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Plantas Tóxicas

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
 
 
Rua do Matão – Travessa 14 no. 321 – CEP 05508-900 – Cidade Universitária 
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PLANTAS TÓXICAS 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
Muitas plantas apresentam, pelo menos em algumas de suas partes, princípios 
ativos com ação tóxica. No entanto, a simples presença de princípios ativos em uma 
planta não a qualifica necessariamente como tóxica. É necessário que haja pelo menos 
uma referência na literatura de um caso de intoxicação em seres humanos ou animais 
domésticos motivado por ingestão ou contato com uma planta para que ela seja incluída 
na lista das espécies tóxicas. 
A relação de princípios ativos tóxicos é muito variada, como também o são os 
seus mecanismos de ação. Muitas vezes, a intoxicação não é causada por substâncias 
produzidas pela planta, mas por agentes que a infectam, como fungos. Por exemplo, a 
aflatoxina é produzida por fungos que infectam a torta de amendoim que é armazenada 
para servir de ração para o gado bovino. Há plantas que são tóxicas porque absorvem e 
acumulam elementos tóxicos do solo, como o selênio. Algumas plantas são tóxicas 
porque desencadeiam processos alérgicos por contato da pele com suas folhas. 
É importante conhecer as plantas tóxicas que mais comumente são causa de 
intoxicações em seres humanos. Vale a pena também acrescentar que nenhuma planta 
agride o homem. Ao contrário, este é invariavelmente o agente agressor. A planta 
simplesmente utiliza os recursos que a natureza selecionou, o que permite a ela resistir 
ao ataque dos animais. Tudo o que devemos fazer é evitar o contato e a ingestão de 
partes de plantas que podem provocar reações adversas ao nosso organismo. Não há 
também nenhum inconveniente em manter essas plantas no ambiente doméstico, desde 
que as pessoas (principalmente crianças) sejam alertadas para o perigo que pode 
representar a ingestão ou a manipulação de plantas tóxicas. 
Há plantas alimentícias que têm propriedades tóxicas. Elas podem ser 
ingeridas somente após um tratamento que inativa ou elimina os princípios tóxicos. Um 
exemplo corriqueiro é o feijão, cujas sementes precisam ser cozidas para inativar certas 
proteínas tóxicas. Por isso, é fundamental esclarecer a população sobre os riscos de 
intoxicação pelo uso inadequado de algumas plantas comestíveis 
 
 
 
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2. PLANTAS TÓXICAS AO HOMEM 
 
a. Manihot esculenta - Mandioca (Euphorbiaceae) 
Apesar de ser uma planta largamente consumida pelo homem como fonte 
calórica, a mandioca, se preparada inadequadamente, causa uma intoxicação que, não 
raro, se mostra fatal. A raiz da mandioca contém uma substância chamada linamarina. 
Sob a ação da linamarase, presente nos tecidos da própria raiz, a linamarina decompõe-
se, liberando, entre outras substâncias, o cianidreto (HCN). 
 
 O-glicose 
 | linamarase 
 CH3-C−CN −→ CH3-CO-CH3 + HCN + glicose 
 | 
 CH3 acetona cianidreto 
 
Este é o mesmo gás que se utiliza em alguns locais dos EUA nas câmaras de 
gás para execução de condenados à morte. A linamarina é um representante do grupo 
dos glicosídios cianogênicos. Certas variedades de mandioca acumulam quantidades 
muito maiores de linamarina: são as chamadas "mandiocas bravas". Sem análise 
química, não é possível distinguir as variedades "bravas" das "mansas". A linamarina 
ocorre em maiores quantidades na casca da raiz, mas a polpa branca comestível contém 
quantidades consideráveis do glicosídio. 
Na circulação sangüínea, o cianidreto libera o íon cianeto, que é transportado 
pela hemoglobina. Nas células, o cianeto liga-se fortemente ao citocromo mitocondrial, 
que é responsável pelo transporte eletrônico na respiração celular. Por essa razão, o 
intoxicado passa por um processo de asfixia celular que, dependendo da quantidade de 
cianeto no sangue, pode provocar a morte. 
A maneira mais segura de se consumir mandioca no ambiente doméstico é 
eliminar uma boa espessura dos tecidos mais externos da casca, deixar as partes 
descascadas imersas em água por uma ou duas horas (o que causa morte das células e 
decomposição da linamarina) e cozinhar em água fervente por pelo menos uma hora 
(para garantir a decomposição química do que restou da linamarina). 
 
 
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b. Dieffenbachia picta - Comigo-ninguém-pode (Araceae) 
A comigo-ninguém-pode é uma planta herbácea muito cultivada nos lares, nos 
estabelecimentos do pequeno comércio (bares, mercearias) e também muito usada em 
rituais afro-brasileiros (nos terreiros de umbanda e candomblé). Uma parcela da 
população acredita que a comigo-ninguém-pode é uma planta capaz de neutralizar certos 
sentimentos negativos, como a inveja e o "mau-olhado". As folhas da planta são muito 
vistosas, apresentando uma variegação, isto é, uma distribuição irregular de áreas verdes 
e albinas. Em biologia, esse padrão de pigmentação foliar é interpretado como um sinal 
de alerta para os animais, sinalizando contra plantas potencialmente tóxicas. 
A mastigação ainda que de pequenas porções de folhas ou pecíolos de 
comigo-ninguém-pode causa uma intensa irritação das mucosas da boca, faringe e 
laringe, com inchaço (edema) da língua e estreitamento da passagem de ar nas vias 
áereas superiores. A pessoa pode perder a fala por algum tempo, daí o nome inglês da 
planta, "dumb-cain", que significa a cana-do-mudo. Dependendo da gravidade da reação 
do organismo, pode sobrevir a morte por asfixia. A irritação e o inchaço são 
conseqüências do desencadeamento de um processo alérgico. Este é causado por dois 
componentes encontrados em certas células da planta. Um componente são cristais 
longos (ráfides), terminados em bisel, e reunidos em feixes contendo algumas centenas 
deles. O outro componente é o suco vacuolar que banha os cristais e contém uma 
proteína com atividade enzimática, chamada dumbcaína. Os cristais, por terem as 
extremidades cortantes, perfuram as mucosas e injetam nelas o suco contendo a 
dumbcaína. Esta proteína provoca a lise das membranas celulares e liberam histamina, 
serotonina e outras aminas que desencadeiam um intenso processo alérgico, que leva à 
formação do edema. 
A comigo-ninguém-pode é uma das plantas mais perigosas no ambiente 
doméstico, por ser muito comum e capaz de provocar uma reação muito intensa e de 
extrema gravidade, a partir da simples mastigação de pequenas porções da folha. É muito 
importante ensinar isto às crianças e manter sobre elas estreita vigilância para evitar 
eventuais acidentes de intoxicação. 
 
 
 
 
 
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c. Abrus precatorius - Jequiriti (Fabaceae); Jatropha curcas - Pinhão-de- 
 purga (Euphorbiaceae); Ricinus communis - mamona (Euphorbiaceae) 
Essa três plantas têm em comum o fato de serem tóxicas pela presença de 
proteínas existentes em suas sementes, que são capazes de aglutinar hemácias e têm 
alta atividade tóxica, sendo letais em quantidades muito pequenas. A proteína tóxica do 
jequiriti é chamada abrina, a do pinhão-de-purga, curcina, e a da mamona, ricina. O 
jequiriti é uma trepadeira não-cultivada, portanto, as pessoas não têm contato freqüente 
com a planta. Ocorre que suas sementes são muito vistosas, apresentado-se vermelhas 
com uma mancha negra. Por isso, são muitas vezes usadas para fazer colares, terços 
(daí o nome precatorius, que significa "oque ora") e outros objetos de adorno. Às vezes, 
crianças ingerem as "contas" do colar ou do terço, o que pode ser muito perigoso. Já 
houve casos em que a ingestão de uma única semente foi suficiente para matar uma 
criança. A semente do jequiriti situa-se entre os mais potentes venenos conhecidos, 
orgânicos ou inorgânicos. 
As sementes do pinhão-de-purga e da mamona têm efeito semelhante quando 
ingeridas. Ambas contém grande quantidade de óleo, que apresenta efeito purgativo. As 
proteínas tóxicas presentes em ambas não ocorrem no óleo, quando este é extraído. 
Portanto, o óleo de mamona, que era usado medicinalmente como purgativo, não tinha 
atividade tóxica. Porém, a torta que se obtém após a extração do óleo é altamente tóxica. 
Há referências de que cinco sementes de pinhão-de-purga são suficientes para matar 
uma criança. As sementes do pinhão-de-purga e da mamona, embora sem os atributos 
ornamentais das do jequiriti, são também vistosas, o que atrai a atenção, principalmente 
de crianças. A mamona, devido ao fato de ser uma planta muito comum, por exemplo em 
terrenos baldios, oferece maior risco de exposição. 
 
d. Nerium oleander - Espirradeira (Apocynaceae); Thevetia neriifolia – 
 Chapéu-de-napoleão (Apocynaceae) 
Essas duas plantas arbustivas são ornamentais, pertencem à mesma família 
botânica e nenhuma delas é nativa do Brasil. Ambas apresentam em todas as suas partes 
princípios ativos pertencentes ao grupo dos glicosídios cardiativos (também encontrados 
nas espécies de Digitalis, importante planta medicinal). 
Há relatos de que ramos de espirradeira, quando usados como espetos para 
assar carne, levaram à morte várias pessoas, devido à transferência dos glicosídios do 
 
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caule para a carne. A ingestão ou simples mastigação de pequenas quantidades de folha 
é capaz de causar intoxicações graves. As flores das duas plantas são vistosas, o que 
aumenta os riscos de exposição, especialmente para crianças. Estas ocasionalmente se 
intoxicam ao tentar sugar o néctar do tubo da corola das flores. O nome "espirradeira" de 
Nerium deve-se ao fato de que algumas pessoas são vítimas de manifestações alérgicas 
(o que provoca o espirro) ao aspirar o aroma das flores. A intoxicação provoca problemas 
gastrintestinais, como náuseas, vômitos, cólicas e diarréia. Há também distúrbios 
cardíacos que, dependendo da quantidade de glicosídios introduzida no organismo, pode 
levar ao óbito por parada cardíaca em sístole. 
 
e. Spartium junceum - Giesta (Fabaceae) 
A giesta é uma planta com 2-4 m de altura, ramos verdes sem folhas, flores 
amarelas vistosas, em cachos. É uma espécie introduzida da região do Mediterrâneo, 
muito cultivada como ornamental. Todas as partes da planta são tóxicas, sendo as flores 
as mais freqüentes causas de intoxicação. O principal princípio tóxico é um alcalóide 
chamado citisina, que tem atividade sobre o bulbo, provocando inibição do centro 
respiratório. No entanto, nos casos de intoxicação normalmente só se manifestam os 
costumeiros sintomas gastrintestinais (vômitos, cólicas abdominais e diarréia). 
 
f. Rhododendron spp. - Azálea (Ericaceae) 
As azáleas são muito comuns entre nós como plantas cultivadas, embora não 
sejam nativas do nosso país. As folhas, flores e néctar das azáleas são fontes de 
terpenóides tóxicos, sendo um deles, a andromedotoxina, bastante freqüente. A 
andromedotoxina age afetando a fisiologia do coração e da respiração. Os acidentes de 
intoxicação mais comuns são motivados por ingestão de flores, néctar ou mel originado 
O
O
OH
R-O
OH
O
OOH
O
O
O
OH
OH
OH3C
tevetiosídeo
oleandrina
 
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do néctar de azáleas. Além dos distúrbios digestivos, os sintomas que se têm observado 
nas intoxicações por azáleas são hiper ou hipotensão, bradicardia e arritmias. 
 
g. Gloriosa superba - Gloriosa (Liliaceae) 
Não há ainda relatos de intoxicação no Brasil por ingestão de gloriosa. Não é 
planta nativa do Brasil, mas é uma espécie muito cultivada e dotada de notáveis atributos 
ornamentais, principalmente devido às suas flores. A planta é propagada através de 
bulbos (caules subterrâneos), que o povo chama comumente de "batatas". São 
precisamente os bulbos que oferecem os riscos de intoxicação, pois há a possibilidade de 
as pessoas confundirem essas partes por órgãos de plantas comestíveis. 
Os bulbos da gloriosa contêm quantidades relativamente altas de colchicina, 
um alcalóide muito conhecido por inibir a mitose. Alguns casos de intoxicação relatados 
no exterior mencionam a ingestão de bulbos que foram confundidos por inhame. Em 
todos os casos, observaram-se vômitos, diarréia violenta, desidratação, grave hipotensão, 
alopecia, isto é, perda total dos cabelos e pêlos do corpo. Nos casos em que se consegue 
a recuperação da pessoa intoxicada, os pêlos retornam. Vários casos de intoxicação por 
gloriosa resultaram em óbito. 
 
 
O QUE FAZER NOS CASOS DE INTOXICAÇÃO POR PLANTAS 
 
É importante conhecer as principais plantas tóxicas presentes no lar, no jardim, 
nos locais públicos e nos arredores, como nos terrenos baldios. Neste capítulo foram 
apresentadas apenas algumas plantas que podem representar riscos de intoxicação para 
as pessoas. Deve-se assumir como norma rigorosa e geral o aconselhamento das 
pessoas, principalmente crianças, de não ingerir qualquer parte de planta, cultivada ou 
não, que seja desconhecida ou a respeito da qual não se tenha absoluta certeza sobre a 
N
N
O
H
H
O
O
N
O
H
CH3
CH3O
CH3O
CH3O
O OH
CH3OH
OH
CH3
CH3 OHOH
H
CH3
C O
CH3
H
citisina
colchicina
andromedotoxina
 
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sua inocuidade. Não se deve também recorrer à prática de fazer chás ou outras 
preparações medicamentosas de plantas, a não ser que se tenha total segurança de que 
o seu uso é seguro. Deve-se combater a noção, totalmente infundada mas infelizmente 
muito comum, de que "as plantas, se não fazem bem, mal não fazem". Na verdade, na 
ingestão de partes quaisquer de uma planta desconhecida, é muito mais provável a 
ocorrência de manifestações indesejadas do que a inocuidade. Finalmente, no caso de 
uma intoxicação, chame um médico. Tenha à mão um ramo da planta que motivou o 
acidente ou partes dela, mesmo que sejam fragmentos retirados da boca do intoxicado ou 
do vômito. É possível que o médico desconheça a existência do Centro de Intoxicações 
local, que muitas vezes é essencial para o tratamento das intoxicações em geral, 
incluindo as causadas por plantas. Na cidade de São Paulo, existem três endereços 
habilitados aos quais a população pode recorrer: 
 
1. Centro de Controle de Intoxicações de São Paulo 
Coordenadora: Dra. Darciléa Alves do Amaral 
Endereço: Hospital Municipal Dr. Artur Ribeiro de Saboya 
Av. Francisco de Paula Quintanilha Ribeiro, 860 – Jabaquara. 04330-020 - São Paulo, SP. 
Telefone: (11) 5012-5311 / 5012-2399 / 0800 7713733 – Nacional 
Fax: (11) 5012-2399 
e-mail: smacci@prefeitura.sp.gov.br 
 
2. Centro de Assistência Toxicológica - Instituto da Criança da Faculdade de Medicina da 
Universidade de São Paulo 
Coordenador: Dr. Anthony Wong 
Endereço: Hospital das Clínicas / Faculdade de Medicina 
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 647 – Instituto da Criança – Pacaembu. 05403-900 - 
São Paulo, SP. 
Telefone: (11) 3069-8571 / 0800 148110– Nacional 
Fax: (11) 3069-8800 
Site: www.ceatox.com.br; e-mail: ceatox@icr.hcnet.usp.br 
 
3. Hospital Vital Brazil 
Coordenadora: Dra. Fan Hui Wen 
Endereço: Instituto Butantan 
Av. Vital Brasil, 1500. 055303-900 – São Paulo, SP. 
Telefone: (11) 3726-7962 / 3726-7222 Ramais 2000, 2002 e 2188 
Fax: (11) 3726-7962 
Site: www.butantan.gov.br; e-mail: hospital@butantan.gov.br 
 
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Os dados referentes a casos de intoxicação no âmbito nacional são gerados 
pelo SINITOX - Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas 
(http://www.fiocruz.br/sinitox/prognacional.htm). Esse centro foi constituído em 1980 pelo 
Ministério da Saúde. A principal finalidade é estabelecer um sistema abrangente de 
informação e documentação em Toxicologia e Farmacologia de alcance nacional, capaz 
de fornecer informações sobre medicamentos e demais agentes tóxicos, às autoridades 
de saúde pública, aos profissionais de saúde e áreas afins e à população em geral. O 
SINITOX coordena o processo de coleta, compilação, análise e divulgação dos casos de 
intoxicação e envenenamento registrados por uma Rede composta, no ano de 2006, de 
36 Centros de Informação e Assistência Toxicológica, localizados em 19 estados 
brasileiros e no Distrito Federal. 
 
3. PLANTAS TÓXICAS AOS ANIMAIS DOMÉSTICOS 
 
Há muitas espécies de plantas invasoras de pastagens e que trazem 
problemas de intoxicação ao gado bovino, ovino, eqüino etc. Em geral, os animais têm 
impresso em seu comportamento a rejeição de plantas que lhes são tóxicas. No entanto, 
freqüentemente ocorre a ingestão de plantas tóxicas por várias razões. Às vezes, nos 
casos de seca prolongada ou de sobrepastoreio, falta material forrageiro, restando ao 
gado unicamente a possibilidade de ingestão de plantas tóxicas. Outras vezes, as plantas 
tóxicas crescem imiscuídas intimamente entre o capim forrageiro, sendo então ingeridas 
acidentalmente. Em certos casos, as plantas forrageiras são infectadas por fungos que 
produzem princípios tóxicos. Finalmente, há casos em que plantas tóxicas são palatáveis, 
merecendo a preferência por parte dos animais. 
Damos abaixo uns poucos exemplos de plantas tóxicas muito comuns entre 
nós e que freqüentemente causam prejuízos na pecuária. 
 
a.Asclepias curassavica - Oficial-de-sala, falsa erva-de-rato (Apocynaceae, 
antes Asclepiadaceae) 
Trata-se de uma erva de distribuição cosmopolita, com flores vistosas, dotadas 
de ginostêmio de coloração amarela e pétalas laranja-avermelhadas. Como todas as 
Asclepioideae, produzem abundante látex em todas as suas partes. A planta é rejeitada 
 
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pelo gado, sendo injerida acidentalmente ou nos casos de carência de material forrageiro 
adequado. 
As plantas de Asclepias contêm glicosídios cardioativos muito potentes, 
causando intoxicação aos animais, que pode levá-los à morte. Apesar disso, as partes 
aéreas da planta são parasitadas por larvas de uma borboleta conhecida como monarca 
(Danaus plexipus), também de distribuição cosmopolita. As larvas acumulam os 
glicosídios em todas as partes periféricas no corpo, acabando por se concentrar também 
nas asas durante a fase de pupa. Os glicosídios têm sabor amargo e intenso efeito 
cáustico, protegendo as borboletas de seus inimigos, que são pássaros. Estes, se 
ingerirem uma parte de uma borboleta contendo glicosídios de Asclepias tornam-se 
vítimas de intensa reação emética (vômito), passando a partir daí a rejeitar toda borboleta 
com o padrão de coloração das monarcas, ou padrões semelhantes. 
 
 
b. Crotalaria spp. - Guiso-de-cascavel (Fabaceae); Senecio brasiliensis – 
 Maria-mole (Asteraceae) 
As duas espécies acima têm em comum o fato de produzirem e acumularem 
em suas partes aéreas quantidades apreciáveis de alcalóides pirrolizidínicos. Essas 
substâncias estão entre os principais princípios ativos hepato-tóxicos. As espécies de 
Crotalaria são conhecidas como guiso-de-cascavel devido aos seus frutos que, ao serem 
agitados, produzem um ruído semelhante ao do guiso de cascavel (cujo nome genérico é 
Crotalus, daí o nome genérico da planta). Outra espécie portadora de alcalóides 
pirrolizidínicos é o confrei (Symphytum officinale), que na década de 1980 representava 
um modismo na medicina popular, o que levou muitas pessoas a comer plantas de confrei 
ou tomar chás diariamente, em grande quantidade. Muitas dessas pessoas tornaram-se 
então vítimas de intoxicação hepática, freqüentemente caracterizadas por lesões 
irreversíveis no fígado. É importante alertar a população de que o confrei é uma 
calatropina - exemplo de glicosídeo cardioativo 
presente em Asclepias curassavica 
O
O
OH
H
O OHC
OO
OH
OH
H
 
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interessante planta medicinal, mas apenas para uso externo, como cicatrizante, não 
devendo em hipótese alguma haver a ingestão, quer das suas partes, quer de preparados 
(chás etc.) a partir delas. 
Muitas vezes, as plantas com princípios hepato-tóxicos, ao afetar as funções 
do fígado, levam ao acúmulo de pigmentos biliares na circulação sangüínea. Na espécie 
humana, o quadro característico seria a icterícia, durante a qual as pessoas adquirem um 
tom amarelado na pele, devido à presença dos pigmentos biliares no sangue dos 
capilares que irrigam a pele. No caso dos animais, a sua exposição à luz solar provoca 
foto-sensibilização, devido à absorção de certa faixa do espectro visível pelos pigmentos 
biliares. É um fenômeno análogo ao que ocorre nos casos em que muitas pessoas 
ingerem grandes quantidades de alimentos que contêm certos pigmentos, como a 
cenoura (que possui carotenóides), com o fim de provocar o bronzeamento da pele por 
exposição ao sol. Nos bovinos, é muito comum problemas de foto-sensibilização, que 
levam a um quadro de ulceração, principalmente nas orelhas e no focinho. Nem sempre a 
foto-sensibilização de animais se deve a plantas com princípios hepato-tóxicos, mas 
essas espécies estão entre as importantes causadoras do problema. 
 
c. Equisetum vulgare - Cavalinha (Equisetaceae, Pteridophyta) 
As cavalinhas ocorrem em locais muito úmidos, comumente à beira de rios e 
lagoas. São plantas com caule fistuloso, cilíndrico, desprovidas de folhas e ramificação 
verticilada. 
Um fato curioso a respeito da intoxicação causada pelas cavalinhas se deve a 
que apenas o gado eqüino é sujeito a ela, sendo que para os ruminantes a ingestão da 
planta é absolutamente inócua. 
O princípio ativo existente em Equisetum é uma proteína que inativa a vitamina 
B1, motivo pelo qual é uma enzima que recebe o nome de tiaminase. A tiamina é uma 
vitamina essencial para o funcionamento do sistema nervoso. Com a queda dos níveis de 
tiamina no sangue, surgem sintomas de natureza neurológica, como tremores e 
incapacidade dos animais de se manterem em pé. Nos casos mais graves, sobrevém a 
morte. 
Os ruminantes não apresentam qualquer sintoma de deficiência de tiamina por 
ingestão de Equisetum porque o enorme volume de fluido estomacal que lhe é 
característico, com a complexa e abundante flora e fauna associada, supre as 
 
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necessidades da vitamina, compensando o que é eventualmente perdido por ação da 
tiaminase presente na dieta. 
 
d. Pteridiumaquilinum - Samambaia (Polypodiaceae s.l., antes Pteridaceae, 
Pteridophyta) 
Essa samambaia não deve ser confundida com as samambaias comuns, 
cultivadas nas residências por muitas pessoas. Estas pertencem ao gênero Polypodium, 
ao passo que Pteridium é uma planta invasora de locais perturbados, apresentando 
semelhanças com as samambaias comuns, mas possui uma aparência geral muito mais 
rústica. 
As plantas de Pteridium também apresentam tiaminase. No entanto, os bovinos 
intoxicam-se com a ingestão dessas samambaias, embora os sintomas que eles 
apresentam não sejam neurológicos. O que se observa nos animais é a perda de sangue 
pelas fezes, pela urina, pelas narinas e por ferimentos que porventura ocorram. Estes se 
cicatrizam com muita dificuldade, levando à perda de grandes volumes de sangue. 
Obviamente, as plantas de Pteridium devem apresentar outro princípio ativo além da 
tiaminase. De fato, ocorre nelas um glicosídio denominado ptaquilosídio, que exerce o seu 
efeito na medula dos ossos, nos tecidos hematopoiéticos. O glicosídio reduz a atividade 
desses tecidos. Por essa razão, há um decréscimo no número de hemácias, leucócitos e 
plaquetas. Com isso, os animais ficam anêmicos e mais propensos a contrair infecções. 
Os sintomas acima descritos e relacionados à perda de sangue se devem à redução no 
número de plaquetas, elementos essenciais para a coagulação do sangue. Com a 
redução em seu número, os capilares tornam-se muito frágeis, rompendo-se com 
facilidade, o que explica a perda de sangue por várias vias. Também pela falta de 
plaquetas, torna-se muito difícil a coagulação do sangue e, conseqüentemente, também a 
cicatrização dos ferimentos. 
 
e. Palicourea marcgravii - Café-bravo, Erva-de-rato (Rubiaceae) 
O café-bravo é um arbusto que ocorre espontaneamente e invade lavouras e 
pastagens, sendo muito comum na região Sudeste do Brasil. Estranhamente, apesar de 
ser uma planta extremamente tóxica, ela é muito palatável ao gado bovino. O seu efeito é 
fulminante, ocorrendo a morte do animal cerca de quinze-vinte minutos após a ingestão 
de suas folhas. 
 
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A natureza do princípio tóxico dessa planta também é curiosa: trata-se do ácido 
monofluoracético. A singularidade na natureza dessa substância prende-se ao fato de que 
são muito raros os metabólitos secundários de angiospermas com átomos de halogênio 
em sua composição. Esta característica é mais comum entre as algas, devido 
provavelmente à abundância de sais bromados, clorados e iodados na água do mar. O 
mecanismo de ação do ácido monofluoracético é muito interessante. Ele compete com o 
ácido acético na transição entre a glicólise e o ciclo de Krebs. Se, ao invés de se ligar ao 
ácido acético a coenzima-A ligar-se ao ácido monofluoracético, não prosseguem as 
reações daquelas vias bioquímicas da respiração, que compreendem a incorporação do 
ácido succínico que, combinando-se ao ácido acético (na forma de acetil-CoA), leva à 
formação do ácido cítrico. Por essa razão, o animal intoxicado morre rapidamente por um 
processo de asfixia celular, analogamente ao que ocorre com a intoxicação por glicosídios 
cianogênicos, mas através de um mecanismo distinto, ao nível da respiração celular.

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