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Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 1 (arts. 1.694 – 1.710) Base constitucional: solidariedade Os alimentos existem no Direito Civil, mas não apenas no direito de família, existem também no chamado “legado de alimentos no direito de sucessão”, por exemplo. Não é, portanto, restrito na esfera do direito de família, mas é muito mais difundido nele, e requer mais requisitos específicos do que nos demais. Os alimentos têm um termo, juridicamente falando, diferente do termo da linguagem comum. Juridicamente, fala-se em valor pecuniário destinado principalmente à manutenção de subsistência de uma pessoa, mas não em uma subsistência orgânica apenas, como também fatores que atendam necessidades de ordem psicológica e de aptidão (exercício de uma individualidade). São valores de subsistência, portanto, e não apenas referentes à comida. Quando se aprofunda nesses valores de subsistência, encontra-se degraus, umas são mais necessárias do que as outras, não se restringindo à educação; ninguém estuda com fome, por exemplo. Entra aí outro ponto, precisa-se de alimentos. Tem graus e dimensões dessa subsistência, que requer prioridades. No direito de família esses alimentos exigem uma legitimidade, que está na conjugalidade ou parentalidade, enquanto na esfera da responsabilidade civil, aquele que recebe os alimentos é necessariamente a vítima ou família de quem foi afetado pelo ato ilícito. Na esfera do direito de família, portanto, a legitimidade está restrita à esfera familiar na conjugalidade (amplo, englobando companheiros) e na parentalidade (linha reta infinita e colateral até SEGUNDO grau). Sempre, no polo obrigacional de crédito e débito, um desses estará precisando e o outro terá a disponibilidade, mas pode ocorrer de essa disponibilidade e necessidade se inverter, gerando a reciprocidade. A base constitucional dos alimentos está na solidariedade familiar (sentido de responsabilidade). Questionamentos de Maria Berenice: Se os parentes até o 4 grau podem ser herdeiros, por que não podem ter o bônus de ter o direito de alimentos, requerer alimentos, e/ou assumir esse ônus também? Do ponto de vista legal, não há divisões que admitem a flexibilização dessa questão. Outras questões: vulnerabilidade. Quando se envolve pessoas vulneráveis, a questão dos alimentos não fica restrita à esfera de decisão privada, recebe uma proteção Estatal maior. Problemas envolvendo criança e adolescente, por exemplo, se ninguém tomar iniciativa o MP tomará. A mesma coisa acontece quando se envolve os idosos e as pessoas com deficiência. A questão do sustento pela vulnerabilidade, embasado na solidariedade, torna esse direito mais amplo. O Regime estatutário de vulneráveis que podem trazer interseções na esfera familiar. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 2 Ex: Pessoa idosa acometida por limitações e que só conta com um primo (quarto grau colateral) que possa assumir os encargos em relação a ela. Rigorosamente, na letra de lei, ela não poderia acionar esse primo, mesmo ele tendo disponibilidade. A extensão da solidariedade precisa começar a ser pensada. A solidariedade é da família, sociedade e Estado. Havendo família, é possível que essa vulnerabilidade receba uma ponderação mais forte para a flexibilização dessa solidariedade. Esse regime estatutário faz uma releitura. → Em suma, para refletir: Deveres parentais para além da questão alimentar e para além da vulnerabilidade. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 3 Tratamento legal sobre alimentos no Brasil: CC 1916 / Lei 6.515/77 / CC 2002 / Lei 5.478/68 O CC16 só tinha uma forma de família (casamento). Toda vez que havia dissolução, aquela cláusula de alimentos era destinada sempre a um devedor certo (pai) e um credor certo (mãe) e os filhos enquanto menores dependentes. Hoje, esses créditos não são tão certos (história de superação e ganho de individualidades e emancipação). No CC16, o capítulo destinado a alimentos enquadrava o devedor e o credor de alimentos na parentalidade e conjugalidade (mesmas regras: a mulher estava como incapaz, sem discussão). Quando o casamento único passou a ser dissolúvel pelo divórcio, em 1977, passou a ter uma bifurcação no tratamento legal: a visão de emancipação, até aí, era concreta. A partir daí era possível que esse credor de alimentos renunciasse a esses alimentos (que não podia no CC16). A renúncia para o direito não é um exercício desse direito, tem que ser expressa, “que não precisa e que não quer exerce-lo”. No desquite (CC16), no âmbito no casamento indissolúvel, não podia haver essa renúncia; o divórcio inaugurou essa possibilidade de renúncia, pois estava num contexto social que poderia haver essa individualidade. De 1977 a 2002 toda jurisprudência havia se consolidado no sentido de que a irrenunciabilidade dos alimentos não se aplicava aos cônjuges (pois a lei determinava dessa forma). A CF88 traz a união estável, que foi tomando aos poucos a mesma situação de casamento, em termos de poder renunciar aos alimentos etc. Com a lei de divórcio, a irrenunciabilidade começou a ser aplicável para a CONJUGALIDE, e a regra do CC16, de renunciabilidade, continuou a regrar aos alimentos na PARENTALIDADE. O CC02 voltou a colocar tudo num capitulo só (conjugalidade + parentalidade) e inadvertidamente manteve a redação das regras do CC 16, principalmente quanto a regra da irrenunciabilidade. Quando se lê essa regra do CC02, não há clareza se o credor é parente, cônjuge, companheiro, aplicando-se a regra da renunciabilidade para todos, quando tudo já estava consolidado pela jurisprudência após a lei de divórcio. A jurisprudência continuou consolidando isso e ficou a cargo do intérprete restringir a aplicação dessa regra. Interpretando, ficou mais sensato “aplicar-se aos alimentos na parentalidade, e não na conjugalidade”. Dificuldade maior em saber na distribuição dessas regrais quais podem ser usadas para cada uma. Lei 5478/68: lei que trata da urgência do procedimento sumário nos alimentos. Provada a legitimidade, concede liminarmente a concessão, por presumir uma dependência econômica. Esse procedimento sumário se articula aos procedimentos do CC, e processualmente trata os alimentos em AÇÃO PRÓPRIA. Podem ser tratados, lembre-se, como cláusula de dissolução de divórcio ou em ação própria (por meio dessa lei) Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 4 Classificação dos alimentos A classificação dos alimentos retoma à discussão acerca da denominação. O que seria alimentos naturais e alimentos civis? Nessas terminações está implícito que os naturais seriam aqueles que atendem naturalmente ao que for de subsistência para a pessoa. Não se referem à classificação de forma de pagamento (in natura ou in pecúnia), não confundir. Estamos falando de classificação de CONTEÚDO. Por ser classificação de conteúdo, considera-se os naturais voltados à subsistência nos termos jurídicos (comida, educação, saúde, moradia, lazer, tratamentos gerais, dentro da disponibilidade do devedor). Não adianta um filho que nunca se movimentou exigir os alimentos e chegar aos 18 anos contra o pai querendo que ele pague o atrasado, porque eles não retroagem. A obrigação se estabelece A PARTIR DA ORDEM JUDICIAL. E os alimentos civis seriam aqueles que estariam voltados também à manutenção de subsistência, mas tem um PLUS que seria a tentativa de manutençãodo PADRÃO DE VIDA. Seriam mais amplos, portanto, do que os naturais. Com base nisso, QUAL É A REGRA GERAL E QUAL É A EXCEÇÃO? Regra geral: ALIMENTOS CIVIS (!!!) está NA LEI, mas a jurisprudência diz que são os naturais. Ideias trazidas pelo entorno da relação CREDOR e DEVEDOR, é uma relação privada de crédito e débito, deve-se verificar a necessidade do credor e a disponibilidade do devedor, ainda que essa disposição e necessidade estejam fora dos parâmetros tidos como razoáveis pela sociedade. Ex: 130mil para duas crianças com base nos alimentos civis: a reação social é a de que esse valor é excessivo. “Não precisam desse valor para sobreviver”, mas precisam sim para manter o padrão de vida de antes. Quando se olha o pedido de crédito de 130mil você repudia, antes mesmo de olhar a disponibilidade do outro. As maiores fundamentações é que são pedidos acintosos, quando a maioria da sociedade é miserável, desestruturada etc. Quando olha para o outro lado e vê que esses 130mil equivale a 20% do devedor de alimentos, chega-se à conclusão de que quem está com enriquecimento ilícito é o DEVEDOR. Quando se convive você não contabiliza, não sai guardando todas as notas fiscais. É claro que não tem nenhum credor de alimentos que tenha convivido com o devedor e vá se sentir plenamente contemplado com o mesmo padrão de vida que tinha antes, mesmo com esses 20%, mesmo que o valor seja alto do ponto de vista da sociedade geral. Na medida em que se depara com uma decisão judicial que traz todos os argumentos sociológicos para reconhecer ser acintoso o valor, essa fundamentação não é JURÍDICA. Não tem motivo nenhum, a não ser o fato da maioria da sociedade não viver nesse padrão. É preciso se desprender disso para fundamentar esse pedido, pois é uma relação privada. As obrigações do representante do credor têm que ser sim proporcionais, mas muitas vezes esse representante também dependia daquele devedor. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 5 Na jurisprudência isso é totalmente invertido, na lei os alimentos naturais são exceções que só podem se dar em duas situações. Atribuir a obrigação de prestar os alimentos naturais é quase que uma sanção, “vou deixar de receber os alimentos civis para receber apenas os naturais”. São as situações legais que admitem a obrigação de prestar alimentos naturais: 1. Quando o próprio credor de alimentos dá causa a sua condição de miserabilidade. Ele já recebeu tudo que era para ter recebido para conquistar a sua individualidade, ter sua aptidão e jogou fora. Os alimentos não devem servir para o parasitismo de ninguém. Ex: pegar tudo que recebeu e gastar em jogos de azar, comprometendo até mesmo a sua própria subsistência. 2. Cônjuge CULPADO na separação (Regina Beatriz). O cônjuge culpado tem direito a alimentos? A lei diz que tem, mas esses alimentos naturais só vão ser determinados se o culpado não tiver nenhum parente que possa arcar e se ele não tiver aptidão para o trabalho (desemprego não é inaptidão). Vê-se a inaptidão quando esse estiver acometido de alguma doença que lhe retira a aptidão + não tem parente. Essa pessoa não pode morrer. O inocente tem que pagar para sustentar. O cônjuge culpado pode ser credor de alimentos em situações excepcionais. Essas são as únicas exceções, na lei, em que os alimentos devem ser naturais. Todo o resto é alimento civil. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 6 Características dos alimentos 1. Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. § 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada 2. 3. → Possibilidade de revisão de alimentos: Ainda que haja, ainda, a legitimidade do credor e do devedor, a modificação da situação de disponibilidade e necessidade pode acarretar na revisão da obrigação de prestar alimentos. → Possibilidade de exoneração: Ocorre quando a necessidade não mais existe ou, embora exista, a pessoa não pode mais suprir. Aqui, há apenas a legitimidade do devedor. Art. 1.699. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo. Algumas possibilidades são trazidas de forma presumida, como, por exemplo, a ocorrência de um novo casamento ou União Estável. A exoneração não é automática, precisa de uma posição ATIVA do devedor para demandar a exoneração. Art. 1.708. Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos. Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor. O art. 1.708 colocou o Concubinato equiparado ao Casamento e à União Estável. O(a) concubino(a) é dependente do marido/esposa casado(a). Exemplo: marido pode pedir, por lei, que se exonere da obrigação porque a mulher é concubina de outro. O parágrafo único acima também traz a hipótese de exoneração quanto ao procedimento indigno em relação ao devedor. É uma hipótese em que, também, se exonera moralmente. Inclusive tem relevância no direito sucessório, como causa de exclusão na sucessão, como os casos em que o credor tiver sido autores/coautor/partícipe de homicídio doloso, ou tentativa, contra a pessoa do devedor, houver acusado caluniosamente ou incorrerem em crime contra a sua honra etc. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 7 4. Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. A obrigação alimentar não permite o uso da compensação como forma de extinção de valores devidos a título de alimentos com outros pagos por mera liberalidade do devedor. → Haver compensabilidade equivale a passar uma régua na disponibilidade e na necessidade, que podem ser diferentes. Não pode nem por acordo. Ex: “eu supro as necessidades do filho, e você supre as necessidades da filha”. Não pode, pois seria estabelecer um critério objetivo quando há características subjetivas a serem analisadas. → Essa incompensabilidade está implícita na própria lógica dos alimentos. Há um credito intransferível, de caráter personalíssimo. A incompensabilidade se relaciona com o princípio da igualdade e isonomia. Lembrar das discriminantes naturais, que devem ser consideradas na hora de ponderar a igualdade (material) no direito. 5. 6. Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide. Se o parente convocado não estiver habilitado a cumprir a obrigação totalmente poderá chamar outros parentes, de grau imediato, para concorrer no cumprimento da dívida alimentar. → Complementação do crédito por parentes legítimos: todos em linha reta ou colaterais até segundo grau.É uma condição proporcional à disponibilidade deles. Os avós paternos, se chamados, podem chamar à lide os avós maternos. 7. O princípio da irrepetibilidade é regra do direito alimentar que veda a devolução dos alimentos que já foram prestados. O entendimento doutrinário predominante nos demonstra que uma vez que os alimentos servem para garantir a vida e são destinados à aquisição de bens de consumo para assegurar a sobrevivência e não se permite se quer pretensão de que possam serem quaisquer momentos devolvidos. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 8 8. 9. A obrigação de prestar alimentos se dá com a fixação na decisão judicial definitiva. Não retroage à decisão provisória, nem para antes da demanda. 10. Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. → Como já dito anteriormente, a irrenunciabilidade só pode ser lida para a parentalidade. Quanto a conjugalidade, são renunciáveis (após a lei de divorcio). O código civil, nesse artigo, não fala qual credor seria, mas está pacificado que se refere à parentalidade. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 9 Outras questões: - Lei de alimentos gravídicos Mãe: seria aquela que se utiliza do golpe da barriga; presunção de má-fé; sociedade imatura para encarar a liberdade sexual da mulher. A lei admite que ela tenha dúvidas, que possa indicar os possíveis supostos pais (se relacionou com mais de um). Alguns doutrinadores apresentam a hipótese de litisconsorte, supostos pais integrando a lide para assumirem solidariamente os encargos quanto a gestação, e após o exame de DNA, definida a paternidade, o pai desobrigado, por não ser pai, teria ação regressiva. Estão em jogo dois bens jurídicos: patrimônio do suposto pai e a vida do nascituro. A lei teve por foco exclusivo a vida do nascituro. O que se pode resolver por via secundaria no sistema, fica de lado. Se os alimentos já trazem um procedimento sumario + urgente, essa lei tem que ser mais urgente ainda. Ação de investigação de paternidade + pensão de alimentos, ao invés de alimentos gravídicos, é mais célere para viabilizar o nascituro mas é pouquíssimo usada. Os arts. vetados foram acertados. O instituto dos alimentos gravídicos foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro no ano de 2008 pela lei 11.804 e assim foi possível o início de uma nova era no que diz respeito a valorização da dignidade do nascituro. Alimento gravídicos se trata de verba de caráter alimentar, o qual valor destinam- se as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, do momento da concepção ao parto, até mesmo as referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais necessidades prescritivas e terapêuticas os quais são indispensáveis a gestante, de acordo com o que o médico julgue necessário e que o juiz considere adequado. É uma norma a qual visa proteger a mãe e o feto, uma vez que se tratava de tal assunto com certa discussão, pois se exigia comprovação do vínculo de parentesco ou de obrigação alimentar, o legislador por sua vez nunca se manifestava e consequentemente, acabava por gerar controvérsias, retardando assim o reconhecimento dos alimentos durante a vida embrionária. Mesmo que timidamente alguns Tribunais aceitassem a obrigação alimentar antes do nascimento consagrando a teoria concepcionista, hoje já se trata de fato da responsabilidade parental desde o feto, suprindo assim uma lacuna a qual se encontrava na vida prática, e que alguns juizes não aceitavam por não estar devidamente expresso na lei. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 10 - Tese da riqueza aparente Vem se construindo doutrinariamente como mecanismo de cercar o devedor de má- fé, de se atribuir a verdadeira disponibilidade do devedor que, apesar da disponibilidade, tem capacidade de esconde-la. Você não pode presumir que uma pessoa que ande arrumada realmente detenha aquela condição, pois se essa aparência esteja por traz de uma situação bancaria muito comprometida. O dinheiro, aqui, está circulando para manter esse padrão ostentado sem grandes sacrifícios, deve se basear nisso, e não em uma riqueza que está por trás. Essa tese pode ser invocada na jurisprudência e pode ser bem trabalhada para suprir o devedor de má-fé que pode e tem disponibilidade. Para se apurar a verdadeira condição econômica do alimentante um dos remédios jurídicos utilizados é a aplicação da teoria da aparência, também conhecida como teoria dos sinais exteriores de riqueza, que consiste em analisar o modo de vida do pagador da pensão, e se este é compatível com sua renda declarada. Assim, havendo indícios que apontam para uma condição superior à que supostamente alega ter, estes servirão de elementos de convicção para o juiz quantificar os alimentos a serem pagos. A análise destes sinais exteriores de riqueza é possível pois a própria Lei de Alimentos - Lei 5.478/1961 - relativiza a apresentação de documentos para o pedido de fixação de pensão alimentícia. Na maioria dos casos, os documentos que comprovam a renda do alimentante são particulares e praticamente inacessíveis ao alimentário (pessoa que recebe a pensão). Portanto, não é justo exigir que esta documentação seja apresentada imediatamente para dar amparo a pretensão. Daí, a criação da teoria da aparência, que fornece mecanismos capazes de dimensionar o poder aquisitivo do alimentante, para que se forme uma equação mais justa entre quem paga e quem recebe pensão alimentícia. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 11 - Alimentos compensatórios Alimentos compensatórios visam estabelecer equilíbrio patrimonial entre os cônjuges, por ocasião do divórcio, haja vista que o fim da relação impôs um novo estilo de vida diferente daquele ao longo do casamento, ficando esta nova realidade social e econômica como motivo ameaçador do cumprimento das obrigações materiais e subsistência pessoal. Em sua essência, a prestação compensatória tem a finalidade de indenizar, seja por tempo determinado, ou não, aquele cônjuge que se viu em desvantagem econômica em relação a seu consorte, passando a conviver com redução em seu padrão socioeconômico, desde que este tenha ficado privado de bens quando da partilha dos mesmos. Com isso, percebe-se que a finalidade do instituto é aplicar, indiretamente, a contribuição indireta do cônjuge. A pensão alimentícia compensatória surge e ganha força no ordenamento jurídico brasileiro em consequência do comando constitucional de reparação das desigualdades entre ex-cônjuges/companheiros, sob o manto de uma necessária principiologia para o Direito de Família. O desfazimento de um casamento ou união estável, especialmente aqueles que se prolongaram no tempo e tiveram uma história de cumplicidade e cooperação, não pode significar desequilíbrio no modo e padrão de vida pós-divórcio e pós-dissolução da união estável. As normas jurídicas que dão suporte e autorizam a pensão compensatória advêm dos princípios constitucionais da igualdade, solidariedade, responsabilidade e dignidade humana. Nas sociedades capitalistas e patriarcais, é comum atribuir-se valor apenasà força de trabalho que produz mercadorias e rendas. Em outras palavras, atribui-se valor apenas àquilo que traduz um conteúdo econômico. E, assim, o trabalho doméstico, historicamente desenvolvido pelas mulheres, nunca recebeu seu devido valor. Nunca se atribuiu a ele um conteúdo econômico. Entretanto, não é possível a existência de sociedades e famílias sem esse necessário trabalho doméstico. Mesmo que se delegue a empregados os cuidados e fazeres domésticos, a administração, o cuidado, o olhar, o afeto e a energia ali despendida para que se crie filhos saudáveis, é necessário que, ao menos um dos pais se dedique mais a essa função. Contudo, como isso não gera renda ou produz dinheiro, tal função ganhou uma importância inferior à de quem trabalha fora de casa. E, assim, a importância e o verdadeiro valor da força de trabalho para a criação e educação de filhos são invisíveis. E, assim, a pensão compensatória surge como uma ação afirmativa para diminuir essas desigualdades. A obrigação alimentar compensatória se extingue com a morte do alimentário ou com a ausência de necessidade compensatória, seja em razão de abrupta queda da possibilidade do alimentante, seja pelo repasse integral de numerário, tornando-se isonômicas as realidades, ou mesmo pela desnecessidade do alimentário decorrente de fator superveniente ao padrão posto em análise no momento da fixação. (Rodrigo da Cunha Pereira – Conjur https://www.conjur.com.br/2017-fev- 05/processo-familiar-alimentos-compensatorios-nem-pao-vive-homem) Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 12 - Alimentos transitórios Por alimentos transitórios, tem-se um verdadeiro provimento destinado a assegurar temporariamente aquele que não pode garantir sua própria subsistência, até que venha a se inserir no mercado de trabalho e passe a auferir renda própria. Há, portanto, flagrante natureza alimentar até que parte que deles necessite consiga prover seu sustento, ressalvando-se que a leniência na procure de trabalho não poderá servir de motivo para se punir o alimentante. Os alimentos transitórios, entendidos como aqueles fixados ao ex-cônjuge ou ex- companheiro, a prazo certo, são aceitos como lícitos por parte da jurisprudência e da doutrina. Conquanto inexista lei específica sobre a possibilidade de concessão de alimentos a termo, segundo a doutrina e a jurisprudência, conforme aludido, eles são lícitos na hipótese de o alimentando ser pessoa com qualidades que possibilitem a aquisição de trabalho. Com efeito, sendo o ex-cônjuge ou ex-companheiro apto a conseguir autonomia financeira, em razão de condições pessoais favoráveis (idade, saúde, qualificação profissional etc), o alimentante poderá propor que a obrigação alimentar seja por tempo determinado, por exemplo, alguns anos, extinguindo-se automaticamente, transcorrido esse tempo. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 13 - Interdisciplinaridade, principalmente quanto a origem biológica da filiação por conta dos princípios da bioética e biodireito. Elementos na biologia, medicina e biotecnologia que fazem uma interface que trazem uma complexidade. Estado de filiação depende de um conceito relacional, precisa-se de pai e filho; mãe e filho, esse conceito relacional é defendido por Paulo Lobo, não há filiação com uma pessoa só, mas dela em relação a outra pessoa. Filiação SEMPRE diz respeito a duas pessoas. Existência de uma família padrão, pai-mãe-filho, a relação não existe de um para com outro pai→mãe→filho, mas sim pai→filho e mãe→filho, sendo o ponto de interseção em uma pessoa: FILHO, criando dois vínculos, mãe→filho e pai→filho. Todas as regras são BINARIAS, trabalham o limite máximo de dois pares. Independentemente de gênero, sempre dois, podem ser dois pais, duas mães, um pai e uma mãe, mas sempre dois. Todo o nosso sistema é estabelecido dessa forma. Repercussão geral que admitiu a possibilidade de quebra desse sistema binário pela multiparentalidade (STF), mas por enquanto vamos estudar as complexidades da binariedade e jogar essa complexidade na multiparentalidade para buscar soluções. São pressupostos para o estabelecimento do estado de filiação. O critério biológico pode criar um estado de filiação, assim como o socioafetivo que vem sendo valorizado para esse estabelecimento, e o critério jurídico que se baseia em PRESUNÇÕES de cojugalidade, presunções essas que independe de haver origem biológica e socioafetiva. No passado filhos seriam filhos se adviessem do casamento, fora dele não havia estado de filiação. No passado origem biológica e convivência familiar era de pouca importância para o mundo jurídico. FILIAÇÃO BIOLÓGICA RHN RHA CONSANGUINEA GENÉTICAJURIDICA (presunções) art. 1.597 (biológica e socioafetiva) SOCIOAFETIVA ADOÇÃO ADOÇÃO À BRASILEIRA POSSE DO ESTADO DE FILIAÇÃO Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 14 Manteve-se o critério das presunções da conjugalidade (jurídico) e fez-se uma releitura, ampliando outras possibilidades de filiações independente dessa presunção. Gera-se uma complexidade, na medida em que tinha critérios objetivos (casou? Sim? É filho, pronto). Era tão objetivo que o marido só poderia contestar a paternidade dentro de um prazo prescricional de 2 meses. Se não contestasse, seria pai e pronto. A ampliação começou pelos avanços da tecnologia, ampliação na filiação BIOLOGICA, trazendo uma verdade real mais aceitável do que a própria convivência familiar. Traz-se um dado real que não se pode renunciar. Analisando o nosso sistema: um homem que engravida uma mulher, pela nossa lei ele não pode simplesmente não querer ser pai, ele pode tentar se esquivar, mas podemos forçar o estado a força-lo à paternidade. Ainda que não haja casamento, pode ser voluntário e até mesmo involuntário. A mulher nem fugir pode dessa responsabilidade. O direto sempre houve essa certeza: mãe é aquela que gera e que vai parir. A maternidade é visível e aparente, a paternidade não. Por ser aparente, a maternidade sempre foi presumida como certa. Essas presunções sempre serviam para a paternidade, o direito não tinha como aferir objetivamente, então presumia. O direito sabia que aquele marido poderia não ser aquele pai biológico, mas como não podia aferir, simplesmente dizia que é o pai. O critério biológico, para a mulher, sempre foi mais oneroso, pois era para a mulher que está a proibição do aborto, não tem mais o direito de não ser mãe pela sua vontade, pois existe um outro ser que ela deve respeitar pelo nosso sistema jurídico, recebendo até mesmo sanções. Hoje imagina-se a possibilidade de não querer exercer, de forma legitima, quando admite-se que possa entregar em adoção. Essa entrega não pode ser feita a outro particular nem dentro da sua escolha, tem que ser feita ao Estado em circunstancias excepcionalíssimas. A mulher só tem direito de não ser mãe antes de engravidar; depois ela não tem direito, tem que assumir. Quando não quer assumir, tem o abandono como forma de extraviar ou pior. É uma descriminante natural. Na origem biológica, portanto, tem que imaginar o que ocorreu após as técnicas de reprodução humana assistida. Como que o filho é gerado biologicamente, naturalmente? Relação sexual [...]. O percurso é ininterrompível quando começa, a não ser pela pílula do dia seguinte. Interrompe o percurso fecundação → nidação etc. Esse caminho segue as etapas um atrás do outro, não tem como escolher. A complexidade da reproduçãoassistida (assistência medica, intervenção medica) começou a ser procurada quando surgiu um maior grau de infertilidade. No passado não havia? Talvez sim, mas talvez haja condições exógenas na atualidade que favoreça essa infertilidade. A reprodução assistida transferiu para o médico a possibilidade de manipulação de gametas. Com essa possibilidade, um poder inimaginável com relação a várias outras coisas questionáveis eticamente. É como se passasse uma procuração com amplos poderes para alguém e acreditasse que ela só fosse utilizar parte desses poderes, mas certamente ele teria poderes para utilizar tudo o que está disposto. A reprodução humana assistida está sujeita a limites éticos que foram construídos pelos próprios conceitos das sociedades e profissionais. Quais seriam e por quem são definidos? Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 15 Dificuldade: nossos centros de reprodução humana são livres, atuam sobre princípios éticos que eles mesmo escreveram, segundo os conselhos federais de medicina, eles têm um discurso ético e um discurso de limites, mas nós sabemos que essa força de Resolução não é uma força normativa imperativa, pois a sua fonte não adveio do Estado. Não há mecanismo de controle nesses centros, por isso ocorrem os extravios. Classificação dos sistemas jurídicos em matéria de reprodução assistida 1. Fechado 2. Aberta, que permite quase tudo, inclusive a mercantilização. 3. Semiaberto, ou semifechado, que autoriza umas e proíbe outras, proíbe aquilo que não pode controlar nem definir. Se o brasil fosse adotar, aposta-se que seria o semiaberto. Curiosamente, já houve inciativa de projeto de lei para isso, 15 projetos, sem definição. Porque há o interesse corporativista, não é interessante a classe medica ter controle e limites, e é uma atividade lucrativa, um viés nobre por um lado (aux. na perpetuação da humanidade) mas que é excessivamente cara. O sus possui esferas de auxilio, mas nos procedimentos mais simples, nos mais elaborados só quem tem acesso é quem tem dinheiro. Preocupante pois só há um parâmetro constitucional limitativo e por ANALOGIA, que é proibir a onerosidade nessas relações, pois há uma lei de transplante de órgãos que proíbe essa onerosidade, não pode vender órgãos, mas sim doar. Com base nessa analogia e limites, e também limites constitucionais em que o ser humano seja coisificado e objeto de contrato, há parâmetros constitucionais que ajudam a refletir sobre esses eles. Aparece a figura de uma terceira pessoa, envolvendo um material genético de terceiro, mas NÃO ENVOLVE ESSA PESSOA. Quando se fala de envolver outras pessoas, há dúvidas entre quem será a mãe: será a dona do óvulo ou a gestante? Mãe é a pessoa que teve a intenção de exercer a maternidade x característica igualmente biológica, que é a consanguínea. A reprodução humana assistida foi capaz de fazer a bifurcação do critério biológico, 1. pode ter filho consanguíneo, mas que não é geneticamente meu; 2. pode ter filho geneticamente meu, mas não consanguíneo. Nessa bifurcação, que está ligada ao critério biológico, qual prevalece? Questionamentos: Se a gestante consentiu em ceder o seu útero solidariamente para um projeto parental alheio ela não tem direito de ser mãe? Por que nesse caso pode entregar a um particular, e na questão da adoção não? Qual é o objeto desse contrato? Quais as obrigações assumidas? A gestante assume obrigações de não exercer direitos fundamentais, de não fumar, não beber, não tomar café, não se locomover, não sair do Estado sem autorização do outro contratante. Ao final assume a obrigação maior, objeto do contrato, entregar a CRIANÇA. Qual o objeto? O ser humano, seria um objeto ilícito, segundo os padrões. Tudo isso acontece sob a ótica positiva da mídia. tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 16 Realidade: gestantes pobres que recebem vantagem que não é dinheiro, mas sim uma moradia (que é um direito fundamental). O que isso significa? As mulheres que gestam não são parentes como sugestiona a resolução, mas sim pessoas do interior que DO NADA decide ser “SOLIDARIAS”. TECNICAS COMO DOACAO DE ORGAO OU DE MATERIAL GENETICO E GESTAÇÃO SUBRGADA (ou maternidade de substituição, barriga de aluguel etc.). não tem lei no Brasil. Regime fechado: países que não admitem essa técnica. Ex: países da Europa. Aberto: Índia. Semiaberto: Brasil. Nem quer proibir, pois tem alguém ganhando com isso, e não admite que isso se dê em larga escala, de autonomia plena e de forma onerosa. “Vamos fazer pois o que não é proibido é permitido”. A adoção dessas manipulações não vem com analises de que podem advir conflitos sociais. E se a gestante se arrepender e não quiser entregar? E se quiser entregar e os “pais” não quiserem receber? Entra-se numa seara que se permite e não sabe solucionar. Tem que ver o que isso significa no nosso contexto social. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 17 (art. 1.597) (03/05/2018) – Falta o começo da aula → Capítulo da filiação Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. Preceito constitucional de igualdade de filiação – repetição. Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. Artigo das presunções. Mais importante. O caput e os dois primeiros incisos vieram do CC16. Os demais foram inseridos no CC02. Antes x o que continuou. No CC16, essas presunções estavam sujeitas a prazos prescricionais restritos de 60 dias. O marido era o pai, mas se ele não arguisse no prazo de 60d, não podia mais negar. Qual era o propósito? Valorização da filiação socioafetiva, se enxergarmos esse art. hoje em dia. Poderia ser lido com a valorização dessa. Argumento que se baseia para negar essa paternidade = critério biológico. Hoje há teste de dna. Quando não tinha, tinha-se que dizer que não é pai pois não estava com a pessoa na época da concepção, porque era infértil, traz o exame etc. Tinha que buscar esses argumentos que demonstrassem ser impossível ele ser o pai biológico, hoje tem uma busca direta para descobrir. Será que esse teste é suficiente? O teste dizendo que não é pai é suficiente para não reconhecer a filiação? Não. Pode negar a paternidade quando a criança era recém-nascida ou quando já tiver convivido com a criança 10 anos? tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 18 O judiciário lida com um dilema: deferir o pedido de negatória diante da negatividade do dna ou indeferir, apesar da negativa do DNA pois já há vinculo socioafetiva. Jurisprudência: negatórias de paternidade que as promovidas pelo pai registral com o argumentoda negativa biológica, para ter que ser julgado procedente tem que vir acompanhada da declaração da ausência de convivência. Pode acontecer de o marido casar com a mulher sem saber que ela estava gravida de outro, e pensar que era o filho dele. Foi levado a erro. Mas pode ser o marido, saber que estava gravida de outro e querer assumir essa paternidade mesmo assim. Nesse caso, não há erro. Tudo isso tem que ser ponderado. No caso de ser recém-nascido, que não houve convivência, mas ele sabia que não era dele mas reconheceu, também tem desfavoráveis a procedência, pois não há erro. Se for estabelecer um critério objetivo a intensidade de convivência não se mede por tempo. Pode ser que tenha convivido intensamente por 2 anos, menos do que um que conviveu há 10. Tem que estar sujeito à perícia. Quando o legislador 2002 tornou imprescritível desvalorizou o critério socioafetivo, pois permitiu que ele possa contestar a qualquer tempo. Juridicamente, origem genética não se confunde com estado de filiação (Paulo Lobo). Origem biológica é importante, mas não exclusiva. Quando julgam improcedente, apesar da negação de dna, não está considerando origem biológica como critério absoluto para a definição. tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 19 Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: III - Havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; Fecundação | homologa | pós mortem Criopreservar. Casal que quer prevenir doença da prole etc. Congelou os óvulos/sêmen. Fala-se em patrimônio genético separado, seres que ainda vão ser fecundados; vai haver a união de gametas. Filhos nascidos que venham a ser unidos mesmo após a morte do marido, é filho desse mesmo assim. Quando se fala homologa significa material genético pertencente ao casal. Por que se presume algo tão evidente, biologicamente falando? Não há certeza biológica? Por que precisou presumir se há certeza biológica? Resposta: PORQUE NÃO É UMA PRESUNÇÃO (incoerência do legislador adicionar isso no rol das presunções). Há uma verdade biológica, material genético meu e do meu marido, o filho só pode ser nosso. Problemas: interesse da esposa viúva em dar andamento ao projeto parental que tinha com o marido. Juridicamente, traz alguns problemas: 1. Como vai acessar o material genético dele se é um material genético pessoal do que morreu? O que lhe dá o direito, enquanto viúva, de ter esse acesso? Ela não é herdeira desse material, muito menos esse é disposto pelo regime de bens. É preciso que haja um consentimento prévio escrito para isso, mas isso não é disposto nesse artigo. Essa elaboração é exterior à literalidade da lei. Para haver essa filiação é preciso que ele tenha autorizado. 2. Se a esposa tem a autorização, pode fazer isso a qualquer tempo após da morte do marido. Fala-se em um ser que, na época da morte, sequer estava concebido. É um filho que não tem direito sucessório, pois a capacidade para herdar na sucessão legitima a partir da concepção. São herdeiros as vivas ou ao menos concebidas. Na sucessão testamentaria, prole eventual que venha a surgir tem direito. Esse testamento só seria eficaz se, com a morte, esse neto viesse a ser concebido nos dois anos consequentes. Passou de dois anos, caduca a disposição testamentaria. Poderia até trazer esse prazo por analogia para esse artigo. 3. Essa viúva pode casar ou viver em união estável. Vai ter durante a nova vigência, um filho do ex marido? E as presunções do inc I e II? 4. Produção independente. Pode dar um pai registral para essa criança que não vai conviver com ela. Não é muito diferente da produção independente. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 20 IV - Havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; Concepção| embrião extraordinário | homologa| a qualquer tempo É material genético único, já está fecundado, quer saber quando pode haver a concepção (colocar no útero), diz-se que a qualquer tempo. Nem aquele prazo de dois anos pode-se trazer. Aqui foi onde suscitaram dúvidas sobre: 1. O embrião fecundado criopreservado tem o mesmo status do nascituro? Se sim, considera-se a possibilidade de herdar e requerer alimentos. Pode nunca vir a ser colocado em um útero. Possibilidade de pagar alimentos que sequer nunca venha a ser concebido. Obvio que é uma insegurança jurídica. Não pode ter o mesmo status do nascituro, pois pode vir a se tornar inviável, a nunca ser implantado, não tem expectativa de vida que o nascituro tem. 2. Por que é presunção se é material genético meu e do meu marido? Há casos em que o casal quer partilhar os embriões no divórcio. São bens? É patrimônio genético, ligado ao direito de personalidade, está unindo dois direitos de personalidade, logo um não pode utilizar se o outro não autorizar. V - Havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. Inseminação heteróloga | autorização do marido Traduz a filiação socioafetiva. O marido autoriza que a mulher fecunde material genético que não é dele e, está, por lei, assegurado. Jus et jure. Não há erro. Não admite prova em contrário, admitir que o marido possa negar após autorizar é venire contra factum proprium. TESE DE REPERCUSAO GERAL STF 622. A parentalidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica com os efeitos jurídicos próprios. (Não se aplica na adoção) Não resolveu nada, retornou para o judiciário. “Não impede” não significa que é obrigado, mas sim que “é permitido”, facultado. Permite a ponderação do magistrado a aplicar ou não, pois “não impedir não é obrigar”. Caso: uma criança tem um pai biológico e um socioafetivo (conflito positivo). Pela redação, parece que valoriza mais o biológico do que o socioafetivo, pois mesmo que não tenha convivido, pode ter o registro pelo simples fato de ser biológico. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 21 Caso que ocasionou essa tese: ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, de uma filha contra o pai biológico. Essa filha já não era menor de idade, tinha sequer interesse de criança e adolescente envolvido. Em razão de ser o pai biológico, mas era registrada e conviveu durante todo o temo com o pai socioafetivo registrado por mais de 20 anos. Entrou com ação pois esse socioafetivo não tinha como sustenta-la. Ela descobriu que o biológico era rico. Negado em primeira instancia pois nunca tinha convivido, seria uma demanda mercenária, na segunda instancia entrou na decisão na repercussão geral o stf decidiu que mesmo que não tenha convivido mas tem dna é o pai. Desvirtua o propósito da filiação e coloca em duvidas tudo o que estava muito claro na jurisprudência. (O STF é doido) Na inseminação heteróloga não pode ir atrás do pai biológico, pois o pai biológico sequer queria ser pai quando doou. Outra coisa: se esse registro do pai registral socioafetivo era um pai adotante, como o pai vaifazer parte se a lei de adoção diz- se que há desvinculação jurídica do filho com os pais biológicos? Se quiser inverter pode? Se disser que a paternidade biológica declarada ou não em registro não impede o reconhecimento baseado na origem socioafetiva. Ai estaria valorizando a socioafetiva. Mas a redação original escrita daquela forma não quer dizer que pode se inverter a redação original. Há quem olhe diferente para essa tese, dizendo que valoriza a socioafetiva pois pela primeira vez o STF não desfez a socioafetiva para incluir a biológica. Mas o caso foi desastroso, e o critério que foi adotado foi igualmente desastroso. Estamos revalorizando o critério biológico. (07/05/2018) Ex: registro como pai de uma pessoa há 10 anos, pode presumir uma socioafetividade, mas pode-se estar nesse registro sem ter convívio. Há possibilidade de quebra. Muitas vezes o registro civil pode presumir essa afetividade, mas pode ser quebrada. Essa avaliação de verdade biológica e verdade socioafetiva, esses são elementos que vem a ser provados no caso concreto, não é o oficial de registro que deve verificar essa verdade; deve-se verificar na esfera da jurisdição em que pode ser aferido. tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 22 Ex: prova de estado de filiação. A prova do estado de filiação se prova pelo registro civil. Se distingue da posse do estado de casado. A doutrina pegou essa posse de filiação e passou a trabalhar não como uma forma de provar esse estado, mas como CONSTITUIÇÃO desse estado. Posse do est de filiação = forma de filiação socioafetiva. Pode vir a ser constituída, mesmo que não tenha registro antes. No casamento, não há dúvidas de que o casamento houve. Aqui, pode-se afirmar que nunca houve registro, mas invoca-se os elementos que consolidam o est de convivência a ponto de estabelecer o est de filiação. O elemento intencional é irrelevante, o que vai configurar são os elementos da convivência familiar e não o fato de a pessoa ter adotado ou não. É uma situação de fato como a união estável, nessa você pode conviver com uma pessoa e entre uma tem certeza que só está namorando e a outra não, se não chegarem a um acordo o que se considera da existência ou não, o que confirma são os elementos externos independentemente da vontade. Nas hipóteses de filiação socioafetiva tem-se filiação a brasileira [...outro] e posse do estado de filiação. O fato do direito passar a conhecer a socioafetividade como uma realidade empírica não tira a existência do vínculo biológico, que também existe. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 23 Qual a funcionalidade do capitulo de reconhecimento dos filhos? Art. 1.607. O filho havido fora do casamento pode ser reconhecido pelos pais, conjunta ou separadamente. Maria Helena Diniz: o adultério da mulher é mais grave do que o do homem, pois o primeiro traz para o homem o ônus da obrigação do marido. Traz para o marido uma filiação que não é dele. O filho tido pelo marido de uma relação adulterina fica lá, o ônus fica fora. Esse filho desse capitulo é esse que pode vir de qualquer dessas relações. Em conjunto ou separadamente. Vem a ideia de que para a lei a maternidade é sempre certa, exige para a mãe a prova da gestação/parto. A mãe pode facilmente ser solteira, viúva ou divorciada, e chegar com a prova e registrar o filho só no nome dela. É possível que o pai biológico reconheça essa filiação e vá junto com ela registrar. Diferente da mulher casada que para isso só precisa mostrar o registro de casamento. → Procedimento de averiguação oficiosa = faz de tudo para que esse reconhecimento seja voluntário. Notifica-se a pessoa e, se confirmar “sou eu realmente o pai”, há reconhecimento voluntário. Momento em que instaura esse procedimento de averiguação; se tem dúvida tem que abrir o processo e remeter para o juiz ligado aquele oficio. Manda chamar a pessoa, jurisdição administrativa. Se continuar apresentando duvidas, o juiz remete ao MP, que tem legitimidade para propor a ação de investigação de paternidade. O MP judicializa, forma compulsória de reconhecimento, nesse processo faz-se a perícia etc. para confirmação ou não por parte do critério biológico. → Ação de investigação de paternidade = fala-se em uma investigação de paternidade biológica; não se investiga paternidade socioafetiva. Na socioafetiva há reconhecimento, há uma prova pós constituída, declaração de que há, não busca investigar. Só se investiga a verdade real biológica. Todas as ações declaratórias de maternidade e paternidade tem por fim a fixação da filiação registral por base na socioafetiva, de forma que esse reconhecimento for posterior ao da mulher não importa, o próprio artigo diz que pode ser em conjunto ou separadamente. Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 24 O reconhecimento da filiação fora do casamento não se dá apenas pelo oficial de registro, é possível que outros instrumentos sejam legítimos para reconhecer o est de fil. Art. 1609. Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: Vimos atrás que a pessoa só pode modificar o registro se houver erro ou falsidade. Não pode mudar porque quer. Por isso que está o “caráter irrevogável”. Se reconheceu o filho, não pode simplesmente negar posteriormente. Por isso que a adoção à brasileira, registro que se faz mediante a falsidade com relação a origem biológica, tem recebido tratamento jurisprudencial negativo quando o pai registral promove a ação negatória de paternidade. É uma via de mão dupla: o pai pode vir a ação negatória de paternidade e o filho também poderá impugnar. I - no registro do nascimento; Prova, por excelência, da filiação. Na doutrina e jurisprudência essa verdade pode ser uma verdade socioafetiva. Segundo a lei, essa verdade é uma verdade biológica. Pode-se chegar em um oficial e solicitar o registro porque é filho socioafetivo. Ponto: qual seria a diferença disso para à adoção a brasileira? No ponto de vista social, sistêmico, é como se o CNJ estivesse admitindo a adoção a brasileira com registro, enquanto o código penal tipifica como crime. Pode ter uma boa intenção mas pode trazer consequências graves. II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório; O pai pode deixar por escrito desde que seja documento autentico, ou deixar em cartório que pode servir a qualquer momento como documento para esse reconhecimento. Serve para qualquer fim. O legislador quis informalizar mais a possibilidade de reconhecimento. Esse escrito particular ou público não altera o registro, apenas é uma forma autentica de reconhecimento que pode levar ao oficial e ele é obrigado a aceitar, basta ele aferir a autenticidade. III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado; O testamento, por natureza, é um negócio unilateral revogável. Reconhecer o filho dentro do testamento é o mesmo que definir como um ato irrevogável (reconhecimento) dentro de um outro ato revogável (testamento). Ainda que depois revogue o testamento e chegue no novo e diga que o filho não é mais o filho, não vai ser revogado, pois há uma distinção do documento do testamento para disposiçõestestamentarias. Para revogar tem que ver se todas as disposições testamentarias são revogáveis. Observar Art. 1.610: O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito em testamento. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 25 IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. Presta declaração de determinado processo judicial que não tinha essa finalidade mas, no correr, eu reconheço. É uma prova como instrumento público qualquer e se levar a registro. Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes. Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação. O reconhecimento é ato a ser praticando pelos pais, enquanto menor não tem vez para consentir, a não ser que a mãe, o representando, impugne dizendo que não é pai (se fora do casamento, se dentro ela não pode dizer isso). Se reconhecer um de maior tem que haver consentimento, ainda que haja prova de dna. Prazo: “maior pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade”, ou “à emancipação” (nesse último não se exige o prazo). Entendimento pacificado: Embora o artigo determine o prazo, da mesma forma que o pai não tem prazo para impugnar a paternidade, o filho não tem prazo também, está pacificado. É o reverso da negativa de paternidade, chance que o outro tem para negar também. Art. 1.611. O filho havido fora do casamento, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem o consentimento do outro. Artigo com constitucionalidade questionada. Presunção genérica. Direito à convivência prevalece. As vezes pode ser mais prejudicial para a criança, mas deve ser resolvido no caso concreto. A anuência não pode ser uma condição sine qua non. A vontade do legislador era falar dos filhos adulterinos, mas com a mudança do contexto social, desde o CC16, essa interpretação é mais ampla: enteados etc. A pessoa pode optar por continuar ou não a conjugalidade, mas não pode interferir na parentalidade do outro cônjuge com o filho. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 26 (08/05/2018) Evolução Histórica A influência da civilistica romana no nosso sistema é um elemento importante. Na antiguidade do direito romano, a filiação socioafetiva era muito mais valorada do que a biológica, tinha um lugar de destaque com relação a biológica, pois a família romana se caracteriza pelo culto doméstico, que era uma família que se reunia em casa passando seus valores e influencias, delegando ao primogênito o poder de repassar esse fruto doméstico para os demais descendentes. Problema: quando a família não tinha descendentes primogênito masculino, pois a mulher não se investia desse poder legitimado pela família. Era comum adotarem o primogênito, para que ocupasse aquele lugar. Esse, por sua vez, exercia uma hierarquia sob os demais; a questão não era a origem, mas o sui generis masculino. Reflexão: adoção como um pacto entre o Estado falido e a sociedade. → CC/1916: atendimento ao interesse do adotante, maiores de 50 anos, s/ prole A legislação civil em 1916 assume dentro do critério de que a família ideal era a biológica, e que a adotiva seria uma supletiva, família a ser buscada apenas SE a família biológica não pudesse se propagar, servia como um consolo, atender o interesse não do adotado, mas dos adotantes que não puderam ter filhos. No primeiro formato a adoção se servia a isso, atender interesses dos adotantes e só poderia ser promovida por casais que estavam +50 anos (um deles, não precisava que ambos tivessem essa idade) e não tivesse prole. Era uma presunção de que não terão mais filhos a partir dali pela queda da fertilidade. Essa adoção era uma permissibilidade do adotante exercer seu projeto parental e o Estado não tinha interesse em supervisionar isso, era ADOÇÃO SIMPLES a denominação, feita por escritura pública no cartório de notas no interesse do adotante. Se deixasse de ser interesse do adotante podia ser revogada. Tinha uma essência de ordem privada muito grande. → Lei 3.313/57: finalidade assistencial em prol do adotado; maiores de 30 anos, c/ ou s/ prole. Começou a ter certa finalidade assistencial para a adoção. Voltou os olhares para o adotado, ainda que não fosse o principal, a ideia de ajudar uma pessoa carente, projeto de caridade começou a permear a adoção. Não seria mais só para dar filhos a quem não tinha, mas para ajudar uma pessoa que precisava. A idade foi modificada para 30 anos. A maioridade era 21 anos, mas só quem podia era 30. Flexibilização em relação a prole também, podendo adotar quem já tinha filhos e quem não tinha. O direito sucessório era desigual, o adotado tinha direito à metade do quinhão hereditário e o biológico 100%. tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 27 → Lei 4.655/65: legitimação adotiva - igualdade Estabeleceu critérios de igualdade. Já que pode adotar, que tenha os mesmos direitos. Note que isso ocorreu antes de 1988. A igualdade de filiação chegou antes do que a igualdade de gênero e igualdade conjugal. → Lei 6.697/79: Código de Menores – adoção plena Inaugurou-se um microssistema. Não houve alteração do CC, mas sim a instalação de um microssistema, codificação à parte com preocupação apenas com os menores. Esse código era muito mais voltado a caracterizar os aspectos infracionais e estabelecer critérios de recolhimento de menores infratores do que propriamente com a criança ou adolescente. Entende-se que essa terminologia “menor” é pejorativa. Didaticamente ficou tão entranhado que o menor era sempre o “menor infrator”. Em relação a adoção, esse código trouxe uma modificação importante, trazendo a ADOÇÃO PLENA. Não excluiu a adoção simples, mas introduziu outra. Seria realizada com uma maior intervenção do Estado, e esse estava finalmente intervindo no arrependimento, determinando a irrevogabilidade. A pessoa vai entrar no seio da família para sempre, de forma plena. Estabeleceu que os vínculos com a família de origem se rompesse. Começa a retirar a autonomia do adotante. Começou uma publicidade de incentivo à adoção. Começou a surgir os projetos de apadrinhamento, um clamor do Estado para que a sociedade “ajudasse o Estado incompetente, que não pode assumir a responsabilidade com seus cidadãos”. Tendo em vista a responsabilidade trinaria (família, sociedade, Estado), na prática a propaganda era do tipo “apadrinhe uma criança para passar o natal/férias com você”. Nesse contexto, era uma escolha do Estado falido, a ideia de que era “menos ruim”: crianças que saem do abrigo, se enchem de esperanças e vão voltar para a dura realidade. Não seria ruim? Sim! Mas essa “ruindade” foi ponderada, pois a estatística na época falava que, de dez crianças apadrinhadas, duas resultavam na adoção. Isso seria o “menos ruim”, os oito que voltaram foi ruim, mas pelo menos dos dez, alguém escapou. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce JulianaAguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 28 → CF/88 – Art. 227 §6 A CF88, depois do Código de Menores, representou a total intervenção do Estado nos interesses da adoção e apresentou o lado de ordem pública da adoção. Não é apenas uma forma de filiação, mas uma estratégia pública: o Estado admite ao particular uma responsabilidade que não pôde assumir. Por isso ocorre turismo de adoção nos países de baixa estrutura onde tem crianças para serem adotadas. Na prática, apenas países subdesenvolvidos e em desenvolvimento têm grande índice de adoção. É isso que justifica o estado intervir com regra própria para adoção. Não posso te sustentar, mas como é o particular que vai fazer isso, preciso garantir que esse cumpra essa função. Não posso permitir que o particular te trafique e venda seus órgãos e lucre com você. Tento garantir nessa intervenção que a coisa seja feita de forma a atender de forma máxima possível os critérios de dignidade da pessoa humana. O Estado começou a entrar realmente nessa questão particular, pois era muito frouxo até então. A adoção simples ainda não foi revogada. Até 2002, ficou com adoção simples e adoção plena. Porém, a adoção plena era apenas para a criança e adolescente. Em outras palavras, se fosse criança ou adolescente, a adoção só poderia ser na modalidade plena. A adoção simples era usada pra pessoas maiores, ainda feita por escritura pública, a lei civil ainda permitia. Somente o CC02 revogou totalmente o CC16. Caiu em desuso, mas do ponto de vista formal só foi revogado em 2002. Até então, se adotava com o costume da adoção, a adoção à brasileira é um desvio de comportamento, uma fuga da burocracia que muitas vezes tem intenção nobre, mas o Estado não está supervisionando se a intenção é nobre ou não, o Estado começou a fechar. Além de ter capacidade para adotar, tem que estar apto, e o Estado que decide se está ou não, aí que está a habilitação. → Lei 8.069/90 – ECA Acabou a adoção simples. Toda adoção é plena, seja para maior ou para criança/adolescente. A competência jurisdicional é distinta: vara da infância e da juventude, para crianças e adolescentes, e vara de família, para maiores de idade. Os maiores têm que consentir para que a adoção ocorra, e em ambas tem que haver processo judicial, não pode ser feito diretamente no cartório, como ocorria na adoção simples. A adoção à brasileira, decorrente de um costume que é só brasileiro, começou a ganhar força na esfera familiar, em razão da nobreza, mas não pode esquecer que toda vez que uma criança ou adolescente estiver sendo negociada entre particulares, o Estado deixa de exercer seu papel de proteção para evitar o tráfico. Há uma razão de ser para que a lei começasse a fechar os caminhos. Habilitação = atribuir mais do que capacidade, mas também aptidão material e imaterial para adotar. tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 29 → Lei 12.010/2009 Essa lei começou a valorizar a paternidade responsável, a família e a origem. Trouxe um conceito diferente de família: FAMÍLIA EXTENSA. Era uma família que sai da esfera nuclear e vai para os parentes. A criança, antes de ingressar no cadastro, tem que ser ofertada a parentes. Mais do que isso, essa família tem um conceito para além do parentesco. O ECA diz que a família extensa engloba toda aquela pessoa que guarda convivência e afinidade, mesmo que parentesco não haja, tudo em prol de não mudar tanto a realidade da criança e de que se mantenha perto de pessoas que conhecem, mas pessoas que tenham tal aptidão. Ex: padrinho, madrinha etc. Deu uma valorização ao parentesco de origem. O foco da adoção mudou de foco, não quer saber se não tem filho, mas sim que essa criança precisa de uma família e você é a pessoa mais adequada. Não deve ser feito friamente com uma decisão judicial, por isso tudo na esfera da criança cabe o centro de apoio psicossocial. → Lei 13.509/2017 Como se o Estado tivesse saído da política de “adote uma criança” e chegar e dizer: “crie seus filhos, por que você quer adotar? ”. Acaba por desestimular a paternidade responsável. Tem que criar um elemento de responsabilidade, uma ponderação que o estado sentiu falta. Só vai para o cadastro de adoção aquela criança que não pode ficar de forma alguma na esfera da família extensa. Houve uma queda na curva de adoção. Pode ter sido ruim pois pode implicar no acumulo de menores em abrigo, nem na família extensa, nem entrar no cadastro. A lei estabeleceu prazos para que houvesse apoio psicossociais. Na pratica, pode até mesmo resultar em uma vulneração maior da criança, ao preferir que ela fique na família biológica/extensa, pois muitas vezes a realidade dessas famílias é muito cruel: adolescentes grávidas, dependência química, sem família para criar. Presunção de que essa criança pode ser abandonada, morta, possa sofrer um dano maior do que ser entregue à adoção etc. tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 30 (10/05/2018) A lei de 2017 veio detalhando bem o procedimento, como deve ser. Observa-se que exige do estado uma não tem: acompanhamento da gestante, equipe multidisciplinar, entrar em contato com a família extensa, ir atrás do pai. Na pratica, não é feito dessa forma na maioria dos casos, principalmente no interior dos Estados. → Parto anônimo: figura da idade medieval. As mulheres solteiras engravidavam, as famílias as colocavam no convento durante a gestação para que não fossem vistas. Ao final, colocavam a criança em uma roda de madeira, na frente do convento, para que as pessoas pudessem passar para pegar as crianças. A mãe ficava anônima. Aqui no Brasil há um projeto de lei para que ocorra isso: ter o filho, deixar no berço e sair sem deixar o nome, para que o Estado assuma. Nesse caso, não poderia a mãe ser criminalizada por abandono, e mais uma vez estamos no preceito do “menos ruim”. Lei 13.509/2017. Art. 19-A. § 5o Após o nascimento da criança, a vontade da mãe ou de ambos os genitores, se houver pai registral ou pai indicado, deve ser manifestada na audiência a que se refere o § 1o do art. 166 desta Lei, garantido o sigilo sobre a entrega. § 9o É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei. OBS: Essa lei de 2017 esvazia o projeto de lei do parto anônimo, pois esmiuçou mais a questão da entrega da gestante para o Estado. O artigo, ao definir que “é garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento [...]” ocorre uma relativização do parto anônimo, que é definido pelo completo anonimato, sem qualquer registro dos dados da genitora. Aqui, a criança terá o nome da mãe em sua certidão de nascimento, a qual será retificada em caso de adoção. Essa lei altera alguns dispositivos do ECA. A ressalva feita ao final, acerca do art. 48, diz respeito ao direito que o adotado tem de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos. Esse artigo se explica pois, ainda que naturalizemos a adoção, a curiosidade sobre de onde viemos é inerente ao ser humano, por isso não há a proibição disso. Essa lei de 2017, com relação à gestante, veio a dar uma força maior à regulamentação do “parto anônimo”, mas manteve o paradigma da adoção excepcional. Essa lei alterou uma série de prazos, ainda, para dar caráter de urgência, dentre eles havia um prazo em que ojuiz aplicava e que, agora, passou a ser determinado pela lei: o prazo de Estado de convivência. Então. O primeiro requisito para adoção: só pode adotar se tiver cadastrado. No momento em que é encaminhado o perfil, vou pegar a criança, iniciado o processo judicial, inicio o processo de convivência. Esse estágio tinha um prazo relativizado pelo juiz. Hoje, a lei diz que o prazo é de NO MÁXIMO 90 DIAS, observado a idade da criança e peculiaridades do caso concreto. É um prazo limitado. tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 31 Na adoção nacional, os pretendentes estão domiciliados no território nacional. Ainda que uma pernambucana queira um perfil, e só encontre essa criança no Paraná, ela terá que ser direcionada para o Paraná para ver a criança na instituição. Na adoção internacional, o pretendente é domiciliado fora do território nacional. O rigor é maior. Aquele que mora fora é obrigado a cumprir o estado de convivência aqui no território nacional. A lei dizia, antes, que esse estágio era de no mínimo 30 dias, não estabelecendo o máximo. Trazia uma variação enorme de caso para caso. Agora, a lei estabelece o MÍNIMO DE 30 DIAS de estágio de convivência para a internacional, estabelecendo, também, o MÁXIMO DE 45 DIAS, podendo ser prorrogado por igual período 1x. O estado diz “agora isso tem que acabar, tem que ter um fim”. Essa lei determina a celeridade, o processo de adoção não pode ser infinito, O PROCESSSO DEVE DURAR NO MÁXIMO 120 DIAS, prorrogável por igual período 1x apenas. Se for um casal que tiver adotando, a convivência tem que ser por ambos. Uma pessoa com conjugalidade não pode adotar sozinho, sem que o outro seja avaliado, pois essa pessoa adotante pode ter toda a idoneidade do mundo e o outro não. Uma coisa que se modificou, também, foi a ordem de cadastro de perfil. Qual a ordem do cadastro? Como essa ordem vai ser atendida? Quem está em primeiro lugar? R: Não é uma ordem cronológica, pois depende do perfil. Pois se meu perfil é diferente do seu, estamos em ordens distintas. A adoção internacional é excepcionalíssima, pois a adoção, por si só, já é excepcional; a internacional, portanto, é excepcional da excepcional. Antes da criança ir para a opção de cadastro internacional, todos os pretendentes do cadastro nacional tinham que ser consultados sobre aquela criança que estava sobrando, ainda que não fosse no perfil indicado por elas. O Estado tinha que esgotar todas essas consultas. Agora, essa consulta não é necessária, tem que ser feita apenas se encaixar no perfil. Se o estrangeiro não indica perfil difícil, basta verificar se esse se encaixa em algum dentro do cadastro nacional. Se não, não vou consultar mais ninguém. Ao invés de consultar os pretendentes, já faz um remanejamento presumindo isso. No ingresso do cadastro dos adotados, quem é a criança que vai entrar? R: É aquela criança que já se tentou de todas as formas manter na família extensa. Ela tem prioridade se tiver deficiência. Tem várias crianças para entrar, mas só tem vagas para x crianças. Entra as que tem algum problema de saúde. Uma coisa importante que se alterou na adoção internacional foi que, antes, não fazia diferença no país de origem. O processo de habilitação do pretendente internacional é feito pela autoridade central, secretaria do ministério da justiça, a comissão é responsável por analisar a documentação, que tem que ser expedida no país de origem através de instituições que são cadastradas pela autoridade do Brasil. O adotante precisa apresentar atestado de sanidade física e mental, comprovando a idoneidade, emitido por instituição credenciada à autoridade central. Toda essa documentação tinha que ser oriunda de instituições legitimadas, traduzida por tradutor juramentado. Essa comissão tinha que estudar a legislação do país de destino e a daqui para ver se não tem incompatibilidade, e se o menor vai ter o mesmo tratamento. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 32 Essa lei de 2017 determinou que só pode adotar os que são de países signatários da Convenção de Haia, países que em que, em seu território, já houve aderência aos mesmos valores e preceitos. Não houve a dispensa da análise da legislação. Modificou-se em 2017, também, a terminologia. De “família substituta” para “família adotiva”. Quis se acabar com a ideia de que substituir é suprir, é supletivo. Art. 197-E. Deferida a habilitação, o postulante será inscrito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo a sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem cronológica de habilitação e conforme a disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis. § 1o A ordem cronológica das habilitações somente poderá deixar de ser observada pela autoridade judiciária nas hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quando comprovado ser essa a melhor solução no interesse do adotando. § 2o A habilitação à adoção deverá ser renovada no mínimo trienalmente mediante avaliação por equipe interprofissional. § 3o Quando o adotante candidatar-se a uma nova adoção, será dispensável a renovação da habilitação, bastando a avaliação por equipe interprofissional. § 4o Após 3 (três) recusas injustificadas, pelo habilitado, à adoção de crianças ou adolescentes indicados dentro do perfil escolhido, haverá reavaliação da habilitação concedida. § 5o A desistência do pretendente em relação à guarda para fins de adoção ou a devolução da criança ou do adolescente depois do trânsito em julgado da sentença de adoção importará na sua exclusão dos cadastros de adoção. A redação anterior do § 2o era: “A recusa sistemática na adoção das crianças ou adolescentes indicados importará na reavaliação da habilitação concedida”. No mais, o pretendente não pode escolher a criança. Ele indica o perfil, é direcionado à criança que tem esse perfil. Pode olhar e dizer que não quer. Nessas hipóteses, antes da nova redação, a habilitação iria ser reavaliada. Agora não, ele tem que renovar a habilitação de qualquer jeito, que não depende da recusa, tem que ser de três em três meses. Quando o adotante se candidata a uma nova adoção, será dispensável a “renovação” da habilitação. Já a “reavaliação” só vai ocorrer quando houver essas três recusas. Quanto ao § 5o, até então, tínhamos a ideia de que a adoção é irrevogável. Quando a redação dispõe que “ou a devolução da criança ou do adolescente depois do trânsito em julgado da sentença de adoção importará na sua exclusão dos cadastros de adoção” está admitindo a revogação, está dizendo que é revogável. A única sanção que se está dando é que não pode mais adotar. tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce tst Realce Juliana Aguiar Leal – Unicap Direito de Família – 2018.1 33 1. Adoção nacional a. Adoção Unilateral x Adoção Singular Pode ter a unilateral, que são os casos de padrastos e madrastas com relação ao filho do companheiro; pode ser singular, feita por uma única pessoa, necessariamente solteira, viúva ou divorciada. b. Adoção póstuma Há também a adoção póstuma, são aquelas que tiveram início durante a vida e, no curso do processo, o adotante veio a falecer. Surge algumas polêmicas: a lei faculta que esse processo vá a termo final. Como a adoção é plena, insere o adotado em todo o seio da família do adotante. A morte não vai
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