Buscar

Envelehcimento e Deficiencia intelectual 1

Prévia do material em texto

MÓDULO II 
 
ENVELHECIMENTO HUMANO: CONCEITOS E 
FUNDAMENTOS 
 
TEMAS: 
AULA 1: Principais Síndromes Geriátricas. 
AULA 2: Luto e finitude. 
 
 
AO FINAL DESTE MÓDULO VOCÊ SERÁ CAPAZ DE: 
 Identificar as principais Síndromes Geriátricas comuns no envelhecimento. 
 Compreender a relação existente entre as princiapis Síndromes Geriátricas e suas 
implicações no atendimento à pessoa com Deficiência Intelectual. 
 Reconhecer a importância da abordagem sobre o luto e finitude. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1. Principais Síndromes Geriátricas. 
 
Alessandro Ferrari Jacinto. 
 
A funcionalidade global do idoso é a capacidade de gerir sua própria vida (cuidar 
de si mesmo). Diz-se que um indivíduo idoso é saudável quando se mostra capaz de 
funcionar sozinho, de forma independente e autônoma, mesmo que tenha doenças. Essa 
capacidade é avaliada por meio da análise das atividades de vida diária (AVDs), que são 
tarefas do cotidiano realizadas pelo idoso
1
.
 
A saúde do idoso é determinada pelo bom 
funcionamento de domínios funcionais, sendo os mais importantes: a cognição, o 
humor, a mobilidade e a comunicação. Estes domínios devem ser obrigatoriamente 
avaliados nas consultas geriátricas
2
. 
 
 
 
 
 
 
 
A cognição é a capacidade mental de compreender e resolver os problemas do 
cotidiano, sendo constituída por um conjunto de funções corticais, formado pela 
memória (capacidade de armazenamento de informações), função executiva (capacidade 
de planejamento, antecipação, sequenciamento e monitoramento de tarefas complexas), 
linguagem (capacidade de compreensão e expressão da linguagem oral e escrita), praxia 
(capacidade de executar um ato motor), gnosia (capacidade de reconhecimento de 
estímulos visuais, auditivos e táteis) e função visoespacial (capacidade de localização no 
espaço e percepção das relações dos objetos entre si). 
O humor é a motivação necessária para os processos mentais. A mobilidade é a 
capacidade de deslocamento do indivíduo. Depende da postura/marcha, da capacidade 
aeróbica e da continência esfincteriana. E, finalmente, a comunicação é a capacidade de 
PARA SABER MAIS: 
Para saber mais sobre o envelhecimento humano, você encontrará um texto adicional 
na biblioteca do curso para leitura (Envelhecimento populacional contemporâneo: 
demandas, desafios e inovações) escrita por Renato Veras, em 2009. Esse artigo aborda e 
discute as consequências sociais e da saúde, decorrentes do aumento do número de idosos no 
Brasil. 
 
 
 
 
 
estabelecer relacionamento produtivo com o meio (habilidade de se comunicar). 
Depende de visão, audição e fala. (Figura 1) 
 
 
Figura 1. Domínios de saúde do idoso (Fonte: Rev. Med. Minas Gerais 2010; 20(1): 54-66). 
 
A perda dessas funções resulta nas grandes síndromes geriátricas: 
 
1. Incapacidade cognitiva 
2. Instabilidade postural 
3. Imobilidade 
4. Incapacidade comunicativa 7 “Is” 
5. Iatrogenia 
6. Incontinência urinária 
7. Insuficiência familiar 
 
Descritas inicialmente por Isaacs
3
, as grandes síndromes geriátricas não incluíam 
a incapacidade comunicativa e a insuficiência familiar. Tem-se, portanto, os 7 “Is” da 
Geriatria. (Figura 2). 
 
 
 
Figura 2. Grandes síndromes geriátricas (Fonte: Rev. Med. Minas Gerais 2010; 20(1): 54-66). 
 
 
 
 
 
 
Incapacidade cognitiva 
 
Incapacidade cognitiva é o comprometimento das funções encefálicas superiores, 
o que prejudica a funcionalidade do indivíduo. Para o estabelecimento do diagnóstico, é 
fundamental a constatação do prejuízo na funcionalidade do indivíduo ou perda de 
AVDs. As principais etiologias da incapacidade cognitiva são: demência, depressão, 
delirium (estado confusional agudo) e doenças mentais (esquizofrenia, por exemplo). 
É recomendado o uso de normas padronizadas para detectar as alterações na 
funcionalidade dos idosos pelo desempenho em suas atividades básicas ou instrumentais 
REFLEXÃO: 
No convívio e\ou no atendimento à pessoa com DI que envelhece, sou capaz de 
perceber que as alterações nos domínios de saúde podem resultar nas grandes 
síndromes geriátricas? Será que esses domínios podem implicar na autonomia e na 
independência da pessoa com DI que atendo? 
 
 
 
 
 
 
de vida diária por intermédio das escalas, por exemplo, de Katz e de Lawton-Brody, 
respectivamente (Anexos 1 e 2). 
Para o diagnóstico das demências, os critérios propostos pela Academia 
Brasileira de Neurologia
4
 devem ser utilizados. (Quadro 1). 
Quadro 1. Critérios diagnósticos de demência 
 
 
A demência da doença de Alzheimer (DA) é a mais prevalente das demências 
em idosos. O diagnóstico da DA depende de uma avaliação clínica detalhada, seguindo 
os critérios
 
relacionados no Quadro 2. 
 
(1) Há sintomas cognitivos e comportamentais (neuropsiquiátricos) que: 
1.1 Interferem com a habilidade no trabalho ou em atividades usuais 
1.2 Representam declínio em relação a níveis prévios de funcionamento e desempenho 
1.3 Não são explicáveis por delirium (estado confusional agudo) ou doença psiquiátrica maior 
 
(2) O comprometimento cognitivo é detectado e diagnosticado mediante combinação de: 
2.1 Anamnese com paciente e informante que tenha conhecimento da história e 
2.2 Avaliação cognitiva objetiva, mediante exame breve do estado mental ou avaliação 
neuropsicológica. 
(3) Os comprometimentos cognitivos ou comportamentais afetam no mínimo dois dos 
seguintes domínios: 
3.1 Memória, caracterizado por comprometimento da capacidade de adquirir ou evocar informações 
recentes 
3.2 Funções executivas, caracterizado por comprometimento do raciocínio, da realização de tarefas 
complexas e do julgamento. 
3.3 Habilidades visuais-espaciais 
3.4 Linguagem (expressão, compreensão, leitura e escrita) 
3.5 Personalidade ou comportamento, com sintomas que incluem alterações do humor, agitação, 
apatia, desinteresse, isolamento social, perda de empatia, desinibição, comportamentos obsessivos, 
compulsivos ou socialmente inaceitáveis. 
 
Quadro 2. Critérios diagnósticos da demência de doença de Alzheimer
4 
 
1- Demência da doença de Alzheimer provável (modificado de McKhann et al.2011) 
Preenche critérios para demência e tem adicionalmente as seguintes características: 
1.1- Início insidioso (meses ou anos) 
1.2- História clara ou observação de piora cognitiva 
1.3- Déficits cognitivos iniciais e mais proeminentes em uma das seguintes categorias: 
 Apresentação amnéstica (deve haver outro domínio afetado) 
 Apresentação não-amnéstica (deve haver outro domínio afetado) 
 
-Linguagem (lembranças de palavras) 
-Visual-espacial (cognição espacial, agnosia para objetos ou faces, simultaneoagnosia e alexia) 
-Funções executivas (alterações de raciocínio, julgamento e solução de problemas) 
1.4- Tomografia ou, preferencialmente, ressonância magnética do crânio deve ser realizada para excluir outras 
possibilidades diagnósticas ou co-morbidades, principalmente a doença vascular cerebral. 
1.5- O diagnóstico de demência de DA provável não deve ser aplicada quando houver: 
 Evidência de Doença cerebrovascular importante definida por história de AVC temporalmente 
relacionada ao início ou piora do comprometimento cognitivo; ou presença de infartos múltiplos ou 
extensos; ou lesões acentuadas na sustância branca evidenciada por exame de neuroimagem; ou. 
 Características centrais de demência com corpos de Lewy (alucinações visuais, parkinsonismo e 
flutuação cognitiva) 
 Características proeminentes da variante comportamentalda demência frontotemporal (hiperoralidade, 
hipersexualidade, perseveração); ou 
 Características proeminentes de afasia progressiva primária manifestando-se como a variante 
semântica, com discurso fluente, anomia e dificuldade de memória semântica; ou como variante não- 
fluente, com agramatismo importante; ou 
 Evidência de outra doença concomitante e ativa, neurológica ou não-neurológica, ou de uso de 
medicação que pode ter efeito substancial sobre a cognição. 
Os seguintes itens, quando presentes, aumentam o grau de confiabilidade do diagnóstico clínico da DA provável: 
a- Evidência de declínio cognitivo progressivo, constatado em avaliações sucessivas; 
b- Comprovação de presença de mutação genética causadora de DA(genes da APP e presenilinas 1 e 2) 
c- Positividade de biomarcadores que reflitam o processo patogênico da DA (marcadores moleculares através de 
PET ou líquor; ou neuroimagem estrutural e funcional) 
A ocorrência do item a confirma a existência de um mecanismo degenerativo, apesar de não ser específico da DA 
2- Demência da Doença de Alzheimer possível 
Quando o paciente preenche os critérios diagnósticos clínicos para demência da DA, porém apresenta algumas 
das circunstâncias abaixo: 
2.1- Curso atípico: início abrupto e/ou padrão evolutivo distinto daqueles observado usualmente, isto é, 
lentamente progressivo. 
2.2-Apresentação mista: tem evidência de outras etiologias conforme detalhado no item 4 dos critérios de 
demência de DA provável 
 
 
 
Os exames de sangue e de imagem devem ser empregados para a investigação de 
causas secundárias potenciais de síndrome demencial (Quadro 3), incluindo a 
relacionada à DA. 
Quadro 3. Exames de rastreio para demência (incluindo a relacionada à DA*) 
Exames laboratoriais Exames de imagem 
Hemograma completo 
Creatinina, Cálcio sérico 
Enzimas hepáticas 
Albumina 
Dosagem de TSH 
Dosagem de vitamina B12 e ácido fólico 
Sorologia para sífilis 
<60 anos: sorologia para HIV 
Tomografia de crânio ou 
 Ressonância Nuclear Magnética do 
crânio (preferencialmente) 
*DA, demência da doença de Alzheimer 
 
 
 
 
 
 
OUTRAS DEMÊNCIAS 
 Demência vascular 
 Demência com corpos de Lewy 
 Demência frontotemporal 
 Demência da doença de Parkinson 
 Doença de Huntington 
 Doenças priônicas 
 Demências virais e outras infecções (HIV, Sífilis e outras). 
 Secundárias a neoplasias 
 Hidrocefalia de Pressão Normal 
 Doenças psiquiátricas 
 Secundária ao alcoolismo 
REFLEXÃO: 
Será que as alterações cognitivas presentes na pessoa com DI em processo de 
envelhecimento podem ser confundidas com doenças graves como demências? 
 
 
 
 
 
 
 Demências metabólicas e tóxicas (deficiência vitamina B12 ou ácido fólico, 
alterações dos hormônios tireoidianos e outros). 
O delirium (estado confusional agudo) é uma síndrome neurocomportamental 
causada por comprometimento transitório da atividade cerebral, secundário a uma causa 
orgânica. É definido como distúrbio de início súbito que envolve a consciência, a 
atenção, a cognição e a percepção e que tende a variar (flutuar) ao longo do dia. Os 
idosos, devido à redução de sua reserva cerebral, são muito vulneráveis ao delirium, que 
pode se manifestar nas formas de delirium hiperativo, hipoativo e misto. Apenas o tipo 
hiperativo é frequentemente diagnosticado na prática clínica, apesar de corresponder a 
aproximadamente um terço dos casos. As principais causas de delirium são: infecções, 
medicamentos, intercorrências clínicas e hospitalizações. Sua prevalência em pacientes 
com síndrome demencial é muito elevada
10,11
. 
Em relação à depressão, os critérios diagnósticos (DSM-IV) devem levar em 
conta a seguinte sintomatologia: humor deprimido, diminuição do interesse e do prazer 
na maioria das atividades (anedonia); insônia ou hipersonia, ganho ou perda de peso 
acima de 5%, redução da capacidade de concentração, agitação ou lentificação 
psicomotora, fadiga, ideia inapropriada de menor valia ou de culpa, pensamento 
recorrente de morte ou de ideação suicida. A sintomatologia deve persistir por mais de 
duas semanas, com perturbação ou alteração da capacidade funcional e não estar 
relacionada ao abuso de alguma substância, condição médica ou luto. O diagnóstico de 
depressão maior requer a presença de cinco desses sintomas, incluindo, 
obrigatoriamente, humor deprimido ou anedonia. Recomenda-se que todos os idosos 
sejam avaliados em busca do diagnóstico de depressão, tendo em vista a sua alta 
prevalência e a significativa repercussão dela decorrente. 
 
Iatrogenia (iatros: médico; gignesthai: nascer, derivado da palavra gênese: 
produzir). 
 
A iatrogenia relaciona-se a qualquer alteração patogênica provocada pela prática 
médica. Ela resulta da presença de uma ou mais das seguintes situações: 
 
 Iatrofarmacogenia, decorrente de polifarmacia, da interação medicamentosa e do 
desconhecimento das alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas 
associadas ao envelhecimento; 
 Internação hospitalar, que pode potencializar os riscos decorrentes do declínio 
funcional, da subnutrição, da imobilidade, da úlcera de pressão e da infecção 
hospitalar; 
 Iatrogenia da palavra, associada ao desconhecimento de técnicas de 
comunicação de más notícias; 
 Iatrogenia do silêncio, que decorre da dificuldade de ouvir adequadamente ao 
paciente e à sua família; 
 Subdiagnóstico, que é a tendência a atribuir todas as queixas apresentadas pelo 
idoso ao fenômeno “da idade”; 
 Cascata propedêutica, em que a solicitação de exames é feita de forma 
desnecessária, extensiva e sem indicação; 
 Distanásia, caracterizada pelo prolongamento artificial da vida sem perspectiva 
de reversibilidade, com sofrimento do paciente e de sua família; 
 Prescrição de intervenções fúteis e/ou sem comprovação científica: que impõem 
ao paciente risco desnecessário; 
 Iatrogenia do excesso de intervenções reabilitadoras, ou o excesso de “equipe 
interdisciplinar”, que pode trazer consequências desfavoráveis ao paciente, assim 
como o faz a polifarmácia. 
Incontinência urinária 
 
A incontinência urinária (IU) é definida como a queixa de qualquer perda 
involuntária de urina. A IU pode ser: 
 De estresse: perda involuntária de urina sincrônica ao esforço, espirro ou tosse. 
Pode ser causada, em mulheres, pela fraqueza do assoalho pélvico e, em 
homens, após prostatectomia radical; 
 De urgência: perda involuntária de urina, associada ou imediatamente precedida 
de urgência miccional. Há, em geral, queixa associada de polaciúria e noctúria. 
Corresponde, frequentemente, à queixa de diminuição da complacência vesical 
ou de bexiga hiperssensível; 
 
 Mista: perda involuntária de urina concomitante à urgência miccional e ao 
esforço; 
 Por transbordamento: gotejamento e/ou perda contínua de urina associados ao 
esvaziamento vesical incompleto, devido à contração deficiente do detrusor e/ou 
obstrução na via de saída vesical. 
 
Instabilidade postural 
O comprometimento da mobilidade pode acarretar consequências graves, 
principalmente nos idosos. A instabilidade postural, por exemplo, leva o idoso à queda, 
o que representa uma grande preocupação por parte de quem cuida dos idosos. 
Imobilidade 
O conceito de imobilidade é variável. Por imobilidade entende-se qualquer 
limitação do movimento.
 
No grau máximo de imobilidade, conhecido como síndrome 
de imobilização ou da imobilidade completa, o idoso é totalmente dependente: apresenta 
déficit cognitivo avançado, rigidez e contraturas generalizadas e múltiplas; afasia, 
disfagia, incontinência urinária e fecal; e úlceras de pressão.Incapacidade comunicativa 
 
Problemas de comunicação podem resultar em perda de independência e 
sentimento de desconexão com o mundo, sendo um dos mais frustrantes aspectos dos 
problemas causados pela idade. A incapacidade comunicativa pode ser considerada 
importante causa de perda ou restrição da participação social (funcionalidade), 
comprometendo a capacidade de execução das decisões tomadas, afetando diretamente 
a independência do indivíduo. 
Insuficiência familiar 
 
A família constitui-se na principal instituição cuidadora dos idosos frágeis, 
devendo ser privilegiada nessa sua função. A transição demográfica, entretanto, a atinge 
diretamente reduzindo drasticamente a sua capacidade de prestar apoio a seus membros 
idosos. 
A redução da taxa de fecundidade trouxe profundas modificações na estrutura 
familiar. O número de filhos está cada vez menor e as demandas familiares são 
crescentes, limitando tanto a disponibilidade dos pais para cuidarem de seus filhos 
 
quanto dos filhos para cuidarem de seus pais. Por sua vez, o aumento da participação da 
mulher no mercado de trabalho, a valorização do individualismo e os conflitos 
intergeracionais contribuem para as modificações nos arranjos domiciliares. Essas 
mudanças sociodemográficas e culturais têm repercussões importantes no acolhimento 
às pessoas com incapacidades que, historicamente, dependiam de apoio e cuidado 
familiar. 
 
2. Luto e finitude. 
 
Deborah Inácio da Silva Boschetti 
 
 
Vida e morte: este é um eixo que sempre despertou a curiosidade dos seres 
humanos. O que acontece quando “acaba”? Há algo reservado para nós? E aos que 
ficam, é possível lidar com a perda? Estas são questões que permeiam nosso imaginário 
e com as quais temos dificuldade de lidar. 
Na sociedade moderna, na qual a figura do idoso é desvalorizada e o passar dos 
anos parece evidenciar a proximidade da morte, o próprio “processo de morrer” parece 
cada vez mais internalizado nos indivíduos como se, ao deixarmos de falar sobre o 
assunto, a finitude pudesse ser adiada. Em relação a esse contexto, Oliveira & Lopes 
(2008) afirmam que: 
A morte, neste modelo social, é algo relegado a um segundo plano, a 
não ser discutido, como se isso pudesse evitá-la. É aquela interdita, 
que deve ser escondida, institucionalizada, medicalizada, sem grandes 
demonstrações de dor pelos enlutados, não mais portadora de ritos. 
(p.217) 
Ainda que morrer seja inevitável a qualquer um de nós, a Ciência parece 
contribuir para prorrogar ao máximo nosso tempo de vida. Os adventos médicos, a 
indústria estética e a própria mídia tornam esse assunto um tabu difícil de ser 
contornado. De acordo com Basso & Wainer (2011): 
Este mistério que é a morte gera medo, medo do desconhecido talvez, 
que pode acarretar em muitas dores físicas, emocionais e psicológicas. 
A morte é um fenômeno que pode desencadear ou gerar uma sensação 
de fragilidade, não só para quem está morrendo, mas também para os 
familiares, amigos, etc.(p.36). 
 
 
Pensemos nas transformações ao longo da História. Apesar de tratada com certo 
medo, a morte sempre foi esperada e a ela eram conferidos, de acordo com cada cultura, 
um processo ritualístico para simbolizar essa penosa passagem. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Nos dias atuais, entretanto, esse simbolismo vem perdendo espaço. A sociedade, 
cada vez mais dinâmica, não atribui mais valor ao processo de morrer e, mais do que 
isso, ao enlutamento presente nos indivíduos que perderam um ente querido. O luto é 
uma construção importante e inerente a todos os seres humanos, ainda que a 
demonstração das emoções (e da dor, por que não?) se dê de forma diferente em cada 
um de nós. 
 
 
 
 
 
Não existe uma fórmula mágica que confira ao luto um roteiro a ser seguido. 
Entretanto, os estudos nas áreas da Psicologia e de algumas Ciências Humanas, nos 
trazem uma gama de características que podem ser encontradas com maior repetição. 
Dentro do contexto subjetivo ao qual se atrela ao luto, pensemos em como se dá 
esse processo em indivíduos com alguma deficiência intelectual. Estes sujeitos sofrem e 
sentem a dor da perda como qualquer um de nós. Entretanto, o aumento da longevidade 
dessa parcela da população traz a necessidade de compreendermos como eles elaboram 
seu enlutamento e como manifestam seus sentimentos. 
PARA SABER MAIS: 
Para saber mais sobre esse tema, você encontrará um vídeo sobre luto e finitude 
humana, produzido pela Drª Carla Mannino, Psicóloga clínica, especialista em psico-
oncologia. Esse material foi veiculado livremente no YouTube. 
http://www.youtube.com/watch?v=R7K3cPWEyeg 
PARA REFLETIR: 
Sou capaz de perceber a importância da elaboração do luto no atendimento à pessoa 
com DI? Será que de fato valorizo o enlutamento da pessoa que atendo? 
 
 
 
 
 
Pretendemos com este pequeno ensaio discutir alguns aspectos essenciais na 
elaboração do luto, especialmente em pessoas idosas com deficiência intelectual, de 
modo a contribuir para a ampliação da discussão sobre como se pode contribuir para o 
bem estar destes indivíduos, no contexto do enlutamento. 
 
A elaboração do luto 
Este processo, de acordo com Rebelo (2005), é um “processo psicossocial que, no 
seu desenvolvimento normal, visa à transferência, na esfera emocional, da vinculação 
em relação a um objeto perdido para memórias amenas das expressões dessa mesma 
vinculação”. 
Perder alguém próximo, alguém que amamos e com quem convivemos, não é uma 
tarefa fácil. Há uma porção de sentimentos que invadem nossa mente: raiva, indignação 
pela perda, culpa, tristeza, sensação de esquecimento, de irritabilidade, ansiedade, entre 
outros. 
A dor da perda acomete a todos os seres humanos, em diferentes proporções, 
podendo atender às variáveis que compreendam, por exemplo, o grau de proximidade 
do ente que partiu com o enlutado. Perder parentes próximos, como pais ou mesmo 
filhos, gera um quadro de luto mais delicado de ser tratado pelos profissionais. 
 
 
 
 
 
Embora não desejemos que alguém querido parta, em algumas situações – como 
em um quadro longo de alguma doença degenerativa, por exemplo – de certa forma, nos 
preparamos para a perda ao longo do tempo. A esse processo, os autores que discursam 
sobre o tema chamam “luto antecipatório”. Basso & Wainer (2011) comentam que: 
Quando ocorre uma perda devido a alguma doença degenerativa, ou 
uma morte natural e esperada, as pessoas possuem um tempo maior 
para se prepararem e até se conformam mais rapidamente com a 
partida do ente querido. O luto antecipatório é bastante encontrado 
nesses casos, pois as pessoas passam a ter sintomas de raiva, 
depressão, ajustes de papéis familiares e, de acordo com alguns 
estudiosos, são facilitadores da vivência do luto. (p.37) 
 
PARA REFLETIR: 
Posso considerar a elaboração do luto como um processo importante na vida da pessoa com 
DI que envelhece? Será que dei a devida importância a esse fato na minha prática de 
atendimento, ou apenas achava que esse processo não tinha tanta relevância? 
 
 
 
 
 
 
 
Em outros casos, frente a uma perda súbita, a elaboração do luto adquire um 
caráter de maior dificuldade e complexidade, pois, além de lidar com o susto da perda, o 
enlutado preciso buscar mecanismos para aceitar e racionalizar algo que aconteceu de 
modo repentino. São casos mais complicados, que envolvem sentimentos mais confusos 
e de indignação. 
Ao longo dos estudos da Psicologia, o processo de elaboração do luto e da 
ressignificação do sentido da vida frente à perda de um ente querido foi amplamente 
estudado. Embora cada autor delimitefases (ou estágios) distintas, elas convergem para 
algumas características comuns – como os momentos de choque, revolta, 
desnorteamento e reorganização. 
Segundo Bowlby (1990), há quatro estágios ou fases do luto: 1) o entorpecimento; 
2) o anseio; 3) a desorganização e o desespero; e 4) a reorganização. 
Podemos afirmar que são diversas as formas de expressar o sentimento 
representativo à perda de um ente. Voltamos a afirmar que, cada indivíduo tem uma 
forma e uma intensidade cabível a essa demonstração, ainda que existam reações 
comumente associadas ao fenômeno da perda. A própria fase da barganha associa-se ao 
eixo perda – ganho do indivíduo que sofre pela perda, e tem medo de que ela possa 
ocorrer novamente (envolvendo outros sujeitos à sua volta). É um processo delicado, no 
qual a fé pode ser colocada em questão e o medo do abandono e da solidão permeia o 
imaginário do enlutado. 
O impacto inicial também constitui um cenário de grande relevância. Para 
Oliveira & Lopes (2008): 
A fase do choque pode durar horas ou dias, constituindo-se de 
desespero, raiva, irritabilidade, amargura e isolamento. Tais 
sentimentos podem se manifestar por atitudes emocionais intensas e 
passam a ser expressos contra todo aquele que venha a compartilhar o 
luto, como uma manifestação de defesa, pois a aceitação desses 
sentimentos reafirma a perda. (p.218) 
 
Outro sentimento que se torna uma armadilha perigosa na construção do luto é a 
culpa. Esta, por sua vez, invade a mente do indivíduo enlutado, deixando a dúvida de 
ações que poderiam ser tomadas para evitar a morte em si, ou ainda, de hábitos que 
poderiam (ou que se pensa, poderiam) impedir ou afastar a morte. Em relação a isso, 
Bassi & Wainer (2011a) comentam que a personalização aparece quando os indivíduos 
 
assumem a culpa pelo fato ocorrido: “’Ele morreu por minha culpa, não podia ter 
deixado sair com o carro’, pois, além dos sentimentos de culpa e de revolta, eles 
encontram-se raivosos consigo mesmos” (p.39). 
Ainda que seja passível de inúmeras variáveis intrínsecas a subjetividade do 
indivíduo, sua historia de vida e o contexto da morte de seu ente, há uma diferenciação 
entre o luto considerado normal e o luto que ultrapassa os parâmetros da normalidade, 
tornando-se complicado. 
Basso & Wainer (2011b), distinguem esses processos de modo que o luto normal 
é uma resposta saudável a um fator estressante que é a perda significativa de um ente 
querido, implicando na capacidade de expressar a dor. No caso do luto complicado, 
esses mecanismos de externalização não foram bem-sucedidos e o enlutado renega a 
possibilidade da perda. 
 
Luto em pessoas com Deficiência Intelectual em processo de envelhecimento 
O aumento da longevidade em indivíduos com deficiência intelectual imprime 
uma tendência que evidencia a necessidade de estudos específicos sobre essa população, 
no que tange a percepção de seu desenvolvimento cognitivo e emocional. 
Na realidade atual, é comum que estes indivíduos tenham que lidar com a perda 
de parentes próximos, principalmente dos pais, uma vez que o envelhecimento e a perda 
de funções fisiológicas chegam tanto para estes quanto para seus filhos. 
Muitas vezes a pessoa idosa com DI, além de perder seus pais ou cuidador, perde 
também seus espaços, pois com a morte destes, passam a morar com um irmão ou 
cuidador em outra casa. Em um espaço diferente, muitas vezes precisam se adaptar com 
a nova família, com uma nova casa, uma nova rotina, fazendo com que o luto e a perda 
sentida sejam em vários outros aspectos que não só a morte de um ente querido. 
Faz-se necessário, dessa forma, preparar esses sujeitos para a perda e acompanhá-
los no processo de enlutamento, para que suas emoções sejam externalizadas de maneira 
bem-sucedida – configurando o luto normal. Infelizmente, ainda existem poucas 
pesquisas na área, o que dificulta aos profissionais que realizam a terapia compreender 
se no processo de racionalização da perda, a deficiência intelectual condiciona ou não os 
indivíduos ao sucesso da elaboração do luto. 
 
Devido à deficiência e declínio cognitivo, muitas vezes a pessoa com deficiência 
intelectual tem dificuldade para entender o que se passa com relação à morte de um ente 
querido ou até mesmo de comunicar ou expressar seus sentimentos. Isto faz com que ela 
demonstre comportamento como isolamento, irritabilidade, falta de motivação nas suas 
atividades sociais e da vida diária, doenças, queda de cabelo, entre outros. 
Outro fator importante em relação ao luto em pessoais com DI é a falta, na 
maioria dos casos, de espaços de escuta terapêutica que possibilitem a eles expressar o 
que lhes angustia. Esses indivíduos, como apontam alguns estudos, têm suas emoções 
negligenciadas na maior parte do tempo. Isso se torna, para eles, uma barreira 
significativa à possibilidade de expressão, de manifestação da dor e da revolta 
legitimadas pela perda. Essa dificuldade de expressão e, em alguns casos, até da 
negação, pode contribuir para a construção de um luto complicado. 
 
Assistência especializada na elaboração do luto 
Mais uma vez, ressaltamos a importância da assistência especializada na 
elaboração do luto em pacientes com alguma dificuldade de expressão da dor provocada 
pela perda. Como mencionado anteriormente, o luto saudável compreende a capacidade 
do indivíduo em aceitar e expressar o sentimento de dor e descontentamento, enquanto 
no luto complicado, essa internalização é dificultada por algum agravante emocional ou 
patológico. 
Em pessoas com DI a comunicação é, por si só, um obstáculo a ser vencido. Em 
casos de perda de familiares, a dor e a não-compreensão do quadro que se instaura 
podem levar a elaboração do luto de um modo complicado. 
Muitos estudos propõem alternativas de intervenção para pacientes enlutados, 
embora os estudos específicos para o tratamento emocional de pacientes com 
deficiência intelectual ainda seja extremamente escasso. Dessa forma, faz-se necessário 
adaptar as alternativas terapêuticas ao contexto do DI, respeitando sua subjetividade e 
suas possibilidades de resposta ao tratamento. 
Dentre as inúmeras possibilidades de intervenção, ressalto alguns caminhos pelos 
quais tenho trilhado a terapia com êxito. É primordial que o suporte seja dado de modo 
acolhedor aos familiares atentando-se, principalmente, àqueles que, por falta de acesso a 
uma rede de suporte psicossocial, estejam em situação de maior risco. 
 
É necessário que o terapeuta, num primeiro momento, auxilie o indivíduo a se dar 
conta da perda, isto é, auxiliá-lo a não negar o que aconteceu, podendo rememorar o 
episódio (com delicadeza, obviamente). 
Outro princípio importante está no incentivo à identificação e expressão dos 
sentimentos do enlutado. Como? Auxiliando para que este expresse e identifique quais 
são os sentimentos pelos quais está tomado naquele momento (por exemplo, raiva, 
indignação, entre outros). 
 
 
 
 
 
Aprender a lidar com a ausência do ente perdido é outro passo fundamental no 
processo de aceitação da perda e ressignificação da própria vida. Este é um passo muito 
difícil de ser dado, uma construção que deve envolver o incentivo à habilidade de lidar 
com situações adversas e reagir positivamente a ela. Ainda que não exista uma fórmula 
a ser seguida, é importante ressaltar que o luto é um processo doloroso, porém comum, 
dentro da possibilidade de expressão da dor. Precisamos ficar atentos ao comportamento 
dos indivíduos enlutados, para verificar se a dor e a insatisfação estão dentro da 
normalidade. O tempo de aceitação de cada um é único, assim como a resposta do 
indivíduo ao processo. 
 
RESUMONeste módulo você foi capaz de aprender sobre o envelhecimento humano 
normal e as principais co-morbidades presentes no envelhecimento patológico. Além 
disso, compreendeu os aspectos que envolvem a finitude humana. No próximo módulo 
você estudará o aumento da expectativa de vida, a transição demográfica e 
epidemiológica. Compreenderá as causas de mortalidade e as principais doenças 
presentes na pessoa idosa. Portanto, entenderá o papel do cuidador e refletirá sobre 
promoção de saúde e a qualidade de vida da pessoa com DI em processo de 
envelhecimento. 
 
PARA REFLETIR: 
Na minha prática de atendimento, tenho sido um facilitador (a) na elaboração do luto da 
pessoa com DI que atendo? Sou capaz de perceber as expressões dos sentimentos 
utilizados como recursos na elaboração do luto? 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
MORAES, E. N. Princípios Básicos de Geriatria e Gerontologia, Belo Horizonte: 
Coopmed; 2008. 
ISAACS, B. The Challenge of Geriatric Medicine. Oxford: Blackwell; 1992. 
MORAES, E. N, Marino MCA, Santos RR. Principais síndromes geriátricas. Rev Med 
Minas Gerais. 2010; 20(1):54-6. 
FROTA, N.A; NITRINI, R; DAMASCENO, BP, FORLENZA O, TOSTA ED, DA 
SILVA AB ET AL. Critérios para o diagnóstico de doença de Alzheimer. Dement 
Neuropsycholol. 5(Suppl 1): 5-10. 2011. 
BRUCKI SM, NITRINI R, CARAMELLI P, BERTOLUCCI PH, OKAMOTO IH. 
Sugestões para o uso do Mini Exame do Estado Mental no Brasil. Arq 
Neuropsiquiatr . 61:777-781. 2003. 
OKAMOTO, I.H. Aspectos cognitivos da doença de Alzheimer no teste do relógio: 
avaliação de amostra da população brasileira. [tese de doutorado]. São Paulo: 
Universidade Federal de São Paulo; 2001. 
BRUCKI SM, ROCHA MS. Category fluency test: effects of age, gender and education 
on total scores, clustering and switching in Brazilian Portuguese-speaking subjects. 
Braz J Med Biol Res. 37(12):1771-7. 2004. 
MAYEUX R. M.D. Early Alzheimer´s disease. N Engl J Med. 362:2194-2201. 2010. 
CHAVES ML, GODINHO C, PORTO CS, MANSUR L, CARTHERY-GOURLAT 
MT, YASSUDA MS, BEATO R. Doença de Alzheimer- Avaliação cognitiva, 
comportamental e funcional. Dement Neuropsychol. 5 (Suppl 1):21-33. 2011. 
STAGNO D, GIBSON C, BREITBART W. The delirium subtypes: a review of 
prevalence, phenomenology, pathophysiology, and treatment response. Palliat 
Support Care. 2(2):171-9. 2004. 
INOUYE SK. Delirium in older persons. N Engl J Med. 354(11):1157-65. 2006. 
YESAVAGE JA, BRINK TL, ROSE TL, LUM O, HUANG V, ADEY M, et al. 
Development and validation of a geriatric depression screening scale: a preliminary 
report. J Psychiatr Res. 17(1):37-49. 1982. 
LUTO E FINITUDE. 
 
BASSO, L. A.; WAINER, R. Luto e perdas repentinas Revista Brasileira de Terapias 
Cognitivas; 2011; v.7, n.1; p. 35 – 43. Disponível em 
<http://www.rbtc.org.br/detalhe_artigo.asp?id=138> Acessado em 22 de agosto de 
2013. 
OLIVEIRA, J. B. A.; LOPES, R. G. C. O processo de luto no idoso pela morte de 
cônjuge e filho. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 13, n. 2, p. 217-221, abr../jun. 
2008. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/pe/v13n2/a03v13n2.pdf > 
Acessado em 20 de agosto de 2013. 
REBELO, J. E. Importância da entreajuda no apoio a pais de luto. Análise Psicológica 
v.4, n.23. P. 373- 380. Disponível em: < 
http://www.scielo.oces.mctes.pt/scielo.php?pid=S0870-
82312005000400002&script=sci_arttext > Acessado em 25 de agosto de 2013.

Continue navegando