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RESUMO XAVIER, Aldemar Chagas. Desenvolvimento das relações capitalistas no Brasil, “questão social” e formas de pauperismo: tendências contemporâneas. Rio de Janeiro, 2013. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) - Escola de Serviço Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. 1.1 Marx, o pauperismo e a “questão social” Marx (2008a) em O Capital [1867], apoiado nos estudos da economia política clássica e nos textos pioneiros de Engels1, analisa criticamente o movimento do capital e aprofunda a crítica da economia política burguesa, ou seja, mediante o exame crítico da dinâmica histórica do capitalismo, Marx desnaturaliza os processos da acumulação primitiva do capital, o surgimento da pobreza moderna e a relação entre trabalho e produção da riqueza social. Ele examina minuciosamente a dinâmica do capital, sua origem histórica e suas contradições imanentes, visando mostrar o caráter histórico e transitório do capitalismo e advertir para a necessidade de sua superação. Na tentativa de superar o determinismo dos “fatos” econômicos, consagrados pelo pensamento liberal político-econômico dos “clássicos”, Marx analisa o movimento da realidade a partir das categorias2 trabalho, valor, mais-valia, trabalho excedente, desnaturalizando as noções de propriedade privada, de trabalho assalariado, de pobreza e de riqueza. Assim, combatendo a abordagem da “lei natural da produção” e da autonomização das leis econômicas, Marx examina o capital, o trabalho, a riqueza e a pobreza, como resultado da própria relação histórico-social entre os homens, orientando-se pela noção de exploração do trabalho pelo capital e pela perspectiva de classe e de revolução. Em suma, Marx revoluciona a noção clássica da “lei do valor-trabalho” com as teorias e categorias da mais-valia, do trabalho necessário e excedente e do trabalho pago e não-pago. Como Marx aponta, é o trabalho excedente que cria o lucro e a riqueza (sob a forma de capital) para a classe capitalista. Ele revelou, assim, o caráter explorador da ordem burguesa. 1 Trata-se principalmente do Esboço para uma crítica da economia política, publicado em 1844. 2 “(...) as categorias exprimem, portanto, formas de modos de ser, determinações de existência” (MARX, 2008a, p. 265). Conforme as observações de Marx, o modo capitalista de produção e de acumulação pressupõe, originariamente como condição fundante e, depois, como condição de existência, a dissociação constante entre trabalhador e meios de produção3,isto é, ocorre a separação do trabalhador de seus meios de produção e a conversão desses meios em capital. Ao mesmo tempo, efetiva-se a socialização do trabalho (o trabalho coletivo) e a apropriação privada da riqueza social e dos meios sociais de produção pelos capitalistas. Nesse processo, a partir da segunda metade do século XVIII, o capital usurpa do camponês e do artesão a propriedade de seus meios de produção, tornando-os força de trabalho assalariada. Para Marx, o processo que cria o sistema capitalista é o mesmo que transforma em capital os meios de produção e os meios sociais de subsistência. A força de trabalho é convertida em mera mercadoria e, por isso, os trabalhadores têm que vendê-la no mercado em troca do salário. Em síntese, a produção capitalista supõe o trabalhador livre e desprovido dos meios de produção. Em outros termos, Marx diz: A separação entre o produto do trabalho e o próprio trabalho, entre as condições objetivas do trabalho e a força subjetiva do trabalho, é, portanto, o fundamento efetivo, o ponto de partida do processo de produção capitalista. (MARX, 2008b, p. 665) Conforme as considerações assinaladas por Marx, analisando a história econômica do capitalismo, Leo Huberman conclui: O capitalista é dono dos meios de produção – edifícios, máquinas, matéria- prima, etc.; compra a força de trabalho. É da associação dessas duas coisas que decorre a produção capitalista. (HUBERMAN, 2008, p. 144) A invenção, o aperfeiçoamento e a introdução de máquinas no processo de produção industrial foram fatores que aceleraram a expropriação constante do trabalhador e que contribuíram para aumentar o tamanho da classe trabalhadora, formando os proletários assalariados e a população trabalhadora “excedente” ou “supérflua”. De outro modo, o capital – dentro do seu movimento contraditório e 3 “A chamada acumulação primitiva é apenas o processo histórico que dissocia o trabalhador dos meios de produção. É considerada primitiva porque constitui a pré-história do capital e do modo de produção capitalista” (MARX, 2008b, p. 828). “(...) Quando a produção capitalista se torna independente, não se limita a manter essa dissociação, mas a reproduz em escala cada vez maior” (Idem, p. 828). “(...) o processo capitalista de produção reproduz, portanto, a separação entre a força de trabalho e as condições de trabalho, perpetuando, assim, as condições de exploração do trabalhador” (Idem, 672). imanente – é impelido a revolucionar-se pelo aperfeiçoamento das máquinas e no investimento em novas tecnologias para estimular a produtividade e a intensidade do trabalho, ao passo em que promove o desenvolvimento das forças produtivas e aumenta o nível de exploração do trabalhador. Observa-se, portanto, que, ao revolucionar as condições técnicas e sociais do processo de trabalho, o capital potencializa a valorização e a extração da mais-valia pelo controle das habilidades, do movimento e do tempo do trabalhador. No entanto, além dos avanços técnico-científicos, das transformações nas bases técnicas e sociais do processo de trabalho e da separação entre trabalhador e meios de produção, a acumulação primitiva do capital e o progresso da grande indústria moderna também foram impulsionados pelas guerras, rapinas, pilhagem e colonização de outras nações. Como disse Marx, não há nada de idílico nesse processo de acumulação primitiva4. Mas, que, ao contrário, evidencia um processo de nascimento violento e desumano5 da grande indústria moderna. Portanto, o capital acumulado para iniciar o capitalismo industrial não foi resultado apenas da troca de mercadorias no comércio mundial. A argumentação profunda e irônica de Huberman explica bem esse processo. Ele diz: a massa de capital inicial que impulsionou o nascimento da produção industrial capitalista não “veio das almas cuidadosas que trabalharam duro”, que “gastaram apenas o indispensável e juntaram as economias aos poucos” (HUBERMAN, 2008, p. 144). A constituição da indústria moderna capitalista supõe, portanto, o controle e a subsunção real do trabalho ao capital. O trabalho é fortemente controlado no processo de trabalho e subordinado aos ditames do capital. A grande indústria moderna, então, submete completamente o trabalhador ao comando e à disciplina do capital. Com isso, o despotismo da divisão do trabalho na indústria capitalista aniquila a autonomia e as habilidades do trabalhador e, por conseguinte, aliena o produto do produtor e a riqueza do trabalhador. A força expansiva do capital e seu processo de acumulação impulsionaram o progresso técnico-científico, possibilitou o aumento da capacidade produtiva do trabalho e da produção de riqueza social, e, motivado por estas mesmas forças, realiza a expropriação e a exploração do trabalhador, produz o subemprego, o 4 No entanto, sabemos que atualmente esse processo de acumulação vem sendo crescentemente garantido pelos mecanismos de consenso, de controle social epelos instrumentos jurídicos legais. 5 Todavia, não quer dizer que o amplo progresso civilizatório alcançado seja anulado. Não se trata, portanto, de negar os avanços sociais, da ciência e da tecnologia obtidos ao longo da história do capitalismo. desemprego, a precarização do trabalho, a insegurança na vida social e o fenômeno do pauperismo. Por um lado, gera a pauperização relativa da classe trabalhadora, expressa pela redução de sua participação na riqueza socialmente produzida e pela queda do “salário relativo” (MARX, 2008b), ou seja, enquanto aumenta a massa de riqueza que o trabalhador produz, diminui, ao mesmo tempo, o valor da força de trabalho – pela tendência crescente de redução do “trabalho necessário” e pelo alargamento do “trabalho excedente”. De outro, gera a pauperização absoluta desta mesma classe, expressa pela precarização do trabalho e pelo estado de miséria dos trabalhadores que vivem das ocupações informais e irregulares e dos desempregados e indigentes que constituem o exército industrial de reserva. Portanto, nessas novas relações sociais modernas, a produção capitalista caracteriza-se, enquanto condição de sua existência, pela exploração do trabalho assalariado e pela produção crescente de riqueza e de pobreza, isto é, a acumulação capitalista concentra e centraliza o poder político, a propriedade, o capital e a riqueza social nas mãos dos capitalistas. Os primeiros efeitos do processo crescente de acumulação, de concentração e de centralização dos capitais nas mãos de capitalistas individuais e do surgimento do pauperismo moderno foram vistos na Inglaterra do início do século XIX. De um lado, o progresso industrial significava a concentração da massa da riqueza social nas mãos de poucos capitalistas, e, de outro, a concentração das mazelas sociais e da pobreza absoluta para a classe operária. Essa nova pobreza que predominava na sociedade da grande indústria moderna capitalista diferenciava-se da pobreza típica das sociedades pré- capitalistas; esta nova modalidade de pobreza não era mais gerada pela escassez, pela mera privação ocasional ou pelos motivos de acidentes naturais6. Nascia uma pobreza produzida e reproduzida pela própria dinâmica econômica do modo capitalista de produção e de acumulação. Como sinaliza Netto: 6 Sobre a caracterização desse novo fenômeno em contraposição às formas de pobreza pretéritas que precederam a ordem burguesa, Netto diz: “Se, nas formas de sociedade precedentes à sociedade capitalista, a pobreza estava ligada a um quadro geral de escassez (quando em larguíssima medida determinado pelo nível de desenvolvimento das forças produtivas materiais e sociais), agora ela se mostrava conectada a um quadro geral tendente a reduzir com força a situação de escassez. Numa palavra: a pobreza acentuada e generalizada no primeiro terço do século XIX – o pauperismo – aparecia como nova precisamente porque ela se produzia pelas mesmas condições que propiciavam os supostos (...) da sua supressão” (NETTO, 2010, p. 4-5). Nas sociedades anteriores à ordem burguesa, as desigualdades, as privações etc. decorriam de uma escassez que o baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas não podia suprimir (...); na ordem burguesa constituída, decorrem de uma escassez produzida socialmente, de uma escassez que resulta necessariamente da contradição entre as forças produtivas (crescentemente socializadas) e as relações sociais de produção (que garantem a apropriação privada do excedente e a decisão privada da sua destinação) e do caráter mercantil que reveste obrigatoriamente aos valores de uso. (NETTO, 2010, p. 8) Isso significa, então, que as desigualdades sociais, a pobreza e as privações modernas decorrem de uma escassez produzida socialmente pela ordem burguesa, isto é, tais problemas “tem a ver, exclusivamente, com a sociabilidade erguida sob o comando do capital” (Idem, p. 8). De acordo com as anotações de Netto (2010), a pauperização massiva da população trabalhadora constituía o “aspecto mais imediato da instauração do capitalismo em seu estágio industrial-concorrencial”. Tratava-se de um “fenômeno novo, sem precedentes na história anterior conhecida (...), era radicalmente nova a dinâmica da pobreza que então se generalizava”. O caráter de novidade histórica desse fenômeno nascente se explica porque: Pela primeira vez na história registrada, a pobreza crescia na razão direta em que aumentava a capacidade social de produzir riquezas. Tanto mais a sociedade se revelava capaz de progressivamente produzir mais bens e serviços, tanto mais aumentava o contingente dos seus membros que, além de não terem acesso efetivo a tais bens e serviços, viam-se despossuídos até das condições materiais de vida de que dispunham anteriormente. (Idem, p. 4) Uma das grandes contribuições para o estudo do pauperismo moderno deve-se, em grande medida, às observações brilhantes de Engels (2008) em A situação da classe trabalhadora na Inglaterra [1845], na fase primitiva da grande indústria capitalista. Engels descreve minuciosamente o processo de exploração do trabalho, de debilitação física (intelectual e moral) do proletariado e de degradação das condições gerais de vida da classe operária nascente. Ele mostra, a partir do contato direto com a classe operária e dos relatórios de fábrica, que a miséria social e a insegurança social do proletariado são efeitos direto do próprio processo industrial capitalista. “Os primeiros proletários surgiram com a indústria, foram seu produto imediato” (ENGELS, 2008, p. 63). Sobre a relação entre a revolução industrial, o progresso da grande indústria e o nascimento da classe dos proletários, Engels diz: Já observamos que o proletariado nasce com a introdução das máquinas. A veloz expansão da indústria determinou a demanda de mais braços; os salários aumentaram e, em consequência, batalhões de trabalhadores das regiões agrícolas emigraram para as cidades – a população cresceu rapidamente e quase todo o acréscimo ocorreu na classe dos proletários. (Engels, 2008, p. 59) A população cresce mais rapidamente na classe dos proletários. Por isso, a população é lançada crescentemente nas fileiras dessa classe. Com o desenvolvimento da indústria moderna capitalista, ocorre o processo de proletarização da população. A grande indústria, portanto, cria “milhões de despossuídos que consomem hoje o que ganharam ontem” (Idem, p. 60). Denunciando o peso da pobreza absoluta nas condições de vida da classe trabalhadora nascente, Engels escreve: A situação da classe operária é a base real e o ponto de partida de todos os movimentos sociais de nosso tempo porque ela é, simultaneamente, a expressão máxima e a mais visível manifestação de nossa miséria social. (Idem, p. 41) Como observa Engels, as condições de vida do proletariado em geral resumem-se numa existência social moralmente degradante. E isto acontece porque a industrialização e a instabilidade no emprego tornaram a sua vida insegura e seus rumos incertos. O operário sabe que, se hoje possui alguma coisa, não depende dele conservá-la amanhã; sabe que o menor suspiro, o mais simples capricho do patrão, qualquer conjuntura comercial desfavorável podem lançá-lo no turbilhão do qual momentaneamente escapou e no qual é difícil, quase impossível, manter-se à tona. Sabe que se hoje tem meios para sobreviver, pode não os ter amanhã. (Idem, p. 70) Desse modo, Engels denuncia a penúria social do proletariado nascente, que vive precariamente em condições miseráveis e desumanas. A classe dos proletários é degradada fisicamente, intelectualmentee moralmente. A maior parte do proletariado vive, portanto, uma existência insuportável. Transitam rapidamente do “modesto conforto” à “privação extrema”: (...) esses operários nada possuem e vivem de seu salário, que, na maioria dos casos, garante apenas a sobrevivência cotidiana. Qualquer operário, mesmo o melhor, está constantemente exposto ao perigo do desemprego, que equivale a morrer de fome e são muitos os que sucumbem. Por regra geral, as casas dos operários estão mal localizadas, são mal construídas, malconservadas, mal arejadas, úmidas e insalubres; seus habitantes são confinados num espaço mínimo e, na maior parte dos casos, num único cômodo vive uma família inteira; o interior das casas é miserável: chega-se mesmo à ausência total dos móveis mais indispensáveis. O vestuário dos operários também é, por regra geral, muitíssimo pobre e, para uma grande maioria, as peças estão esfarrapadas. A comida é frequentemente ruim, muitas vezes imprópria, em muitos casos – pelo menos em certos períodos – insuficiente e, no limite, há mortes por fome. (ENGELS, 2008, p. 115) A classe operária de meados do século XIX, portanto, estava sujeita a todo tipo de degradação e de privação. Habitação irregular e insalubre, má alimentação, saúde precária e o alcoolismo eram fatores que configuravam a ausência das condições básicas de sobrevivência. A miséria e a insegurança de vida desmoralizavam a família operária. (...) as casas são sujas, velhas e degradadas e o aspecto das suas adjacentes é absolutamente horrível. (Idem, p. 90-91) Em síntese, nas moradias operárias (...) não há limpeza nem conforto e, portanto, não há vida familiar possível; só podem sentir-se à vontade nessas habitações indivíduos desumanizados, degradados, fisicamente doentios e intelectual e moralmente reduzidos à bestialidade. (Idem, p. 105) (...) e muitas vezes esses miseráveis refúgios do pior pauperismo se encontram próximos dos suntuosos palácios dos ricos. (Idem, p. 71) Para Engels, “Tudo isso é obra exclusiva da indústria, que não poderia existir sem esses operários, sem a sua miséria e a sua escravidão” (Idem, p. 96). Nas suas anotações, Engels chegou a afirmar que na grande cidade, “só existe uma classe rica e uma classe pobre, desaparecendo dia a dia a pequena burguesia”. Engels ressalta que havia certo temor por parte dos órgãos oficiais e da sociedade inglesa – o artigo do The Times advertia: “Na realidade, isso é assustador. Os pobres estão em toda parte”. Em face dessa ameaça potencial, o governo criou um conjunto de legislações para administrar a nova pobreza e a nova classe perigosa. A Poor Law chamada também de “Lei dos Pobres” (criada em 1603 pela rainha Elizabeth) foi totalmente reformulada em 1834 e denominada de New Porr Law (Nova Lei dos Pobres). Tal lei deveria, então, ser reformulada para se ajustar às novas exigências econômicas e políticas da sociedade burguesa. Esse conjunto de legislações oficiais funcionava basicamente para manter a estabilidade da ordem social, reprimir os pobres considerados aptos para o trabalho e, enfim, para administrar a população “supérflua” de desempregados e de miseráveis. Esses pobres “supérfluos” e miseráveis da população trabalhadora seriam então alvos das inúmeras políticas assistencialistas governamentais, das ações de caridade e de filantropia da igreja e dos empresários. Assim, na Inglaterra do início do século XIX, foram reformadas as antigas workhouses (casas de trabalho), financiadas pelos órgãos do governo, para oferecer o acolhimento, a internação, a alimentação e trabalhos irregulares aos pobres, desempregados e indigentes. O crescente assistencialismo estatal e as ações de caridade e de filantropia da sociedade significavam, na verdade, medidas paliativas contra a nova pobreza e um forte controle social sobre a nova “classe perigosa”, o proletariado moderno. Para o pensamento aguçado e crítico de Engels, “a beneficência dos ricos é uma gota de água no mar, cujo efeito desaparece num instante” (Idem, p. 130). Assim, de acordo com o revolucionário, o verniz da filantropia apenas alivia o sofrimento do pobre. Como mostra Engels, os operários mais afetados pela miséria, (...) dormem em qualquer lugar, nas esquinas, sob uma arcada, num canto qualquer onde a polícia ou os proprietários os deixem descansar tranquilos; alguns se acomodam em asilos construídos aqui e acolá pela beneficência privada, outros nos bancos dos jardins, quase sob as janelas da rainha Vitória. (ENGELS, 2008, p. 75) A população trabalhadora “excedente”, que Engels designa como os “supérfluos”, são os operários desempregados, arruinados ou privados de sua própria capacidade de trabalho, que estão sempre com o pé no pauperismo. São recrutados ou dispensados conforme as constantes oscilações do mercado e da indústria. Vivem do trabalho irregular e ocasional. Sobrevivem do comércio ambulante, do biscate ou da mendicância. (...) os “supérfluos” safam-se como podem ou sucumbem; a beneficência e as leis sobre os pobres ajudam a prolongar vegetativamente a existência de muitos deles; outros encontram aqui e acolá, naqueles setores de trabalho mais afastados da indústria, menos suscetíveis à concorrência, alguma forma miserável de subsistência – e tão pouco basta ao homem para sobreviver por algum tempo. (Idem, p. 124) Assim, a “população supérflua” sobrevive miseravelmente “graças a pequenos ganhos ocasionais. São espantosos os expedientes a que esses indivíduos recorrem para ganhar qualquer coisa” (ENGELS, 2008, p. 126). A maior parte dos “supérfluos” dedica-se ao comércio ambulante. Especialmente nos sábados à noite, quando toda a população operária sai à rua, podem se ver aqueles que vivem dessa atividade. Fitas, rendas, galões, laranjas, guloseimas, em resumo, todos os artigos imagináveis, são oferecidos por homens, mulheres e crianças. E ainda outros desempregados, os chamados jobbers, circulam pelas ruas em busca de qualquer trabalho ocasional; alguns deles conseguem trabalho por uma jornada, mas esses afortunados são poucos. (Idem, p. 127) Às vezes, toda a família se instala numa rua movimentada e deixa, sem nenhuma palavra, que o puro e simples espetáculo de sua miséria produza efeitos por si só. (Idem, p. 127-128) Nas Glosas Críticas [1844], Marx (2010) analisa ironicamente a visão do Estado moderno em face do pauperismo. O Estado moderno admite a existência do pauperismo, mas, ao mesmo tempo, esquiva-se de buscar as suas raízes e fontes concretas nas relações capitalistas de produção. Assim, ele procura situar às mazelas sociais e o pauperismo no “âmbito das leis da natureza”, no “âmbito da vida privada” ou no “âmbito da impropriedade da administração”. O Estado identifica a causa do pauperismo como (...) falha de administração e de beneficência e, em consequência, vale-se de medidas administrativas e beneficentes como meio para sanar o pauperismo. (MARX, 2010, p. 32) [O Estado, assim,] explica o terrível aumento do pauperismo como “falha administrativa”. (Idem, p. 33) A panaceia encontrada pelo Estado moderno para administrar e combater o perigo do pauperismo é situado, portanto, na ineficácia da administração estatal, nas legislações sociais e nos problemas da vida privada dos trabalhadores. Desse modo, o Estado moderno procura desde sempre dissociar as causas do pauperismo da organização da sociedade burguesa. O Estado jamais verá no “Estado e na organização da sociedade” a razão das mazelas sociais (...). Onde quer que haja partidos políticos, cada um deles verá a razão de todo e qualquer mal no fato de seu adversário estar segurando o timão do Estado. (Idem, p. 38)Por fim, todos os Estados buscam a causa nas falhas causais ou intencionais da administração e, por isso mesmo, em medidas administrativas o remédio para suas mazelas. Por quê? Justamente porque a administração é a atividade organizadora do Estado. (Idem, p. 39) O Estado é, portanto, resultado da própria organização da sociedade dividida em classes. Segundo a concepção marxiana, a origem do Estado reside da própria divisão e do conflito das classes antagônicas existentes na sociedade, isto é, ele é um produto (e consequência) da sociedade civil; expressa e perpetua as classes e os antagonismos da sociedade. Portanto, o Estado emerge das relações de produção e dos antagonismos da estrutura de classe estabelecidos na sociedade. Assim, para Marx e Engels, o Estado é um instrumento de dominação de uma classe sobre outra e representa o interesse da classe dominante, garantindo o direito de propriedade, a propriedade privada dos meios de produção, a apropriação privada da riqueza social e a organização da produção na sociedade. Por tudo isso, O Estado não pode suprimir a contradição entre a finalidade e a boa vontade da administração, por um lado, e seus meios e sua capacidade, por outro, sem suprimir a si próprio, pois ele está baseado nessa contradição. Ele está baseado na contradição entre a vida pública e a vida privada, na contradição entre os interesses gerais e os interesses particulares. (MARX, 2010, p. 39) O Estado não pode, portanto, acreditar que a impotência seja inerente á sua administração, ou seja, a si mesmo. Ele pode tão somente admitir deficiências formais e casuais na mesma e tentar corrigi-las. Se essas modificações não surtem efeito, a mazela social é uma imperfeição natural que independe do ser humano, uma lei divina, ou a vontade das pessoas particulares está corrompida demais para vir ao encontro dos bons propósitos da administração. (Idem, p. 40) Ao mesmo tempo em que crescia a miséria social do proletariado, o assistencialismo estatal, a caridade e a filantropia, também, aumentava, na mesma proporção, a organização e à associação de trabalhadores dos diferentes ramos da indústria em torno da luta por melhores condições de trabalho, aumento salarial e pela redução da jornada de trabalho. Como Engels já havia afirmado, “a situação da classe operária é a base real e o ponto de partida de todos os movimentos sociais de nosso tempo” (Idem, p. 41). Portanto, a classe dos proletários, (...) os operários fabris, primogênitos da revolução industrial, estão, como sempre estiveram, no centro do movimento operário. O movimento operário evolui pari passu com o movimento industrial. (ENGELS, 2008, p. 63) As primeiras revoltas coletivas da classe operária, em oposição à burguesia, foram realizadas por meio da ação violenta contra a introdução das máquinas na primeira fase do processo de industrialização moderna. As revoltas resumiram-se na quebra das máquinas, e isso, portanto, expressava apenas uma consciência de classe “parcial” do proletariado nascente. Para Engels, essa forma de ação “nunca foi a expressão geral da opinião pública dos operários”. “Mas essa forma de oposição era também isolada, limitada a determinadas localidades e dirigia-se contra um único aspecto da situação atual” (Idem, p. 249). Lowy (2012), analisando a evolução ideológica de Marx e as lutas sociais na Europa ocidental ao longo da década de 1840, argumenta que ocorreram mudanças qualitativas no movimento operário a partir do contato direto com as ideias e teorias comunistas na Liga dos Justos franco-inglesa (1836), nas sociedades secretas francesas (1840), na esquerda cartista inglesa (1845), na Liga dos Comunistas, entre Bruxelas e Londres (1847) e na Associação Internacional dos Trabalhadores (1864). Tais movimentos eram compostos de artesãos, operários e de revolucionários socialistas e anarquistas, todavia, o que passou a prevalecer foi o peso da composição operária. Como bem disse Engels, essa unidade e síntese dialética das ideias comunistas com o movimento operário, pressupõe, que, O conhecimento das condições de vida do proletariado é, pois, imprescindível para, de um lado, fundamentar com solidez as teorias socialistas. (ENGELS, 2008, p. 41) O contato direto de Marx com as lutas operárias acontece no momento que as ideias e teorias comunistas começavam a penetrar na massa operária. Nesse instante Marx já caminhava para a superação tanto do “comunismo filosófico” quanto do “socialismo utópico”. A partir de 1845, Marx se aprofunda na história da luta de classes e participa diretamente das lutas sociais na Europa e do próprio movimento de organização do proletariado. Marx vê de perto o crescimento da classe operária e o desenvolvimento de sua organização independente. Nesse contexto, ele se aproxima do movimento operário e estabelece contato direto com os dirigentes da “esquerda cartista”, e, ao mesmo tempo, se dedica aos estudos da história da revolução industrial e da história do movimento operário inglês. O revolucionário, portanto, presenciava de perto a penúria social do proletariado, as grandes greves e às reivindicações operárias por direitos políticos e trabalhistas. Todavia, para além das reivindicações políticas e econômicas pontuais, Marx apontava à necessidade histórica da revolução social e os limites da luta política do proletariado – os limites da emancipação política na ordem burguesa. Dessas associações e movimentos de trabalhadores7 na Europa ocidental, o cartismo (1838-1848) foi um dos principais protagonistas nas lutas sociais da classe operária. Engels caracteriza o cartismo do seguinte modo: O cartismo é a forma condensada da oposição à burguesia. [...] O cartismo nasceu do partido democrático, partido que nos anos oitenta do século passado [século XVIII] desenvolveu-se com o proletariado e, ao mesmo tempo, no proletariado. (ENGELS, 2008, p. 262) [...] o cartismo tornou-se um movimento puramente operário, depurado de todos os elementos burgueses. [...] Os operários cartistas, por seu turno, participaram com ardor redobrado de todas as lutas do proletariado contra a burguesia. (Idem, 268) A programática do movimento cartista, no entanto, dividia-se entre as reivindicações políticas e econômicas imediatas e os anseios socialistas. Assim, a forte composição operária do movimento se contrastava entre os interesses imediatos de classe e as aspirações socialistas de superação da ordem burguesa8. Inicialmente as lutas dos cartistas foram motivadas pelas condições de miséria social dos operários, pela redução da jornada de trabalho e pelo aumento dos salários, mas, depois, o movimento se concentrou basicamente nas reivindicações de participação política da classe operária no parlamento e na democracia representativa. As reformas sociais exigidas pelos operários junto ao parlamento foram, então, reunidas na chamada People´s Charter (Carta do Povo): Em 1838, uma comissão da Associação Geral dos Operários de Londres (London Working Men´s Association), liderada por Willian Lovett, elaborou a Carta do Povo, cujos “seis pontos” são: 1) sufrágio universal para todos os homens maiores, mentalmente sadios e não condenados por crime; 2) renovação anual do Parlamento; 3) remuneração para os parlamentares, para que indivíduos sem recursos possam exercer mandatos; 4) eleições por voto secreto, para evitar a corrupção e a intimidação pela burguesia; 5) colégios eleitorais iguais, para garantir representações equitativas e 6) supressão da exigência (já agora apenas formal) da posse de propriedades fundiárias no valor de trezentas libras como condição para a elegibilidade – isto é, qualquer eleitor pode tornar-seelegível. (Idem, 262) Todo o acúmulo de lutas e o processo de organização internacional da classe trabalhadora possibilitaram a criação, em 1864, da Associação Internacional 7 Como aponta Engels: “A história dessas associações é a história de uma longa série de derrotas dos trabalhadores, interrompida por algumas vitórias esporádicas” (Idem, p. 251). 8 “(...) o movimento operário está dividido em duas frações: os cartistas e os socialistas. Os cartistas são de longe os mais atrasados e menos evoluídos [teoricamente]; mas são proletários autênticos, de carne e osso, e representam legitimamente o proletariado. Os socialistas têm horizontes mais amplos, apresentam propostas práticas contra a miséria, mas provém originalmente da burguesia e, por isso, são incapazes de se amalgamar com a classe operária” (Idem, p. 271). dos Trabalhadores, depois chamada de Primeira Internacional9. Marx e Engels, por sua vez, participaram ativamente da fundação desse organismo independente e revolucionário do proletariado. Como bem lembrou Lenin: A recrudescência dos movimentos democráticos, no fim dos anos de 1850, e nos anos de 1860, levou Marx a retomar uma atividade prática. Em 1864 (em 28 de setembro) foi fundada em Londres a célebre I Internacional, a “Associação Internacional dos Trabalhadores”. Marx era a alma dela; é igualmente o autor da sua primeira “Mensagem” e de um grande número de resoluções, declarações e manifestos. Ao unir o movimento operário dos diversos países, ao procurar orientar, pela via de uma atividade comum, as diferentes formas do socialismo não proletário, pré-marxista (Mazzini, Proudhon, Bakunin, o tradeunionismo liberal inglês, as oscilações para a direita dos lassalianos na Alemanha etc.), ao conhecer as teorias de todas essas seitas e escolas, Marx forjou uma tática única para a luta proletária nos diversos países. (LENIN, 2001, p. 14) Como diz Lenin, Marx foi a alma da primeira associação internacional do proletariado moderno, que, como tal, significava a unificação das lutas sociais do movimento operário europeu. Assim, tal avanço político da classe trabalhadora foi acelerado tanto pelo agravamento da luta de classes quanto pelo descontentamento geral do proletariado contra o despotismo e a penúria social imposta pela ordem burguesa. Portanto, como resultado da pressão, mobilização e organização independente do movimento operário e socialista, surgiram nos países capitalistas centrais as primeiras legislações sociais10 e um conjunto de medidas estatais de proteção social para a classe trabalhadora. Em fevereiro de 1848, Marx e Engels publicam em Londres o célebre Manifesto do partido comunista – o documento programático do II Congresso (novembro/dezembro de 1847) da Liga dos Comunistas. A redação do Manifesto foi confiada a Marx ainda em dezembro de 1847, a sua elaboração atrasou por causa da intensa atividade política dos autores, mas, depois, foi acelerada por conta das 9 A história das Internacionais resume-se, portanto, na Associação Internacional dos Trabalhadores (1864- 1876); na Internacional Socialista (1889-1916), depois chamada de Segunda Internacional; e, na Internacional Comunista (1919-1943), conhecida como a Terceira Internacional. Por outro lado, seguindo uma linha revolucionária “trotskista”, também foi criada, em 1933, a Liga Comunista Internacional, fundada como a Quarta Internacional em 1938. Na atualidade, existem correntes políticas de todas essas organizações comunistas internacionais. 10 Nascia a cidadania liberal. Para o sociólogo T. H Marshall em Cidadania, classe social e status [1950], diz Coutinho (2000), a cidadania moderna é objetivada pela conquista dos direitos civis, políticos e sociais. Para a concepção liberal, o cidadão é o indivíduo que possui direitos, que tem posses, ou seja, é o proprietário de si próprio e de seus bens. O indivíduo é cidadão a partir de sua posição na divisão do trabalho, a partir daquilo que ele possui. Com isso, o direito privado protege a relação contratual entre os indivíduos proprietários. Portanto, os indivíduos cidadãos se relacionam através de contratos, onde cada um é livre para usar o que possui. situações revolucionárias criadas no cenário social europeu. Inclusive, como estratégia de agitação política, a programática sociopolítica do Manifesto já apostava fervorosamente numa iminente vitória comunista. E no final desse mesmo mês de fevereiro de 1848, sem haver ligação direta com a publicação do Manifesto11, ocorreram diversas explosões revolucionárias por toda a Europa ocidental. As forças democráticas e populares aterrorizam as burguesias com intensos levantes revolucionários contra a ordem social e a dominação de classe burguesa. Mas, por volta de maio de 1849, o movimento geral das insurreições proletárias foi brutalmente derrotado pela reação repressiva e organizada da burguesia europeia. Os acontecimentos sociopolíticos de 1848 na Europa ocidental marcam, desse modo, o protagonismo do proletariado no cenário político burguês e sua respectiva tomada de consciência política12 enquanto classe, em face dos interesses antagônicos com a classe burguesa. Marcou, com isso, a afirmação do projeto sócio- político do proletariado, pautado por uma perspectiva classista, socialista. O proletariado moderno surge, então, como o novo sujeito histórico, portador da emancipação social. É a nova força social que carrega – com seus interesses universais, democráticos e populares – o projeto de emancipação humana. Assim, os eventos de 1848 tornaram visíveis tanto o caráter explorador do capital sobre o trabalho quanto o caráter antagônico dos interesses entre o proletariado e a burguesia. Ao mesmo tempo, as revoluções de 1848 também marcavam o encerramento do ciclo progressista da ação de classe da burguesia13. O projeto 11 Conforme Netto: “Está claro que ao Manifesto não se deve nenhum papel estimulador dos eventos de 1848 – mesmo que tenha previsto como iminente, em antecipação arguta, uma explosão revolucionária” (NETTO, 1998, p. 17). 12 Como observa Netto (2010), a consciência teórica, no entanto, seria alcançada pelo movimento operário e socialista somente após a publicação, em 1867, do livro primeiro d’ O capital de Marx. Ou seja, essa consciência se desenvolveria com a própria evolução da produção teórica de Marx. 13 Após as revoluções de 1848, o pensamento burguês, preocupado em justificar a dominação de classe da burguesia, rompe com a tradição progressista (que perdurou até Hegel) e abandona o ideal de progresso, ou seja, “a burguesia traiu definitivamente a causa do progresso social” (COUTINHO, 2010, p. 22). Conforme Coutinho, em O estruturalismo e a miséria da razão, a burguesia tornava-se uma classe essencialmente conservadora, e o seu pensamento social (mais empobrecido) passava a servir prioritariamente à justificação teórica do existente. A partir daí, diante das mazelas sociais (sobretudo o pauperismo absoluto) geradas pela primeira onda do processo de industrialização e, inclusive, em face do surgimento da classe operária e de sua ascensão no cenário político, o pensamento liberal-reformista se voltou predominantemente para as reformas sociais e “democráticas”. Assim, as relações sociais naturalizadas e as reformas sociais, desvinculadas da relação antagônica entre capital e trabalho e das tensões da luta de classes, tornam-se o núcleo do pensamento social conservador. Por outro lado, após as revoluções de 1848, as tendências conservadoras se reuniram no pensamento burguês e as tendênciasprogressistas se inclinavam para o pensamento socialista. sócio-político da burguesia não ultrapassava agora o campo da emancipação política. A classe burguesa deixava de ser a força da emancipação social, ou seja, ela abandona o ideal de Progresso Social. O seu protagonismo reduz-se, desde então, à conservação da ordem social e à manutenção do domínio de classe. Para Hobsbawm (1981), entre as décadas de 1830 e 1840, o pensamento liberal rompe com o pensamento progressista dos “clássicos” e abandona a “ideologia do progresso”, isto é, a ideologia liberal abandona a visão de progresso social e os valores da tradição iluminista. Esse giro conservador do pensamento burguês acontece, portanto, quando a ideologia liberal abandona os “elementos radicais” da economia política inglesa (Smith e Ricardo), do pensamento político francês (Rousseau e os socialistas utópicos) e da filosofia alemã clássica (Hegel). O pensamento burguês, portanto, aceita passivamente a positividade capitalista; sua produção teórica passa a servir, prioritariamente, para justificar a ordem burguesa; no campo da economia, ganha prioridade a análise da esfera da circulação e da distribuição14; e, por fim, a economia, a história e a razão dialética perdem importância significativa na elaboração de sua concepção de mundo. Todo o otimismo exacerbado dos liberais “clássicos”, baseado na ideia de que o progresso social seria tão “natural” quanto o desenvolvimento do capitalismo, foi abalado e contestado pelos próprios resultados sociais e econômicos da ordem burguesa do século XIX. A liberdade, a felicidade e a “riqueza das nações” que os “clássicos” haviam previsto, como um “bem comum”, não foram alcançadas. As desigualdades sociais, econômicas e políticas entre as classes sociais e as contradições do desenvolvimento e do progresso no capitalismo tornaram-se cada vez mais intensas e evidentes. O capitalismo, portanto, provou ser incapaz de promover a riqueza e a felicidade para todos os indivíduos. Ao mesmo tempo, motivado por essa incapacidade do capitalismo, o pensamento socialista vinculava-se aos valores da tradição progressista de base iluminista e resgatava os “elementos radicais” do pensamento social dos “clássicos”: a história, a razão dialética e o progresso social. Toda essa dinâmica de luta das classes sociais – tensões e conflitos entre o capital e o trabalho – mais o amplo conjunto de problemas que afetavam a classe trabalhadora no processo de constituição da sociedade burguesa, constituem, 14 Nos economistas clássicos, ao contrário, havia uma ênfase na produção e certa noção da relação entre produção de riqueza e trabalho. portanto, a chamada “questão social”15 capitalista. De modo geral, ela é caracterizada, enquanto forma capitalista, pela exploração do trabalho pelo capital e pelo caráter coletivo da produção contraposto à apropriação privada da riqueza social e dos meios sociais de produção. Como argumenta Netto (2010), o termo “questão social” começou a ser utilizado por volta de 1830 para dar conta do fenômeno do pauperismo nascente, isto é, a nova dinâmica da pobreza que se generalizava junto à classe operária, era, assim, designada e qualificada pela expressão “questão social”. Todavia, conforme a análise teórica marxiana elucida, a nova pobreza era apenas uma manifestação imediata e particular da então chamada “questão social”. Por tais razões, a partir da segunda metade do século XIX, a expressão “questão social” “desliza, lenta, mas nitidamente, para o vocabulário próprio do pensamento conservador” (NETTO, 2010, p. 5). Conforme Netto, de um lado, os eventos de 1848 modificaram substantivamente as bases da cultura política do movimento dos trabalhadores: (...) resultou a clareza de que a resolução efetiva do conjunto problemático designado pela expressão “questão social” seria função da subversão completa da ordem burguesa, num processo do qual estaria excluída qualquer colaboração de classes – uma das resultantes de 1848 foi a passagem, em nível histórico-universal, do proletariado de classe em si a classe para si. (NETTO, 2010, p. 6) As vanguardas operárias acederam, no seu processo de luta, à consciência política de que a “questão social” está necessariamente colada à sociedade burguesa: somente a supressão desta conduz à supressão daquela. A partir daí o pensamento revolucionário passou a identificar, na própria expressão “questão social”, uma tergiversação conservadora e a só empregá-la indicando este traço mistificador. (Idem, p. 6-7) De outro, também afetaram as expressões ideais (culturais, teóricas, ideológicas) do campo burguês. Preocupado em manter, defender e justificar a ordem social burguesa, o pensamento social conservador trata de naturalizar e de moralizar a “questão social”. Ela é, então, desvinculada de suas bases econômicas e sócio-históricas capitalistas, ou seja, ela é estrategicamente dissociada da relação entre o desenvolvimento 15 Conforme Netto, “questão social” é “o conjunto de problemas econômicos, sociais, políticos, culturais e ideológicos que cerca a emersão da classe operaria como sujeito sócio-político no marco da sociedade burguesa” (NETTO, 1989, p. 90). Ou, “Por ‘questão social’, no sentido universal do termo, queremos significar o conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operária impôs no curso da constituição da sociedade capitalista. Assim, a ‘questão social’ está fundamentalmente vinculada ao conflito entre o capital e o trabalho” (Cerqueira Filho apud NETTO, 2005, p. 17, nota 1). capitalista e o processo de criação da riqueza social e de pauperização. É dissociada da relação de exploração entre capital e trabalho. As tendências conservadoras liberal-reformistas se voltavam, então, para a estratégia das “reformas sociais” e “democráticas” no interior da ordem burguesa, no sentido de reformar para conservar. Portanto, para o ideário burguês reformista, o fenômeno do pauperismo (designado pela expressão “questão social”) e os diversos “problemas sociais” que afetam a classe trabalhadora não podem ser eliminados da ordem social, pois são resultados do próprio curso natural das relações sociais de todas as formas de sociedades. Por isso, o que se propõe são as “reformas sociais”, mediante intervenção técnica e política, para reduzir e amenizar tais “problemas sociais”. Para tanto, o Estado burguês, apoiado no paradigma conservador, administra as sequelas da “questão social” como se fossem meros “problemas sociais”, “carências”, “desvios” e “desajustes individuais”. Com isso, o Estado, através das políticas sociais, intervém na “questão social” como se ela fosse um mero problema técnico-burocrático. A intervenção estatal, então, atua nas manifestações da “questão social” – entendidas como “disfunções” e “desvios” naturais – no sentido de reduzi-las e corrigi-las, para garantir a integração social e a coesão social da ordem burguesa. Em síntese, tal modalidade de intervenção do Estado apoia-se, portanto, no pensamento social burguês, que, por sua vez, se fundamenta na moralização da “questão social”. Ou seja, a partir da deseconomização, despolitização e desistoricização da “questão social”, a análise social conservadora tende a explicar a sociedade com base na psicologização das relações sociais e na individualização das manifestações particulares da “questão social”. Isso significa que a “questão social” seja convertida em “problemas sociais” (desvinculado das relações de exploração do trabalho e da luta de classes) e emobjeto de intervenção técnica. Portanto, os “problemas sociais” são entendidos como meras “disfunções” ocasionadas pela inadequação social dos indivíduos “desviantes”, ou seja, o indivíduo é responsabilizado pelo seu desajustamento social. Desse modo, as questões políticas são convertidas em problemas técnicos ou de desintegração social dos indivíduos. Portanto, o que prevalecia nas condições de vida do proletariado na fase inicial do processo de industrialização capitalista era a pobreza absoluta, enquanto uma expressão imediata e particular da “questão social”; era a forma predominante de pauperismo nos países capitalistas centrais, no curso da primeira revolução industrial – e no estágio do capitalismo concorrencial16. Ou seja, a pobreza absoluta confundia-se com a própria “questão social” capitalista, visto à sua grandeza e impacto gerados. As mazelas sociais e a miséria social do proletariado industrial eram gritantes em meio ao desenvolvimento econômico, ao progresso tecnológico e aos outros diversos problemas que afetavam o proletariado. Em suma, nesse contexto sociopolítico da fase primitiva da produção capitalista, em contraste com o incipiente processo de acumulação de capital, de propriedades e de riquezas nas mãos de alguns capitalistas individuais, emergia a pobreza moderna17: a concentração do desemprego, da miséria extrema e da insegurança social junto ao proletariado industrial, que, consequentemente, resultava na sua debilidade física (intelectual e moral) e na precarização das suas condições básicas de vida e de trabalho. Em face disso, Marx e boa parte dos pensadores da época foram fortemente influenciados pelo surgimento desse novo tipo de pobreza de proporções nunca antes vistas na história. O impacto gerado justificava-se quando se comparado ao nível, à capacidade e ao potencial da produção social moderna e de suas bases técnicas em relação ao progresso da ciência e da indústria. Para ilustrar o contexto histórico em que se encontrava Marx em face da pobreza absoluta do proletariado e da “questão social”, Netto adverte: (...) a “questão social”, para continuarmos com esta nomenclatura horrorosa, se põe logo nos primeiros momentos da revolução industrial; Marx confronta-se com ela, teórica e politicamente, ainda no espaço do capitalismo concorrencial, “clássico”. (NETTO, 1989, p. 90) 16 Conforme as observações de Lenin, no desenvolvimento histórico do capitalismo, temos: o estágio do capitalismo comercial (ou mercantil), do século XVI até meados do século XVIII; o estágio do capitalismo concorrencial, de 1780 até 1870/1880; e, o estágio do capitalismo monopolista (ou estágio imperialista), de 1880/1890 até os dias de hoje. Esta demarcação cronológica (aproximada) é, em grande medida, aceita pelos estudiosos do assunto. Para Lenin, é a partir das décadas de 1860 a 1870 que temos o desenvolvimento máximo da livre concorrência, onde se inicia a passagem do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista. “O capitalismo transformou-se em imperialismo”, ou ainda, o monopólio “é a transição do capitalismo para um regime superior” (LÊNIN, 2005, p. 89). 17 Como diz Netto: “A análise marxiana fundada no caráter explorador do regime do capital permite, muito especificamente, situar com radicalidade histórica a ‘questão social’, isto é, distingui-la das expressões socais derivadas da escassez nas sociedades que precederam a ordem burguesa. A exploração não é um traço distintivo do regime do capital (sabe-se, de fato, que formas sociais assentadas na exploração precederam largamente a ordem burguesa); o que é distintivo deste regime é que a exploração se efetiva no marco de contradições e antagonismos que a tornam suprimível sem a supressão das possibilidades mediante as quais se cria exponencialmente a riqueza social” (NETTO, 2010, p. 8). Foi então a partir da análise marxiana, expressa n’ O capital, já no livro primeiro publicado em 1867, que o movimento operário e socialista alcança a consciência teórica acerca da origem da “questão social” e de sua vinculação direta com as bases fundamentais da produção capitalista. Uma mostra da unidade e da síntese dialética entre a consciência política e a consciência teórica do movimento operário foi a Comuna de Paris de 1871. Essa breve experiência histórica da tomada do poder do Estado pelas forças proletárias é retratada minuciosamente por Marx em A guerra civil na França [1871]. A Comuna foi o primeiro governo operário da história – a primeira república proletária da história, considerada a primeira experiência moderna de um governo popular. O governo revolucionário adotou uma política de caráter socialista, baseada nos princípios da Associação Internacional dos Trabalhadores. Todavia, a gloriosa experiência comunista não durou muito. O governo oficial francês instalado em Versalhes (com o apoio do Império Alemão) esmagou cruelmente os revolucionários communards e aniquilou a Comuna em 30 dias. Para Marx, portanto, o principal ensinamento da Comuna para o proletariado é o de que não basta apenas conquistar a velha máquina do Estado, mas, sim, que as forças revolucionárias devem mesmo é dissolvê-la e criar um novo Estado proletário. Nesse momento, Marx recusa a tese da pauperização absoluta do conjunto da classe trabalhadora18. N’ O capital Marx já “distingue nitidamente os mecanismo de pauperização absoluta e relativa” (NETTO, 2010, p. 7, nota 12). Assim, Marx, ao contrário do pensamento conservador corrente fundamentado na visão dos economistas, superou a noção restrita e naturalizada de salário mínimo, de pobreza absoluta, de classe social e de “questão social”, ampliando a sua análise e elaboração teórica a partir do estudo rigoroso das leis e tendências históricas e das categorias econômicas capitalistas. Marx, portanto, realizou um profundo estudo da história da luta de classes e da dinâmica da produção, da circulação e do consumo na ordem social capitalista. Por isso, longe de identificar a “questão social” com a mera expansão da pobreza absoluta, os apontamentos de Marx sugerem que o seu surgimento resulta do próprio processo de constituição do capitalismo, isto é, a “questão social” emerge 18 No entanto, observa Netto: “(...) tanto na Miséria da filosofia [1847] quanto no Manifesto do partido comunista [1848], Marx prognóstica que o desenvolvimento do capitalismo implica em pauperização absoluta da massa proletária” (Idem, p. 7, nota 12). com a expropriação constante dos meios sociais de produção dos trabalhadores, com o desenvolvimento da grande indústria moderna, com a formação do trabalhador assalariado e com a formação do exército (ativo e de reserva) de trabalhadores – no qual possui o direito de ir ao mercado e vender livremente a sua força de trabalho. Então, para Marx, a “questão social” está diretamente vinculada ao nascimento e desenvolvimento da grande indústria moderna, à formação da classe operária e à generalização do trabalho “livre” assalariado e de todos os seus agravantes sociais, políticos e culturais. Para ir além das manifestações imediatas da chamada “questão social” e desvendar a sua raiz, associando-a como um produto da própria dinâmica capitalista, Marx examina as suas mediações com a luta de classes e as bases históricas da produção capitalista. Para Marx, a dinâmica capitalista produz, reproduz e atualiza constantemente a “questão social”. Isso significa, portanto, que dentro dos marcos da ordem burguesa ela não pode ser eliminada, mas, apenas administrada e combatida nas suas faces particularescomo, por exemplo, na redução da pobreza extrema e da fome. Portanto, para a concepção marxiana, a “questão social” é um fenômeno originário do próprio processo de constituição do capitalismo – resultado da exploração do trabalho pelo capital, da desigualdade social no acesso a propriedade e à riqueza socialmente produzida, do processo de expropriação dos meios sociais de produção e da contradição entre a socialização do trabalho – o caráter coletivo da produção – e a apropriação privada da riqueza social. Ou seja, através da análise da própria lógica de acumulação capitalista (na lei geral da acumulação capitalista), expressa na produtividade social do trabalho, na produção de um exército industrial de reserva, no trabalho excedente não-pago (mais-valia) e na polarização da riqueza e da pobreza, Marx desvenda o pretenso caráter natural e místico das “leis rígidas” da economia, decifra a raiz da “questão social” e torna visíveis os mecanismos de controle e de exploração do capital sobre o trabalho. A análise teórica de Marx revela, portanto, como se manifesta a forma específica da relação de exploração no regime do capital19. 19 “A análise de conjunto que Marx oferece n’ O capital revela, luminosamente, que a ‘questão social’ está elementarmente determinada pelo traço próprio e peculiar da relação capital/trabalho – a exploração. A exploração, todavia, apenas remete à determinação molecular da ‘questão social’; na sua integralidade, longe de qualquer unicausalidade, ela implica a intercorrência mediada de componentes históricos, políticos e culturais. Contudo, sem ferir de morte os dispositivos exploradores do regime do capital, toda luta contra as suas Como mostra Netto, para Marx, a “questão social”: (...) é um complexo de processos absolutamente indivorciável do capitalismo; mais exatamente, para Marx, o capitalismo é a produção e a reprodução contínua e ampliada da “questão social”. (NETTO, 1989, p. 91) Para Marx, então, a elucidação da “questão social” deve ter como ponto de partida a lei geral da acumulação capitalista20. Como o autor de O capital mostra, a lei que dinamiza a produção da riqueza social é a mesma que lança os trabalhadores na pauperização (absoluta e relativa). Ao mesmo tempo em que cresce as necessidades de expansão do capital e se amplia a produção da riqueza social também se intensifica a desigualdade social, a desvalorização do trabalho, a degradação, a miséria e a insegurança de vida da classe trabalhadora (no “exército ativo” e no seu “exército de reserva”). Ou seja, as causas e leis que impulsionam a produção do capital e da riqueza social são as mesmas que produzem a exploração/desvalorização dos trabalhadores, o desemprego, a fome, o pauperismo e a insegurança na vida social. Assim, Marx associa a “questão social” ao resultado direto das tensões e conflitos entre o capital e o trabalho na ordem burguesa, ou seja, sua origem fundamenta-se no antagonismo de classe, na luta de classes e na lógica interna do desenvolvimento da produção capitalista. Ao contrário, os economistas, os sociólogos e o pensamento liberal-reformista vêm se comprometendo, até os dias de hoje, justamente em desvincular a “questão social” (também chamada de “problemas sociais”) do âmbito das relações capitalistas de trabalho e das reivindicações políticas da classe trabalhadora. Propõem variadas reformas para reduzir e amenizar as sequelas da “questão social”, visando sempre à manutenção e à conservação da ordem burguesa. No sentido oposto, “a análise teórica marxiana interdita qualquer implicações político-econômicas, sociais e humanas (inclusive o que se designa por ‘questão social’) está condenada a enfrentar sintomas, consequências e efeitos” (NETTO, 2010, p. 7-8). 20 Sobre a referida lei, Marx escreve: “Quanto maiores a riqueza social, o capital em função, a dimensão e energia de seu crescimento e, consequentemente, a magnitude absoluta do proletariado e da força produtiva de seu trabalho, tanto maior o exército industrial de reserva. A força de trabalho disponível é ampliada pelas mesmas causas que aumentam a força expansiva do capital. A magnitude relativa do exército industrial de reserva cresce, portanto, com as potências da riqueza, mas, quanto maior este exército de reserva em relação ao exército ativo, tanto maior a massa da superpopulação consolidada, cuja miséria está na razão inversa do suplício de seu trabalho. E, ainda, quanto maiores essa camada de lázaros da classe trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior, usando-se a terminologia oficial, o pauperismo. Esta é a lei geral, absoluta, da acumulação capitalista. Como todas as outras leis, é modificada em seu funcionamento por muitas circunstâncias que não nos cabe analisar aqui” (MARX, 2008b, p.748). ilusão acerca do alcance das reformas no interior do capitalismo” (NETTO, 2010, p. 8). Conforme as sinalizações de Marx, para decifrar a anatomia original da “questão social” (na sua raiz histórica e nas suas manifestações políticas, culturais e ideológicas), deve-se ter como ponto de partida a crítica da economia política. Os seus fundamentos, núcleo e raiz encontram-se na dinâmica da própria produção capitalista. Por isso, a sua eliminação só pode ser pensada a partir da perspectiva de superação da própria ordem burguesa. Ou seja, A descoberta e a análise marxianas da lei geral da acumulação capitalista, sintetizada no vigésimo terceiro capítulo do livro primeiro d’ O capital, revela a anatomia da “questão social”, sua complexidade, seu caráter de corolário necessário do desenvolvimento capitalista em todos os seus estágios. O desenvolvimento capitalista produz, compulsoriamente, a “questão social” – diferentes estágios deste desenvolvimento produzem diferentes manifestações da “questão social”; esta não é uma sequela adjetiva ou transitória do regime do capital: sua existência e suas manifestações são indissociáveis da dinâmica específica do capital tornado potência social dominante. A “questão social” é constitutiva do capitalismo: não se suprime aquela se este se conservar. (NETTO, 2010, p.7) Em linhas gerais, Marx se confronta com a “questão social” já no estágio concorrencial do capitalismo, em meados do século XIX. Para ele, a “questão social” só pode ser resolvida com a superação da ordem burguesa. Portanto, trata-se de eliminar a “questão social” mediante a superação da própria ordem social capitalista. Conforme as considerações apresentadas, Netto conclui: Na ótica marxiana, a superação da “questão social” demanda, liminarmente, a ultrapassagem dos marcos do capitalismo. (...) Marx é um pensador inserido caracteristicamente na ordem burguesa, ainda que a sua pesquisa seja toda ela direcionada para derruir e ultrapassar esta ordem. (NETTO, 1989, p.91). A “questão social” é, portanto, resultado da sociabilidade específica do regime do capital. Portanto, as possíveis reformas sociais apenas amenizam as sequelas e expressões particulares e imediatas da “questão social”. Por isso, não há como suprimi-la conservando a ordem social que a produz e atualiza. A supressão da “questão social” supõe, assim, o questionamento dos fundamentos da sociedade burguesa e a substituição radical de suas bases. Em suma, a dissolução da “questão social” deve, então, implicar necessariamente na subversão completa da ordem burguesa, ou seja, significa, precisamente, a supressão da exploração do trabalho pelo capital.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABREU, H. Para além dos direitos. Cidadania e hegemonia no mundo moderno. Rio de janeiro: Editora UFRJ, 2008. ALENCAR, F; RAMALHO, L. C; RIBEIRO, M. V. T. História da sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Editora ao Livro Técnico, 1996. ANTUNES, R. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 11 ed. São Paulo: Cortez, 2006a. ______. Os sentidos do trabalho. Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. ______. (org). A era da informatização e a época da informalização. In: Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2006b1. ______. (org). Construção e desconstrução da legislação social no Brasil. In: Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. 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