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10/11/2016 Demências ­ Versão para Impressão
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Demências
Versão original publicada na obra Fochesaĥo Filho L, Barros E. Medicina Interna na Práĕca Clínica. Porto Alegre: Artmed; 2013.
Caso Clínico
Um paciente do sexo masculino, 67 anos, branco, brasileiro, é funcionário aposentado de uma fábrica de solventes químicos. Ele é hipertenso,
diabéĕco e ex‐fumante (consumia 40 maços/ano) e uĕliza enalapril e meĔormina, apresentando adesão adequada aos medicamentos. Não há
história familiar significaĕvo.
O  paciente  procura  auxílio  médico  acompanhado  de  sua  esposa,  que  relata  estar  preocupada,  pois  afirma  que  seu  marido  "está  muito
esquecido”.  Ele  já perdeu as  chaves de  casa várias  vezes e  recentemente esqueceu uma panela no  fogão, quase  causando um  incêndio na
cozinha.  O  próprio  paciente  relata  que  está  “mais  devagar”  e  que  tem  demorado muito  tempo  para  fazer  palavras  cruzadas.  Afirma  não
apresentar alterações no sono e diz que não se sente  triste. Ele brigou vigorosamente com sua esposa quando ela  falou sobre a panela no
fogão. Ele auxilia sua esposa, que é cozinheira, para complementar a renda domésĕca. Ambos frequentam a igreja regularmente, tendo uma
boa rede social.
 
Definição
O termo “demência” agrupa um conjunto de doenças que afetam a cognição* e causam perda gradual e progressiva na capacidade funcional
das aĕvidades de vida diária (AVDs)**. O resultado final é frequentemente a perda da independência do indivíduo (Quadro 91.1).
As  doenças  que  causam  demência  podem  ser  classificadas  em  neurodegeneraĕvas  (Alzheimer,  corpúsculos  de  Lewy  e  frontotemporal),
cerebrovasculares (demência vascular) e secundárias (hidrocefalia com pressão normal, infecções, drogas psicoaĕvas, neoplasias, hematoma
subdural, doenças endócrinas e metabólicas).
 
*Cognição:  Processo  de  obter,  organizar  e  uĕlizar  o  conhecimento  intelectual.  Implica  o  entendimento  entre  causa  e  efeito;  entre  ação  e
consequência de qualquer ato.
 
**  AVDs:  Compreendem  tarefas  instrumentais  (limpar  a  casa,  a  roupa,  cuidar  da  comida,  fazer  compras,  uĕlizar  transporte,  controlar
medicações, finanças) e de autocuidado (vesĕr‐se, fazer higiene, alimentar‐se).
 
 
Epidemiologia
A prevalência e a incidência de demência aumentam com a idade, sendo incomum a ocorrência da doença em indivíduos com menos de 50
anos. Estudos esĕmam que 7% da população com mais de 65 anos apresenta algum ĕpo de demência, aĕngindo uma taxa de 20 a 25% dos
idosos entre 85 e 89 anos.
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Patogênese
Os  transtornos  cogniĕvos  que  geram demência  apresentam  representações  topográficas  cerebrais  variadas  de  acordo  com a  eĕologia  e  as
manifestações clínicas. De uma maneira geral, a demência provém de uma disfunção nos hemisférios cerebrais, especialmente dos córtex de
associação, das formações hipocampais e dos núcleos subcorĕcais de suporte, como o caudado e o tálamo. Pode também ser classificada em
corĕcal,  em  que  funções  superiores,  notadamente  linguagem,  estão  envolvidas,  e  subcorĕcal,  em  que  há  predomínio  de  manifestações
motoras (Tab. 91.1).
 
Fonte: Adaptada de Kaplan e Sadock.1
 
Quadro Clínico
Por  tratar‐se  de  um grupo de  doenças  com acomeĕmento  topograficamente  disĕnto  do  cérebro,  de  forma potencial  qualquer  domínio  da
cognição pode estar afetado. No entanto, a amnésia anterógrada*** é o sintoma mais comum, por ser esse sintoma ėpico da demência mais
frequente, a doença de Alzheimer (DA).
Inicialmente,  o  compromeĕmento  cogniĕvo  é  observado  em  AVDs  instrumentais,  progredindo  com  o  tempo  para  o  autocuidado.
Frequentemente, quem relata os sintomas são os cuidadores, por ser uma caracterísĕca quase invariável a ausência de percepção do déficit
por parte dos pacientes (anosognosia).
Pode haver também sintomas neuropsiquiátricos, principalmente apaĕa e perda de iniciaĕva (síndrome apato‐abúlica). Além disso, coexistem
depressão, ansiedade, irritabilidade, delírios paranoides e alucinações. Em função desses sintomas, a diferenciação entre demência e delirium
nem sempre é fácil. O dado mais consistente que sugere o diagnósĕco de demência é a instalação gradual e progressiva. Em contraposição, o
delirium caracteriza‐se por flutuações no nível de consciência, alternando períodos de alerta com períodos de atenção irregular (Tab. 91.2).
*** Amnésia anterógrada: Perda da capacidade de formar novas memórias a parĕr de determinado ponto no tempo, considerada disfunção da
memória declaraĕva episódica.
 
Diagnóstico
O diagnósĕco de demência é eminentemente clínico, realizado por meio de dados obĕdos na história clínica e achados do exame do estado
mental. O principal  elemento provém da definição de demência: quais  são os dados que atestam compromeĕmento  cogniĕvo e quais  as
evidências de interferência na execução das tarefas diárias.
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Dos procedimentos disponíveis para o exame à beira do  leito, o miniexame do estado mental  (MMSE) é um dos mais uĕlizados e pode ser
realizado  em  cerca  de  10 minutos.  Ele  consiste  em  uma  série  de  perguntas  com  pontuação máxima  de  30,  com  o  limiar  para  demência
internacionalmente  variando  entre  23  e  24  (Quadro  91.2).  Esse  teste  foi  validado no Brasil,  onde  devido  à  diversidade  da  escolaridade  da
população, alguns autores propõem que o corte seja reduzido para 18/19, para indivíduos analfabetos.
 
 
 
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Embora  seja  úĕl  para  o  rastreamento  clínico,  o  MMSE  não  apresenta  sensibilidade  para  acompanhar  a  progressão  clínica  dos  doentes  e
tampouco para compromeĕmentos mais suĕs. Nesses casos, a realização de testes neuropsicológicos são de grande valia.
Por fim, os exames neurológico e de neuroimagem podem sugerir eĕologias específicas. Por exemplo, sinais de piramidalismo indicam doença
cerebrovascular, e alterações motoras extrapiramidais são um indício de demência por corpúsculos de Lewy. No fluxograma da Figura 91.1, há
uma sistemaĕzação da abordagem diagnósĕca de pacientes com demência, integrando todos esses dados.
 
Déficit Cognitivo Leve
O déficit cogniĕvo leve (DCG) define‐se como uma redução na função cogniĕva maior do que o esperado para a idade de um indivíduo; sem
que haja interferência significaĕva nas aĕvidades de vida diária. Didaĕcamente, pode ser considerado como um estado de transição, e, com
frequência, até 80% dos pacientes podem desenvolver DA em seis anos.
Qualquer domínio da cognição pode estar afetado, no entanto o subĕpo amnésico parece ser o mais comum e o que apresenta maior risco de
desenvolvimento de DA. Frequentemente, esses pacientes queixam‐se de dificuldades nas tarefas do dia a dia, como esquecer compromissos,
lidar com finanças ou lembrar‐se de fatos ou conversas. Caracterisĕcamente, os pacientes apresentam a níĕda percepção do declínio.
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Como se trata de um quadro clínico suĕl, o diagnósĕco é impreciso e a prevalência varia de 3 a 19% em diferentes estudos populacionais. O
DCG vem sendo cada vez mais reconhecido e possivelmente agrupa estados fisiopatológicos  iniciais de eĕologias disĕntas, como Alzheimer,
doença cerebrovascular ou demência por corpúsculos de Lewy.
Há alguma evidência de que o treinamento cogniĕvo possa auxiliaresses pacientes, assim como o uso de anĕ‐colinesterásicos parece retardar
a progressão no primeiro ano de doença. O manejo mais importante para esses pacientes é controlar os fatores de risco (p. ex., hipertensão e
diabetes nos pacientes com doença cerebrovascular) e suspender medicações que possam interferir na cognição (p. ex., anĕcolinérgicos).
 
Doença de Alzheimer
Definição
A doença de Alzheimer (DA) é um transtorno em que a demência está associada à amnésia anterógrada como sintoma predominante. A DA
divide‐se em dois subĕpos, uma forma familiar e outra esporádica (Tab. 91.3).
 
 
Figura 91.1
Fluxograma para abordagem diagnósĕca de pacientes com demência.
Fonte: Adaptada de Neef e Walling.3
 
Epidemiologia
A DA é inquesĕonavelmente a causa mais comum de todas as demências, correspondendo a 50 a 80% dos casos, na grande maioria por forma
esporádica.  Entre  os  indivíduos  com mais  de  65  anos,  até  5%  da  população  pode  estar  afetada,  e  a  prevalência  dobra  a  cada  cinco  anos.
Homens e mulheres são igualmente susceėveis.
Fatores de risco
Os fatores de risco mais consistentes para essa doença são o envelhecimento e a história familiar posiĕva, mesmo na forma esporádica. Outro
fator  adicional  parece  ser  a  baixa  reserva  funcional  cerebral  (baixo  nível  educacional/  intelectual  prévio,  trauma  craniano,  doença
cerebrovascular  prévia,  tamanho  cerebral  reduzido).  Alguns  fatores  protetores  foram  propostos,  como  uso  de  anĕoxidantes,  consumo
moderado de álcool e óleo de peixe (por conter DHA, um ácidos graxo do ĕpo ômega 3).
 
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Patogênese
Embora o modelo fisiopatológico da DA ainda esteja em estudo, a deposição de produtos de degeneração celular anômala, como as placas
senis e os novelos fibrilares, apresentam papel central na morte neuronal e no desenvolvimento da doença.
As placas senis são formadas pelo acúmulo extracelular de uma proteína denominada beta‐amiloide, derivada do metabolismo da membrana
de células cerebrais, especificamente da proteína transmembrana APP. A beta‐amiloide, em condições normais, é depurada do SNC, porém,
quando existente em grandes quanĕdades, torna‐se insolúvel, neurotóxica e gera reação inflamatória local. A plasĕcidade sinápĕca é afetada
em  áreas  responsáveis  pela  memória  (p.  ex.,  hipocampo),  e  a  transmissão  nervosa  é  prejudicada,  sobretudo  na  sinapse,  em  que  o
neurotransmissor principal é a aceĕlcolina (ACh) (Quadro 91.3).
As placas senis são encontradas sobretudo na porção medial do  lobo temporal e em outras áreas corĕcais. Desequilíbrios entre a produção
(forma familiar) e a depuração  (forma esporádica) de amiloide A podem explicar o seu acúmulo, culminando em disfunção neuronal, como
exemplificado na Figura 91.2.
Os  novelos  fibrilares  são  formados  por  acúmulos  intracelulares  de  uma  proteína  denominada  Tau,  que  está  associada  à  função  dos
microtúbulos (Quadro 91.4).
Nos pacientes com DA, a proteína Tau torna‐se hiper‐fosforilada e disfuncional, gerando um agregado insolúvel. Não se sabe com certeza se
sua  formação  é  um dos  eventos  finais  da  cascata  amiloide  –  como  representado na  Figura  91.3  –, mas  é  estabelecido que  sua  localização
cerebral correlaciona‐se fortemente com a evolução clínica dos pacientes, sobretudo no córtex entorrinal e no hipocampo. A existência de Tau
não  é  exclusiva  de  pacientes  com  DA,  sendo  também  observada  em  indivíduos  com  outras  doenças  degeneraĕvas,  como  as  demências
frontotemporais.
 
Manifestações clínicas
O sintoma mais precoce apresentado por pacientes com DA é a amnésia anterógrada. No início do quadro clínico, o déficit de memória pode
ser  suĕl e unicamente  idenĕficado por  testagem neuropsicológica. Os  sintomas  incluem esquecimento de  tomar medicações, de  conversas
recentes, dificuldades com as finanças, perda de objetos ou de noções geográficas. À medida que a doença progride, esses episódios passam a
ser mais  frequentes e  começam a  surgir  dificuldades no autocuidado.  Embora progressiva,  a  rapidez  com que ocorre o declínio  é  variável,
podendo durar de dois anos até uma década com a manifestação de sintomas até a perda total de independência do indivíduo. A progressão
está correlacionada ao grau de atrofia cerebral e representada graficamente na Figura 91.3.
 
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Diagnóstico
Deve‐se considerar o diagnósĕco de DA sempre que dados clínicos e da história forem compaėveis, já que há certeza atualmente apenas com
estudo anatomopatológico. A realização de neuroimagem está  indicada para avaliação estrutural do SNC, com o  intuito de descartar outras
causas  de  demência,  principalmente  doença  cerebrovascular  e  lesões  com efeito  de massa.  Embora  inespecíficas,  alterações ėpicas  de DA
incluem diminuição no volume hipocampal e da espessura do córtex entorrinal,  com atrofia corĕcal em casos avançados. A  tomografia por
emissão de pósitrons pode evidenciar hipometabolismo nas áreas temporoparietal e córtex cingular posterior.
Deve‐se  ressaltar  que,  para  um  paciente  com  suspeita  de  demência,  a  abordagem  deve  descartar  causas  potencialmente  tratáveis,  como
deficiência de vitamina B12 e hormônios ĕreoidianos, e avaliar de forma individual a necessidade de sorologia para sífilis, Aids e dosagem de
metais pesados.
Os critérios clínicos para diagnósĕco de PA estão listados no Quadro 91.5.
 
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Figura 91.2
Cascata amiloide.
Fonte: Adaptada de Blennow e colaboradores.4
 
Tratamento
Duas classes de drogas são aprovadas para o tratamento de Alzheimer: os inibidores de colinesterase (donepezila, rivasĕgmina, galantamina)
e um antagonista do receptor de glutamato (memanĕna). A prinicipal ação dos três agentes parece ser retardar a progressão dos sintomas no
início do tratamento.
Os tratamentos não farmacológicos são de fundamental importância e incluem apoio e educação para os cuidadores. Grupos de apoio, como a
Associação  Brasileira  de  Alzheimer,****  podem  auxiliar  as  famílias.  Supervisionar  os  pacientes  também  é  importante  a  fim  de  controlar
medicações, finanças e aĕvidades potencialmente perigosas (p. ex., dirigir). Por fim, algumas medidas podem ter impacto benéfico, como dieta
adequada, uso de ácido graxo ômega 3 (DHA), aĕvidade εsica e exercícios cogniĕvos.
****Disponível em: www.abraz.com.br.
 
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Figura 91.3
Alterações anatômicas no cérebro de pacientes com Doença de Alzheimer. Em A, um cérebro normal; em B, já se observa diminuição da área
medial  temporal  (córtex  entorrinal  e  hipocampo),  atrofia  corĕcal  leve  e  aumento  compensatório  dos  ventrículos.  Em C,  paciente  com DA
avançada – a atro? a é intensa nas áreas descritas e os ventrículos aumentam compensatoriamente (hidrocefalia ex‐vacuum).
Fonte: Adaptada de Naĕonal Insĕtutes of Health.6
 
Demência Vascular
Definição
A demência vascular (DV) caracteriza‐se por pacientes portadores de doença cerebrovascular que apresentam áreas de infarto em topografias
cerebrais, jusĕficando os sintomas.
 
Patogênese
O principal substrato fisiopatológico é a aterosclerose, com dois mecanismos principais: obstrução ateroembólica em grandes vasos (cerebral
anterior, média e posterior) e infarto em nível arteriolar, gerando pequenos infartos (< 1,5 cm, cognominados lacunas) no tálamo, nos núcleos
da base e na substância brancasubcorĕcal.
Outras eĕologias menos comuns são CADASIL (arteriopaĕa cerebral autossômica dominante com infartos subcorĕcais e  leucoencefalopaĕa),
angiopaĕa amiloide cerebral e vasculites do SNC.
 
Epidemiologia
Pelo menos 20% do grupo de pacientes com demência apresentam doença cerebrovascular. No entanto, é frequente a ocorrência de doença
cerebrovascular  comórbida à doença de Alzheimer,  sendo em geral  diεcil  determinar  a parĕcipação de  cada doença no  compromeĕmento
cogniĕvo.  Homens  e  mulheres  evidenciam  prevalência  semelhante,  e  os  principais  fatores  de  risco  são  doença  cardiovascular,  diabetes  e
hipertensão.
 
Manifestações clínicas
O achado mais consistente para determinação da DV é um acidente vascular cerebral com declínio cogniĕvo evidente.
Tipicamente, podem ocorrer acidentes vasculares subclínicos nos pacientes que determinam uma piora clínica escalonada.
Além das manifestações motoras, com paresias e/ou alentecimento psicomotor, esses pacientes em geral apresentam maior déficit de atenção
e das funções execuĕvas.
Também  ocorrem  amnésia  anterógrada,  alterações  de  personalidade,  afasias  e  agnosia,  por  vezes  dificultando  a  diferenciação  com  DA.  A
existência  de  sinais  neurológicos  focais  (hemiparesia,  hemianopsia,  hemianestesia,  alterações  em  pares  cranianos)  é  um  forte  indício
localizador de doença cerebrovascular.
 
Diagnóstico
Fundamentalmente, a história e o exame clínico devem vincular temporalmente os sintomas cogniĕvos a um evento vascular, sobretudo se for
de maneira escalonada. O resultado da neuroimagem também pode sugerir a ocorrência da doença se houver achado de múlĕplos  infartos
bilaterais, notadamente no córtex, nos núcleos da base e na substância branca (Quadro 91.6).
 
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Tratamento
A  principal  estratégia  de  tratamento  deve  ser  a  prevenção  de  doença  cerebrovascular  por meio  do  controle  rigoroso  dos  fatores  de  risco
(sobretudo diabetes, hipertensão e dislipidemia).
Uma  vez  instalada  a  demência  vascular,  o  uso  de  inibidores  de  colinesterase  pode  apresentar  pouco  beneεcio.  No  entanto,  a  prevenção
conĕnua sendo fundamental para evitar novos eventos vasculares.
 
Hidrocefalia de Pressão Normal
Definição
Os três sintomas ėpicos: alterações progressivas da marcha, demência e urgeinconĕnência urinária foram originalmente relatados por Hakim e
Adams, havendo ventrículos cerebrais aumentados, sem achados de hipertensão intracraniana.
 
Patogênese
Inicialmente,  postulou‐se  que  os  sintomas  ocorriam  devido  a  um  desequilíbrio  entre  a  produção  e  a  reabsorção  do  líquido  cerebrospinal,
causando  ventriculomegalia,  porém  sem  hipertensão  do  líquido  cerebrospinal.  Pesquisas  mais  recentes  sugerem  que,  adicionalmente  ao
desequilíbrio no fluxo de  líquido  cerebrospinal,  exista disfunção na  circulação  cerebral. Acredita‐se que os  sintomas  sejam provenientes de
uma compressão lateral às estruturas ventriculares, alterando a perfusão de tratos, como o corĕcoespinal (gerando as alterações de marcha), e
fibras sacrais da coroa radiada (jusĕficando os sintomas urinários).
 
Manifestações clínicas
Embora a existência desses três sintomas seja ėpica da síndrome, sintomas isolados também podem ser observados. Tipicamente ocorre, em
um  primeiro momento,  alteração  na marcha,  caracterizada  como  uma  apraxia  de movimentos.  Os  pacientes  apresentam  dificuldades  em
iniciar a passada ou mudar de direção (“pés magnéĕcos”) e a marcha é lenta, com passos curtos. Se não for tratada, sobrevém déficit cogniĕvo
e inconĕnência urinária.
A  demência  manifesta‐se  caracterisĕcamente  por  alentecimento  da  velocidade  de  pensamento  e  dificuldades  nas  funções  execuĕvas.  O
sintoma urinário mais frequente e inicial é a urgência, estando a inconĕnência associada à demência franca.
 
Diagnóstico
Os sintomas  são confirmados com o achado de ventrículos aumentados na neuroimagem,  sem que haja hipertensão craniana pela punção
lombar. Paradoxalmente, embora a pressão não esteja aumentada, a drenagem de  líquido cerebrospinal ocasiona melhora clínica de  forma
frequente.
 
Tratamento
A  principal  estratégia  de  tratamento  é  a  derivação  (shunt)  da  drenagem  do  líquido  cerebrospinal,  sendo mais  frequente  no  Brasil  o  shunt
ventriculoperitoneal.  Durante  a  fase  de  diagnósĕco,  a melhora  clínica  após  punção  lombar  já  auxilia  na  predição  da  resposta  terapêuĕca,
ocorrendo  em  50  e  90%  dos  pacientes,  dependendo  da  técnica  e  da  forma  de  derivação  uĕlizadas.  A  recorrência  dos  sintomas  requer
invesĕgação de hipo/hiperdrenagem de líquido cerebrospinal por disfunção da derivação.
 
Demência Com Corpúsculos Delewy
Definição
A  demência  com  corpúsculos  de  Lewy  (DCL)  caracteriza‐se  principalmente  por  alterações  cogniĕvas  associadas  a  parkinsonismo,  delirium,
alterações  do  sono  e  sintomas  neuropsiquiátricos  (alucinações  visuais  e  depressão).  Neuropatologicamente,  são  encontrados  acúmulos
intracelulares em neurônios corĕcais denominados corpúsculos de Lewy.
A DCL corresponde a cerca de 10% dos quadros demenciais, e, entre as doenças neurodegeneraĕvas, é a segunda causa mais frequente depois
de DA.
 
Patogênese
A DCL pode ser caracterizada como uma união entre aspectos da DA e da doença de Parkinson. Em pacientes com DCL, são observadas placas
senis compostas de beta‐amiloide, porém o que caracteriza a doença são os corpúsculos de Lewy,  inclusões  intraneuronais eosinoεlicas de
uma proteína denominada alfa‐sinucleína.
Esses corpúsculos estão presentes na substância nigra em indivíduos com doença de Parkinson, porém, naqueles com DCL, a localização ėpica
é em áreas corĕcais (sobre‐ tudo frontotemporal) e subcorĕcal.
 
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Manifestações clínicas e diagnóstico
Em geral, o déficit cogniĕvo mais proeminente é o do nível de atenção, com dificuldades nas funções execuĕvas e na orientação visuoespacial
(Fig. 91.4). Os sintomas extrapiramidais são ėpicos de parkinsonianos.
O diagnósĕco de DCL deve ser considerado em todos os pacientes que apresentam demência, cujos sintomas cogniĕvos iniciaram antes dos
sintomas  motores  ou  no  máximo,  concomitantemente.  Nos  pacientes  que  evidenciam  sintomas  extrapiramidais  prévios  ou  diagnósĕco
estabelecido de doença de Parkinson, sobretudo se for por mais de um ano, deve‐se considerar demência intrínseca à doença de Parkinson.
 
Tratamento
O manejo farmacológico desses pacientes é diεcil, pois os agentes anĕparkisonianos podem acentuar os sintomas neuropsiquiátricos.
Os inibidores da colinesterase podem ser uĕlizados para pacientes com sintomas neuropsiquiátricos, porém apresentam pouco efeito naqueles
com transtorno cogniĕvo.
Anĕpsicóĕcos, anĕdepressivos e benzodiazepínicos podem auxiliar na diminuição dos sintomas neuropsiquiátricos e do transtorno do sono.
 
 
Figura 91.4
Déficit visuoespacial em caso de demência por corpúsculos de Lewy.
 
Demência Frontotemporal
Definição
Também  conhecida  como  degeneração  lobar  frontotemporal,  a  demência  frontotemporal  (DFT)  designa  um  grupo  de  doenças
neurodegeneraĕvas, cuja síndrome clínica é caracterizada ĕpicamente por alterações no comportamento/relacionamento social e perda das
funções execuĕvas*****. Como um grupo, as DFTs apresentam um início mais precoce, com a maior parte dos casos ocorrendo entre 50 e 70
anos. Após essa idade, a incidência tende a decrescer.
 
***** Funções execuĕvas compreendem habilidades cogniĕvas que capacitam um indivíduo a realizar ações, ĕpicamente localizadas no córtex
frontal.  Incluem  funções  de  organização(atenção,  tomada  de  decisões,  planejamento,  sequenciamento,  resolução  de  problemas)  e  de
regulação (início de ações, auto‐controle, autorregulação).
 
Patogênese
Por  tratar‐se de um grupo de diversas eĕologias, os mecanismos patológicos são disĕntos. De maneira geral, as DFTs são divididas em dois
grupos, conforme a existência ou não de inclusões intracelulares da proteína Tau. Ambos os grupos evidenciam igual incidência.
Entre as denominadas demências Tau posiĕvas, a enĕdade mais ėpica é a doença de Pick, em que os acúmulos são também conhecidos por
corpúsculos de Pick. Outras doenças significaĕvas são a paralisia supranuclear progressiva e a degeneração corĕcobasal.
Os sintomas da DFT, sobretudo os comportamentais, ocorrem devido ao acomeĕmento preferencial das áreas temporal anterior e do córtex
pré‐frontal,  especialmente  o  direito.  Se  outras  áreas  cerebrais  são  compromeĕdas,  pode  haver  síndromes  motoras  ou  de  linguagem,
principalmente síndromes afásicas, quando o lado esquerdo (dominante) é afetado (demência semânĕca).
 
Manifestações clínicas
As DFTs  são em geral  insidiosas, apresentando, de  forma ėpica e  inicial,  apaĕa, embotamento afeĕvo e perda da  iniciaĕva.  Incialmente, os
pacientes  podem  preservar  a memória,  embora  já  com  dificuldades  nas  funções  execuĕvas,  e,  com  a  progressão  da  doença,  os  sintomas
comportamentais passam a ser mais proeminentes.
Em estágios avançados, a perda de memória  torna diεcil  a diferenciação com DA. De acordo com o acomeĕmento  topográfico no cérebro,
alguns  sintomas  de  doença  do  neurônio  motor  podem  ocorrer  (p.  ex.,  fraqueza,  atrofia,  fasciculações),  bem  como  síndromes  afásicas  –
sobretudo afasia motora, em que a anomia é um sinal precoce.
 
Diagnósĕco e curso clínico
Os dados clínicos e neuropsicológicos podem ser confirmados com a realização de neuroimagem ėpica das DFTs: atrofia focal dos lobos frontais
e/ou temporais. O estudo metabólico com PET‐scan também pode auxiliar quando há hipocaptação de glicose pelos neurônios dessas áreas.
Por  tratar‐se de um grupo  com eĕologias disĕntas,  pacientes  com DFTs  apresentam prognósĕco  variável. De maneira  geral,  indivíduos que
evidenciam síndrome com acomeĕmento motor têm uma sobrevida menor, e aqueles com afasias e/ou apraxias da fala manifestam curso mais
protraído.
 
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Tratamento
Não há  tratamento específico para pacientes  com DFTs,  embora uma área de  estudo  atual  seja  sobre drogas que  retardem e/ou  inibam o
substrato patológico da proteína Tau. As medicações são dirigidas aos sintomas comportamentais, com o uso de anĕpsicóĕcos aėpicos (p. ex.,
queĕapina) para os sintomas como agitação psicomotora e delírios.
 
Pseudodemência
A  pseudodemência  caracteriza‐se  por  compromeĕmento  cogniĕvo  observado  em  alguns  pacientes  com  transtorno  depressivo  maior.  A
semelhança  dessa  condição  com  um  quadro  demencial  pode  dificultar  o  diagnósĕco.  De maneira  geral,  os  sintomas  depressivos  são mais
proeminentes, existe história de transtorno do humor, e em geral os pacientes apresentam maior percepção do declínio cogniĕvo (Tab. 91.4).
 
 
Caso Clínico Comentado
O quadro é compaėvel com o diagnósĕco de déficit cogniĕvo leve.
Pelos dados obĕdos por meio da história, afasta‐se um quadro demencial: não há impedimento significaĕvo na execução das tarefas diárias
(não  há  interferência  demasiada  no  trabalho/relações  sociais/autocuidado).  No  entanto,  evidentemente  existe  um  compromeĕmento  de
memória, disĕnto do nível habitual do paciente. A dificuldade na realização de um de seus hobbies, sobretudo um em que é uĕlizada função
execuĕva (palavras cruzadas), corrobora a suspeita clínica. Outro dado importante é o fato de o próprio paciente se queixar da alteração (i.e,
tem  percepção  de  seu  déficit),  em  contraposição  à  anosognosia,  observada  em  quadros  demenciais  mais  graves.  É  possível  que  ocorra
alterações  neuropsiquiátricas  suĕs  nesses  pacientes  (p.  ex.,  briga  com  a  esposa).  Por  fim,  a  inexistência  de  humor  deprimido  torna  o
diagnósĕco de pseudodemência improvável.
 
Os critérios diagnósĕcos para déficit cogniĕvo leve, subĕpo amnésico, estão listados a seguir:
•Reclamação em relação à memória, preferivelmente confirmada por acompanhante.
•Compromeĕmento de memória observado em bases objeĕvas, quando comparado ao esperado para a idade e o nível educacional.
•Demais funções cogniĕvas normais.
•Aĕvidades de vida diária, em grande maioria, sem interferências.
•Inexistência de demência.
 
Devido  às  queixas,  é  realizada  uma  avaliação  detalhada  com  testagem  neuropsicológica,  já  que  o miniexame  do  estado mental  pode  ser
normal. No manejo inicial, é apropriada a avaliação com neuroimagem (podendo haver atrofia da porção medial do lobo temporal), e deve‐se
descartar  causas  orgânicas  (dosagem  de  hormônios  ĕreoidianos,  vitamina  B12,  sorologias  para  HIV/lues,  etc.).  A  pesquisa  do  alelo  4
configuraria um maior risco de desenvolver doença de Alzheimer.
O  tramento  pode  incluir  treinamento  cogniĕvo,  uso  de  ácido  graxo  ômega‐3  (óleo  de  peixe,  DHA)  e  anĕco‐linesterásicos  (donepezila).
Apresenta impacto benéfico em controlar os fatores de risco (diabetes, hipertensão) e instruir o paciente sobre o risco de desenvolvimento de
demência – para que este possa planejar sua vida e manter um acompanhamento constante.
Referências
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2.Lourenço  RA,  Veras  RP.  Mini‐exame  do  estado  mental:  caracterísĕcas  psicométricas  em  idosos  ambulatoriais.  Rev  Saude  Pública.
2006;40(4):712‐9.
3.Neef D, Walling AD. Demenĕa with Lewy bodies: an emerging disease. Am Fam Phys. 2006;73(7):1223‐4
4.Blennow K, De Leon MJ, Zeĥerberg H. Alzheimer’s disease. Lancet. 2006;368(9533):387‐403.
6.Naĕonal Insĕtutes of Health. Naĕonal Insĕtute on Aging [Internet]. Bethesda: NHI; c2012 [capturado em 15 set. 2012]. Disponível em: hĥp://
www.nia.nih.gov/.
7.UCFS  Memory  and  Aging  Center  [Internet].  San  Francisco:  Regents  of  the  University  of  California;  c2012  [capturado  em  15  set.  2012].
Disponível em: hĥp://memory.ucsf.edu/Educaĕon.
 
Leituras Recomendadas
Cummings JL. Alzheimer’s disease New Engl J Med. 2004;351(1):56‐67.
Factora R, Luciano M. When to consider normal pressure hydrocephalus in the paĕent with gait disturbance. Geriatrics. 2008;63(2):32‐7.
Gauthier S, Reisberg B, Zaudig M, Petersen RC, Ritchie K, Broich K, et al. Mild cogniĕve impairment. Lancet. 2006;367(9518):1262‐70.
Knopman DS. Alzheimer’s disease and other demenĕas.  In: Goldman L, Ausiello D, editors. Cecil medicine. 23rd. ed. Philadelphia: Saunders;
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Knopman DS. Demenĕa and cerebrovascular disease. Mayo Clin Proc. 2006;81(2):223‐30
McKeith IG, Dickson DW, Lowe J, Emre M, O’Brien JT, Feldman H, et al. Diagnosis and management of demenĕa with Lewy bodies: third report
of the DLB Consorĕum. Neurology. 2005;65(12):1863‐72.

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