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O ESCOPO E O MÉTODO DA ECONOMIA POLÍTICA1 Por John Neville Keynes CAPÍTULO I - INTRODUTÓRIO §1. Natureza e importância da investigação sobre o escopo e o método da economia política. – Nos termos economia e econômico existe uma ambiguidade que está por trás de boa parte da atual confusão quanto à natureza da economia política. Qualquer linha de ação é comumente designada econômica quando alcança seus fins com o menor dispêndio possível de dinheiro, tempo e esforço; e por economia compreende-se o emprego de nossos recursos com prudência e discernimento, de maneira a extrair deles o maior retorno líquido de utilidade. Mas as palavras são também usadas em um sentido que não implique qualquer adaptação especialmente razoável de meios a fins; e nas obras sobre economia política o termo econômico é geralmente empregado simplesmente como um adjetivo correspondente ao substantivo riqueza. Por um fato econômico, por conseguinte, compreende-se qualquer fato relacionado ao fenômeno da riqueza. Por atividades econômicas entendem-se aquelas atividades humanas que se direcionam para a criação, apropriação e acumulação da riqueza; e por costumes e instituições econômicas, os costumes e as instituições da sociedade humana relacionados à riqueza. Economia política ou economia é um corpo de doutrinas relacionadas a fenômenos econômicos no sentido acima; e o propósito das páginas a seguir é discutir o caráter e o escopo dessa doutrina, e o método lógico apropriado para o seu desenvolvimento. Na intenção de definir o escopo de qualquer campo de estudo, o objetivo em questão é primariamente determinar os aspectos distintivos dos fenômenos com o qual ele lida, e do tipo de conhecimento que busca acerca desses fenômenos. A investigação também envolve uma análise das relações entre o estudo em questão e ramos cognatos de estudo. Ao passar para a consideração do método, lidamos com um ramo da lógica aplicada, sendo o objetivo determinar a natureza dos processos lógicos especificamente apropriados para o estudo – isto é, os métodos de investigação e prova dos quais possam fazer proveito – e o caráter lógico das conclusões implicadas como resultado. A discussão que se segue pertence, então, ao que podemos chamar de filosofia ou lógica da economia política, e não nos faz avançar diretamente no conhecimento dos fenômenos econômicos em si mesmos. Por essa razão, certa impaciência é ocasionalmente sentida quando uma discussão desse tipo é proposta. O que nós queremos, dizem, não é mais conversa sobre método, mas, ao contrário, aplicações úteis do método correto; aumentem o nosso estoque atual de verdades econômicas, ao invés de se entregarem a disputas estéreis sobre a maneira como as verdades econômicas devem ser obtidas. A essa objeção o especialista em lógica deveria responder que a investigação tem de qualquer modo algum grau de significância, se não econômica, lógica. Mas ela também tem importância econômica. Um momento de reflexão mostrará que, do ponto de vista da própria economia política, 1 KEYNES, J. N. The Scope and Method of Political Economy. Batoche Books: Kitchener, 1999 [1890]. Capítulo Introdutório traduzido por Júlio César Afonso Rodrigues e João Leonardo Medeiros, para fins didáticos, como parte do programa de monitoria em Pensamento Econômico III (2016) / UFF. Não citar ou reproduzir sem autorização. 2 é de importância ímpar que seu escopo e método sejam corretamente compreendidos. Existe, para começar, uma ampla confusão corrente quanto à natureza das leis econômicas; e por essa razão, entre outras, é imperativo que o economista procure definir da maneira mais acurada possível a natureza e os limites da sua esfera de investigação. Não deve haver qualquer imprecisão na questão sobre se a economia política está preocupada com o real [actual]2 ou o ideal, se ela trata meramente do que é, ou pergunta ademais sobre o que deve ser, prescrevendo regras para a obtenção daqueles fins proclamados desejáveis. Mesmo que investigações teóricas e práticas sejam ambas incluídas em seu escopo, ainda assim a distinção entre as duas, e suas mútuas relações, precisam ser claramente e inequivocamente estabelecidas. Incompreensão sobre esses pontos levou à incompreensão das próprias verdades econômicas, e consequentemente debilitou a influência e a autoridade da ciência econômica. Em seguida, quanto ao método, é dito que, ao invés de discutir sobre qual método de investigação é certo, é melhor exemplificar o método certo empregando-o na obtenção efetiva de novas verdades econômicas. Mas estamos então levantando a questão de sua correção? No longo prazo, o tempo não poderia senão conduzir para um estudo preliminar dos instrumentos de investigação a serem usados, da maneira correta de usá-los, e dos tipos de resultados que eles são capazes de produzir. Porque na medida em que os métodos de raciocínio são usados sem o devido cuidado sobre sua validade, os resultados atingidos devem igualmente ser de validade incerta, e o progresso do conhecimento econômico, ao invés de avançar, será retardado. O processo, ademais, por meio do qual uma conclusão é alcançada afeta seu caráter e valor, e as qualificações e limitações às quais está sujeita devem ser aceitas. Se for meramente empírico, então ela será estabelecida apenas com maior ou menor grau de probabilidade, e não poderá ser estendida para muito além do alcance do espaço ou tempo no qual foram coletadas as variáveis em que se baseou. Se, por outro lado, ela é obtida dedutivamente, então será hipotética até que seja determinado em que medida, e sob quais condições, as suposições que a apoiam são de fato realizadas. Foi plausivelmente argumentado que a grande fraqueza de Ricardo foi a de não compreender claramente a verdadeira natureza de seu próprio método. Em boa medida, ao interpretar seus resultados, ele não tomou as precauções necessárias para prevenir concepções errôneas da parte de muitos dos seus leitores. É verdade que uma coisa é estabelecer o método certo para desenvolver uma ciência, e outra coisa muito diferente é ter sucesso em desenvolvê-la. É verdade também, como o economista austríaco Menger assinalou, que as ciências foram criadas e revolucionadas por aqueles que não pararam para analisar seus próprios métodos de investigação. Ainda assim, seu sucesso deve ser atribuído ao fato de terem empregado o método correto, mesmo que o tenham empregado inconscientemente ou que não tenham se desviado para caracterizá-lo. Seu método deve, além disso, ser sujeito a uma análise cuidadosa antes que o valor de suas contribuições para a ciência possa ser propriamente estimado. A economia não é de forma alguma peculiar ao requerer que seu método deva ser discutido. A lógica de outras ciências é, entretanto, em sua maior parte suficientemente tratada em trabalhos gerais sobre lógica ou metodologia. Há razões especiais, a serem encontradas parcialmente na natureza própria do assunto, e parcialmente devido a causas extrínsecas, que explicam por que a lógica da economia 2 [N. T.] O termo original é “actual”, que, numa tradução mais literal, poderia ser traduzido por “efetivo”. Optou-se por “real”, no entanto, para acentuar o contraste com “ideal”, respeitando assim a evidente intenção do autor. 3 política necessita de uma consideração mais detalhada. Em primeiro lugar, a ciência econômica lida com fenômenos que são mais complexos e menos uniformes do que aqueles com as quais as ciências naturais se preocupam; e suas conclusões, exceto em sua forma mais abstrata, carecem tanto da certeza como da universalidade que pertencem às leis físicas. Existe uma dificuldade correspondente com relação ao método apropriado do estudoeconômico; e o problema de definir as condições e os limites da validade dos raciocínios econômicos torna-se de excepcional complexidade. É, ademais, impossível estabelecer o direito de qualquer método de dominar o campo com a exclusão de outros. Diferentes métodos são apropriados, de acordo com os materiais disponíveis, o estágio de investigação alcançado, e o objeto em questão; e assim surge a tarefa especial de designar para cada [método] seu legítimo lugar e relativa importância. Outra razão para discutir os verdadeiros princípios do método econômico em algum detalhe é que raciocínios falaciosos são mais comuns na economia política do que na maioria dos outros estudos. Isso se deve apenas em parte à dificuldade e à complexidade do assunto com a qual a ciência se preocupa. Ela lida com fenômenos que, embora cercados de dificuldades, são assuntos de observação cotidiana; e ela possui uns poucos termos técnicos que não são também do discurso cotidiano. Não é uma consequência anormal [unnatural] que as pessoas considerem a si mesmas competentes para discutir sobre problemas econômicos, não importa quão complexos sejam, sem qualquer tipo de treinamento científico preparatório que seria universalmente considerado essencial em outros departamentos de investigação. Essa tentação de discutir questões econômicas sem preparação científica adequada torna-se enorme, porque as condições econômicas exercem uma influência muito poderosa sobre os interesses materiais dos homens. “Poucos homens”, diz o General Walker3, “são presunçosos o suficiente para discutir com o químico ou o mecânico sobre questões relacionadas com os estudos e trabalhos de sua vida; mas praticamente qualquer homem que possa ler e escrever sente-se na liberdade de formar e manter opiniões próprias sobre comércio e dinheiro. A literatura econômica de todo ano seguinte abarca trabalhos concebidos no verdadeiro espírito científico, e trabalhos exibindo a mais vulgar ignorância de história econômica e o mais flagrante desdém pelas condições da investigação econômica. É como se a astrologia fosse elaborada lado a lado com a astronomia, ou a alquimia com a química”. Falando em termos gerais, a tendência geral da economia popular segue em direção a generalizações precipitadas e argumentos falaciosos post hoc ergo procter hoc4. Isso é frequentemente combinado com uma análise imperfeita de concepções fundamentais, levando à confusão do pensamento e à seleção de falsas proposições como postulados autoevidentes; e onde o raciocínio dedutivo é empregado, seus resultados são frequentemente aplicados sem consideração pelas condições exigidas para sua aplicação válida. A isso devemos acrescentar que as marcadas distinções entre escolas opostas, e seu estreito dogmatismo, têm complicado desnecessariamente todo o problema. O assunto tornou-se envolto em acaloradas controvérsias, que não só o tornou exaustivo para as pessoas imparciais, mas também injuriou a própria imagem da economia política. Leigos [outsiders] são naturalmente desconfiados de uma ciência, no tratamento que tão frequente e espalhafatosamente proclama um novo departamento como essencial. Até aqui, pode ser inferido, pelo fato 3 Referência ao economista americano Francis Amasa Walker, que também serviu como general no exército norte-americano. 4 Do latim “depois disso, logo causado por isso”. Refere-se à falácia lógica, usualmente denominada correlação coincidente, que consiste em confundir sequências cronológicas de eventos (concomitância) com relações de causa e efeito. 4 de os economistas terem feito progresso em sua ciência, que eles não têm acordo sequer sobre a forma de iniciar seu trabalho. A persistente falácia dos escritores sobre método econômico tem sido justamente apontada como a falácia da exclusividade. Um único aspecto ou departamento do estudo econômico é isoladamente mantido em foco, sendo enaltecido o método apropriado para ele, enquanto outros métodos, de igual importância em seu devido lugar, são negligenciados ou até explicitamente rejeitados. Por conseguinte, os disputantes de ambos os lados, embora corretos positivamente, estão errados negativamente. Suas críticas aos métodos rejeitados são, ademais, muito frequentemente baseadas em mal- entendidos ou más representações. Métodos são atacados por não fazerem aquilo que os que advogam seu uso jamais pensaram que poderiam fazer; e as qualificações e limitações, com as quais cada lado expõe seu próprio método, são desconhecidas pelo outro lado. Isso, combinado com a falácia da exclusividade, ou talvez como consequência dela, dota essas controvérsias de uma extraordinária prevalência de ignoratio elenchi5. Nas próximas páginas será feita uma tentativa de fazer justiça a todos os diferentes instrumentos de investigação dos quais se pode valer o economista; embora a atenção seja também dirigida para as limitações que afetam cada um deles. §2. A concepção da economia política como uma ciência positiva, abstrata e dedutiva. – Os principais pontos envolvidos em controvérsias sobre método econômico podem ser indicados em linhas gerais com um breve contraste entre duas escolas completamente distintas, uma que descreve a economia política como positiva, abstrata, e dedutiva, enquanto a outra a descreve como ética, realista e indutiva. Deve ser distintamente entendido que esse rígido contraste não é encontrado na efetiva economia dos melhores economistas de ambas as escolas. Nos métodos que eles empregam – quando estão realmente discutindo os mesmos problemas – há em grande medida substancial consentimento. Eles diferem, porém, na relativa importância que eles atribuem a diferentes aspectos de seu trabalho; e em seus enunciados formais sobre método essas diferenças tornam-se exageradas. A questão do método correto da investigação econômica não foi enquanto tal discutida por Adam Smith; e suas visões sobre o assunto precisam, portanto, ser deduzidas da sua maneira de lidar com efetivos problemas econômicos. Na verdade, o apoio de sua autoridade foi reivindicado em favor de ambas as escolas acima referidas. Tem sido dito dele que ele foi o primeiro a elevar a economia política à dignidade de uma ciência dedutiva. Mas ele também tem sido reconhecido como o fundador do método-histórico na economia política. A razão para essa aparente contradição não é difícil de ser alcançada. É de ser encontrada no fato de Adam Smith livrar-se dos excessos tanto do lado de argumentação a priori como do a posteriori. Ele não rejeitava métodos de investigação que poderiam de alguma forma ajudá-lo a investigar os fenômenos da riqueza. Para argumentar ou ilustrar ele recorreu, conforme a ocasião, tanto a fatos elementares da natureza humana, quanto a fatos complexos da vida industrial. Ele acreditava numa ordem “natural” de eventos, que poderia ser deduzida a priori a partir de considerações gerais; mas ele constantemente checava seus resultados recorrendo ao curso efetivo da história. Ele partia de abstrações para chegar à complexa realidade do mundo econômico no qual vivia. Portanto, se em solo dedutivo ele assenta uma doutrina da tendência à equalização dos salários, ele a combina com uma investigação indutiva das causas que confirmam ou restringem a operação dessa tendência. Se ele demonstra o progresso “natural” da opulência, ele também entra numa 5 Do latim, quer dizer, literalmente, “ignorância da demonstração”. Refere-se à falácia lógica de desconexão entre uma assertiva, seja ela correta ou não, e a questão de que se ocupa. 5 investigação histórica sobre como efetivamente se deu o progresso da opulência. Se ele condena a doutrina de proteção às indústrias nativas principalmente emterreno abstrato, ele reforça suas visões com ilustrações concretas e argumentos da maior variedade. No que tange às tendências indutivas perceptíveis em Adam Smith, seu sucessor é encontrado em Malthus; para a continuação e desenvolvimento das tendências abstratas dedutivas, voltamo-nos para Ricardo. Economistas subsequentes da escola inglesa assimilaram o que era mais característico em ambos os autores; mas foi Ricardo, ao invés de Malthus, que deu ao seu trabalho um tom distintivo, particularmente em suas análises específicas do método a ser adotado. Senior e J. S. Mill foram os primeiros economistas ingleses que definitivamente formularam princípios do método econômico. As visões de Senior estão contidas em suas aulas introdutórias na Universidade de Oxford, e no seu tratado em Economia Política; as visões de Mill são encontradas no seu Ensaios sobre algumas questões não resolvidas da economia política6, e no sexto livro de sua Lógica7. O problema é discutido com mais detalhe por Cairnes em seu Caráter e método lógico da economia política8, um trabalho de admirável lucidez, que foi por muito tempo considerado o livro-texto indispensável de economia política inglesa, no que concerne à sua lógica. Os ensaios de Bagehot sobre os postulados da economia política inglesa e sobre os princípios da economia política, publicados em seu Estudos econômicos9, têm também um caráter representativo em alguns aspectos. Existem mínimas diferenças nos princípios estabelecidos por esses quatro autores respectivamente, mas fundamentalmente eles estão de acordo ao encarar a economia política como uma ciência que possui escopo positivo, distinguindo-o do ético e prático, e método abstrato e dedutivo. Segue um breve sumário de suas doutrinas características. Em primeiro lugar, uma rígida linha de distinção é traçada entre a própria economia política e suas aplicações à prática. A função da economia política é investigar fatos e descobrir verdades sobre eles, não prescrever regras da vida. Leis econômicas são teoremas sobre fatos, não preceitos práticos. A economia política é, em outras palavras, uma ciência, não uma arte ou um departamento de investigação ética. Ela é descrita como posicionada de forma neutra entre esquemas sociais concorrentes. Ela fornece informações sobre as prováveis consequências de dadas linhas de ação, mas por si só não profere julgamentos morais, ou pronuncia o que deve e o que não deve ser. Ao mesmo tempo, é atribuído o maior valor possível às aplicações práticas da ciência econômica; e há acordo de que o economista deve voltar sua atenção a elas – não, entretanto, em seu caráter de economista puro, mas ao contrário como um filósofo social, que, por ser um economista, está em posse do conhecimento teórico necessário. Considera-se que se essa distinção for traçada, os aspectos social e ético de problemas práticos – que podem ser de vital importância – estão menos sujeitos a serem negligenciados ou subjugados. Quanto à sua posição entre as ciências, a economia política não é considerada como inseparavelmente ligada com a filosofia social em geral. Fatos econômicos são, concede-se, influenciados por fatos sociais de muito variados tipos, e, por sua vez, os influenciam; mas ainda assim é tido como possível até certo ponto isolar o estudo dos fenômenos da riqueza do estudo de outros fenômenos da sociedade. Tal isolamento é, de fato, dito como sendo implicado pelos requerimentos da ciência, que procede pela 6 [N.T.] Livre tradução do ensaio de Mill, intitulado Essays on some unsettled questions of political economy. 7 [N.T.] Referência à obra de Mill intitulada A system of logic. 8 [N.T.] Livre tradução do ensaio de Cairnes, intitulado Character and logical method of political economy. 9 [N.T.] Livre tradução do ensaio de Bagehot, intitulado Economic studies. 6 análise de fenômenos concretos, de modo a lidar separadamente com seus diferentes aspectos e os diferentes elementos dos quais eles são compostos. A ciência econômica constitui, portanto, um departamento de especulação sociológica distinto, apesar de não inteiramente independente. Passando para os meios mediante os quais as verdades da ciência hão de ser alcançadas, sustenta-se que, por conta da variedade e complexidade das influências às quais os fenômenos econômicos são sujeitos, o método da experiência específica ou indução direta é inadequado para produzir mais do que generalizações empíricas de validade incerta. Experimento é, ademais, um recurso do qual o economista é privado. Segue-se que nós não devemos tomar como nosso ponto inicial a análise de fatos industriais concretos. O método correto de procedimento é, ao contrário, dedutivo, ou, como Mill o chama, a priori. As premissas últimas sobre as quais a ciência dedutiva é baseada são, ademais, limitadas em número, de maneira que a mais importante delas admite enunciado preciso desde o início. Isso porque, embora as circunstâncias contribuindo em algum grau para moldar os fenômenos econômicos sejam indefinidamente numerosas, existem poucas cuja influência é predominante, tendo muito mais importância que todo o resto. Essas circunstâncias predominantes consistem em alguns fatos da natureza humana simples e indisputáveis – por exemplo, que em seus tratos econômicos os homens são influenciados pelo desejo por riqueza –, tomados em conexão com as propriedades físicas do solo, e a constituição fisiológica do homem10. A economia política é, por conseguinte, tida como, principalmente, uma ciência abstrata. Isso porque, ao basear suas conclusões em um número limitado de suposições fundamentais, ela tem de deixar de lado muitas circunstâncias, que são importantes em casos individuais, mas desimportantes quando as instâncias são tomadas em conjunto. É reconhecido que outros desejos, além do desejo por riqueza, operam em várias ocasiões na determinação das atividades econômicas dos homens. Eles devem ser, no entanto, negligenciados – de qualquer forma, em primeira instância – uma vez que sua influência é irregular, incerta e inconstante. Nesses termos, argumenta-se que a abstração por intermédio da qual a ciência assume como seu tema central o “homem econômico”, cujas atividades são determinadas somente pelo desejo por riqueza, é tanto legítima como necessária; e, como justificativa adicional, é traçada uma analogia com a matemática e a física, que são tidas como baseadas em abstrações correspondentes11. Em termos semelhantes, a ciência é caracterizada por Mill e Cairnes como hipotética. Isso porque, uma vez que suas premissas não exaurem todas as causas que afetam o resultado, suas leis são apenas verdadeiras hipoteticamente, isto é, na ausência de agentes contrapostos. O mesmo ponto é expresso pela alegação de que a economia 10 Há, no entanto, uma visão diferente sobre a medida em que a aplicação de doutrinas resultantes precisa ser limitada. Bagehot encara as doutrinas da economia política inglesa como não aplicáveis a todos os estados da sociedade, mas apenas aqueles em que o comércio se desenvolveu largamente e, em particular, à forma de desenvolvimento que encontramos na Inglaterra no tempo presente. A relatividade das investigações econômicas também é indicada incidentalmente por Cairnes. Senior, por outro lado, afirma que aquelas conclusões que se relacionam à natureza e à produção da riqueza são universalmente verdadeiras; e embora aquelas que estão relacionadas à distribuição da riqueza estejam sujeitas a serem afetadas pelas instituições particulares de países particulares, ainda assim o estado natural de coisas pode ser expresso por uma regra geral, e as anomalias produzidas por causas perturbadoras particulares reconhecidas posteriormente.Em outras palavras, enquanto Bagehot encara as premissas da economia política como relacionadas apenas aos hábitos econômicos e instituições de uma era e país particular, Senior os encara como “naturais”, e, com pequenas qualificações, como independentes de época e país. 11 Mill e Bagehot insistem particularmente no alto grau de abstração envolvido no raciocínio econômico. Bagehot mais de uma vez repete que “Os economistas políticos ingleses não estão falando de homens reais, mas de homens imaginários; não de homens como nós os vemos, mas de homens como é conveniente que nos suponhamos que sejam”. (Economic Studies, p. 5). 7 política é uma ciência de tendências apenas, não de fatos, sendo seu objeto descobrir e averiguar o resultado de certas forças maiores, como se elas operassem sozinhas, e nada mais exercesse qualquer influência modificadora12. Senior resume suas visões na máxima de que a economia política “depende mais de raciocínio [reasoning] do que de observação”. Mill, Cairnes e Bagehot, no entanto, insistem todos que o recurso à observação e à experiência cumpre sua função antes que as leis hipotéticas da ciência possam ser aplicadas na interpretação e explicação de fatos industriais concretos. Porque é preciso então determinar em que medida, no que diz respeito aos casos particulares sob consideração, deve-se ter em conta a operação de causas perturbadoras – isto é, as modificações peculiares introduzidas pelas influências menores afetando fenômenos econômicos. A comparação com fatos observados fornece um teste para conclusões dedutivamente obtidas, e permite que os limites de sua aplicação sejam determinados. Consequentemente, enquanto o método da experiência específica é considerado como no geral ineficaz para a descoberta de leis econômicas, e como incapaz de fornecer prova independente de sua validade, é, todavia, considerado a formar um suplemento indispensável para o raciocínio dedutivo que constitui o arcabouço da ciência. As doutrinas do método econômico acima, que são aquelas explicitamente formuladas pelos escritores referidos, precisam ser interpretadas e em alguns aspectos qualificadas com referência aos seus escritos efetivamente econômicos. Porque se, ao examinar os últimos, procuramos deduzir suas visões sobre método, nós descobrimos que suas práticas não correspondem precisamente a suas teorias; e nós somos levados à conclusão de que, julgados por seus próprios escritos, eles formulam suas doutrinas sobre método de maneira demasiadamente absoluta, em particular exagerando a abstratividade da economia política como um todo. Eles também falam como se a ciência tivesse alcançado o estágio dedutivo de maneira mais definitiva do que evidenciado por seu próprio modo de lidar com problemas econômicos. Ao tratar da produção da riqueza, por exemplo, como é apontado pelo Professor Sidgwick, Mill e outros economistas de sua escola têm sempre empregado um método indutivo e analítico, estando o elemento dedutivo em seus raciocínios essencialmente subordinado nessa parte de seu estudo. Mill é até mais distintivo: um economista indutivo em sua elaborada discussão sobre a propriedade camponesa em seus aspectos econômicos. Há indubitavelmente um elemento dedutivo, baseado em dados psicológicos, em seu argumento quanto ao efeito da propriedade sobre a indústria e a energia do cultivador. Mas, mesmo nesse ponto, ele procura sustentar-se com uma quantia considerável de evidência a posteriori; e seu argumento geral depende principalmente de uma investigação indutiva e comparativa do atual funcionamento da propriedade camponesa: na França, na Suíça, e em outros países, nos quais a operação do sistema pode ser observada em escala considerável. Cairnes, novamente, em seu trabalho sobre O poder da escravidão13, onde ele analisa as características econômicas gerais do trabalho escravo, estabelece algumas importantes doutrinas econômicas por meio de um cuidadoso estudo indutivo dos fatos, fazendo comparativamente pouco uso do raciocínio dedutivo. É verdade que a teoria geral da distribuição e da troca, exposta pela escola de Mill, é baseada num raciocínio de caráter abstrato; mas mesmo aqui os escritores, aos quais se fez referência, tendem a exagerar as características de seu próprio método. Eles não se mantêm à distância das realidades concretas do mundo econômico efetivo em favor de algo como a extensão que suas descrições da ciência 12 Senior, embora afirme que as conclusões da economia política sejam verdadeiras apenas na ausência de causas perturbadoras, ainda assim a denomina positiva, distinguindo-a da ciência hipotética, querendo com isso dizer que suas premissas não são arbitrariamente assumidas. 13 [N.T.] Livre tradução do trabalho de Cairnes, intitulado Slave Power. 8 permitiram seus leitores a antecipar: e é muito distante da verdade dizer que suas doutrinas são inteiramente construídas na ausência de poucas leis elementares da natureza humana. Em todos os casos, a fim de estabelecer sua consistência, uma enorme porção de seus melhores trabalhos econômicos devem ser considerados como interessados nas modificações práticas dos totais da economia política, e não com aquelas próprias verdades. O contraste é especialmente marcado entre a teoria do método de Mill contida nos Ensaios14, e sua prática, expressa nos Princípios15. No primeiro, a concepção de “homem econômico” ocupa uma posição central e de ampla importância; no último, ela desempenha um papel bem mais modesto. Ademais, em seu Princípios de economia política16, Mill declaradamente trata não apenas desses princípios mesmos, mas também de “algumas de suas aplicações para a filosofia social”. Ele declara em seu prefácio que ao mesmo tempo em oferece uma exposição das doutrinas abstratas da economia política, ele também deseja entregar algo mais; seu objeto abrange “um conjunto muito mais amplo de ideias e tópicos que são incluídos na economia política, considerados como um ramo de especulação abstrata”. Considerações morais e sociais, no sentido mais amplo, recebem por conseguinte a atenção devida; e seria difícil encontrar uma instância melhor de um tratamento ético dos problemas econômicos do que aquela contida no capítulo sobre “o provável futuro das classes trabalhadoras”. §3. As concepções da economia política como uma ciência ética, realista e indutiva. – A ênfase que os primeiros escritores sistemáticos em método econômico, especialmente na Inglaterra, atribuíam ao lado abstrato da economia política levou a uma reação, que surgiu na Alemanha, e está especialmente associada aos nomes de Roscher, Hildebrand e Knies. As duas escolas, assim em geral diferenciadas, são ocasionalmente mencionadas como a inglesa e a alemã respectivamente. Essas designações têm o mérito da brevidade; e, levando em conta o que foi efetivamente escrito sobre método respectivamente por economistas ingleses e alemães durante a parte intermediária do século dezenove, elas não são injustificáveis. Elas não devem, no entanto, ser interpretadas muito literalmente. A doutrina do método apresentada na seção precedente não representa exatamente a multilateralidade dos trabalhos ingleses em economia. Em particular, ela falha em designar um lugar suficientemente importante para a massa de materiais históricos e estatísticos produzida pelo trabalho de economistas ingleses. A doutrina seria, ademais, aceita apenas em uma forma modificada e ampliada por aqueles economistas contemporâneos que declaradamente levam a diante as tradições da escola inglesa. Novamente, as assim chamadas doutrinas alemãs, qualquer que tenha sido sua origem, não são mais da posse peculiar de algum país. Elas são, por exemplo, representadas por uma escola emergente de economistas nos Estados Unidos,que expressamente repudiam a assertiva de que o novo movimento é exclusivamente um movimento alemão. Mesmo na Inglaterra o espírito da reação foi manifestado há muito tempo por Richard Jones, e em anos mais recentes uma expressão muito veemente foi dada a ela por Cliffe Leslie e outros. Por outro lado, entre ilustres economistas que empregaram um método altamente abstrato de lidar com problemas econômicos, deve- se incluir diversos alemães, e.g., von Thünen; e mais recentemente tem brotado na 14 [N.T.] Ver nota 6. 15 [N.T.] Referência à obra de Mill intitulada Principles of Political Economy. 16 [N.T.] Livre tradução da obra citada na nota 15. 9 Áustria uma nova escola, que insiste muito enfaticamente na necessidade de um tratamento abstrato da ciência17. Levando-se em conta a explicação acima, é conveniente falar da escola de Roscher e Knies como a escola alemã. Os ensinamentos explícitos dessa escola em relação ao escopo e método da economia é brevemente indicado nos próximos parágrafos18. Em primeiro lugar, à ciência é conferido um escopo mais extenso do que o usual com economistas ingleses; pois é feita assumidamente para lidar com o que deve ser bem como com o que é. A possibilidade de traçar qualquer clara linha de separação entre essas investigações é, de fato, praticamente negada. Sustenta-se que não pode haver ciência puramente positiva da economia política, tal como foi contemplada por Cairnes. A escola denomina-se explicitamente ética; ela considera a economia política como tendo uma elevada tarefa ética, e como preocupada com os mais importantes problemas da vida humana. A ciência não é meramente para classificar os motivos que compelem à atividade econômica; ela também tem de pesar e comparar seu mérito moral. Ela tem de determinar um padrão da correta produção e distribuição da riqueza, de modo que as demandas por justiça e moralidade possam ser satisfeitas. Ela deve delinear um ideal de desenvolvimento econômico, tendo em vista a vida intelectual e moral, bem como a meramente material; e ela deve discutir os caminhos e meios – como o fortalecimento dos motivos certos, e a difusão de costumes e hábitos saudáveis na vida industrial, bem como a direta intervenção do Estado – pelos quais tal ideal deve ser perseguido19. Outra característica da escola histórica alemã é a maneira como seus adeptos insistem sobre o lado social da economia política, e a interdependência de fenômenos econômicos e outros fenômenos sociais. Sustenta-se que, por conta dessa interdependência, a economia política não pode ser tratada adequadamente exceto em conexão estreita com outros ramos da ciência social. O tratamento adotado deve, por conseguinte, ser realista. Argumenta-se que o economista deveria apenas muito 17 O professor Carl Menger de Vienna é um dos principais líderes desse último desenvolvimento da opinião alemã. Confira seu Untersuchungen über die Methode der Socialwssenschaften uber der Politischen Oekonomie insbesondere. Ele insiste particularmente na necessidade de distinguir economia política teórica de história econômica e estatística, de um lado, e das ciências práticas de economia política, de outro; e ele acusa a escola alemã dominante tanto de não compreender o ponto de vista do método abstrato, como de atribuir uma importância exagerada ao histórico. Ele em seguida os acusa de errar ao tentar oferecer uma direção ética à economia política teórica. Ele fala de modo ainda mais contundente numa série de cartas especialmente dirigidas contra Schmoller, e publicadas sob o título Die Irrthümer dies Historismus in der Deutschen Nationalökonomie. O professor Emil Sax de Praga está de acordo com Menger em muitos pontos fundamentais, mas apresenta suas visões de modo menos controverso. Ele insiste fortemente na importância da teoria pura. Confira seu Wesen und Aufgaben der Nationalökonomie. 18 Sobre os pontos que se seguem, conferir Roscher, Geschichte der National-Oekonomik in Deutschland, especialmente pp. 1032–1036; Knies, Die Politische Oekonomie vom Standpunkte der geschichtlichen Methode; o artigo de Schonberg no Die Volkswirthschaft (em seu Handbuch), §§1–13; e Wagner, Systematische Nationalokonomie no Jahrbucher fur National ökonomie und Statistik, Março, 1886 (traduzido no Quarterly Journal of Economics, vol. I., p. 113). Uma boa análise histórica da nova economia política alemã, cujas fundações foram assentadas nos anos de 1842-53, principalmente por Roscher, Hildebrand e Knies pode ser encontrada em System der National ökonomie, Grundlegung. (§§108–122), de Cohn. Ver ainda o artigo do professor Ashley sobre a Escola Histórica dos Economistas no Dictionary of Political Economy do Sr. Palgrave. 19 Deve-se observar que as diferenças com relação ao escopo de uma ciência são, numa extensão considerável, apenas verbais. Um autor pode incluir no interior da própria ciência investigações que outro autor julga com pertencente apenas a suas aplicações; mas isso não implica que o último rejeite essas investigações, ou mesmo, em menor grau, atribua pouca importância a elas. 10 raramente, se é que deveria, abstrair das realidades complexas da vida econômica efetiva; e deveria consequentemente na maioria de seus raciocínios lidar, não com um “homem econômico” abstrato, sujeito apenas a um único motivo, o desejo por riqueza, mas diretamente de como os homens realmente são, movidos por motivos diversos, e influenciados pelas condições efetivas da época e sociedade em que vivem. Intimamente conectado com essa característica é a insistência a respeito da relatividade das doutrinas econômicas. As condições econômicas da vida são sujeitas à variação; e sujeitas a tal variação são as leis pelas quais as atividades econômicas dos homens são reguladas. Quanto ao método de raciocínio mediante o qual o conhecimento econômico deve ser aumentado, uma grande ênfase é colocada na necessidade de apelar constantemente para observações específicas do mundo econômico efetivo, e de generalizar a partir delas. Por isso a escola é conhecida como indutiva e estatística. É ainda mais distintivamente designada histórica, por sua insistência especial na importância do material histórico na construção da ciência. Somente com referência ao passado, alega-se, pode o presente ser apropriadamente entendido; e somente por meio da comparação de condições econômicas de diferentes períodos e de diferentes países é que se pode adequadamente perceber as limitações das doutrinas econômicas, e salvar os economistas de dogmatismos unilaterais e estreitos. A importância de estudar o curso da evolução econômica é, por conseguinte, enfatizada. Deve-se acrescentar que, independentemente de diferenças a respeito do escopo e do método da economia política, a escola alemã dominante distingue-se dos antigos economistas ingleses por uma diferença de atitude em direção ao laisser faire e à interferência governamental. Isto é, entretanto, um ponto de contraste com o qual não estamos diretamente preocupados no presente tratado. Será observado que as características supracitadas não são, de forma alguma, independentes uma da outra. Em alguns casos, a conexão é, de fato, muito próxima. Quanto mais realista nosso ponto de vista, por exemplo, mais óbvio se torna a necessidade de recursos diretos à história e à estatística; o método histórico leva forçosamente ao reconhecimento da relatividade das doutrinas econômicas; e os pontos de vista realista e social são também intimamente conectados. Por sua vez, a concepção ética da ciência enfatiza todos os outros pontos; e,de fato, caso se assuma que a economia política está diretamente preocupada com o que deve ser, é preciso logicamentedizer, então, que quase todo o resto seguirá20. Resulta dessa dependência de características que, ao discutir as várias questões em foco, não se poderá evitar uma certa repetição. Consequentemente, nas páginas seguintes, mesmo quando estivermos aparentemente tratando de problemas distintos, não será infrequente uma recorrência dos mesmos pontos fundamentais, vistos em diferentes aspectos. Dentro da própria nova escola observa-se marcadas diferenças de tom e atitude. Os membros mais avançados da escola não se contentam em enfatizar a importância do método histórico, mas chegam ao ponto de rejeitar a ajuda de qualquer outro método exceto em subordinação extrema a ele. Eles não são meros reformistas, mas revolucionários; pois eles advogam uma completa reconstrução e transformação da economia política. Em sua visão, a ciência no passado foi estéril em resultados valiosos; somente uma mudança radical de método pode trazer esperança de que venha a ser frutífera no futuro. As velhas doutrinas, e as velhas maneiras para chegar a elas, devem ser colocadas de lado e não mais observadas. O professor Schmoller e o Dr. Ingram podem ser tomados como exemplos dessa ala avançada da nova escola. O primeiro praticamente identificaria economia política e história econômica, ou dissolveria de 20 Dirão por aí, no entanto, que o inverso não se sustenta; que é possível, em outras palavras, adotar um tratamento realista dos problemas econômicos sem passar por julgamentos éticos. 11 algum modo a economia política dentro da filosofia da histórica econômica. O último, cujo objetivo é de certa forma diferente, apesar de ser igualmente revolucionário em sua tendência, absorveria a economia política dentro da sociologia geral. A posição tomada pelos mais moderados partidários da escola alemã, incluindo o próprio Roscher, está em marcado contraste com a posição acima. Eles adotam um tom de moderação e uma atitude de conciliação. Embora insistam na importância da investigação histórica para a economia política, eles admitem a necessidade de empregar outros métodos em conjunção com esse; e embora tenham uma visão realista da ciência como um todo, eles reconhecem o valor da abstração, em grande medida em certos estágios preparatórios. Eles aceitam muitas das conclusões antigas mais características, e nos velhos termos. De acordo com o Professor Adolph Wagner, que deve ser tido como uma liderança representativa da seção mais moderada da nova escola, tanto o método indutivo quanto o dedutivo possuem seu espaço na economia. “Esses, então,” diz ele, “são os dois métodos: de um lado, dedução a partir dos motivos psicológicos – primeiro e principalmente, dedução a partir do motivo da vantagem individual, depois dos outros motivos; do outro lado, indução a partir da história, da estatística, e do menos exato e menos certo, mas indispensável, processo de observação e experiência comum. Com ambos os métodos nós podemos nos ocupar dos vários problemas da economia política, e resolvê-los até onde pudermos. Que método deve ser mais usado depende da natureza dos problemas particulares; mas depende também, por outro lado, da mente, muito provavelmente em processo de treinamento e educação, do próprio investigador”21. § 4. O método da economia política não pode ser adequadamente descrito por qualquer frase única. – Não devemos então exagerar a oposição entre o que pode ser chamado de escola clássica inglesa e a nova escola. A primeira percebe mais nitidamente os problemas abstratos da ciência, e ao escrever sobre método mantém esses problemas em vista. A última percebe mais vividamente os problemas concretos, e, portanto, pôs ênfase em todos os pontos que a escola inglesa tendeu a negligenciar. Mas a diferença é 21 Quarterly Journal of Economics, vol I, p. 124. Em seu Lehr- und Handbuch der politischen Oekonomie, vol. I, p. 17, Wagner escrever algo na mesma linha. “Não é”, diz ele, “uma questão de mudar completamente o método da dedução, nem de substituí-lo inteiramente pelo método da indução. Não seria possível realizar o último objetivo; e, mesmo se fosse possível, não seria correto nem desejável. O problema consiste em obter um aprimoramento no procedimento dedutivo, uma fundação psicológica e seu desenvolvimento mais refinado e profundo, e uma aplicação mais cuidadosa, sobretudo nas questões práticas concretas. Para isso, deve-se adicionar atenção constante às hipóteses a partir das quais as deduções estão sendo feitas, e um discernimento claro dos limites necessários de aplicação do método. Em suma, a verdadeira solução para a disputa sobre o método não reside na seleção entre dedução ou indução, mas na aceitação da dedução e da indução. Cada uma delas deve ser empregada livremente onde for especialmente adaptada à natureza particular do problema a ser resolvido, e na medida do possível – isso porque nem sempre é possível – ambas devem ser combinadas, embora em casos concretos uma ou outra deve ter precedência”. O Dr. Von Scheel se expressa de modo similar. Diferentes métodos, ele diz, são adequados para a solução de problemas econômicos. “Nós devemos usar tanto métodos indutivos quanto dedutivos. O método mais adequado vai continuamente variar de acordo com a natureza particular do problema a ser solucionado”. (Handbuch, Die politische Oekonomie als Wissenschaft, §3, de Schönberg). O Professor Gustav Cohn pode ser citado com o mesmo propósito. A ideia, diz ele, que meras coleções de material histórico ou estatístico possam tornar-se disponíveis para a ciência sem auxílio dedutivo, não passa de uma extravagância, como a ideia oposta de que a ciência inteira possa ser construída a partir da dedução de hipóteses elementares (Grundlegung der Nationalokonomie, p. 35). O Dr. E. R. A. Seligman, novamente, escrevendo em nome dos americanos partidários do novo movimento, enfatiza que os mais extremados dos alemães “ultrapassaram o limite, minimizando indevidamente o trabalho da escola inglesa, e negado, em seu zelo muito dogmático, a possibilidade de formular quaisquer leis gerais”. (Science Economic Discussion, p. 21). 12 estritamente falando apenas de grau; e nós achamos a oposição reduzida a um mínimo, quando comparamos o procedimento efetivo de solução de determinados problemas adotados pelos melhores economistas contemporâneos, independentemente de se declararem membros da nova escola ou se contentarem com a classificação da antiga22. Quanto à doutrina a ser exposta nas páginas seguintes, é suficiente dizer aqui que embora grande importância seja atribuída ao espaço do método dedutivo na investigação econômica, e embora um protesto seja iniciado contra o espírito não- histórico evidenciado pelos partidários do novo movimento que proclamam a necessidade de uma completa reorganização da ciência, ainda assim nenhuma tentativa será feita para justificar as doutrinas da escola antiga na forma precisa em que foram propostas por Mill e Cairnes. O método da economia política não pode ser adequadamente descrito por qualquer frase única; e correspondentemente o método de ninguém será advogado pela inteira exclusão dos outros métodos. Ao contrário, será difundido que, de acordo com o departamento especial ou aspecto da ciência sob investigação, o método apropriado seja tanto abstrato ou realista, dedutivo ou indutivo, matemático ou estatístico, hipotético ou histórico. 22 Em 1890, quando a primeira edição desse trabalho foi publicada, as controvérsias referentes a esse capítulo foram gradualmente menos agudas; e desde 1890 houve mais um avanço na direção do mútuo entendimento por parte dos economistas teóricos e dos historiadores econômicos.Veja, do Professor Ashley, On the Study of Economic History (Surveys: Historic and Economic, pp. 1–21).
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