvidas de quais seriam as melhores técnicas de ensino, além de atividades que efetivamente promovam a prática da escrita dentro do espaço escolar. Tal reflexão se percebe no passado quando a produção textual em sala de aula era dissociada das práticas discursivas e sociais nas quais o indivíduo estava inserido. A escrita que buscávamos ensinar baseava-se nas palavras, frases ou até mesmo em ideias soltas e sem sentido da contextualização social e cultural dos alunos.
Quando destacamos a realidade do aluno, consideramos que qualquer criança ou jovem que vivem, de algum modo, as experiências sociais, culturais e históricas de um determinado momento, têm o conhecimento necessário, mesmo que para a escola não seja o melhor. Para isso, devemos iniciar as práticas de produção textual de modo reflexivo, crítico, produtivo e coerente com as suas percepções. Afinal, ninguém escreve sem um olhar a partir da perspectiva do mundo no qual está inserido, sem viver as experiências que surgem ao seu redor.
Segundo o escritor Bartolomeu Campos de Queirós (2007) em sua obra Para ler em silêncio a escrita é uma prática construída a partir da curiosidade: 
Escrever é imprimir a experiência do espanto de estar no mundo. E estender as dúvidas, confessar os labirintos, povoar os desertos. E mais, escrever é dividir sobressaltos, explicitar descobertas e abrir-se ao mundo na ilusão de tocar a completude.” (p.1 2) 
O professor deve apresentar ao aluno a prática da produção escrita da língua como algo que se tornará constante em sua vida em razão de nós, seres humanos, termos a necessidade de nos comunicar também pela escrita. O registro da língua através da escrita se faz necessário pois expande, demarca e constrói uma identidade social, cultural e porque não dizer política de uma determinada sociedade. Nossa relação com os textos escritos tem sido cada vez mais constante e intensa na vida em sociedade. Pois, mesmo com o surgimento das novas tecnologias, com a Internet e seus afins (blogs, comunidades sociais, sites de cultura e informação, entre outras), o formato texto segue um padrão próprio e específico, que determina sua função, estilo, composição e formato do material a ser lido.
Compreender a relação que a sociedade estabelece com a linguagem escrita e o papel que os textos ocupam nessa sociedade torna-se fundamental para a compreensão e o desenvolvimento de práticas de ensino e de aprendizagem da escrita em diferentes espaços sociais. Assim, quando a escola assume a importância de trabalhar práticas de leitura e escrita em sala de aula, devemos nos preocupar com o risco de padronização e com a rigidez de modelos estabelecidos na construção do texto pelo aluno. Devemos, inicialmente, compreender a escrita como ação social.
Segundo Marcuschi (2000),
“A escrita é usada em contextos sociais básicos da vida cotidiana, em paralelo direto com a oralidade. Estes contextos são, entre outros: o trabalho, a escola, o dia-a-dia, a família, a vida burocrática, a atividade intelectual. Em cada um desses contextos, as ênfases e os objetivos do uso da escrita são variados e diversos (...). Seria interessante que a escola soubesse algo mais sobre essa questão para enfrentar sua tarefa com maior preparo e maleabilidade, servindo até mesmo de orientação na seleção de textos e definição de níveis de linguagem a trabalhar.” (p.19)
Explicação Expandida
Logo, apenas possibilitar a repetição de proposições padronizadas, de textos que seguem um ritual, acabam por provocar um esvaziamento da atividade de produção escrita. Escrevemos porque existe uma necessidade, um objetivo e se não construirmos isso em sala de aula, a produção dos textos torna-se uma mera atividade de exercícios formais da escrita. Não devemos executar a produção do texto como um processo regulado por normas regidas pela gramática da língua, desconsiderando o sujeito-escritor, a situação da escrita e o papel discursivo e social do texto.
Ao professor cabe estimular uma diversidade de textos que irão despertar no aluno a importância e o uso adequado da prática de produção textual. Quando pensamos na produção escrita em sala de aula, devemos estabelecer estratégias para o desenvolvimento da habilidade da escrita através de situações funcionais. Escrevemos para o outro ler, para alguém se identificar com a mensagem, para que um grupo social ou a sociedade em geral tome conhecimento de um determinado assunto, uma ideia. Escrevemos simplesmente para sair da inércia, do silêncio das palavras, para externalizar sensações, sentimentos advindos do interior ou de nosso olhar diante do mundo.
Bartolomeu Campos de Queirós (2007) diz:
“Escrever é dar às palavras o mesmo tratamento com o qual o pintor seleciona suas cores, o pedreiro equilibra seus tijolos. Escrever é desenhar com cuidado as nuances que intrigam e instigam o espírito. Escrever é apaziguar o susto de viver em um mundo em permanente mudança que o cotidiano comprova. Escrever é fazer carinho em mim, abençoando o que aindanão me foi revelado, inclusive o tamanho das veredas. Escrever como única maneira de adaptar-se às mutações, sem arranhar o desconhecido absoluto.” (p.23-24)
Débora Rana, professora e formadora do Instituto Avisa Lá, explica como um percurso de autoria pode ser construído a partir da reescrita de textos conhecidos pelos alunos. Débora Rana destaca que, para mediar um trabalho de escrita, o professor precisa ensinar um tipo específico de comportamento: a busca de informações com o objetivo de produzir um novo texto.
Explicação Expandida
Nota-se a partir dos vídeos que devemos cuidar para que a atividade iniciada como prática de produção da escrita não se torne um processo de escolarização excessiva apenas apresentando um gênero. A atividade deve sempre permear o enquadramento do indivíduo numa situação social, ou seja, de produção escrita rotineira.
Com o advento da Internet, surgiram os e-mails, blogs e comunidades sociais para os quais, de algum modo, temos que escrever um tipo de texto. Mesmo que nesse espaço social, muitas vezes, a linguagem produzida seja informal, com supressões de palavras, expressões e surgimento de gírias cibernéticas, podemos tratar desse espaço como um meio de apresentar modos próprios de produção da escrita, além de definir os parâmetros com os quais cada texto eletrônico é construído. A partir daí, promovemos aos alunos a sua inserção nas formas de estruturação ou configuração dos textos digitais, nas suas relações com os comportamentos do leitor.
Mesmo considerando que os meios eletrônicos quase acabaram com o estilo de produção via papel e correios, não se pode negar que ainda continua a produção de cartas, um tipo de gênero que resiste em nosso país. Essa permanência se dá por três motivos:
Por sermos um país de dimensões continentais, ainda temos lugares sem acesso à banda larga, sem a existência de qualquer lan-house para o envio de mensagens.
Apenas 10% da população em nosso país dominam o meio eletrônico ou possui acesso à Internet, restando apenas a velha e boa produção escrita de cartas para se comunicar, sem considerar o uso do telefone.
Por fim, os jornais e revistas impressos ou on-line possuem a “seção cartas dos leitores”, espaço no qual os leitores podem enviar por e-mail, pelo site ou simplesmente por cartas sugestões, reclamações, dicas, ideias, tudo sobre seu bairro, sua cidade, seu país a respeito de temas sociais, culturais, políticos ou históricos em geral.
A produção de cartas ainda se faz presente em nossa sociedade, por isso devemos não apenas apresentar, como também estimular a construção desse tipo de gênero pelo aluno. Mostrar os diversos tipos de cartas, seus fins e níveis de formalidade e informalidade conforme a quem se direciona o texto. Fazer com que os alunos produzam um texto a partir de uma matéria jornalística e escrever para um colega de outra sala ou até mesmo para outro membro da família são exemplos de situações contextualizadas, concretas, reais de produção da escrita.
Veja uma situação interessante de produção textual que pode ser desenvolvida com alunos em sala de aula:
A apresentação de uma carta argumentativa de reclamação e um abaixo-assinado que fazem parte do cotidiano de qualquer pessoa, comunidade ou bairro. Quem nunca fez uma reclamação por escrito ao prefeito, ao governador ou aos representantes do poder público sobre buracos nas ruas, sinais de trânsito que não funcionam, lixo nas ruas, barulhos de casas de festas ou carro de som, ausência ou falta de luz no bairro, falta de água constante na rua?
Você sabia?Em diversas situações públicas, o cidadão possui  direitos e poder de crítica para reclamar, divulgar e exigir, através de uma carta e uma lista de representantes, as mudanças necessárias em benefício da comunidade. Trabalhar esse tipo de produção textual com o aluno é levá-lo à percepção de que a escrita não apenas se faz presente em nossa sociedade, mas também acontece de maneira a registrar, ampliar e construir uma visão de mundo necessária ao exercício da cidadania. A produção do texto deve ser trabalhada em seu suporte real, e o que deve variar conforme a idade do aluno é o nível de complexidade dos textos.
Os PCNs de Língua Portuguesa apresentam alguns gêneros adequados para o trabalho com a linguagem escrita:
Anúncios, slogans, cartazes, folhetos. Parlendas, canções, poemas, quadrinhas, adivinhas, trava-línguas, piadas, contos (de fadas, de assombração, etc.), mitos e lendas populares, folhetos de cordel, fábulas e textos teatrais. Relatos históricos, textos de enciclopédia, verbetes de dicionário, textos expositivos de diferentes fontes (fascículos, revistas, livros de consulta, didáticos, etc.), textos expositivos de outras áreas e textos normativos, tais como estatutos, declarações de direitos, etc. C artas (formais e informais), bilhetes, postais, cartões (de aniversário, de Natal, etc.), convites, diários (pessoais, da classe, de viagem, etc.); quadrinhos, textos de jornais, revistas e suplementos infantis: títulos, lides, notícias, resenhas, classificados, etc. A escolha de um determinado gênero discursivo depende em grande parte da situação de produção, ou seja, da finalidade do texto a ser produzido, de quem são o(s) locutor(es) e os intelocutor(es), do meio disponível para veicular o texto, etc. 
Um aspecto muito importante, com relação ao desenvolvimento de habilidade da escrita, que não podemos deixar de discutir, diz respeito à apresentação de textos literários e a sua produção por parte dos alunos. Nesse caso, a leitura de obras literárias, através dos círculos de leitura, a leitura de poesias com os alunos e a interpretação de textos teatrais em sala de aula criam possibilidades de escrita pelos alunos de modo rico e criativo. O livro literário deve ser fonte de inspiração na produção de textos e não pode ser tratado como algo distante, dissociado da realidade social do aluno. Mesmo porque, se o livro literário, a poesia não fizerem parte do cotidiano do aluno, compete ao professor inserir esse gênero e promover a construção literária também do aluno.
Para Bartolomeu Campos de Queirós (20007), a escrita literária tem um importante significado: “(...) A escrita ordena emoções e torna a fantasia transparente. E a palavra escrita, pelo que ela guarda de franjas, confere ao leitor o poder de atribuir inumeráveis sentidos à oração. Ler é também escrever. Desconheço exatidão maior que a fantasia. Não se escreve sem lapidar o assunto. Lapidar é tomar cuidado com o que se tem a registrar. Escrever é um pensar muitas vezes. É costurar, com fio frágil, o real e o sonhado. Escrever é deixar vir à tona a resposta que me falta. A literatura, se construída de fantasia, é feita do que não temos. Só fantasiamos sobre o que sonhamos. Fantasiar é noticiar ao mundo que ainda tenho desejos. Fantasiar é festejar a vida.” (p. 25 e 28)
Devemos sempre pensar na produção textual como um processo de formação da inventividade, da criticidade, da autoria e não apenas como uma mera formalização de avaliação da escrita do aluno.
O professor deve promover sempre no aluno a reescrita de seu texto, estimular a reavaliar seu texto de modo a ampliar a sua capacidade de coerência e coesão.  Analisar detalhadamente a forma como os alunos escrevem é a primeira providência para determinar os pontos que devem ser trabalhados em sala de aula. Fazer com que o aluno perceba o quanto é importante, rever ideias, conceitos e organização do texto com o objetivo de tornar o aluno cada vez mais sujeito-autor, fazendo com que ele seja capaz de compreender cada vez mais e melhor como funciona a produção social da escrita.
O professor deve apresentar ao aluno algumas questões que seriam oportunas de serem identificadas na produção do texto. Questões como:
Quem é o sujeito-autor e qual é o espaço social em que se insere; que conhecimentos linguísticos e de mundo traz consigo e que expectativas para com a escrita apresenta.
Que gênero do discurso se pretende construir,que regularidades léxico-sintáticas são previstas e reconhecidas para esse gênero e que regularidades composicionais se pressupõe na construção do gênero.
Qual o objetivo dessa escrita e qual a situação interacional e esfera social  em que essa prática se insere.
Quais são os interlocutores, que familiaridade se tem com o gênero, além de atentar para questões de textualização como: situacionalidade, intertextualidade e informatividade.
Os PCNs defendem que o aluno deve ser considerado produtor de texto na sociedade. Nesse sentido, os gêneros discursivos são recursos para afirmar os significados sociais, a função social, os valores, o ponto de vista de cada indivíduo. A escola tem que ser o espaço de estímulo, de produção da linguagem, da escrita, estabelecendo as relações necessárias para a construção de um aluno que se posiciona de maneira crítica, responsável pelas situações sociais. Dessa forma, ele questiona, formula problemas, utiliza o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, selecionando procedimentos e verificando a adequação da sua produção textual.
Escrever é, simultaneamente, inserir-se não apenas num contexto de atuação social, mas também é demarcar um formar particular de escrita que liberta o ser humano da inércia do silêncio, da palavra sem vida, sem sentido. Escrever seria o meio pelo qual o ser humano registra a sua passagem na sociedade, marcando os seus pensamentos, seus desejos.
Bartolomeu Campos de Queirós (2007) diz que aprendeu a escrever para libertar-se, para encontrar o outro: “Eu aprendi a escrever para deixar gravado o tamanho do meu desejo, da minha dúvida, do meu medo. Escrever é jamais poder negar o pensado. Escrever é afirmar – que a incompletude nos aproxima por nos revelar que o homem é um ser de relações.” (p.51)
Neste aula, você:
- Compreendeu a importância da prática de produção textual em sala de aula como prática discursiva e social.
- Assimilou como realizar estratégias para o desenvolvimento da habilidade da escrita. 
- Percebeu que o professor tem um importante papel na construção do texto pelo aluno, e na sua reescrita.
Aula 10
Nesta aula, vamos chamar a atenção para o estudo da gramática numa perspectiva de base estruturante para a leitura, a escrita e a fala. 
Destacar a importância do conceito e análise do termo gramática em função da compreensão da leitura e da produção textual. 
Vamos ressaltar o papel do professor na mediação do ensino dos usos gramaticais focados na reflexão da análise da linguagem.
Nesta aula, poderíamos nos alongar muito a respeito do conceito e termo da palavra gramática. Entretanto, para que possamos ser mais objetivos e claros com relação ao entendimento do estudo e aplicação da gramática da língua, achamos pertinente apresentar algumas definições e, a seguir, levantar algumas reflexões baseadas nos indicadores dos PCNs de língua portuguesa.
A professora Irandé Antunes em Antunes, Irandé. Muito Além da Gramática.Parábola Editorial. São Paulo:2007 faz uma reflexão muito pertinente de como são atribuídas cinco concepções de significados a partir da palavra gramática:
“.... quando as pessoas se referem à gramática, podem estar falando:
1-das regras que definem o funcionamento de determinada língua, como em; “ a gramática do português”; nessa acepção, a gramática corresponde ao saber intuitivo que todo falante tem de sua própria língua, a qual tem sido chamada de “gramática internalizada”.
2-das regras que definem o funcionamento de determinada norma, como em : “ a gramática da norma culta”, por exemplo.
3-de uma perspectiva de estudo, como em “ a gramática gerativa”, “a gramática estruturalista”, “a gramática funcionalista”; ou de uma tendência histórica de abordagem, como em: “ a gramática tradicional”, por exemplo.
4-de uma disciplina escolar, como em : “aulas de gramática”.
5-de um livro, como em : “ a gramática do Celso Cunha”.
Portanto, podemos sintetizar em um quadro assim:
	GRAMÁTICA INTERNALIZADA
	 Saber intuitivo
	GRAMÁTICA DA NORMA CULTA
	Funcionamento da regras
	GRAMÁTICA COMO OBJETO DE ESTUDO
	Tradicional, Gerativa, Estruturalista, Funcionalista
	GRAMÁTICA COMO DISCIPLINA ESCOLAR
	Aula de Gramática
	GRAMÁTICA COMO LIVRO
	Livros que tratam de gramática
Passemos a fazer breve análise de cada item:
1.Gramática como livro
São livros escritos por estudiosos da Língua portuguesa que adotam duas posições: 
a) uma posição mais descritiva - descreve como a língua é usada pelos falantes e escritores, apresentando as regularidades que surgem nas variações, considerando a norma como uma das possibilidades; 
b) ou uma posição mais prescritiva/normativa - focaliza-se nos usos lingüísticos considerados como padrão. 
2.Gramática como Disciplina de estudo
É a gramática vista como o estudo que dá suporte ao discurso oral, à escrita e à leitura. Não deve, portanto, ser uma disciplina escolar em que o foco principal do ensino são as regras gramaticais da norma culta, apesar de muitos pais e até alunos acharem que aula de Português é aula exclusivamente de gramática. Voltaremos a comentar esse assunto até o final desta aula. 
3.Gramática como perspectiva de estudo de uma língua
É o estudo científico sobre o funcionamento e usos de uma língua, que apresenta um corpo de teorias formuladas a partir da apreensão, observação e análise do fenômeno linguístico. 
4.Gramática da Norma Culta
É o conjunto de regras que regulam a norma culta e que foram estabelecidas na ótica da língua prestigiada socialmente, de acordo com o poder econômico e político da comunidade linguística. A matéria-prima desse ensino gramatical se concentra na observação da escrita considerada culta e de boa qualidade. Portanto, a forma considerada errada é mais aproximada da classe social de menor prestígio e poder socioeconômico. Esse dado é fundamental para o professor considerar a dificuldade de apropriação das regras gramaticais da norma culta pelos alunos de determinados contextos sociolinguisticos. 
5.Gramática Internalizada
É o conjunto de saberes que as pessoas desenvolvem desde a mais tenra idade. As pessoas que aprendem a falar uma língua utilizam as regras de funcionamento da gramática que regulam essa (íngua, mesmo que não tenham consciência disso. As crianças vão aprendendo a falar a (íngua materna e a utilizar os pronomes pessoais sem saberem a sua classificação. Por exemplo, ao responder se querem água, inicialmente dizem: Quer; em seguida, passam a responder: - Quero, com o verbo já flexionado na 1° pessoa. Esse conhecimento gramatical vai se processando paralelamente com a descoberta de sua identidade. 
Diante dessas características, enfrentamos o desafio:
Qual a mais adequada?
Em primeiro lugar, consideremos que o ato de ensinar é contextualizado em um espaço e tempo. Mediado pelas conveniências do aprendiz e do professor e pressupõe, por isso, uma interação constante entre ambos e o objeto de estudo. Importante é que se adote uma gramática que não sirva apenas como mais um conhecimento supérfluo que se “aprende” e se “esquece”, mas que seja um conhecimento efetivo do funcionamento das regras usadas na língua falada ou escrita inseridas numa perspectiva textual, contextualizada, Limitadas por uma análise Lingüística do processo de utilização da Lingua. 
Renomados autores direcionam suas obras, expressando a tendência pedagógica para o ensino da língua materna no Brasil.
Celso Cunha, ao encerrar o capítulo “Normas e nível socioculturais” em seu livro Á questão da norma culta brasileiro, afirma que se deve propiciar ao aluno uma posse do “dialeto prestigioso sem que seu vernáculo íntimo” seja violentado. 
João Wanderley Geraldi em O texto em sala de aula diz que os professores deveriam “oportunizar aos alunos o domínio do dialeto padrão como outra forma de linguagem, sem depreciar sua família, em seu grupo social. 
Magda Soares, numa visão revolucionária da escola, propõe ensinar o padrão, além das variantes desprestigiadas para a conscientização das várias modalidadesde uso e transformação da sociedade. 
Se qualquer falante já possui uma gramática internalizada ao ingressar na escola, ele deve desenvolver a sua competência comunicativa de tal modo que possa utilizar da melhor maneira possível sua Língua em todas as situações de fala e escrita. Ele deve ser capaz de refletir sobre a capacidade Lingüística que já possui e domina no nível intuitivo, mas sobre o qual nunca antes se tinha debruçado para analisar o funcionamento. 
A aula de português seria então um exercício contínuo de descrição e análise desse instrumento de comunicação; e um estratégia seria reconhecer a variação inerente a cada grupo social para interagir com todos e adequá-la a cada contexto social.
Sendo assim, as aulas focariam o domínio das várias modalidades de uso da língua – do coloquial ao culto – na fala, na leitura de gêneros variados e na escrita.
Por exemplo, a conjunção verbal só é válida se o aluno utilizá-la com adequação ao tempo do texto que ele escreve ou fala e de acordo com a concordância com o pronome adequado.
Há casos de o aluno saber, na “ponta da Língua” os tempos verbais do verbo por e ao se expressar, escrever ou dizer: Eu ponhei o caderno na mesa. O mesmo acontece com o uso inadequado do verbo ser: Espero que o caderno seje encontrado. Ainda tem-se o uso do mas (conjunção com sentido de porém) e mais (pronome ou advérbio com sentido de intensidade). Se o aluno não entender o funcionamento desses casos, o erro persistirá durante toda a sua vida. 
Pensemos, então, que há necessidade de se adequar os conteúdos curriculares gramaticais aos anos escolares iniciais do ensino fundamental. É recomendável que a exploração da terminologia gramatical mereça pouca atenção, desde que esse momento de primeiros contatos sistemáticos do sujeito seja de priorizar a faculdade da linguagem e sua interação com o texto. 
Progressivamente, faz-se da nomenclatura um recurso, uma mediação, um ponto de passagem e não um objeto isolado de estudo. O conteúdo deve-se direcionar para os componentes textual e discursivo da língua, sendo as estruturas gramaticais estudadas como itens formadores do sentido do texto. 
Segundo Celso Luft em seu Língua e Liberdade (2004):
“Não se trata de “ensinar” a língua materna, que o aluno já fala 
ao entrar na escola; nem se pode, aliás, ensinar uma língua. O 
que cabe é ir aumentando a capacidade comunicativa dos alunos. 
Trabalhar muito com a língua, melhorando sempre mais e 
tornando mais produtivo o manejo desse instrumento.” (p.3O) 
De acordo com os PCNs de Língua Portuguesa, o ensino da gramática deve ser baseado no desenvolvimento da habilidade do aluno em identificar:
“o sentido que um recurso ortográfico, como, por exemplo, diminutivo ou aumentativo de uma palavra, entre outros, e/ou os recursos morfossintáticos (forma que as palavras se apresentam), provocam no leitor, conforme o que o autor deseja expressar no texto. Essa habilidade é avaliada por meio de um texto no qual se requer que o aluno identifique as mudanças de sentido decorrentes das variações nos padrões gramaticais da língua (ortografia, concordância, estrutura de frase, entre outros) no texto.” 
Uma outra habilidade que os PCNs indica são as relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções, advérbios, etc. Assim determina...
“As habilidades que podem ser avaliadas por este descritor relacionam-se ao reconhecimento das relações de coerência no texto em busca de uma concatenação perfeita entre as partes do texto, as quais são marcadas pelas conjunções, advérbios, etc., formando uma unidade de sentido. Essa habilidade é avaliada por meio de um texto no qual é solicitado ao aluno, a percepção de uma determinada relação lógico discursiva, enfatizada, muitas vezes, pelas expressões de tempo, de lugar, de comparação, de oposição, de causalidade, de anterioridade, de posteridade, entre outros e, quando necessário, a identificação dos elementos que explicam essa relação.” 
Irandé Antunes nos expõe o seguinte questionamento:
É assim que se aprende a compreender um texto?
Leia o texto e faça o que se pede:
Sou pretinho...
Pretinho de uma perna só.
Uso gorro vermelhinho
E cachimbo de cipó.
Faço cada traquinada!
Sou esperto como eu só.
Retire do texto palavras com:
Uma sílaba
Duas sílabas
Três sílabas
Quatro sílabas
Analisar o sentido da palavra “só” usada duas vezes. Em “pretinho de uma perna só” significa somente; Em “sou esperto como eu só” integra expressão como eu só que significa inigualável.
Diante desse texto, tão rico em duas construções lingüísticas, é feita apenas uma pergunta de constatação de sílabas.Façamos alumas considerações de recursos textuais:
Verificar o conhecimento do vocabulário para que a adivinhação seja entendida.
Observar como a pontuação participa na construção do sentido do texto. No primeiro verso, as reticências evidenciam um suspense do personagem. E o ponto de exclamação aumenta o sentido das traquinagens.
O uso do diminutivo deve ser analisado na sua formação com o acréscimo do “inho” e, principalmente, a função semântica que ele denota: pequeno e delicado: “pretinho”; “gorrinho”.
Desse modo, os itens comentados permitem conhecer que um texto tem grande função significativa em toda a sua estrutura e precisa ser estudado em vários aspectos. Solicitar o reconhecimento de separação de sílabas, somente, sena desperdiçar o conhecimento que esse texto pode desenvolver no raciocínio verbal. Um programa de estudo da Língua que inclua regras de textualização será mais relevante do que aquele que se detém em apenas nomear as classes gramaticais e a sintaxe. 
O estudo da gramática nunca pode ser retirado da prática escolar, pois ela faz parte da Língua. Não se 
pode confundir o estudo da nomenclatura com o estudo da gramática. As regras necessárias para a formação de um texto com coesão e coerência precisam ser 
gradativamente apresentadas e sempre com a devida aplicação de sua funcionalidade, de acordo com o desenvolvimento cognitivo de cada grupo sociocultural. O diálogo, a conversa, as histórias, os relatos, os poemas, as notícias e outros gêneros textuais devem ser orientados para o desenvolvimento específico da Linguagem nos mais diversos suportes( jornais, revistas, cartazes, meios eletrônicos, etc.) 
Contudo, não podemos esquecer que a gramática é um suporte, é ela que deve acompanhar o estudo da língua como instrumento de comunicação e não o contrário. Afinal, ‘são dispensáveis todas as regras que não contribuem para a eficiência comunicativa. Indispensável é aprender a língua, que contém a gramática” (Luft, (elsa. In Língua e Liberdade - p. 18) 
Neste aula, você: 
- Compreendeu o  conceito e o termo gramática. 
-Aprendeu também a importância de se estudar a gramática como base estruturante para a leitura, a escrita e a fala.
 -Assimilou a relevância do ensino da gramática em função da compreensão da leitura e da produção textual. 
-Percebeu o papel do professor na mediação do ensino dos usos gramaticais focados na reflexão da análise da linguagem.

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