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Obstáculos epistemológicos

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Obstáculos epistemológicos: a dificuldade de alcançar a objectividade 
nas ciências sociais 
 A objectividade é uma característica fundamental do conhecimento científico, 
seja nas Ciências da Natureza e na Matemática seja nas Ciências Sociais. 
 Dizer que um conhecimento, para ser científico, deve ser objectivo significa que 
este deve ser independente da vontade e dos interesses do cientista. Ou seja: deve 
mostrar as coisas como elas realmente são e não como o cientista eventualmente 
gostaria que fossem; deve ser completamente impessoal. Essa objectividade deve ser tal 
que, relativamente ao mesmo tópico, dois cientistas pesquisando em condições 
semelhantes cheguem ao mesmo resultado. Caso contrário não passará de mera opinião 
e não será universal, ou seja, válido para todos. 
 À partida, é evidente que tal objectividade é mais difícil de conseguir nas 
Ciências Sociais do que nas Ciências da Natureza e na Matemática. 
 Há várias dificuldades que um cientista social tem de vencer. O programa de 
Sociologia do 12º Ano, na linha de certos autores, chama-lhes “obstáculos 
epistemológicos”. Essa expressão designa um entrave à produção de conhecimento 
científico rigoroso e objectivo. São vários: 
• A observação modifica o comportamento de quem sabe que está ser observado. 
• Os cientistas sociais são observadores e observados. 
• A familiaridade com o social. 
• A ilusão de transparência do social. 
• As explicações naturalistas. 
• As explicações individualistas. 
• As explicações etnocêntricas. 
 
A OBSERVAÇÃO MODIFICA O COMPORTAMENTO DE QUEM SABE 
QUE ESTÁ SER OBSERVADO 
 Esta dificuldade prende-se com a própria natureza do objecto de estudo das 
Ciências Sociais. Os seres humanos são seres racionais, conscientes de si e do mundo. 
Se perceberem que estão a ser observados os seus comportamentos podem alterar-se. 
Desse modo, os observadores não captarão o modo como as pessoas habitualmente 
agem e poderão formar ideias erradas sobre o assunto que estiverem a estudar. 
 Eis um exemplo célebre, ocorrido numa pesquisa feita no âmbito da Psicologia 
Social. 
 “Quando as pessoas sabem que estão a ser submetidas a uma experiência, 
assumem comportamentos que julgam ser adequados à situação. Procuram reagir de 
acordo com o que supõem ser o desejo do experimentador. Um exemplo possível diz 
respeito a uma experiência orientada por Elton Mayo (1880-1949) numa fábrica de 
equipamentos telefónicos nos EUA. O investigador pretendia determinar a correlação 
entre a produtividade e a iluminação do local de trabalho. Para surpresa de Mayo, os 
operários reagiram de acordo com as suas suposições pessoais: devia-se trabalhar 
mais quando a intensidade da luz fosse maior. Esta situação foi comprovada quando os 
experimentadores trocaram as lâmpadas por outras da mesma potência, fazendo crer 
que a intensidade da luz variava. Verificou-se um nível de rendimento proporcional à 
intensidade da luz sob a qual os operários supunham trabalhar [trabalhavam mais 
quando julgavam que a intensidade da luz tinha aumentado e trabalhavam menos 
quando julgavam que tinha diminuído].” - M. Monteiro e M. Santos, Psicologia – 1º 
Vol., Porto Editora, 1997, pp. 55-56. 
 
OS CIENTISTAS SOCIAIS SÃO OBSERVADORES E OBSERVADOS 
 Uma outra dificuldade com que o cientista social se depara na sua busca de 
conhecimentos rigorosos e objectivos prende-se com o facto de ser ao mesmo tempo 
observador e observado. Ou seja: é um ser humano a estudar seres humanos, é um 
membro da sociedade a estudar a sociedade, estuda certos grupos sociais de que pode 
fazer parte (um partido político ou uma Igreja, por exemplo) ou acerca dos quais tem 
opiniões anteriores ao estudo (algumas delas provenientes do senso comum). Estuda 
realidades com as quais está envolvido e de algum modo comprometido. Essa 
proximidade em relação ao objecto de estudo pode eventualmente impedi-lo de ser 
imparcial. Mesmo que não faça de propósito, pode inconscientemente “puxar a brasa à 
sua sardinha”. 
 Por exemplo: Um sociólogo que seja religioso ao estudar a religião pode, mesmo 
sem consciência disso, retratar a religião de um modo favorável, ainda que os factos 
apurados não o justifiquem. 
 
A FAMILIARIDADE COM O SOCIAL 
 Os fenómenos sociais são normalmente coisas próximas, com as quais temos 
contactos frequentes no dia-a-dia e em relação às quais já temos algum conhecimento 
(ao nível do senso comum). Pense em casos como a droga, a imigração, o desemprego, 
a educação, etc. Vejamos com mais detalhe o exemplo da educação: um certo indivíduo 
já foi aluno, agora tem filhos que andam na escola, é vizinho de um Professor e cunhado 
de uma Contínua, passa todos os dias ao pé de duas escolas, vê notícias na TV sobre a 
educação, etc. Essa familiaridade com o social pode constituir um obstáculo 
epistemológico caso leve a pessoa a pensar que já sabe o suficiente sobre o assunto, que 
as crenças do senso bastam e que portanto não é preciso investigar mais. O que é um 
erro, pois mesmo que essas crenças sejam verdadeiras é preciso investigar para 
aprofundar o conhecimento e saber justificar aquilo que se sabe. 
 
A ILUSÃO DE TRANSPARÊNCIA DO SOCIAL 
 Este obstáculo decorre da familiaridade referida. Como os fenómenos sociais são 
coisas próximas e relativamente aos já sabemos algo, as pessoas podem cair no erro de 
julgar que são evidentes – que aquilo que se percebe à primeira vista corresponde à 
realidade. Ora, as coisas nem sempre são o que parecem. Muitas vezes aquilo que 
julgamos perceber intuitivamente é desmentido pelas pesquisas de ciências como a 
Psicologia ou a Sociologia. 
Por exemplo: 
 Parece evidente a muitas pessoas que os gordos são sempre simpáticos, mas as 
pesquisas sociológicas mostram que não há relação necessária entre a personalidade e as 
características físicas. 
Parece óbvio que os imigrantes se integrarão melhor na sociedade que os acolhe se 
substituírem a sua cultura de origem pela cultura dessa sociedade; no entanto, pesquisas 
sociológicas com imigrantes polacos no norte de França mostraram que os imigrantes 
melhor integrados na sociedade francesa eram aqueles que não abdicavam dos costumes 
e tradições polacas. 
 
AS EXPLICAÇÕES NATURALISTAS 
 As explicações de tipo naturalista interpretam o social a partir de factores que 
consideram inerentes à natureza humana, à natureza de um povo, de uma raça ou de um 
dos sexos. Consideram, portanto, que as causas dos fenómenos sociais são naturais e 
não sociais. 
 Um cientista social que dê esse tipo de explicação não estará a ser obviamente 
rigoroso nem objectivo. 
Por exemplo: 
 Considerar que o menor desenvolvimento económico e industrial de certos 
povos se deve a um carácter preguiçoso e indolente inato. 
 Certas pessoas acreditam que uma das razões que deveria levar as mulheres a 
participar mais na vida política é a circunstância de terem uma maneira de ser mais 
sensível e comunicativa que os homens. 
 
AS EXPLICAÇÕES INDIVIDUALISTAS 
 As explicações de tipo individualista explicam os fenómenos sociais a partir de 
factores meramente individuais, como se tudo dependesse da vontade e das escolhas do 
indivíduo. Este tipo de explicações esquece que há tendências e mecanismos sociais, de 
que o indivíduo pode nem sequer estar consciente, que têm um enorme peso e 
influência. 
 Um cientista social que dê esse tipo de explicação não estará a ser obviamente 
rigoroso nem objectivo. 
Por exemplo: 
 Considerar que há desemprego porque este e aquele indivíduo não querem 
trabalhar. 
 «A Mafalda não fuma e detesta que fumem ao pé dela. Ao conversar com um 
amigo acerca do filme “Casablanca” (realizadoem 1942), em que a romântica e 
heróica personagem principal, representada por Humphrey Bogart, aparece 
frequentemente a fumar, a Mafalda disse que mesmo que vivesse naquela época 
detestaria o fumo do tabaco e nunca se apaixonaria nem casaria com um homem que 
fumasse. “Mesmo que mais ninguém pensasse assim, eu de certeza absoluta que 
pensaria”, concluiu a Mafalda.» 
 
AS EXPLICAÇÕES ETNOCÊNTRICAS 
 No planeta Terra existe uma enorme diversidade cultural. As diferentes 
comunidades humanas desenvolveram diferentes línguas, costumes, normas, valores, 
etc. Por isso, existem milhares de culturas diferentes. Por vezes, as pessoas de uma 
sociedade não respeitam as culturas de outras sociedades, consideram-nas inferiores e 
“atrasadas”. A essa atitude chama-se etnocentrismo cultural. Este é a atitude 
característica de quem só reconhece legitimidade e validade às normas e valores 
vigentes na sua própria cultura. As pessoas que pensam desse modo, consideram 
frequentemente que, sendo a sua cultura superior, têm o direito de a impor (pela força se 
necessário) a outros povos. Existem exemplos de atitudes etnocêntricas em muitas 
sociedades. Na Europa foi uma atitude habitual durante séculos, ostentada não só pelas 
pessoas do povo como por intelectuais. 
 Um cientista social que dê esse tipo de explicação não estará a ser obviamente 
rigoroso nem objectivo. 
Por exemplo: 
 Os antigos gregos chamavam bárbaros aos estrangeiros. A palavra grega que se 
traduz por bárbaro significava “aquele que fala como os pássaros”. Ou seja: quem não 
falava grego, quem não era grego, não era considerado verdadeiramente humano. 
 “Os Índios americanos foram inicialmente olhados [pelos europeus] como 
criaturas selvagens que tinham mais afinidades com os animais do que com os seres 
humanos. Paracelso, nunca lá tendo ido, descreveu o continente norte-americano como 
sendo povoado por criaturas que eram meio homens meio bestas. Julgava-se que os 
Índios, os nativos desse continente, eram seres sem alma nascidos espontaneamente das 
profundezas da terra. O Bispo de Santa Marta, na Colômbia, descrevia os indígenas 
como homens selvagens das florestas e não homens dotados de uma alma racional, 
motivo pelo qual não podiam assimilar nenhuma doutrina cristã, nenhum ensinamento, 
nem adquirir a virtude [sendo, portanto, legítimo escravizá-los].” - Anthony Giddens, 
Sociology, Polity Press, Cambridge, p. 30. 
 “Durante o século XIX, os missionários cristãos em África e nas ilhas do 
Pacífico forçaram várias tribos nativas a mudar os seus padrões de comportamento. 
Chocados com a nudez pública, a poligamia e o trabalho no dia do Senhor, decidiram 
reformar o modo de vida dos "pagãos". Proibiram os homens de ter mais de uma 
mulher, instituíram o sábado como dia de descanso e vestiram toda a gente. Estas 
alterações culturais, impostas a pessoas que dificilmente compreendiam a nova 
religião, mas que tinham de se submeter ao poder do homem branco, revelaram-se, em 
muitos casos, nocivas: criaram mal-estar social, desespero entre as mulheres e 
orfandade entre as crianças. Se bem que o complexo de superioridade cultural não 
fosse um exclusivo dos Europeus (os chineses do século XVIII consideraram 
desinteressantes e bárbaros os seus visitantes ingleses), o domínio tecnológico, 
científico e militar da Europa, bem vincado a partir das Descobertas, fez com que os 
Europeus julgassem os próprios padrões, valores e realizações culturais como 
superiores. Povos pertencentes a sociedades diferentes foram, na sua grande maioria, 
desqualificados como inferiores, bárbaros e selvagens.” - Luís Rodrigues, Filosofia - 
10º Ano, Plátano Editora, pág. 79. 
 
 Alguns destes obstáculos epistemológicos (nomeadamente a “familiaridade com 
o social”, a “ilusão de transparência do social”, a condição de observador e observado e 
as explicações etnocêntricas) podem ser vistos como diferentes manifestações da 
influência do senso comum. 
 Tal como qualquer outro ser humano, o cientista social possui senso comum: um 
certo conjunto de crenças e saberes práticos, que adquiriu através da experiência de 
vida, no decurso do processo de socialização. Algumas dessas crenças podem ser falsas, 
podem ser superstições e preconceitos. Esse cientista pode nem se aperceber que as 
possui. Se essas crenças influenciarem as suas investigações o rigor e a objectividade 
destas serão afectados. 
 Por exemplo: Se um sociólogo (educado de maneira muito religiosa e moralista) 
ao entrevistar uma prostituta utilizar uma linguagem valorativa e tendenciosa (“Porque é 
que se dedica a esta profissão vergonhosa e imoral?”, “Porque é que se deixou arrastar 
para esta vida desgraçada?”) terá dificuldade em comunicar com ela e não conseguirá 
recolher informações rigorosas. 
 No manual de Sociologia fala-se de “ruptura com o senso comum” na medida 
em que o cientista social deve tentar libertar-se dessa influência: muitas crenças do 
senso comum são falsas e devem ser corrigidas pela pesquisa científica (outras crenças 
até podem ser verdadeiras, mas ao nível do senso comum não existe justificação para 
elas, sendo tarefa da ciência fornecer essa justificação).

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