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EAD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA LICENCIATURA EM HISTÓRIA HISTÓRIA INDígENA MARIA HILDA BAqUEIRO PARAISO Salvador UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A ©2010 Cedido à Editora da Universidade do Estado da Bahia – EDUNEB para esta edição. Proibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio de impressão, em forma idêntica, resumida ou modificada em Língua Portuguesa ou qualquer outro idioma. Depósito Legal na Biblioteca Nacional FICHA TÉCNICA EDITORA DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – EDUNEB DIRETORA Maria Nadja Nunes Bittencourt ASSESSORA EDITORIAL Carla Cristiani Honorato de Souza REVISÃO E PREPARAÇÃO DE ARqUIVO Carla Cristiani Honorato de Souza Maíta Nogueira de Andrade Naiara Rios Sena DIAgRAMAÇÃO Sidney Santos Silva O conteúdo deste Material Didático é de inteira responsabilidade do(s)/da(s) autores (as), por cuja criação assume(m) ampla e total responsabilidade quanto a titularidade, originalidade do conteúdo intelectual produzido, uso de citações de obras consultadas, referências, imagens e outros elementos que façam parte desta publicação. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP). Catalogação na Fonte BIBLIOTECA DA COORDENAÇÃO UAB/UNEB Editora da Universidade do Estado da Bahia – EDUNEB Rua Silveira Martins, nº 2.555 – Cabula CEP: 41.195-001 – (71) 3117-3458 editora@listas.uneb.br www.uneb.br PARAÍSO, Maria Hilda. P222 História indígena: licenciatura em história. / Maria Hilda Paraíso. Salvador: UNEB/ UAB, 2011. 86p. 1. Brasil 2. História 3.Índio I. Maria Hilda Paraíso II. Título. III. Universidade Aberta do Brasil. IV. UNEB CDD: 980.41 EAD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI APRESIDENTE DA REPÚBLICA Dilma Roussef MINISTRO DA EDUCAÇÃO Fernando Haddad SISTEMA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL PRESIDENTE DA CAPES Jorge guimarães DIRETOR DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DA CAPES João Teatini GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA GOVERNADOR Jacques Wagner VICE- GOVERNADOR Otto Roberto Mendonça de Alencar SECRETÁRIO DA EDUCAÇÃO Osvaldo Barreto Filho UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB REITOR Lourisvaldo Valentim da Silva VICE-REITORA Adriana dos Santos Marmori Lima PRÓ-REITOR DE ENSINO DE GRADUAÇÃO José Bites de Carvalho COORDENADOR UAB/UNEB Silvar Ferreira Ribeiro COORDENADOR UAB/UNEB ADJUNTO Daniel de Cerqueira góes EAD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A Caro (a) cursista, Estamos começando uma nova etapa de trabalho e para auxiliá-lo no desenvolvimento da sua aprendizagem es- truturamos este material didático que atenderá ao Curso de Licenciatura na modalidade de Educação a Distância (EaD). O componente curricular que agora lhe apresentamos foi preparado por profissionais habilitados, especialistas da área, pesquisadores, docentes que tiveram a preocupação em alinhar o conhecimento teórico e prático de maneira contextualizada, fazendo uso de uma linguagem motivacional, capaz de aprofundar o conhecimento prévio dos envolvidos com a disciplina em questão. Cabe salientar, porém, que esse não deve ser o único material a ser uti- lizado na disciplina, além dele, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), as atividades propostas pelo Professor Formador e pelo Tutor, as atividades complementares, os horários destinados aos estudos individuais, tudo isso somado compõe os estudos relacionados a EaD. É importante também que vocês estejam sempre atentos às caixas de diálogos e ícones específicos que aparecem durante todo o texto apresentando informações complementares ao conteúdo. A ideia é mediar junto ao leitor, uma forma de dialogar questões para o aprofundamento dos assuntos, a fim de que o mesmo se torne interlocutor ativo desse material. São objetivos dos ícones em destaque: Você sabia? – convida o leitor a conhecer outros aspectos daquele tema/conteúdo. São curiosidades ou informações relevantes que podem ser associadas à discussão proposta. Saiba mais – apresenta notas, textos para aprofundamento de assuntos diversos e desenvolvimento da argumentação, conceitos, fatos, biografias, enfim, elementos que o auxiliam a compreender melhor o conteúdo abordado. Indicação de leituras – neste campo, você encontrará sugestões de livros, sites, vídeos. A partir deles, você poderá aprofundar seu estudo, conhecer melhor determinadas perspectivas teóricas ou outros ol- hares e interpretações sobre determinado tema. Sugestões de atividades – consiste num conjunto de atividades para você realizar autonomamente em seu processo de auto-estudo. Estas atividades podem [ou não] ser aproveitadas pelo professor formador como instrumentos de avaliação, mas o objetivo principal é o de provocá-lo, desafiá-lo em seu processo de auto-aprendizagem. Sua postura será essencial para o aproveitamento completo desta disciplina. Contamos com seu empenho e entu- siasmo para juntos desenvolvermos uma prática pedagógica significativa. SETOR DE MATERIAL DIDÁTICO UNEB/EaD ?? VOCÊ SABIA? ??? ??? SAIBA MAIS INDICAÇÃO DE LEITURA SUGESTÃO DE ATIVIDADE EAD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A Apresentação da Disciplina A disciplina História Indígena tem como objetivo, conforme sua ementa, fazer compreender, nas múltiplas di- mensões das experiências dos índios como sujeitos históricos, a constituição de diferentes relações de tempo e espaço. Os textos que compõem este módulo estão organizados em ordem cronológica, para que o processo histórico possa ser mais bem compreendido. Sugerimos, portanto, que sua leitura e as orientações obedeçam à ordem de inserção dos textos. O objetivo deste curso é o de estabelecer um diálogo com vocês sobre o assunto, responder as perguntas que todos temos e abrir novas perspectivas para compreender a realidade indígena. O módulo está organizado em 8 capítulos. No capítulo I, veremos que é possível se fazer História Indígena, quando ela foi aceita pela academia, como podemos trabalhar a temática e as dificuldades a serem enfrentadas. No capítulo II, o tema é o que é ser índio. No capítulo III, de onde são originários e como o foram; e, no capítulo IV, como são diversos entre si. Dessa forma, daremos uma visibilidade mais acurada a esses personagens históri- cos. No capítulo V, trataremos do índio colonial, isto é, analisaremos as várias formas de interação estabelecidas entre índios, missionários, colonos e autoridades metropolitanas. Veremos os principais pontos de conflito e negocia- ção, a escravidão indígena e a relevância do seu trabalho, inclusive, na defesa da colônia. Destacaremos algumas das principais revoltas que desencadearam, pois, diferentemente do que estamos acostumados a ler, os indígenas estabeleceram formas de resistência e impuseram negociações, obrigando o governo colonial a fazer concessões e dar garantias aos grupos revoltados. Aprenderemos a dinâmica dessas relações, conhecendo como e por que a metrópole deliberou, nos meados do século XVIII, abolir a escravidão indígena e transformar seus aldeamentos em vilas. No capítulo VI, iniciamos nosso estudo pelo início do XIX, quando a guerra justa a alguns grupos indígenas é retomada e a escravidão indígena volta 50 anos depois de ter sido proibida. Esta foi a forma encontrada paraconquistar novos espaços produtivos e abrir outros caminhos de circulação. É o período conhecido pela política de interiorização da conquista e de acirramento das relações entre índios e não índios e dos preconceitos contra aqueles povos. Pensados como substitutos dos escravos de origem africana, os indígenas passaram a ser ad- ministrados por missionários capuchinhos e, logo depois, abandonados à própria sorte, quando da opção pelos imigrantes europeus para trabalharem no Brasil. Em seguida, demonstraremos como a independência do Brasil não alterou a visão preconceituosa sobre os índios, particularmente por predominarem as teorias racistas como explicação para as diferenças sociais. Analisaremos, ainda, como a necessidade de substituição dos escravos de origem africana, após a proibição do tráfico negreiro, fez o governo brasileiro deliberar por criar centros de educação e preparação de trabalhadores nas aldeias indíge- nas e entregar sua administração aos frades capuchinhos italianos. Porém, quando a elite política imperial deliberou substituir escravos por imigrantes estrangeiros, os índios foram abandonados à própria sorte e tiveram as terras dos seus aldeamentos vendidas em praça pública aos interessados. No capítulo VII, veremos que a proclamação da República não implicou em alterações até 1910, quando, após muitas discussões, criou-se o Serviço de Proteção aos Índios que, após muitos fracassos e corrupção, e alguns sucessos, terminou sendo extinto e substituído pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI). As contradições da política indigenista serão reveladas, assim como os efeitos provocados pela oscilação de orientações e posturas. Também veremos, nesse mesmo capítulo, as formas encontradas pelos indígenas para se organizarem e assim melhor poderem conquistar seus direitos. Finalmente, no capítulo VIII, vamos estudar quais as grandes questões que estão postas, hoje, para as populações indígenas, sua organização e lutas, além de analisar os principais questionamentos feitos pela sociedade nacional com relação às conquistas desses povos. Espero que, ao final do curso, tenhamos aprendido mais sobre os índios e que os possamos ver na sua real dimen- são humana e histórica; que possamos (re) conhecê-los e compreender suas ações e reivindicações. Desejo, ainda, que sejamos capazes de pensar questões como: qual o lugar dos índios na sociedade nacional? Os índios “misturados” são índios e têm os mesmos direitos dos demais? Após tantas demarcações de terras indígenas, há muita terra para pouco índio? Que também entendamos melhor como se formou a nossa sociedade e como se constituíram os fundamentos discriminatórios e hierarquizantes que caracterizam nossa nação. Desejo-lhes, então, bons estudos! A Autora EAD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A SUMÁRIO CAPíTULO I: A HISTÓRIA DA HISTÓRIA INDígENA 13 CAPíTULO II: DEFININDO íNDIOS 13 CAPíTULO III: ORIgEM DAS POPULAÇÕES INDígENAS 15 CAPíTULO IV: ENTENDENDO AS DIVERSIDADES NO BRASIL 17 CAPíTULO V: O íNDIO COLONIAL 19 CONTATOS E CONVIVÊNCIAS INTERÉTNICAS 19 A ESCRAVIDÃO INDígENA 21 ALDEAR, MISSIONAR, ADMINISTRAR E CIVILIZAR 23 CAPíTULO VI: O SÉCULO XIX E AS POLíTICAS INDIgENISTAS 29 As políticas indigenistas e o período regencial: a consolidação das novas tendências. 34 O 2º império e a possível incorporação dos índios ao todo nacional. 37 O FRACASSO DO REgULAMENTO DAS MISSÕES 40 A LEI DE TERRAS, A OPÇÃO PELOS IMIgRANTES E O ABANDONO DOS íNDIOS 41 CAPíTULO VII: AS PERPLEXIDADES DA REPÚBLICA 43 O SPI E SUA TRAJETÓRIA 46 A FUNAI E AS NOVAS E VELHAS POSTURAS 53 CAPíTULO VIII: O LUgAR DO íNDIO E qUESTÕES ATUAIS. 55 gLOSSÁRIO 59 EAD 1313UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A CAPíTULO I: A HISTÓRIA DA HISTÓ- RIA INDígENA Até a década de 70 do Século XX, os historiadores consideravam impossível e irrelevante realizar História Indígena, atribuindo essa reflexão aos antropólogos. Essa forma de pensar mantinha-se, apesar do estabe- lecimento do diálogo entre a História e a Antropologia desde o início daquele século, quando foi criada a conhecida Escola dos Annales. ??? ??? SAIBA MAIS A Escola dos Annales surgiu na França, no início do século XX. Seus componentes editaram uma revista, chamada Les Annales, que terminou por dar o nome a um grupo de historiadores que a escreviam e propunham uma nova forma de fazer História. Eles buscaram o diálogo com as Ciências Sociais e introduziram novos objetos e métodos de análise. Principalmente, buscaram ter uma visão crítica dos documentos usados na pesquisa a partir de sua contextualização do autor e do momento em que o documento foi escrito. Para saber mais, acesse: ESCOLA DOS ANNALES. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2011. Disponível em: < http://www.infopedia.pt/$escola-dos-annales> Acesso em: 20. jan.2011. Apesar dessa nova postura que mudou as temáticas e os métodos dos historiadores, os índios continuaram a ser vistos, principalmente, após o fortalecimento do Estruturalismo, como povos sem história. Não haviam produzido documentos e não pensavam numa perspectiva temporal, como era compreendida pelos estudiosos ocidentais – continuando, portanto, a ser objeto da Etnologia, segundo afirmava o célebre historiador brasileiro Francisco Adolfo Varnhagen, em 1850. Um dos exemplos mais claros dessa postura é a publicação, em 1997, da coletânea História da Vida Privada no Brasil, obra na qual são tratados os mais diversos temas, onde, porém, não há sequer um capítulo sobre os índios no país. INDICAÇÃO DE LEITURA Este livro é muito interessante para você saber mais sobre o assunto: MELLO E SOUZA, Laura de. História da vida privada no Brasil – cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo. Companhia das Letras, 1997. ??? ??? SAIBA MAIS A escola Estruturalista influenciou a História, destacando a necessidade de serem abandonados os fatos, em si, como objeto de análise, para usá-los para criar modelos de análise e compreender as estruturas profundas do pensamento humano, as regras que ordenariam o comportamento humano. CAPíTULO II: DEFININDO íNDIOS No início da colonização, a resposta era facilmente dada: índios eram todos aqueles que não eram europeus ou seus descendentes. Porém, com o passar do tempo e a chegada de povos de outras origens, como aqueles que vieram da África, a intensidade da miscigenação e a dinâmica cultural vivenciada pelos grupos indígenas e demais povos, esta resposta ficou cada vez mais difícil. ??? ??? SAIBA MAIS No Brasil atual, ante os constantes conflitos por terras envolvendo populações indígenas e a sua diversidade física e cultural, uma das perguntas que mais ouvimos é: afinal, o que é um índio? Iniciando o nosso exercício, devemos destacar que a própria denominação “índio” é problemática e implica num conjunto de dados a serem considerados. Sabe- mos que não existe uma etnia ou um povo chamado índio, indígena, nativo, silvícola ou algo similar. Essas denominações foram criadas pelos europeus, para 14 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A Vários critérios foram propostos e praticamente todos abandonados, por não se mostrarem adequados à realidade. O primeiro foi o racial, que partia das ideias equivocadas de que é possível aplicar esse conceito aos seres humanos e, consequentemente, o da existência de raças puras, o que pressupunha a inexistência da miscigenação e da igualdade física de todos esses povos que aqui habitavam. Aprimeira falha é a grande diversidade física entre os chamados indígenas. A segunda é não considerar que a miscigenação foi e é uma realidade concreta. ??? ??? SAIBA MAIS Nos Estados Unidos, esse critério ainda é usado. Quando uma pessoa tem uma bisavó indígena, ela é legalmente índio, mesmo que não o queira. O mesmo acontece com os negros. É uma forma bastante discriminatória de tratar as pessoas, pois não dá liberdade ao indivíduo de sequer optar pela raça de um dos sete bisavós, para se identificar. REgISTRE A SUA IDEIA É possível ou não identificar os índios por suas características físicas? Pensou-se, então, em defini-los pelos aspectos cul- turais peculiares. Também aqui, ignorava-se, não só a diversidade cultural desses povos, conhecidos desde o fim do Século XV, quando Colombo chegou ao continen- te americano, como também a realidade da dinâmica e transformação cultural resultante da convivência entre índios de várias etnias em aldeamentos criados pelos colonizadores, com europeus e seus descendentes, com escravos de origem africana em quilombos, en- genhos e vilas e povoados, e povos de origem asiática. Além do mais, o fato de os grupos indígenas viverem em situações diferenciadas de contato – tempo pacíficas ou não, opções de como se relacionar - tornam a adoção desse critério bastante problemática. Nos Estados Unidos deliberaram por adotar o que chamam de critério legal, Isto é, para alguém ser considerado índio, deverá comprovar documentalmente possuir as exigências estabelecidas por lei. Como a lei muda com o tempo, esse critério criava uma situação confusa, pois, de acordo com a lei vigente no ano anterior, alguém era indígena, porém, com a lei do ano seguinte, não o era mais. definir os vários grupos humanos que encontraram nas Américas. Essa denominação genérica – outras vão surgir posteriormente – ignorava um aspecto fundamental: a diversidade entre as centenas ou milhares de etnias existentes na América. Assim, passaram a ser colo- cados nas mesmas categorias povos tão diferentes quanto, por exemplo, os Astecas, os Maias e os Incas, com suas sociedades complexas e hierarquizadas, e os Tupinambá do Brasil, os Cheynne dos Estados Unidos, com organização social não hierarquizada. Se houve miscigenação, transformações sócio-cul- turais e ampliação do número de povos que passaram a viver nas Américas, como então definir o que é ser índio no novo contexto? Figura 1 – Foto do Cacique Raoni da tribo Kaiapó do Parque Nacional do Xingu, Mato grosso. Fonte: Agência Brasil. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:149372.jpeg> Acesso em 20.jan.2011. Figura 2 – Foto de Nelson Júnior de índios de várias tribos comemo- rando em Brasília a vitória na ação de demarcação da Terra Indígena Serra do Sol. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/cms/lista- rImagem.asp?palavraChave=%EDndios> Acesso: 20.jan.2011 EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 15UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Outra tentativa foi feita, levando em conta o nível de desenvolvimento econômico. Segundo os for- muladores desse critério, os indígenas estariam para sempre condenados a não atingirem o nível de desen- volvimento dos não índios, o que tem sido desmentido pela realidade atual. Ignoraram o estado de pobreza das populações faveladas e camponesas em áreas rurais de muitos países americanos. Estas, muitas vezes, vivem em igual condição ao das populações indígenas ou até piores, por não contarem com políticas governamentais de apoio e não possuírem terras. REgISTRE A SUA IDEIA Você pensa que esses critérios de identificação são adequados e justos? O critério que tem sido adotado desde 1949 e acolhi- do pela ONU é o da auto identificação étnica. Segundo ele, são índios todos aqueles indivíduos que, dada a sua ancestralidade e socialização, se consideram e são assim considerados pelo grupo com o qual convivem e pelos não índios. Valorizam-se, assim, os sentimentos de pertença de uma pessoa e como ela se posiciona no mundo em que vive e se reconhece que esse sentimento nada tem a ver com aspectos físicos e nem com qualquer possibilidade de serem povos sem história, isto é, sem dinâmica social. INDICAÇÃO DE LEITURA Como esse assunto é muito interessante, sugiro este texto: MESQUITA, Caroline Rosa. A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ÉTNICA E AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS. 2010. Disponível em: <http://www.webartigos.com/articles/30808/1/A-Construcao- da-Identidade-Etnica-e-as-representacoes-Sociais/pagina1. html#ixzz1EEuQy01c>. Acesso em: 17.fev.2010. CAPíTULO III: ORIgEM DAS POPULA- ÇÕES INDígENAS Até a década de 1980, a teoria vigente sobre a ori- gem dos povos indígenas afirmava que a penetração de todos eles, na América, havia ocorrido pelo estreito de Bering, durante a última glaciação, provavelmente há 12 mil anos. ?? VOCÊ SABIA? Os índios não são nativos da América. Foi preciso muita pesquisa genética, arqueológica, histórica e antropológica para se saber, com certeza, de onde eles vieram. Figura 3 – Mapa mostrando a localização do Estreito de Bering entre o Alaska e a Sibéria. Fonte: ESTRELLA, Sylvia. Como Funcionam os índios. Disponível em <http://pessoas.hsw.uol.com.br/indios.htm> Acesso em 20.jan.2011. INDICAÇÃO DE LEITURA Para entender melhor esse assunto, leia Silva, Washington Luiz Alves da. GLACIAÇÕES, 2004. Disponível em <www.geomundo. com.br/meio-ambiente-40127.htm>. Acesso em 20. jan.2011. Segundo essa ótica, o mesmo povo de origem asiática teria atravessado o referido estreito, usando como pontos de apoio as Ilhas Aleutas, adentrando no território que hoje pertence aos Estados Unidos e daí se espalhando em todas as direções, até ocupar todo o território das três Américas. Figura 4 – Mapa mostrando a localização das Ilhas Aleutas Fonte: Mare Nostrum Disponível em <http://wwwseaclopedia.blogspot.com/2010_01_01_ archive.html> Acesso em 20.jan.2011 16 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A ?? VOCÊ SABIA? Os achados arqueológicos, no Brasil, foram muito importantes para repensar a origem dos povos indígenas da América e revolucionaram os conhecimentos existentes até então. Algumas questões foram surgindo, ao longo do tempo, com a ampliação dos estudos antropológicos e arqueológicos. O primeiro aspecto a chamar a atenção era a grande diversidade física e sócio cultural entre os muitos povos aqui existentes. O tempo pensado para essa migração era muito curto para tantas diferencia- ções. Entretanto, foram os achados arqueológicos que co- locaram definitivamente em cheque a teoria da entrada única. No caso do Brasil, dois achados, ainda que haja muitos outros, têm sido destacados. O primeiro são os trabalhos da arqueóloga Niede Guidon, no sudoeste do Piauí. Figura 5 – Foto de pintura rupestre na Serra da Capivara, Piauí Fonte: Pablo de Sousa. Disponível em <http://viajeaqui.abril.com.br/ vt/materias/vt_materia_451483.shtml.> Acesso em 20.jan.2011. Após longas pesquisas e envio de material para datação nos Estados Unidos e na França, apesar da sistemática oposição das universidades americanas aos novos dados, ficou comprovada a presença humana na região entre 14 e 48 mil anos. INDICAÇÃO DE LEITURA Como este assunto é muito importante e pouco conhecido, leia o texto abaixo que terá muita informação interessante: GUIMARÃES, Henri. PARQUE NACIONAL DA SERRA DA CAPIVARA, 2008. Disponível em: <spintravel.blogtv.uol.com.br/.../parque- nacional-serra-da-capivara-piaui>. Acesso em: 24. jan. 2011 ?? VOCÊ SABIA? O fóssil mais antigo do Brasil foi encontrado em Lagoa Santa, no estado de Minas Gerais, e era de uma mulher com traços negroides. Outra descoberta que mereceser destacada é a de André Prous, na região de Lagoa Santa, em Minas Gerais, em 2001. O crânio encontrado e datado de 11 mil e quinhentos anos, apresentava peculiaridades tais que o arqueólogo o enviou para o antropólogo físico Walter Neves. Este, após vários estudos, concluiu que a mulher a quem pertencera o crânio não tinha caracte- rísticas ameríndias, mas negroides. Chamado de Luzia, esse fóssil apontou para a existência de populações não indígenas que aqui viviam simultaneamente com esses povos. Figura 6 – Foto da reconstituição da face de Luzia, fóssil encontrado em Lagoa Santa, Minas gerais. Fonte: Professor Daniel. Disponível em <http://tonahistoria.blogspot.com/2010/08/historia- do-brasil.html> Acesso em 20.jan.2011. INDICAÇÃO DE LEITURA Veja como ocorreu essa descoberta em: SOARES FILHO, Ney DNA DO HOMEM DE LAGOA SANTA JÁ FOI EXTRAÍDO DOS OSSOS in HOJE EM DIA. 2001. Disponível em: <http://www.lagoasanta. com.br/homem/index.htm>. Acesso em: 24. Jan.2010. Também em outros pontos da América, outras descobertas levavam á contestação frontal da teoria da entrada única por Bering. Os novos dados apontam para o fato de vários povos, em momentos distintos e usando rotas distintas, terem EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 17UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA adentrado na América. Aqui estabeleceram relações entre si e viveram experiências históricas particulares que resultaram nos diversos povos que habitaram e habitam o nosso continente, inclusive o Brasil. INDICAÇÃO DE LEITURA Para conhecer melhor este assunto, leia LUZIA. Em Revista VEJA, 25 de Agosto de 1999, Disponível em: <http://novosolhos.com.br/ site/arq_material/12528_13532.pdf> Acesso em: 21. jan.2011 Figura 7 – Mapa das rotas de entrada de povos na América como está estabelecido na atualidade. Fonte: Blog do Professor Daniel Disponível em <http://tonahistoria.blogspot.com/2010/08/historia- do-brasil.html> Acesso em 20.jan.2011. ?? VOCÊ SABIA? Que há poucos trabalhos arqueológicos no Brasil e que muitas informações já se perderam e outras estão por se perder? Antes de estudarmos a diversidade dos povos indí- genas, é importante considerar alguns aspectos quase nunca sinalizados nos livros didáticos. Devido à precariedade dos estudos arqueológicos, à destruição de grande quantidade de sítios, resultante da ação humana e á fragilidade de alguns equipamentos, feitos com fibras vegetais, madeiras e cerâmica, muitas informações sobre essas populações são irrecuperá- veis. Assim sendo, há que se ter muito cuidado ao usar afirmativas sobre demografia pré colonial (os cálculos são arbitrários e nada confiáveis), relações interétnicas, nome dos povos e sua localização. Só a partir do fim do século XX, houve censos demográficos no país e as informações são parcialmente aceitáveis, porque só foram contados os índios que estavam em contato com os não índios. Os que viviam nas matas não foram incluídos nos dados produzidos. ??? ??? SAIBA MAIS Os dados demográficos que se referem ao período que vai do século XVI ao XX se baseiam em cálculos feitos por não índios, que desconheciam a quase totalidade dos povos indígenas: quantos eram, que espaço ocupavam, quantos viviam em cada aldeia. Para fazer o cálculo, baseavam-se em dados aproximados das aldeias tupis do litoral, calculavam a distância entre essas aldeias, dividiam pelo tamanho do atual território nacional, para saber quantas aldeias existiriam, e multiplicavam esse número pelo dos supostos moradores das aldeias tupis. CAPíTULO IV: ENTENDENDO AS DI- VERSIDADES NO BRASIL O primeiro indicador usado pelos pesquisadores para identificar a identidade de um grupo é a língua que eles falam. Ela é um indicador confiável e inicial das características sócioculturais de um povo. Além do mais, através dos estudos de etnolinguística, é possível identificar as migrações dos falantes da língua estudada e as relações que mantiveram com outros povos. ??? ??? SAIBA MAIS Etnolinguística é o estudo comparativo das línguas indígenas. As semelhanças entre as palavras de várias línguas indicam que elas têm uma língua antiga comum. Por exemplo, as chamadas línguas latinas, como o português, o francês, o italiano e o espanhol, indicam que elas derivam do latim. Então, se identificarmos os locais onde se falam as línguas latinas, podemos estabelecer a história do contato e da expansão dos povos que falavam latim e daqueles que falam línguas latinas. 18 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A INDICAÇÃO DE LEITURA Você pode aprender mais sobre isso, lendo: Barreto, Evanice Ramos Lima ETNOLINGUÍSTICA: PRESSUPOSTOS E TAREFAS in Revista Virtual Portes, 2010, disponível em: < www.partes.com. br/cultura/etnolinguistica.asp> acesso em: 21. Jan.2011. Embora seja tradicional se afirmar que, no Brasil, só havia dois grupos falantes de línguas diferentes – os Tupi e os Tapuia -, esta não é a realidade. O grupo Tapuia, como um povo, nunca existiu. Assim eram chamados todos aqueles que não falavam tupi ou guarani. Sequer é possível saber quantos grupos não falavam o tupi, onde se localizavam e o que com eles aconteceu. ??? ??? SAIBA MAIS Tapuia era como os vários grupos falantes da língua tupi chamavam aqueles que usavam outras línguas e que, portanto, não pertenciam a seu povo e eram vistos como inimigos. A palavra pode ser traduzida como aqueles que tinham a língua travada. O que se sabe é que, ainda hoje, no Brasil e em paí- ses vizinhos, existem os seguintes troncos lingüísticos: o Tupi e o Macro Jê (ambos existentes na Bahia). Além dos troncos, há várias famílias lingüísticas: Aruaque, Arauá, Caribe, Ianomâni, Tucano, Catuquina, Pano, Txa- pacura, Nambiquara, Guaicuru, Ticuna, Canoê, Aicaná, Cuazá, Aricapu, Irantxe/Minki e Trumai. Para entender melhor essa diversidade de línguas faladas pelos nossos indígenas, leia : INDICAÇÃO DE LEITURA FUNAI. ÍNDIOS. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/indios/ conteudo.htm#LINGUAS>. Acesso em 22. jan.2011. Instituto Sócio Ambiental, TRONCOS E FAMÍLIAS. Disponível em: <http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/ troncos-e-familias> Acesso em: 21.jan.2011. Há povos que, devido ao longo tempo de contato, são falantes apenas do português. Outros, como os Fulni-ô, de Pernambuco, falam, além do português, uma língua que nenhum outro povo conhece. Provavelmente, os demais falantes devem estar extintos. Muitos são bilíngues, inclusive com o apoio do Governo brasileiro, que tem investido na formação de professores capazes de ensinar as duas línguas – a dos índios e o português – nas escolas das aldeias. Essas línguas se distribuem de forma diferenciada pelas várias regiões do país e o número de falantes varia bastante. Hoje ainda são faladas 180 línguas diferentes no país, constituindo-se num patrimônio imaterial dos mais relevantes e que deverá ser considerado como Patrimônio Imaterial da Humanidade. Figura 8 – Mapa das línguas indígenas faladas no Brasil na atuali- dade. Fonte: AMENDOLA, Marcio Disponível em <6.04-Línguas Indígenas faladas no Brasil Di- sponível em <http://contextohistorico.blog.terra.com.br/category/6- imagens-da-exclusao/604-linguas-indigenas-faladas-no-brasil/> Acesso em 21.jan.2011. A essa diversidade linguística corresponde a diver- sidade social, econômica, política, religiosa e cultural, que se acentua, na medida em que esses grupos se dispersam e passam a viver experiências particulares que alteram o seu universo cultural e social. A essa diversidade, que precede o contato com os não índios, devemos acrescentar as decorrentes des- sas novas relações e considerar o tempo da relação, seu caráter mais ou menos agressivo,as imposições, as novas experiências e, por fim, as opções feitas por cada grupo ante a situação vivenciada. Isto é, como reelaboram sua economia, organização social, cultura e seu universo de crenças. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 19UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA CAPíTULO V: O íNDIO COLONIAL CONTATOS E CONVIVÊNCIAS INTERÉTNICAS Os historiadores tradicionais apresentam sempre duas visões acerca dos primeiros contatos: ou os índios se apresentavam espontaneamente aos euro- peus, em atitude pacífica e aceitando submissamente as condições impostas pelos recém-chegados, ou agressivamente, dificultando ou impedindo a conquista e a colonização. O encantamento com a beleza e a liberdade dos índios, mas, ao mesmo tempo, estranheza, os medos e a incompreensão da hierarquia ante a presença do comandante da esquadra: esta primeira visão foi ex- pressa na carta escrita por Pero Vaz de Caminha ao Rei de Portugal, em 1500. INDICAÇÃO DE LEITURA Para você conhecer essa visão, é interessante acessar esta indicação: CARTA AO REI D. MANUEL. 2008. Disponível em: <pt.wikisource.org/.../Carta_a_El_Rei_D._Manuel_(ortografia_ atualizada)> Acesso em: 21.jan.2011. A partir daí, vários autores escreveram sobre os ín- dios do litoral brasileiro, predominantemente falantes da língua tupi e guarani. Esses autores elaboraram imagens positivas ou negativas sobre esses povos, calcadas em suas experiências e visão do mundo. Porém, as imagens negativas passaram a predominar, após o estabelecimento de conflitos entre índios e colonos em disputa por terras e em reação à escravização que lhes era imposta. Essa dualidade na forma de vê-los está expressa, com muita clareza, no Regimento do Governador Tomé de Souza, elaborado em 1548, através do qual foram definidas duas categorias de índios: os mansos, que deveriam ser livres, aldeados, protegidos e assalariados, e os bravos,que eram destinados à guerra e à escravidão. INDICAÇÃO DE LEITURA O Regimento do Governador Tomé de Souza é uma das leis mais importantes para você entender como a Coroa portuguesa pensava sua colônia americana. Veja isso neste texto: O REGIMENTO DE TOMÉ DE SOUZA. 2009. Disponível em: <www.variasvariaveis. sites.uol.com.br/tome.html>. Acesso em: 21. Jan. 2011. Os conflitos entre índios e colonos se iniciaram, quando Portugal deixou de, simplesmente, explorar as riquezas naturais e decidiu implantar a colonização, para tanto doando sesmarias, deslocando população de Portugal e incentivando o plantio de cana-de-açúcar. A nova realidade gerou insatisfações. Algumas delas decorreram da ocupação das terras indígenas para a instalação da agricultura e pecuária; outras advieram do uso do trabalho escravo, que ainda não se buscava na África, e cujas necessidades não podiam ser supri- das em Portugal. A escravização dos índios provocou profundos desarranjos no sistema econômico, social e político daquelas sociedades. INDICAÇÃO DE LEITURA Para entender melhor como a escravidão afetou a vida dos índios, acesse esta análise: BORGES, Jóina Freitas ENTRE O ESPANTO E O CONFLITO: AS REAÇÕES DOS NATIVOS À CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS À COSTA LESTE-OESTE. 2009. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/ihb/Trabalhos/ST36Joina.pdf> Acesso em: 21. Jan. 2011. Destacaremos, inicialmente, a redução do seu acesso aos alimentos, fosse por não mais disporem de tempo para caçar, pescar, coletar ou plantar, fosse pela competição na disputa pelos alimentos com os colonizadores. A redução na produção de alimentos obtidos também se refletiu nas relações interétnicas. O estabelecimento de alianças entre índios e não índios – sistema de troca pelo qual os índios ofertavam alimen- tos e trabalho em troca de produtos manufaturados e garantia de que não seriam escravizados – faliu, a partir do momento em que a produção indígena se tornava menor e mais inconstante, não mais sendo satisfatória para os europeus. A opção dos colonizadores foi, então, a de escravizar os índios, numa tentativa de regularizar o fluxo de mercadorias e trabalho. Ainda no campo econômico, outros fatores desa- gregadores foram importantes: a atribuição das tarefas agrícolas aos homens, sendo estas exercidas apenas por mulheres, assim como a substituição de uma eco- nomia calcada nos princípios da troca e da solidariedade por outra de caráter mercantilista, regida por regras de mercado que desconheciam, e voltada para o lucro. No campo religioso, cujos valores também interfe- riam na organização social, um dos grandes elementos complicadores foi a pressão exercida pelos colonos 20 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A para que os prisioneiros de guerra, destinados ao sacrifício ritual, fossem desviados e entregues como escravos para os interessados. Por ser uma sociedade hierarquizada, cujo prestígio e poder se fundamentava na captura e morte de prisioneiros, nas constantes guerras que os grupos mantinham entre si, a ruptura dessa prática não só lhes retirava as referências do ordenamento social, como também era vista como um desrespeito ao seu deus e ao cativo,que possuía direito a uma morte digna, única forma de atingir a Terra Sem Males, algo equivalente ao céu dos cristãos. INDICAÇÃO DE LEITURA Para entender melhor essa questão, aproveite esta dica de leitura: MAESTRI, MÁRIO. OS SENHORES DO LITORAL: CONQUISTA PORTUGUESA E AGONIA TUPINAMBÁ NO LITORAL BRASILEIRO (SÉCULO XVI) Porto Alegre, EDUFRS, 1994 REgISTRE A SUA IDEIA De como você vê o drama vivido por esses índios e se havia outras formas possíveis de relacionamento entre eles e os colonos. Figura 9 – Foto de gravura de jesuítas catequizando índios Fonte: Claudia *Literatura, Cultura e Artes* Disponível em claudialiteraturaculturaeartes.blogspot Acesso em 21.jan.2011. Ante essa realidade tão complexa, as respostas dadas pelos índios foram bastante diversificadas. Para fazerem suas opções, usavam o repertório dos seus conhecimentos anteriores ao contato e os adquiridos a partir das novas experiências no mundo colonial. Pode- mos elencar entre as várias formas de posicionamento adotadas a resistência, as fugas, os enfrentamentos, a construção de alianças com portugueses ou franceses e a tentativa de, através da aceitação do aldeamento compulsório, construir um espaço no mundo colonial, aprendendo a usar os espaços e instrumentos adminis- trativos que lhes eram favoráveis. Era preciso repensar, adaptar, encontrar brechas, formular estratégias de inserção e preservação, fazendo surgir uma nova so- ciedade indígena mais operante ante a nova realidade. ??? ??? SAIBA MAIS O aldeamento compulsório resultava da imposição ou da decisão dos índios de aceitarem viver em áreas restritas, administradas e localizadas pelos colonizadores, de acordo com seus interesses: garantir mão-de-obra nas proximidades de suas propriedades e defesa dessas propriedades, povoações e vilas, em caso de ataque de outros europeus ou de índios não aliados. INDICAÇÃO DE LEITURA Como essa questão é complexa, que tal aproveitar para ler essas referências: MONTEIRO, J. NEGROS DA TERRA. ÍNDIOS E BANDEIRANTES NAS ORIGENS DE SÃO PAULO. S. Paulo. Companhia das Letras, 1995; ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. METAMORFOSES INDÍGENAS: IDENTIDADE E CULTURA NAS ALDEAIS COLONIAIS DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 2003. E POMPA, Cristina. RELIGIÃO COMO TRADUÇÃO: MISSIONÁRIOS, TUPI E TAPUIA NO BRASIL COLONIAL. Bauru, SP: EDUSC/ANPOCS. 2003. Em termos de ordenamento sociopolítico, há que destacar os efeitos negativos provocados pela mudança do eixo de poder, o que acentuava a dependência e a incapacidade de uma reação de maiores proporções e mais efetivados indígenas ante as imposições que lhes eram feitas. Nesse sentido, a morte e a destituição das lideranças indígenas ou sua cooptação acentuavam- lhes o sentimento de abandono, ausência de proteção e de perspectivas ante a violência imposta. No entanto, algumas dessas sociedades encontraram formas de se ajustarem a essa nova realidade e, até mesmo, de criarem regras hereditárias de sucessão para os cargos de chefia. Criaram, à moda européia, uma casta de governantes indígenas ativa no seu diálogo, capaz de apresentar suas exigências e reivindicar seus direitos através do uso de mecanismos políticos próprios do mundo colonial. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 21UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA INDICAÇÃO DE LEITURA Conheça como os índios se tornaram hábeis negociadores, usando este texto: APOLINÁRIO, Juciene Ricarte AÇÕES POLÍTICAS MULTIFACETADAS DOS TARARIÚ NOS SERTÕES DAS CAPITANIAS NO NORTE ENTRE OS SÉCULOS XVI E XVII. 2009. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/ihb/Trabalhos/ST36Juciene.pdf> Acesso em: 21. Jan. 2011. Independentemente de as relações de poder se expressar, através de mecanismos de violência explí- cita ou da criação de alianças, suas bases estavam fincadas no projeto estatal de programar a conquista, a colonização e a integração. Ainda que forçada a um modelo estabelecido para conquistar e administrar, de acordo com seus interesses e os dos segmentos sociais tornados parceiros e executores daqueles projetos. E isso implicava a negação do direito à autonomia das populações nativas, gerando várias instâncias de an- tagonismo, oposição e resistência, o que só fortalecia a adoção de medidas e os argumentos voltados para garantir a dominação e o controle sobre os revoltosos. Logo, temos que pensar que as relações coloniais eram constantemente atualizadas, a partir das interações estabelecidas entre os dois segmentos sociais, o que atribui peculiaridades aos vários momentos e conjun- turas historicamente constituídos. INDICAÇÃO DE LEITURA Quer saber como as relações entre índios e colonos estavam em constante mudança, leia Lopes Fátima Martins, OFICIAIS DAS ORDENANÇAS DE ÍNDIOS: NOVOS INTERLOCUTORES NAS VILAS DA CAPITANIA DO RIO GRANDE. 2009. Disponível em: <http:// www.ifch.unicamp.br/ihb/Trabalhos/ST36Fatima.pdf> Acesso em 21. Jan.2011 A ESCRAVIDÃO INDígENA Desde 1548 os índios haviam sido divididos em duas grandes categorias - os aliados e os inimigos – e cada uma delas tinha tratamento diferenciado: aldeamento ou guerra justa e escravidão. Um dos mitos mais comuns na nossa história é a de que a escravidão indígena deixou de existir a partir de 1560, quando começaram a chegar os escravos de origem africana e que essa substituição deveu-se à inadequação dos índios ao trabalho e à escravidão. Na verdade, a primeira notícia de indígenas es- cravizados data de 1514, quando a Nau Bretoa levou, juntamente com toras de pau-brasil e papagaios, um lote de pessoas nativas para serem vendidas na Euro- pa. A partir de então, essa prática se tornou comum e foi regulamentada, após 1532, quando da criação das capitanias hereditárias. Constava nas diversas cartas de doação o direito de os donatários enviarem, com isenção de pagamento de impostos, até 21 índios por ano, para comercializar na Europa. Os que excedessem essa cota seriam taxados pela Coroa. Com o Regimento de 1548 foi deliberado que to- dos os grupos que se revoltassem ou dificultassem a expansão da colonização deveriam ser aprisionados e escravizados. Aqueles que optassem por conviver com os colonos e se aldear seriam entregues à adminis- tração real, à particular ou à dos missionários, como veremos a seguir. SUGESTÃO DE ATIVIDADE Analise por que a Coroa portuguesa adotou essa política e a quem interessava que ela tratasse de forma diferente os índios. Essa política era uma tentativa da Coroa portuguesa de atender a duas necessidades essenciais, para ga- rantir a colonização: garantir moradores e defensores para a colônia, com o estabelecimento de alianças com os aldeados e, simultaneamente, garantir trabalhadores aos colonos. É preciso recordar que Portugal era um país com baixa densidade demográfica; Possuía colônias na África e na Ásia, onde a presença de portugueses era fundamental para viabilizar a exploração econômica, e era preciso manter lusos na metrópole, não só para garantir o funcionamento da máquina administrativa, como também produzindo alimentos e realizando outras tarefas essenciais á metrópole e ao império português como um todo. Até 1560, foi a mão de obra indígena que tocou os campos agrícolas, os engenhos, a criação de gado, a produção de subsistência, o corte e transporte de ma- 22 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A deiras e pedras, as construções e as demais atividades econômicas na América portuguesa, além da defesa da colônia dos ataques de corsários europeus e de outros índios que não aceitavam se aldear. Naquela década, ocorreram duas grandes epide- mias - uma de varíola e outra de catapora -, as quais, segundo o padre José de Anchieta, mataram 2/3 de toda a população indígena que vivia no litoral. A razão de tantas mortes deveu-se à contaminação dos índios aldeados, porque os ameríndios não possuíam anticor- pos para doenças infecto- contagiosas e nem sabiam como se tratar. Os aldeamentos se esvaziaram devido às mortes e às fugas, colocando em colapso o sistema produtivo colonial. Para agravar a situação, foi decretada uma Bula Papal, em 1570, proibindo a escravidão indígena, o que obrigou Portugal a enrijecer as normas relativas à decretação de guerra e escravização dos nativos da América. Mais uma vez, foi a política imperial que determinou a solução: a vinda de escravos africanos. Essa forma de resolver o problema mostrava-se benéfica a vários segmentos. A Coroa, que cobrava impostos aos co- merciantes de escravos, aos financiadores estrangeiros da produção de açúcar, que passavam a oferecer mais um item a ser financiado aos senhores de engenho, aos comerciantes possuidores de frotas de transporte que podiam navegar pelo Atlântico com três pontos para abastecimento de mercadorias – Europa, África e América. E, finalmente, os senhores de engenho sentiram-se mais seguros quanto ao abastecimento de escravos, já que não havia qualquer restrição legal, religiosa e moral para o uso dos africanos. A propaganda também estimulou esse comércio: os interessados no tráfico afirmavam que os africanos já não mais morriam de doenças infecto-contagiosas, se- riam mais fortes, resistentes e acostumados ao trabalho e teriam menores chances de fugir, por desconhecerem a terra e temerem os “índios antropófagos.” REgISTRE SUA IDEIA Para que possa sistematizar melhor seu conheci- mento, registre sua ideia sobre o assunto, analisando a importância da escravidão indígena e as razões pelas quais a História afirma que ela não continuou, porque os índios não se adaptaram às novas formas de trabalho e porque eram preguiçosos. No entanto, ressalte-se que a escravidão indígena não se extinguiu no século XVI. O primeiro grande em- pecilho era o preço do escravo africano, que chegava a ser dez vezes maior do que o praticado na aquisição dos índios. O segundo resultava de os empréstimos não serem acessíveis a todos os colonos. Agriculto- res, mesmo plantando cana-de-açúcar, mas que não possuíam engenhos, os que se dedicavam à lavoura de subsistência e os demais segmentos produtivos não eram financiados pelos importadores europeus nem pelos grandes comerciantes de escravos. Para eles, o acesso possível a trabalhadores continuava a ser o escravo indígena e, por isso, continuaram a usá-lo, inclusiveos senhores de engenho, até sua proibição em 1756. Foi no espaço dos engenhos que se estabe- leceram casamentos mestiços entre índios e negros e as primeiras alianças que resultaram em quilombos partilhados pelos dois grupos escravizados. INDICAÇÃO DE LEITURA Este é um tema novo e ainda pouco conhecido, porém você pode encontrar boas observações neste texto sugerido: PERRONE- MOISÉS, Beatriz. ÍNDIOS LIVRES E ÍNDIOS ESCRAVOS: OS PRINCÍPIOS DA LEGISLAÇÃO INDIGENISTA NO PERÍODO COLONIAL. In: CUNHA, Maria Manuela C. da. (org.) História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, Fapesp/ SMC, 1992. p.115-132 e em SCHWARTZ, S. B. SEGREDOS INTERNOS: ENGENHOS E ESCRAVOS NA SOCIEDADE COLONIAL, 1550-1835. São Paulo: Companhia das Letras; CNPq, 1988. Figura 10 – Foto de gravura de índios trabalhando em fazendas Fonte: Jean Baptiste Debret Disponível em <http://mestresdahistoria.blogspot. com/2010_05_01_archive.html> Acesso em 21.jan.2011. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 23UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Outro espaço em que continuou a escravidão in- dígena de forma intensa foi a periferia econômica da colônia, particularmente nas zonas de fronteira, onde os colonos não dispunham de capital para adquirir escra- vos africanos, por ainda não terem acumulado capital suficiente para tal investimento. O aumento do valor de mercado e a ampliação da captura dos indígenas ocorreram durante a ocupação de São Paulo de Luan- da, na África, pela Companhia das Índias Ocidentais, quando houve drástica redução da vinda de escravos africanos para o Brasil. ??? ??? SAIBA MAIS Durante a invasão holandesa a Pernambuco, os membros da Companhia das Índias Ocidentais decidiram conquistar o principal porto de onde eram enviados escravos da África para o Brasil. Buscavam, assim, inviabilizar a produção açucareira em toda a América portuguesa, impedindo a compra de escravos. Por isso, os índios voltaram a ser aprisionados em larga escala e seu preço, enquanto durou a ocupação de Luanda, aumentou bastante. Porém, logo em seguida, houve outra desvalorização do escravo indígena, devido à grande quantidade de aprisionados e descidos para o Recôncavo durante as sucessivas rebeliões, entre o fim do século XVII e os meados do XVIII. Esses eventos ficaram conhecidos como Guerra dos Bárbaros e envolveram os grupos indígenas que viviam nos sertões entre a Bahia e o Ceará e entraram em conflito com os criadores de gado, como as famílias dos Ávila e Guedes de Brito. ?? VOCÊ SABIA? Que havia uma legislação especial definindo as razões pelas quais os índios podiam ser escravizados? Os índios podiam ser cativados, segundo as determinações legais que regiam a decretação da Guerra Justa e da escravização, nas seguintes situações: 1 – em casos de “ataques” dos índios, quando a vida e os bens dos colonos estariam em perigo; 2 – quando impedissem a expansão da fé cristã ; 3 – através da compra de índios aprisionados por outros e que originalmente seriam destinados ao sacrifício ritual. O que se sabe, através das cartas escritas pelos jesuítas, é que nem sempre os índios criavam situações que justificassem a decretação da guerra e a escravidão. Os colonos as criavam e, então, pediam autorização para promover o que chamavam de “resgates de prisioneiros” e guerra defensiva. Figura 11 – Foto do quadro Família guarani capturada por caçadores escravistas de índios.. Fonte: Jean Baptiste Debret Disponível em <http://liliabreu.blogspot.com/> Acesso em 21.jan.2011. ALDEAR, MISSIONAR, ADMINISTRAR E CIVILIZAR A Coroa portuguesa também organizou a vida dos chamados aliados. Para tanto, instituiu os aldeamentos, isto é, espaços administrados por lusos e destinados a adequar os índios às novas exigências da realidade colonial. Foram criados três tipos de aldeamentos quanto às formas de administração: aqueles em que atuavam os missionários, inicialmente apenas os jesuítas e depois outras ordens religiosas, os de responsabilidade dos particulares e os dirigidos por agentes administradores reais. ??? ??? SAIBA MAIS Os primeiros jesuítas chegaram à América portuguesa com Tomé de Souza, em 1549. Logo iniciaram seus trabalhos de catequização dos índios na Bahia e depois se espalharam por outras capitanias. Inicialmente faziam missões volantes, isto é, iam às aldeias dos índios para pregar. Depois do governo de Mem de Sá, foram fundados aldeamentos para que eles morassem com os indígenas e melhor pudessem fazer seu trabalho de conversão e de lhes impor novos hábitos. Cada um dos três tipos de aldeamento apresentava peculiaridades, porém havia um eixo orientador comum a todos: preparar os índios para realizarem as novas atividades produtivas; desestruturar sua organização social; deslocá-los para os pontos mais adequados aos colonos – próximos a povoações e áreas produtivas – e usá- los como trabalhadores remunerados. 24 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A Também possuíam suas próprias regras de funcionamento e objetivos. Os aldeamentos del Rei visavam fornecer trabalhadores para as obras de interesse da metrópole: abertura de caminhos, construção de fortificações, de prédios administrativos, fornecer alimentos e garantir a defesa dos interesses da Coroa em momentos de ameaça interna ou externa. A preocupação central era a de treiná-los para exercerem essas atividades, o que fizeram com bastante competência, por exemplo, na expulsão dos holandeses da cidade do Salvador, em 1625. Os particulares podiam ser formados de três maneiras: pela conquista, por descimentos ou por estarem vivendo num pedaço de terra que era dada como sesmaria a um colono que fizesse jus a essa mercê real, geralmente em virtude de ter conquistado e ocupado esse espaço. Nesse tipo de aldeamento, os índios trabalhavam nas terras dos sesmeiros, em atividades que lhes eram indicadas. Porém, sua principal função era a de defender a propriedade do seu administrador e garantir futura expansão da área ocupada, o que significava a inclusão de novas aldeias a serem administradas pelo sesmeiro. Os serviços desses índios flecheiros administrados foram essenciais para a formação das grandes propriedades do Recôncavo e dos sertões da Bahia, assim como em outros pontos da colônia. Essas tropas eram convocadas para participar de outros eventos militares a convite do governo-geral, de forma a fortalecer as tropas dos aldeamentos del Rei. ??? ??? SAIBA MAIS Descimento é o suposto ato voluntário de índios abandonarem o local de sua aldeia, de acompanharem o europeu e de instalarem um aldeamento nas terras daquele que promoveu o descimento. Figura 12 – Foto de quadro de índio flecheiro. Fonte: Jean Baptiste Debret Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0104-87752009000100005> Acesso em 24.jan.2011. ?? VOCÊ SABIA? Os maiores aldeamentos eram os administrados pelos missionários, o que desagradava os colonos, que queriam ter livre acesso à mão de obra dos indígenas. Já os administrados por missionários, além de cum- prirem as mesmas tarefas atribuídas aos ocupantes dos outros tipos de aldeamentos, apresentavam um projeto mais amplo e considerado essencial pela Coroa: formar cristãos e súditos fiéis. Os missionários que ali atuavam deveriam erradicar os “maus costumes” dos indígenas: a poligamia, a nudez, o compartilhamento das casas sem divisórias, a prática da guerra e a antropofagia ritu- al. Outro objetivo era o de transformar os aldeados em futuros pequenos produtores de subsistência capazes de garantir o abastecimento à sociedade luso-brasileira em expansão. Os missionários, para serem aceitos, inicialmente atuavam nas aldeias onde os indígenas viviamno momento do contato. Adotavam o discurso dos caraís e buscavam desacreditar esses sacerdotes indígenas e a religião dos moradores, promover casamentos e batizados e convertê-los ao cristianismo. ??? ??? SAIBA MAIS Caraís eram os sacerdotes- profetas que realizavam visitas regulares às aldeias, fazendo pregações e definindo quando seriam feitas as migrações em busca da Terra sem Males, que corresponde, aproximadamente, ao nosso conceito de paraíso celestial. Como não podiam exercer um controle mais efetivo sobre o comportamento dessas populações, passa- ram a viver nos aldeamentos e a enviar as crianças (curumins) para seus colégios, na expectativa de que viessem, no futuro, a atuar como missionários. REgISTRE SUA IDEIA A disputa de poder entre caraís e jesuítas teve grande dimensão nas relações coloniais. Avalie como o trabalho dos jesuítas desvalorizava os caraís e o que isso representou para os indígenas. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 25UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Os trabalhos dos missionários sofreram vários percalços: a dificuldade de se fazerem compreender, a resistência dos indígenas em abandonarem suas prá- ticas sociais e valores e, após as epidemias de 1560 e 1563, terem sido responsabilizados pelas mortes. Também enfrentavam os constantes questio- namentos dos colonos. Acusavam-nos de reterem grande quantidade de trabalhadores sob suas ordens trabalhando para enriquecer a Companhia de Jesus, de não pagarem impostos, além de receberem recursos da Coroa. Os conflitos se ampliaram e culminaram na expulsão dos jesuítas, na administração do Marques de Pombal, em 1756. Cabe destacar que a vivência nesses aldeamentos criou a situação da convivência entre índios de várias etnias, entre eles e europeus e negros, dando origem às bases da miscigenação e da hibridez cultural. Os aldeamentos jesuíticos eram, na verdade, grandes laboratórios sociais, voltados para a realização de dois projetos que se superpunham: o da Coroa – criar súdi- tos envolvidos com o sucesso do projeto de conquista e colonização da América portuguesa – e o da Igreja Católica – expandir sua fé pelo mundo e transformar os índios em bons súditos e cristãos. Para ambas as instituições, os índios deveriam se tornar produtores de artigos agrícolas, inseridos no mercado local e capazes de se auto sustentar e de su- prir as necessidades dos colonos, como trabalhadores dóceis e súditos fiéis ao Rei e ao Papa. INDICAÇÃO DE LEITURA O trabalho desenvolvido pelos jesuítas foi fundamental para o avanço da conquista e da colonização. Você poderá entender melhor essa importância lendo POMPA, Cristina. O LUGAR DA UTOPIA: OS JESUÍTAS E A CATEQUESE INDÍGENA In Novos Estudos, CEBRAP, N.° 64, novembro 2002, pp. 83-95, NOVEMBRO. Disponível em: <http://www.cebrap.org.br/v1/upload/biblioteca_ virtual/POMPA_O%20lugar%20da%20utopia.pdf.> Acesso em: 24. Jan.2011. SANTOS, Fabricio Lyrio. ALDEAMENTOS MISSIONÁRIOS E CATEQUESE INDÍGENA: NOVAS ABORDAGENS. 2008. Disponível em: <http://www.ppgh.ufba.br/IMG/pdf/ALDEAMENTOS_ MISSIONARIOS_E_CATEQUESE_INDIGENA_-_NOVAS_ ABORDAGENS_Fabricio_Lyrio_.pdf>. Acesso em: 24. Jan.2010. SUGESTÃO DE ATIVIDADE Pesquise se houve algum aldeamento administra- do por missionários nas proximidades de onde você mora. AS REFORMAS POMBALINAS E O PROJETO DE CI- VILIZAÇÃO O século XVIII, em Portugal, foi de grandes mudan- ças e conflitos. As ideias iluministas começaram a circular, as crises econômicas aconteceram, particu- larmente no que se referia á balança comercial com a Inglaterra. Também era tempo de modernizar a estrutura administrativa do Império, separar a Igreja e o Estado e definir as fronteiras americanas com a Espanha. Este conjunto de questões marcou o reinado de D. José I e foi o grande palco de atuação do seu Ministro, o Marquês de Pombal. ??? ??? SAIBA MAIS Devido ao desconhecimento das terras que estavam no interior das possessões espanhola e portuguesa na América, os limites entre os domínios dos dois países não eram claros. Essa situação terminava por criar conflito entre colonos e entre apresadores de escravos indígenas, colonos portugueses e missionários espanhóis. Além disso, dificultava a formulação de políticas de expansão econômica das duas Coroas. O Marquês via a questão indígena interagindo com três problemas que precisavam ser solucionados: o excesso de poder da Igreja, a necessidade de incorporar novos súditos produtivos e que pagassem impostos, e como definir, de forma favorável a Portugal, os limites de sua colônia na América. Para atender a todos esses aspectos e seguindo a sugestão de seu irmão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, governador do Estado do Grão Pará, em 1751, promulgou, entre 1755 e 1758, um conjunto de leis que alteraram de forma radical a forma de os índios serem administrados e seus destinos. As cartas de Mendonça Furtado atacavam violenta- mente os jesuítas, acusando-os de tirania no trato com os índios, de exercerem monopólio no comércio das especiarias, de possuírem imensas riquezas, de não 26 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A terem transformado os índios em súditos fiéis da Coroa e de, por ser a Ordem de origem espanhola, beneficiar os interesses daquele país. Essas e outras denúncias fizeram com que o ministro passasse a considerar os inacianos como os grandes responsáveis pelos proble- mas e dificuldades vividos por Portugal. INDICAÇÃO DE LEITURA Que tal aprofundar um pouco mais essa questão, lendo : PIRES, Maria Idalina, RESISTÊNCIA INDÍGENA NOS SERTÕES NORDESTINOS NO PÓS-CONQUISTA TERRITORIAL, 2009. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/ihb/Textos/MICPires. pdf> Acesso em: 24. Jan.2011. Figura 13 – Foto do quadro Negociantes contando índios. Fonte: SPIX, J. B. von, MARTIUS, C. F. P. Disponível em <http://aescravidaonobrasil.blogspot.com/2010/04/ colonizacao-portuguesa-e-acassada.html> Acesso em 24.jan.2011. A primeira medida adotada foi a de, através do Alvará de 07/06/1755, proibir a escravidão indígena no Grão Pará e de abolir o poder temporal dos religiosos nos aldeamentos, por considerar que sua forma de admi- nistrar era contrária à boa ordem e à administração da justiça. A administração temporal passava a ser de responsabilidade dos Juízes Ordinários, Vereadores, Oficiais de Justiça e índios naturais das aldeias e seus distritos. As aldeias independentes das vilas seriam administradas pelos Principais e seus subalternos. A Lei de 06/06/1755 estendia as decisões às demais Capitanias. INDICAÇÃO DE LEITURA Para saber como era difícil para os índios ocuparem os cargos de vereadores em seus antigos aldeamentos, leia o seguinte texto: ROCHA Rafael Ale, OS ÍNDIOS NAS CÂMARAS DAS VILAS DO ESTADO DO GRÃO PARÁ E MARANHÃO: UMA POLÍTICA DO ESTADO PORTUGUÊS. 2009. Disponível em: <http://www.ifch. unicamp.br/ihb/Trabalhos/ST36Rafael.pdf>. Acesso em: 24.jan. 2011. Ante a reação negativa dos jesuítas a essas deci- sões, outras acusações lhes foram imputadas, o que culminou na decisão de expulsá-los, não só dos alde- amentos indígenas, mas de todo o Império luso, e de confiscar seus bens em 1759. As medidas também atin- giram outras ordens que missionavam entre os índios, embora seu afastamento tenha sido feito lentamente, ante a dificuldade de encontrar substitutos, párocos, para atuarem junto a essas populações. Para finalizar as medidas administrativas relativas aos índios, em 1757 foi promulgado o Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará e do Maranhão, cuja matriz de pensamento era a de promo- ver a integração dos índios à comunidade lusitana como súditos. Suas bases eram a de promovera civilização desses povos e de romper o isolamento em que viviam nos aldeamentos jesuíticos. Essa decisão, dentre outras razões, vinculava-se à questão da definição das fronteiras com a Espanha. O critério para defini-las foi o da efetiva ocupação, o que seria identificado a partir dos pontos limítrofes ocupa- dos por falantes do espanhol e do português. ?? VOCÊ SABIA? Em nome do progresso, da liberdade, da razão e da civilização, a organização social, política e cultural dos povos indígenas foi totalmente desrespeitada. O que se constatou foi que os índios aldeados não falavam o português, mas suas línguas nativas ou a chamada “língua geral”, que era uma língua criada pe- los jesuítas através da latinização do tupi. Era preciso impor-lhes a língua portuguesa e torná-los súditos defensores da Coroa lusitana e, para isso, era essencial ensinar-lhes hábitos “civilizados”. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 27UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA INDICAÇÃO DE LEITURA Esse projeto de transformação dos índios poderá ser melhor compreendido se você ler: GARCIA, Elisa Fruhauf. A “CONQUISTA” DOS SETE POVOS DAS MISSÕES: DE “ATO HERÓICO” DOS LUSO- BRASILEIROS A CAMPANHA NEGOCIADA COM OS ÍNDIOS. 2005. Disponível em: < http://www.ifch.unicamp.br/ihb/Textos/EFGarcia. pdf> Acesso em: 24. Jan.2011. SUGESTÃO DE ATIVIDADE Assista ao filme A Missão, filme inglês de 1986, que mostra os efeitos dos acordos estabelecidos entre Portugal e Espanha sobre os índios que viviam na área denominada Sete Missões Guarani, na área conhecida como São Pedro e que hoje integra o território do Rio Grande do Sul. Acesse: <www.blogbrasil.com.br/filme-a- missao-assista-agora-mesmo/- Acesso em 08/05/2011. REgISTRE SUA IDEIA Considerando-se a violência sofrida pelos índios, quando passaram a ser administrados pelos portu- gueses, sob o impacto das mudanças impostas pelo Diretório Pombalino aos povos daquela região, você considera que foram necessárias ou havia outras so- luções que poderiam ser adotadas? Para atrair os indígenas à esfera da influência por- tuguesa, os administradores metropolitanos conside- ravam essencial eliminar todas as diferenças, inclusive legais, entre os vários segmentos que compunham a população colonial. Para atingir essa meta, além das medidas acima referidas, o conjunto de leis deter- minava ainda que fossem garantidos aos índios a plena liberdade de comércio e uso dos bens indígenas pelos verdadeiros donos; elevação dos aldeamentos a vilas, estímulo aos casamentos interétnicos como forma de acelerar a integração e de aumentar as áreas cultivadas, o que também se refletiria no aumento do recolhimento dos impostos pelo governo. No mesmo sentido, foi determinada a extinção da propriedade coletiva da terra, substituindo-a pelo lotea- mento particular e a entrega da administração temporal a diretores que só seriam remunerados com o trabalho indígena e a cobrança de uma taxa sobre o salário que recebessem dos colonos e sobre o que comerciali- zassem. A presença desse administrador não índio era explicada pelo argumento de que este não estava capacitado a administrar seus bens e as vilas. INDICAÇÃO DE LEITURA A lei que garantia aos índios o direito de se autogovernarem não foi cumprida devido à visão negativa dos brancos sobre os índios. Veja por que razão, no texto : Teresinha Marcis, O EXERCÍCIO DO PODER EM UMA VILA INDÍGENA: OLIVENÇA-BA, 1824-1889. 2005. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/ihb/Textos/ TMarcis.pdf>. Acesso em: 24. jan.2011. Figura 14 – Foto do quadro do Marquês de Pombal. Fonte: TAVARES. Ruy Pombal e a Censura Iluminada. Disponível em <http://oeiras-a-ler.blogspot.com/2009/11/pombal-e- censura-iluminista-com-rui.html> Acesso em 24.jan.2011. Os diretores deveriam também educar e civilizar os aldeados e lhes impor a língua e os costumes por- tugueses. Para tanto, era considerado fundamental o incremento do número de moradores nas aldeias de índios forros, moradores que poderiam arrendar as terras dos indígenas. 28 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A ??? ??? SAIBA MAIS Índios forros eram os índios não escravos, isto é, aqueles que não eram escravos e viviam aldeados sob a administração de missionários. Após o Diretório Pombalino, todos os índios se tornaram livres, o que não significou que aqueles que viviam sob a administração de particulares tenham sido libertados de fato. Dessa forma, o Diretório, em nome da necessidade de promover a civilização e de tornar os indígenas rapi- damente produtores de culturas diversificadas, inseri- dos nas redes de comércio interno e externo, pagadores de impostos e vassalos confiáveis, garantiu não só o livre acesso dos colonos à força de trabalho indígena, como também a suas terras. Portanto, o projeto de civilização vinculava-se diretamente à habilitação do trabalhador indígena, concebido a partir do modo de produção dominante da sociedade colonial. Os poderes atribuídos a um diretor, que não era re- munerado, geraram problemas sérios para os indígenas. Por terem o direito de acertar os contratos de trabalho e reter 2/3 dos salários, tornaram-se administradores vo- razes reduzindo o tempo que os índios podiam dedicar as suas roças. Como podiam retirar as terras daqueles que não cumpriam as metas de produção, terminavam por ampliar as áreas arrendadas aos colonos, diminuin- do cada vez as possibilidades de os índios produzirem e obterem sua autonomia, como previra a lei. Além do mais, os contratos de trabalho permitiam ao diretor reforçar sua rede de alianças locais, ao privilegiar seus aliados nos contratos de trabalho, em detrimento dos interesses dos aldeados. Da mesma forma, era proibido aos índios se ausen- tarem do aldeamento, pois isto implicaria em prejuízos. Argumentando que uma das formas de mantê-los satis- feitos era fazer com que eles vivessem em povoações e vilas e povoados iguais aos dos demais súditos, os administradores descaracterizaram os aldeamentos com construção de prédios públicos - câmara e cadeia -, o que, aos poucos, desfez os laços de pertença a um espaço indígena e atraiu colonos para as novas vilas criadas a partir dos aldeamentos indígenas. ??? ??? SAIBA MAIS Foram elevadas a vilas as seguintes aldeias, hoje no estado da Bahia: Natuba (hoje Nova Soure); Nossa Senhora da Escada de Olivença (hoje Olivença); Maraú (que recebeu o nome de Barcelos e hoje voltou a se chamar Maraú); Serinhaém (que passou a se chamar Santarém e hoje, Ituberá); São João dos Tapes (hoje Trancoso); Patatiba (hoje Vila Verde); Cana Brava (denominada de Ribeira do Pombal e hoje Banzaê); Espírito Santo de Abrantes (Abrantes, distrito do município de Camaçari); Viçosa (hoje Nova Viçosa); Aldeia das Lages (Prado); Belmonte (Belmonte); Nossa Senhora de Nazaré de Pedra Branca (Pedra Branca, distrito de Santa Terezinha); São Bernardo de Alcobaça (Alcobaça); São José de Porto Alegre (Mucuri); Nossa Senhora da Conceição dos Índios Gren (Almada); Saco dos Morcegos (Mirandela/ Banzaê). Insatisfeitos e empobrecidos ante a impossibilidade de produzirem o necessário para manter suas famí- lias, muitos índios optaram pela fuga e deserção, o que era encarado como uma ameaça aos projetos de incremento demográfico, econômico e militar, além de contrariar o maior interesse dos diretores e moradores: o de disporem de um celeiro de mão-de-obra ao qual tinham fácil acesso. Razão pela qual eram severamente punidos, quando recapturados. Os conflitos com os colonos pelo não cumprimento dos termos de contratos de trabalho e arrendamento/ invasão dos territórios indígenas agravaram as relações interétnicas, o que culminou na emissão de uma Carta Régia, em 1798, pela RainhaD. Maria I, que voltou a permitir que particulares realizassem descimentos e criassem aldeamentos particulares, satisfazendo os interesses dos colonos e abrindo novas frentes de conflito que serão melhor compreendidas no próximo capítulo, quando tratarmos do século XIX. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 29UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Figura 15 – Foto de quadro de D. Maria I – Rainha de Portugal Fonte: Agência Brasil. Disponível em <http://topazio1950.blogs.sapo.pt/238893.html> Acesso em 24.jan.2011. CAPíTULO VI: O SÉCULO XIX E AS PO- LíTICAS INDIgENISTAS O início do século XIX não apresentou grandes transformações na administração dos índios, o que não significa que as vidas desses atores sociais ficaram es- tagnadas. Os que continuaram sob a administração dos diretores de aldeamentos, segundo as normas definidas pelo Diretório dos Índios promulgado no reinado de D. José I, viviam as agruras da exploração excessiva de seu trabalho. Sua reação a essa situação variava entre a fuga para o mato, a busca de contratos de trabalho sem a intermediação do diretor ou, quando contratados através daquelas autoridades, atuarem de forma que não fossem valorizados pelos contratantes. O resultado era o crescente esvaziamento dos aldeamentos e o arrendamento das terras a particulares. Os dirigidos pelas determinações da Carta Régia de 1798 sofriam, igualmente, com a ação descuidada dos seus administradores, que os tratavam como se escravos fossem, sem lhes garantir os direitos legal- mente determinados. Sua insatisfação se expressava em revoltas e fugas, gerando prejuízos àqueles que os aldearam. As regiões de fronteira interna - particularmente no Oeste, na região de São Paulo e Paraná, na Amazônia e nas áreas de Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo -, que, até então, haviam-se constituído em refúgio de grupos indígenas, após o decréscimo da produção de ouro e diamantes em Minas Gerais, tornavam-se áreas cobiçadas e vistas como solução para a crise econômica que afligia o Império português. Apesar das muitas correspondências enviadas ao Príncipe Regente D. João, este não tomou qualquer decisão sobre o assunto até 1808, quando aportou no Rio de Janeiro, já então capital da colônia. A presença da corte exigiu que fossem adotadas várias medidas, buscando garantir o abastecimento dos súditos ali ins- talados. O aumento da população da cidade e os novos hábitos de consumo dos portugueses recém- chegados exigiam medidas urgentes. Era preciso interiorizar a conquista e a exploração de novas terras e abrir caminhos que permitissem o escoamento dos produtos locais para a capital. Um dos obstáculos a serem superados era a dominação dos ín- dios que viviam nas áreas a serem tomadas. Assim, nos anos de 1808 e 1811, foram decretadas guerras justas aos índios que ali viviam e que receberam denomina- ções genéricas: Botocudos, na Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e em São Paulo e Paraná; Canoeiros, em Goiás e Mato Grosso e Muras, na Amazônia. Figura 16 – Foto de quadro Rua Direita. Rio de Janeiro século XIX. Fonte: MEDDI, Jjeocazeocaz lee Disponível em <http://virtualiaomanifesto.blogspot.com/2010/02/ rio-de-janeiro-do-seculo-xix.htmlin websarti.blogspot.com > Acesso em 25.jan.2011. 30 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A Figura 17 – Foto de pintura de índios Botocudos Fonte: WIED. NEUWIED, M. Viagem ao Brasil. São Paulo: Edusp; Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1989. Disponível em <http://www.iande.art.br/boletim014.htm> Acesso em 25.jan.2011. Figura 18 – Foto d e gravura de índio Mura da Amazônia. Fonte: RODRIgUES,Vanessa Disponível em <http://sinaisdagente.com/blog/?tag=povos-indige- nas>. Acesso em 25.jan.2011. Figura 19 – Foto de gravura índio Mura inalando o paricá. Fonte: POZELLA, Eduardo Disponível em <http://planetasustentavel.abril.com.br/album/ invencao-brasil-232858.shtml.> Acesso em 25.jan.2011. INDICAÇÃO DE LEITURA Veja como a volta da política de combate aos índios, no Século XIX, era considerada essencial para a conquista das fronteiras de ocupação, lendo: LOPES, Marta Maria. OS GRUPOS INDÍGENAS NA FRONTEIRA OESTE DE MATO GROSSO E SUAS RELAÇÕES COM OS MILITARES NO SÉCULO XIX, 2005. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp. br/ihb/Textos/MMLopes.pdf> Acesso em: 25. Jan.2011. Os moradores que se dispusessem a participar da guerra recebiam inúmeras vantagens econômi- cas: sesmarias nas terras conquistadas, o direito de escravizar os índios por 10 ou 20 anos, perdão de dívidas fiscais e até de crimes que por ventura, tivessem cometido. Para viabilizar essa empreitada e apoiar a ação dos colonos, foram criados quartéis e destacamentos militares e colônias de degredados, todos localizados em pontos estratégicos: ao longo de rios que poderiam vir a ser usados como vias de comunicação, em áreas de terras sabidamente férteis e ricas em madeiras e onde houvesse grande concen- tração de indígenas. EAD L IC EN CI AT UR A EM H IS TÓ RI A 31UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Essa política administrativa de cunho militar provo- cou graves desarranjos na vida dos povos nativos que viviam nessas áreas. Caçados, uns buscaram se inte- riorizar nas matas, na tentativa de se proteger. Alguns outros grupos optaram por aceitar os aldeamentos impostos e por se aliarem aos colonos na guerra contra os demais, na tentativa de evitar que fossem também escravizados. ?? VOCÊ SABIA? Boa parte das tropas de combate aos chamados índios inimigos era formada por indígenas aldeados, que eram obrigados a participar da guerra. Dos grupos que se recusavam a aldear-se e compor as tropas, alguns decidiram pelo enfrentamento, consi- derando que a vida como trabalhadores nas fazendas ou nos quartéis e destacamentos não era atrativa devido aos maus tratos e ao excesso de trabalho. Outra tática era a da fuga dos aldeamentos após três anos, período em que se extinguiam as benesses – terem roças plan- tadas por terceiros, receberem brindes e atendimento e não serem usados como trabalhadores -, e circularem pelas áreas onde havia colonos recém instalados, apresentando-se como índios saídos das matas, pas- sando a usufruir mais três anos de benefícios. Figura 20 – Foto de índio Avá Canoeiro do Centro-Oeste. Fonte: TORAL, André Disponível em <http://pib.socioambiental.org/pt/povo/ava- canoeiro/195> Acesso em 25.jan.2011. ?? VOCÊ SABIA? Os combates nas guerras aos índios eram extremamente violentos. As aldeias eram cercadas durante a noite e as casas eram queimadas perto do amanhecer. Nesse meio tempo, os atacantes cortavam as cordas dos arcos e quebravam as flechas. Quando os moradores fugiam das chamas, eram presos ou mortos a tiros. Muitas vezes só aprisionavam crianças e mulheres, sendo os demais mortos. Os prisioneiros eram tratados de forma diferenciada. Os homens sobreviventes eram vendidos ou entregues aos interessados em trabalhadores, pois essas eram re- giões que, por estarem em fase inicial de desbravamen- to, seus conquistadores não dispunham de capital para adquirir escravos de origem africana. Posteriormente, a prática, ante as atitudes de rebeldia dos homens aprisionados ainda crianças, a ordem era de matá-los no momento de combate. Apenas eram aprisionadas as mulheres que, além de serem trabalhadoras, também se tornavam amasias dos militares e dos colonos, queixa constante dos índios, mesmo daqueles que viviam aldeados e sob a suposta proteção da lei. Também as crianças eram aprisionadas, doadas e vendidas. O comércio de crianças indígenas foi