Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. CAP. 50 ONCOLOGIA Glossário Glossário Carcinoma – Cânceres originados em tecidos de órgãos do corpo. Hematopoiese – Processo de produção do sangue. Leucemia – Cânceres que afetam as células do sangue e os órgãos que produzem o sangue. Linfoma – Cânceres que surgem no sistema linfático; afetam linfócitos T e B. Lesão lítica – Lesão da medula óssea por invasão tumoral colocando a pessoa em risco de fratura patológica. Paliativo (cuidados) – Cuidados de suporte com objetivo de aliviar os sintomas; relevante ao longo de todo o tratamento; tipicamente utilizado no final da vida quando todos os tratamentos deixam de ser efetivos. Sarcomas – Cânceres de ossos e/ou tecidos conjuntivos. Câncer: a palavra por si só evoca medo e estigma. As pessoas comparam o diagnóstico de câncer com a morte. Porém, as doenças cardíacas, e não o câncer, são a principal causa de morte nos Estados Unidos (American Cancer Society, 2006). Um entre dois homens e uma entre três mulheres nos Estados Unidos poderão receber o diagnóstico de câncer ao longo da vida. Todos os grupos étnicos são afetados pela doença, embora alguns grupos tenham acesso ao diagnóstico e tratamento mais precoce que os demais. Acesso à avaliação e ao tratamento são determinantes para o prognóstico e para a sobrevivência. Um diagnóstico de câncer desafia, assim, significados e prioridades de vida. A pessoa que vive com esse diagnóstico bem como os membros de sua família ou de seu grupo social de apoio, precisam se adaptar às mudanças e às perdas. A pessoa com câncer é considerada um sobrevivente desde o momento do diagnóstico e ao longo do resto de sua vida. Tanto a doença como seu tratamento, podem alterar o funcionamento ocupacional da pessoa e de seu grupo de apoio. Rotinas podem ser quebradas, papéis importantes e atividades associadas a esses papéis podem ser perdidos, os comprometimentos podem levar à incapacidade de longo prazo, em alguns casos. Embora esse capítulo tenha foco na pessoa com câncer, os terapeutas ocupacionais que trabalham com a população desse diagnóstico, devem estar conscientes do impacto do resultado sobre o grupo social da pessoa. Ainda mais, o tratamento da pessoa com câncer precisa levar em consideração necessidades físicas, emocionais, cognitivas, espirituais para facilitar o ajustamento e maximizar o desempenho ocupacional. ESTATÍSTICAS DO CÂNCER: INCIDÊNCIA E ETIOLOGIA A Sociedade Americana para o Câncer (ACS) (2006) estimou que 1,4 milhões de novos casos de câncer seriam relatados em 2006. A maioria dos novos casos são carcinomas, cânceres originados de tecidos de órgãos do corpo (Centro M.D. Anderson de Tratamento do Câncer da Universidade do Texas [MDACC], 2006). Em termos de incidência relatada, os homens são mais afetados pelos cânceres de próstata (33% dos casos previstos), pulmão (13%), e colorretal (10%), enquanto as mulheres estão em maior risco de câncer de mama (31%), pulmão (12%), colorretal (10%). Outros tipos de câncer como leucemia (cânceres de células do sangue, medula óssea e outros órgão produtores de sangue), linfomas (cânceres que surgem no sistema linfático), e sarcomas (cânceres do osso e/ou tecidos conjuntivos) apresentam menores taxas de incidência (ACS, 2006). 2 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. Os cânceres a grosso modo, representam doenças das células do corpo. Qualquer evento que afete a função de replicação das células, alterando sua estrutura genética, pode ser considerado como um fator de risco ou uma causa para o câncer. Fatores ambientais e celulares constituem as duas principais fontes de risco para o desenvolvimento do câncer e contribuem para causas subjacentes de câncer (ACS, 2006; Rohan & Fontham, 2001; MDACC, 2006; Rohan & Budds, 2004). Fatores ambientais podem ser considerados quanto ao estilo de vida e à exposição ambiental. Os fatores de risco relacionados ao estilo de vida incluem dieta (ou seja, exposição alimentar a cancerígenos), obesidade e nível de atividade física ou de lazer (ACS, 2006; Heath & Fontham, 2001). Fumar é parte do estilo de vida de 90% das pessoas que recebem diagnóstico de câncer de pulmão (Van Cleave & Cooley, 2004). Outros fatores ambientais incluem exposição a substâncias químicas como amianto ou benzeno; a fontes de radiação como raios ultravioleta presentes na luz solar; ou a processos infecciosos como hepatite pelo vírus Epstein-Barr ou hepatite C. Fatores celulares (ou moleculares) incluem a predisposição genética ao câncer por causa da hereditariedade ou comprometimento da função do sistema imunológico (Heath & Fontham, 2001). MECANISMOS DO CÂNCER: BASES FISIOPATOLÓGICAS DA REDUÇÃO DE CAPACIDADES E HABILIDADES Uma vez que o DNA da célula ou componentes genéticos sejam modificados, essas modificações são copiadas para as novas células à medida que as células alteradas se replicam. Se o corpo não tem função imunológica ou capacidade para restaurar esse DNA e interromper a divisão celular das células mutantes, se forma um câncer. As células em mutação perdem a função e as características que as definem histologicamente como um tipo determinado de célula. Elas proliferam para agredir outras células ou outros órgãos (Workman, 2004). Os cânceres podem ser classificados e estagiados. Os tumores são classificados pelo grau de diferenciação, ou seja, o grau de semelhança com o tecido originário (Hutson, 2004). Estagiamento é o processo de determinação de quanto o câncer já desenvolveu (Lenhard & Osteen, 2001). O sistema TNM de estagiamento adotado pela União Internacional Contra o Câncer e pelo Comitê Americano sobre o Câncer, é o método mais comum. Consiste na identificação de (1) tamanho do tumor, (2) número de linfonodos afetados, pelos quais o câncer se espalhou, e (3) presença de metástase (chegada a locais distantes no corpo). O estagiamento ajuda os médicos a selecionar o tipo de tratamento que será mais apropriado para o paciente e isso contribui para a estimativa do prognóstico. Um câncer estágio I, grau I é aquele que o tumor está presente, mas não infiltrado nos tecidos adjacentes e suas células são bem diferenciadas. Em um câncer estágio III, grau III, o tumor é grande, invadiu outros tecidos e linfonodos e suas células são pouco diferenciadas. Embora, esteja além do escopo desse capítulo, os terapeutas ocupacionais que trabalham com oncologia devem conhecer processos específicos que ocorrem na formação e no crescimento do tumor (angiogênese) e na metástase (RECURSOS 50-1). Cânceres de Pulmão Thomas et al. (2001) e Van Cleave e Cooley (2004) descrevem duas categorias de câncer de pulmão. Cânceres de pulmão de pequenas células (CPPC) são derivados das células neuroendócrinas, enquanto os cânceres de pulmão de não pequenas células (CPNPC) surgem dos tecidos epiteliais encontrados nos pulmões. Os cânceres de pulmão tendem a ser diagnosticados em estágios tardios quando já emitiram metástase para outros locais e quando os sintomas como a perda de peso, fadiga, dor, ou osteoartropatia (semelhante à artrite óssea e dor articular) já se tornaram mais evidentes e prejudicam as rotinas diárias. Esses e outros sintomas como a fraqueza, falta de ar, dispneia, ou alterações neurológicas indicativas de metástase para o cérebro, contribuem para a redução das capacidades e habilidades da pessoa. Os terapeutas ocupacionais podem atuar para ajudar as pessoas com câncer de pulmão a modificar seu estilo de vida para se adaptar a essas mudanças nas funções corporais, como observado no Estudo de Caso 50-1 a respeito de Joan. Cânceres HematológicosCânceres hematológicos correspondem aos três principais tipos de doença das células-tronco: leucemias, linfomas e mielomas múltiplos. Como um grupo, esses cânceres correspondem ao quinto tipo mais comum e a segunda causa de morte por câncer nos Estados Unidos (Decreto de investimento em pesquisa e educação para o câncer hematológico de 2001: S 1094, 2002). Mais de 100.000 residentes nos Estados Unidos são diagnosticados a cada ano com cânceres do sangue, e 60.000 pessoas morrem anualmente. No momento, cerca de 700.000 pessoas vivem com cânceres do sangue nos Estados Unidos, e o controle é uma tarefa monumental. Tipicamente, os pacientes diagnosticados com cânceres do sangue são tratados por equipes de saúde multidisciplinares; terapeutas ocupacionais são, em geral, membros fundamentais dessa equipes de saúde. 3 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. A Hematopoiese (produção do sangue) é um processo biológico ordenado em que células-tronco pluripotenciais formam células sanguíneas normais e maduras como linfócitos, granulócitos, eritrócitos e plaquetas (Weisman, 2000). Nos cânceres hematológicos, alterações na sinalização celular resultam em crescimento ou divisão descontrolados seguidos de “comprometimento do desenvolvimento”, ou pouca diferenciação das células durante a conversão de células-tronco em células sanguíneas maduras. Essas alterações muitas vezes resultam em acúmulo de células sanguíneas imaturas que não realizam suas funções fisiológicas normais. Além disso, a proliferação de um tipo de célula supera as funções normais das outras células resultando em doença. O restante dessa discussão irá abordar a leucemia. Leucemias são doenças do sangue originadas em órgãos produtores do sangue (Mandrell, 2004; Miller & Grodman, 2001). Afetam os linfócitos, células brancas do sangue, células vermelhas e plaquetas. São de natureza aguda ou crônica. Nas leucemias agudas, as células não amadurecem à medida que proliferam e infiltram a medula óssea e outros órgãos, especialmente os linfonodos, baço e fígado, bem como o sistema nervoso central (SNC) em alguns tipos da doença. Nas leucemias crônicas, as células proliferam, mas alcançam a maturidade e diferenciam-se em componentes funcionais distintos (Mandrell, 2004; Miller & Grodman, 2001). A proliferação das células, contudo, afeta os órgãos. A maturação e diferenciação celular, podem continuar por muitos anos antes de ocorrer uma crise (a proliferação de células que não amadurecem). No caso de leucemias agudas, numerosos sintomas podem limitar as capacidades e habilidades de uma pessoa. A anemia aumenta a sensação de fadiga da pessoa e causa falta de tolerância à atividade pela pouca resistência. Edema pode ocorrer limitando a mobilidade. Quando as células infiltram a medula óssea, a pessoa pode experimentar dor articular e óssea ou estar em risco de fraturas patológicas (Nota de Segurança 50-1). Quando as células infiltram o SNC, a função cognitiva da pessoa pode ser afetada. Susceptibilidade a infecção e a contusão afeta a capacidade funcional. Nas leucemias crônicas, a fadiga principalmente afeta as capacidades e habilidades da pessoa. Sarcoma Como um grupo de doenças, os sarcomas incluem os sarcomas de tecidos moles e tumores ósseos primários. Desses dois grupos, os sarcomas de tecidos moles são quatro vezes mais comuns (American Cancer Society, 2005), mas eles são raros em adultos (Yasko et al., 2001). Os sarcomas de tecidos moles, incluem tumores que se desenvolvem do tecido adiposo, muscular, nervoso e fibroso ao redor de articulações, vasos sanguíneos e tecidos epiteliais profundos. Tumores ósseos primários surgem tanto do osso como da cartilagem. A maioria dos sarcomas é descoberta nos membros inferiores, mas podem surgir em qualquer parte do corpo. De acordo com Yasko et al. (2001), os sarcomas de tecidos moles não apresentam fatores etiológicos identificados, embora algumas condições genéticas e tratamento prévio para câncer tenham sido identificados como fatores predisponentes. As pessoas que apresentam tumores primários ósseos ou sarcomas de tecidos moles, tipicamente necessitam de serviços de reabilitação durante o curso do tratamento, especialmente no período pós-operatório. A causa patológica primária da redução da capacidade de participar das ocupações pode ser atribuída diretamente ao crescimento do tumor no sítio primário da doença e à doença metastática que se dissemina em sítios secundários. O tratamento da doença por si só pode resultar em causas secundárias de redução das capacidades, já que muitas vezes causa alterações de estruturas e/ou funções corporais ao ponto de incapacidade. O crescimento tumoral seja em sítio primário ou sob a forma de lesão metastática irá geralmente resultar em enfraquecimento de estruturas corporais. Tumores ósseos primários e metastáticos, particularmente lesões líticas, podem enfraquecer os ossos ao ponto de causar fratura patológica. O crescimento tumoral pode também comprometer a função circulatória resultando em edema, e pode comprimir nervos, invadir estruturas musculares, articulares causando dor ou alterando a percepção sensorial e limitando a amplitude de movimento. NOTA DE SEGURANÇA 50-1 Precauções gerais para o tratamento ●Antes de entrar no quarto do paciente, leia o quadro e converse com o enfermeiro do paciente para saber se ocorreu qualquer evento ou mudança desde sua última visita. ●Pratique as precauções universais. Você estará se protegendo e evitando disseminar infecção para outros. ●Esteja familiarizado com o atendimento de emergências oncológicas (consulte RECURSOS 50-1) e observe as precauções necessárias. Categorias de emergências oncológicas podem ser obstrutivas/compressivas, hematológicas/imunológicas, metabólicas, aquelas relacionadas a aumento de pressão ou acúmulo de líquido e fratura patológica (Garrett e 0 Kirchner, 1995; Hockett, 2004; Tatu, 2005). Embora algumas dessas condições/emergências possam não impedir que você trabalhe com pessoas com câncer, você deve conhecer como responder a elas, quando ocorrerem. ●Quanto ao uso de agentes físicos: ●Obedeça a todas as precauções padronizadas quanto ao seu uso. ●Não aplique agentes térmicos ou elétricos sobre áreas de malignidade ativa ou potencial. 4 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. ●Evite áreas com alteração da integridade da pele (ou seja, locais de irradiação, enxerto ou doença, queimadura de quimioterapia, etc.). ●Uso inadequado dos agentes físicos pode exacerbar condições como o linfedema. ●Quanto ao uso de exercícios ●Considere o comprometimento ou a condição. Exercícios agressivos podem estar contraindicados na presença de compressão de medula espinhal, linfedema, ou fratura patológica. ●Em caso de mielossupressão, a contagem de plaquetas deve ser uma preocupação. É SEGURO fazer o paciente praticar AVD leve ou vencer resistência até 2,5 kg quando a contagem de plaquetas está abaixo de 20k/mL. ●Quando em dúvida, consulte seu instrutor ou supervisor clínico. Efeitos do Tratamento sobre as Capacidades e as Habilidades Funcionais Como observado anteriormente, não apenas os diferentes tipos de cânceres afetam as capacidades funcionais da pessoa, mas o tratamento para esses cânceres também afeta a função e a habilidade de participar de papéis e atividades valorizadas. O curso do tratamento para os diferentes tipos de câncer, podem envolver múltiplas modalidades como cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia, bem como terapias experimentais. Esses tratamentos acontecem em diferentes intervalos e representam desafios físicos, cognitivose emocionais para a pessoa. O tratamento pode levar a frequente modificação do estilo de vida e das atividades. Além disso, o câncer e o seu tratamento em geral, desencadeiam sentimento de incerteza sobre o futuro, o que torna difícil para algumas pessoas participar do planejamento de atividades e rotinas diárias. Em casos em que o câncer progride e o tratamento produz efeitos colaterais, as pessoas experimentam uma perda funcional progressiva (Bertero, Eriksson & Ek, 1997; Schumacher et al., 1998). Em geral, as pessoas com câncer podem chegar à clínica de terapia ocupacional com uma miríade de problemas somáticos, cognitivos e psicossociais. Comprometimentos que impactam as estruturas e as funções corporais, podem limitar padrões de desempenho e ameaçar o desempenho em áreas ocupacionais (American Occupational Terapy Association [AOTA], 2002). Neuropatia periférica induzida por quimioterapia pode ser extremamente dolorosa e limitar a mobilidade, bem como a destreza manual. As pessoas podem também apresentar tremores após a quimioterapia, o que interfere na função motora fina. A radioterapia causa fibrose (endurecimento de estruturas internas), o que pode limitar o movimento e algumas vezes comprimir nervos causando lesão nervosa periférica (Cooper, 1998). O edema pode ocorrer independentemente do tratamento do câncer, enquanto o linfedema é uma sequela típica de cirurgia e/ou radioterapia que afeta um ou mais linfonodos. Eventualmente, o linfedema pode se tornar um risco ao longo de toda a vida, e os terapeutas ocupacionais devem buscar treinamento para poder oferecer tratamento especializado (consulte o Exemplo de Caso 50-2). Não é incomum observar alterações musculoesqueléticas como artrite ou artropatia, retração fascial ou ombro congelado, em pessoas submetidas ao tratamento do câncer. Fadiga, dor e náusea são efeitos colaterais frequentes do tratamento. A disfunção cognitiva também é um resultado do tratamento do câncer. Pacientes que estão isolados algumas vezes sentem os efeitos da privação. Em alguns a disfunção se manifesta como comprometimento de funções executivas, lentificação do processamento de informações, redução do período de atenção e comprometimento da memória de curto prazo. Os sintomas podem levar ao afastamento social. Um terapeuta ocupacional pode também observar alteração da consciência de segurança, julgamento, e de solução de problemas em algumas pessoas. Algumas vezes o tratamento de câncer pode revelar distúrbios cognitivos subjacentes como demência ou alterações neurológicas como o parkinsonismo. Os efeitos do tratamento sobre o ajustamento psicossocial serão discutidos adiante. A medida que a pessoa conhece melhor diferentes tipos de câncer, ela pode prever os problemas relacionados ao diagnóstico e ao tratamento, do mesmo modo que em relação a outras doenças. Por exemplo, no caso do sarcoma, as alterações relacionadas ao tratamento de estruturas corporais, pode também limitar a participação em ocupações. Uma cirurgia pode ser necessária para remover parte ou todo um membro. A preservação de um membro, por outro lado, pode levar a restrições pós-operatórias significativas, em geral para toda a vida. Tratamentos menos invasivos para o sarcoma como a quimioterapia estão geralmente associados a sintomas como fadiga, náusea e vômito, alopecia, febre neutropênica relacionada à anemia, leucopenia e trombocitopenia. A quimioterapia também pode resultar em alterações neurológicas como perda da audição e neuropatia periférica. A radioterapia, um tratamento pré--operatório frequente (Yasko et al., 1997), pode resultar em diminuição da elasticidade da pele ou de outros tecidos moles e em diminuição ou ausência de respostas de proteção nos sítios da irradiação. CURSO ESPERADO PARA A RECUPERAÇÃO (OU DECLÍNIO) O curso esperado para a recuperação depende de quando o câncer é detectado, do estágio em que se encontra e da resposta da pessoa ao tratamento. Geralmente, quanto mais cedo o câncer é detectado e tratado, melhor é o 5 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. prognóstico para a pessoa. Tendências sugerem que a sobrevivência de longo prazo está aumentando para diferentes tipos de câncer (ACS, 2006). A morbidade associada ao tratamento do câncer pode ser debilitante se não abordada corretamente. A futura habilidade de uma pessoa para participar de uma ocupação pode estar diretamente relacionada ao tratamento fornecido, e os terapeutas ocupacionais são fundamentais por sua compreensão sobre os fatores dos pacientes que irão influenciar o desempenho. Infelizmente, o estigma persiste em relação ao potencial de reabilitação de pacientes com câncer, o que pode e, quase sempre, limitar seu acesso ao tratamento. Pandey e Thomas (2001) identificaram a necessidade de promover tanto a reabilitação física como a reabilitação psicossocial de pacientes com câncer e ao mesmo tempo utilizar uma abordagem abrangente, multidisciplinar para prevenir e tratar a incapacidade. Os terapeutas ocupacionais precisam estar conscientes de seu papel na reabilitação de pacientes com doenças crônicas. Cânceres de Pulmão Os cânceres de pulmão podem ser curáveis nos estágios iniciais, mas não existe método de investigação efetivo para detectá-los. Eles tendem a ser detectados em estágios avançados e apresentam uma taxa geral de sobrevivência de 5 anos em 15% dos casos (ACS, 2006). O tratamento desses cânceres pode envolver cirurgia, quimioterapia, e/ou radioterapia, o que será determinado pelo tipo e pelo estágio do câncer e pelas metas do tratamento (curativo ou paliativo). As pessoas com câncer de pulmão tendem a ser encaminhadas para a terapia ocupacional para abordagem de aspectos da qualidade de vida para maximizar o desempenho em caso de declínio gradativo ou acentuado. Cânceres Hematológicos As pessoas que têm cânceres hematológicos apresentam períodos de estabilidade funcional intercalados com variadas taxas de declínio. Inicialmente, elas podem tentar permanecer em atividade nas áreas de desempenho ocupacional, mas a imunossupressão, a fadiga e o estresse emocional, podem impedi-las de se manter assim (Mandrell, 2004). Esse grupo de cânceres apresenta uma taxa de sobrevivência relativa de 5 anos em 49% dos casos (ACS, 2006). A trajetória desses cânceres varia de pessoa para pessoa, dependendo dos períodos de exacerbação, tipo de tratamento, resposta ao tratamento. As leucemias são tratadas tipicamente com múltiplos episódios de quimioterapia para induzir e manter a remissão e para reinduzir a remissão em caso de recorrência. Seguindo esse curso, a pessoa pode considerar opções para transplante alogênico (doador familiar ou desconhecido) de medula óssea ou de células-tronco sanguíneas periféricas. O tratamento pode levar à debilidade e as pessoas com cânceres hematológicos, se beneficiam com a reabilitação e com os tratamentos, que têm como objetivo facilitar o ajustamento psicossocial e o planejamento de atividades. Sarcomas Os sarcomas também podem ser curados se forem diagnosticados precocemente. A taxa de sobrevivência de 5 anos para sarcomas de tecidos moles é maior do que 90%. Como discutido anteriormente, o curso esperado da recuperação está diretamente relacionado à severidade e à extensão do tratamento necessário para se conseguir a completa retirada do tumor (se possível). No passado, a amputação era considerada com a única opção de tratamento cirúrgico. Estudos recentes, porém, têm demonstrado que não existe diferença significativa entre a taxa de sobrevivência de 5 anos com amputação do membro contra a preservação do membro (Bacci et al., 2002; Veth et al., 2003). A preservação do membro é a cirurgiaque preserva, repara ou reconstrói estruturas fundamentais necessárias para a função do membro (Yasko et al., 1997). O período de reabilitação típico para o membro preservado é maior do que para o membro amputado. Com o tratamento, seja a amputação, ou seja a preservação a técnica escolhida, o paciente tipicamente retoma a participação na ocupação. Por exemplo, pessoas com preservação de membro e pessoas com amputação, relatam alto percentual de retorno à direção de automóvel, percentual relativamente alto de retomada de emprego e prática em relações sexuais, e níveis moderados de participação em esportes (Tabela 50-1) (Refaat et al., 2002). Tabela 50-1. Percentual de Pessoas que Retomam a Função Ocupacional após Amputação de Membro contra Preservação de Membro Relacionada ao Sarcoma. Atividade Amputação de Membro (%) Preservação de Membro (%) Necessidade de dispositivo para marcha 83 50 Emprego 74 77 Capacidade para dirigir 90 92 6 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. Participação em esportes 68 58 Prática de relações sexuais 88 75 Retirado de Refaat et al., 2002. PROBLEMAS DO AJUSTAMENTO PSICOSSOCIAL Muitas pessoas veem sua experiência com o câncer como uma mudança de vida. Algumas utilizam o diagnóstico como mola propulsora para crescimento e desenvolvimento, apesar do desfecho. Quase todas as pessoas com que nós tivemos contato na nossa prática profissional tiveram problemas de ajustamento psicossocial, muitas delas observaram que tratamento e suporte para ajudar na resolução desses problemas, falta entre os profissionais da saúde. Os terapeutas ocupacionais estão bem equipados para abordar esses problemas. Um dos problemas mais desafiadores que os pacientes enfrentam é a falta de controle (Bertero, Eriksson & Ek, 1997; Schumacher et al., 1998). O câncer e seu tratamento quebra padrões de desempenho levando à privação ocupacional, a perda de rotinas e de papéis valorizados. Mais do que isso, as pessoas relatam estresse quando perdem controle de suas funções corporais por causa dos efeitos colaterais do tratamento como náusea, vômito e diarreia. As mudanças no corpo da pessoa como a perda de peso por causa da doença, ganho de peso por causa do uso de esteroides, queda do cabelo – também afetam a sensação de bem-estar da pessoa. A perda do controle pode induzir o sentimento de inutilidade e dependência, especialmente quando a pessoa não é capaz de realizar atividades prévias consideradas banais ou atender às expectativas de um papel. Algumas pessoas expressam incerteza em relação ao futuro à luz da progressão da doença e à frequência e os efeitos do tratamento. As pessoas com câncer também sofrem com a modificação de seus contextos social e cultural. Elas podem ser fisicamente retiradas de seu sistema de suporte, caso precisem buscar tratamento em locais distantes de sua comunidade, estado ou país. O estigma do câncer ou a carga percebida do tratamento pode resultar em perda de suportes sociais fundamentais, ou inversamente, em afastamento social da pessoa. Por fim, a hospitalização prolongada, especialmente quando isolamento está envolvido, pode resultar em institucionalização, onde a pessoa se habitua, se torna dependente do ambiente hospitalar e temerosa de viver fora desse ambiente. Robinson et al. (1991) estudaram a condição de um grupo de 54 pacientes após preservação de membro para determinar a qualidade de vida percebida e a função do membro 2 anos após a cirurgia. Os autores descobriram que o déficit relatado foi a redução da participação em atividades de lazer, uma área de ocupação com frequência esquecida pelos profissionais que trabalham com pacientes com câncer. Assim, o terapeuta ocupacional pode facilitar o ajustamento psicossocial às mudanças nos padrões de desempenho, ajudando o paciente a identificar oportunidades alternativas de lazer e a desenvolver habilidades de adaptação necessárias para lidar com a realidade dos resultados esperados do tratamento. O ajustamento psicossocial certamente parece ser uma área que necessita de atenção. Cerca de 25% das pessoas estudadas após se submeter a tratamento cirúrgico para sarcoma relatam problemas de ajustamento como depressão, ansiedade, distúrbio de sono, necessidade de medicação para dor e diminuição da satisfação com a vida (Lane et al., 2001; Refaat et al., 2002). Os Procedimentos para a Prática 50-1 fornecem maior discussão sobre o ajustamento à perda. Perda do Ajustamento O câncer, independente de seu tipo, tratamento ou curso, pode resultar em perda. Muitas dessas perdas são óbvias e por vezes temporárias, como mudanças na aparência física por causa do tratamento de quimioterapia (ou seja, queda do cabelo ou neuropatia periférica). Outras perdas podem ser permanentes. Elas não são apenas físicas, mas afetam também o senso de identidade da pessoa. O senso de “eu” ou a imagem corporal da pessoa pode ser alterada como resultado de mastectomia, orquiectomia, ou amputação/preservação de um membro. Perdas adicionais incluem a perda do lócus de controle, isolamento social ou retirada, mudança de papéis, e comprometimento ou ausência de funções corporais. Tratamentos voltados para facilitar o ajustamento às perdas estão bem documentados e incluem estratégias que variam de um diário do paciente (Smith et al., 2005) até o aprendizado de técnicas de controle do estresse pelos cuidadores (Kurtz et al., 2005). Alguns pesquisadores sugerem que idade mais precoce no momento do diagnóstico seja preditiva de melhor ajustamento a longo prazo (Schroevers, Ranchor e Sanderman, 2004). O ajustamento à perda é uma consideração importante para qualquer terapeuta ocupacional que trabalhe com uma pessoa que tem câncer. Carver (2005) descreve pessoas como “seres que buscam metas cujos esforços para alcançar os resultados desejados são ameaçados pelo câncer” (p. 2602). Carver acredita que a adaptação permite que a pessoa permaneça engajada em suas metas de vida. A perda, porém, não é apenas percebida pela pessoa que recebe o diagnóstico de câncer, mas também pela família, pelos amigos e pelos cuidadores, e o terapeuta ocupacional precisa considerar isso quando planeja o tratamento. 7 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. MEMBROS DA EQUIPE DE TRATAMENTO E SEUS PAPÉIS Assim como muitos diagnósticos, a equipe envolvida no tratamento de uma pessoa com câncer pode ser onerosa. O pessoal envolvido no tratamento da pessoa varia de acordo com as necessidades específicas de cada uma (Figs. 50-1 e 50-2). A pessoa com câncer e seu sistema de suporte constituem o núcleo da equipe. Membros da família e outros cuidadores são muitas vezes os fornecedores primários do tratamento de rotina em casa, e algumas vezes, quando a pessoa está hospitalizada. A equipe de enfermagem, enfermeiras registradas e enfermeiras voluntárias, são cuidadores fundamentais quando as pessoas estão hospitalizadas. Elas são geralmente o contato primário do cuidado do paciente, tanto em regime de internação como ambulatorial. Enfermagem para cuidado de ferida, ostomia, e continência pode ser consultada para abordar preocupações e orientar cuidadores quanto ao tratamento de feridas com cicatrização pobre, sítios de incisões e de ostomias. Um técnico de enfermagem certificado, pode realizar o cuidado diário de pacientes, ajudá-los em muitas das tarefas de autocuidado com banho e vestir-se. Os médicos tendem a ser especializados em domínios específicos de tratamento como neurologia, ortopedia, cardiopneumologia, fisiologia e psiquiatria. Outros especialistas podem ser esses a seguir. Patologistas que determinam tipo,estágio e grau do câncer. Oncologistas clínicos que direcionam o tratamento da doença primária. Cirurgiões oncologistas que tratam o câncer com ressecção de tumores e reconstrução dos sítios danificados. Oncologistas especializados em radioterapia que determinam e aplicam o tratamento, com radiação de alta energia para combater o câncer. Especialistas no controle da dor e em cuidados paliativos para o câncer e que muitas vezes, ajudam o paciente e seus familiares a lidar com as questões de transição e de fim da vida. Além dos terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, e profissionais que prestam outros serviços podem ser consultados durante o curso do tratamento de uma pessoa. Eles podem ser ortotistas ou protéticos, gerentes de caso, padres, especialistas na vida de crianças e adolescentes, nutricionistas, massoterapeutas, musicoterapeutas, representantes legais do paciente, enfermeiros voluntários, médicos assistentes, neuropsicológos e assistentes sociais. Por fim, voluntários, especialmente aqueles que sobreviveram ao câncer são parceiros vitais para a equipe clínica. Eles funcionam como amigos visitantes em alguns casos, e como conselheiros e líderes do grupo de suporte, em outros. Eles ajudam a atender as necessidades do paciente por meio de numerosos programas patrocinados por hospitais ou por comunidades. Todos os membros da equipe são aconselhados a reconhecer e tentar prevenir esgotamento, de modo que possam melhor servir a seus pacientes (Procedimentos para a Prática 50-2). VISÃO GERAL DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO E TRATAMENTO EM TERAPIA OCUPACIONAL De modo ideal, a avaliação e o tratamento de terapia ocupacional são orientados por modelos de prática e diretrizes baseadas em evidências. Uma abordagem completa permite que o terapeuta e o paciente identifiquem papéis significativos, níveis de competência, níveis de satisfação ao realizar atividades e tarefas que sustentam esses papéis. O terapeuta e o paciente também identificam os contextos nos quais os papéis valiosos são desempenhados. O paciente define seus valores, metas e qualidade de vida. As pessoas com câncer apresentam necessidades e prioridades complexas que podem se modificar, algumas vezes rapidamente, dependendo da severidade da doença, do estágio do câncer, da resposta ao tratamento, estágio do tratamento e assim por diante. A diversidade dos cânceres e dos tipos de tratamento torna um desafio estabelecer diretrizes definitivas para a prática. É essencial a reavaliação contínua do desempenho do cliente, da adaptação, das metas e do programa de tratamento. Avaliação de Terapia Ocupacional Os terapeutas ocupacionais podem estabelecer um relacionamento com o paciente abordando as necessidades imediatas e compreendendo quem essa pessoa é, foi e deseja ser, por meio de sua narrativa. O tipo de avaliação escolhida e a duração do processo de avaliação dependem da condição clínica e cognitiva da pessoa. A informação pode ser obtida com entes queridos, membros da equipe e consulta ao prontuário. O profissional precisa compreender o histórico clínico do paciente, respostas prévias e efeitos colaterais de outros tratamentos, prognóstico, impacto atual, potencial da doença e do tratamento sobre áreas de desempenho. Além disso, precauções em relação a imunossupressão, trombocitopenia, isolamento (para evitar exposição a Enterococccus, Clostridium difficile,fungos, etc), resistentes a vancomicina e anemia devem ser observadas porque esses fatores têm impacto sobre o funcionamento e o tratamento de terapia ocupacional. A Medida Canadense de Desempenho Ocupacional (Law et al., 1998) e a Entrevista da História do Desempenho Ocupacional (Kielhofner et al., 1998) são avaliações baseadas na ocupação que facilitam a identificação da sensação 8 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. de autoeficácia e autoestima do paciente, bem como da satisfação com os papéis de vida na automanutenção, no autodesenvolvimento e autorrealização. Observar os pacientes enquanto eles desempenham tarefas e atividades, fornece informação sobre níveis de desempenho, capacidades, habilidades e hábitos. Outras avaliações podem estar indicadas para determinar fatores limitantes e causas subjacentes para redução da capacidade de atender demandas de atividades. As habilidades de desempenho motor, de processamento e/ou comunicação da pessoa podem estar afetadas por efeitos colaterais do tratamento ou por efeitos de tumores primários ou metástases. A avaliação dessas habilidades e de fatores específicos do paciente (AOTA, 2002) como funções mentais, funções sensoriais, dor, funções musculoesqueléticas outras relacionadas ao movimento, pele e estruturas correlacionadas, funções cardiovascular, hematológica, imunológica e respiratória podem estar ameaçadas. Avaliações específicas de habilidades de desempenho e fatores do paciente têm sido descritas detalhadamente em outros capítulos desse livro. Alguns instrumentos desenvolvidos para monitorar sintomas relacionados ao câncer e seus efeitos sobre a qualidade de vida são descritos aqui. A fadiga é o problema mais comumente relatado pelas pessoas com câncer. O Breve Inventário de Fadiga (Mendoza et al., 1999) fornece uma avaliação rápida da severidade da fadiga e de seu impacto sobre a função diária. Cleeland et al. (2000) também desenvolveram uma avaliação global de sintomas, o Inventário M.D. Anderson de Sintomas que mensura a severidade de muitos sintomas relacionados ao câncer e o grau em que interferem na função diária. Qualquer dessas ferramentas pode ser utilizada rotineiramente para monitorar modificações na condição da pessoa, efeitos colaterais do tratamento e efetividade da reabilitação. A Medida Funcional do Tratamento do Câncer mensura a qualidade de vida das pessoas submetidas ao tratamento do câncer (Cella et al., 1993). Diferentes versões foram desenvolvidas sendo específicas para diferentes tipos de câncer. À medida que os profissionais desenvolvem sua prática em oncologia ou com pessoas com outras condições desafiadoras, eles podem considerar a incorporação de instrumentos, que mensurem fatores psicológicos como o lócus de controle, tomada de significado, autoeficácia e esperança, em seus repertórios. Por fim, a avaliação deve incluir investigação sobre o suporte social que está disponível bem como as barreiras ambientais e do suporte. Reconhecendo e Prevenindo o Esgotamento Prestadores de serviços de saúde que são especializados em oncologia são susceptíveis a estresse crônico relacionado ao trabalho e que resulta em esgotamento. Esgotamento é uma síndrome identificada por três componentes: exaustão emocional, despersonalização e redução do sentimento de realização pessoal. O Inventário Maslach do Esgotamento – Questionário de Serviços Humanos (MBI – HSS) é comumente utilizado para avaliar o esgotamento (Chopra, Sotile e Sotile, 2004; Maslach, Schaufeli e Leiter, 2001). Esgotamento é uma função de fatores pessoais e do contexto. Fatores pessoais incluem traços de personalidade, atitudes e percepções como o lócus de controle e o senso de comando. Maslach e Leiter (1997) identificaram carga de trabalho, controle, recompensa ou reconhecimento, comunidade, satisfação e valores como seis fatores contextuais que, quando sem a sintonia pessoal, contribuem para o esgotamento em oncologia, incluindo a exposição às questões da morte e do morrer; estresse emocional do paciente; conflito entre metas curativas da medicina, prognóstico do paciente, e seus desejos e metas funcionais e do terapeuta; além da exposição às consequências algumas vezes dolorosas, debilitantes e desfigurantes do tratamento médico. Em resumo, os terapeutas ocupacionaispodem ser traumatizados quando trabalham com pacientes traumatizados pelo tratamento médico. Sintomas de esgotamento podem incluir queixas somáticas (ou seja, dor de cabeça, dor articular, etc), comportamento de retirada, falta de criatividade e diminuição da qualidade do tratamento. O esgotamento também pode estar relacionado à depressão maior. É importante diferenciar o esgotamento da depressão. Autorreflexão honesta é essencial para identificação de fatores de risco para o esgotamento e a implementação de estratégias preventivas. Os profissionais da saúde podem implementar as estratégias a seguir para prevenir o esgotamento: ●Equilíbrio em todas as áreas de desempenho ocupacional. ●Renovação por meio de atividades significativas. ●Criação de estruturas de suporte dentro do ambiente de trabalho para abordar limites e fornecer suporte emocional. ●Incorporação de controle do ritmo de trabalho e períodos de descanso no trabalho. ●Folgas para refletir sobre valores e prioridades. ●Estratégias de controle do tempo. ●Técnicas de relaxamento. ●Humor. ●Trabalhar o luto. ●Desenvolver um sistema de suporte fora do trabalho (Brachtesende, 2004; Lyckholm, 2001). O terapeuta ocupacional incentiva uma vida equilibrada e a participação em atividades significativas. Os terapeutas ocupacionais são bem versados em estratégias para o controle do estresse de seus pacientes como já mencionado 9 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. anteriormente (Painter et al., 2003). O desafio para os terapeutas ocupacionais é utilizar rotineiramente essas estratégias consigo mesmos. Metas e Variáveis Moderadoras que Afetam o Estabelecimento de Metas Realísticas ao Longo do Tratamento A meta do tratamento é capacitar os pacientes a otimizar suas qualidades de vida pela participação em ocupações significativas, independente da expectativa de vida. Muitas das metas que são significativas para o paciente que tem câncer, são as mesmas desejadas por pessoas com outros diagnósticos. Com o câncer, porém, variáveis moderadoras distintas podem afetar o estabelecimento de metas realísticas. Pessoas com câncer experimentam rápidas mudanças na condição clínica e funcional ao longo do tratamento. Algumas vezes é difícil para a pessoa e para o terapeuta determinar o quão permanentes essas mudanças podem ser. A severidade da doença e as expectativas da pessoa em relação à função e à recuperação podem ser incongruentes. O terapeuta ocupacional deve monitorar continuamente essas mudanças e ajudar a pessoa a modificar metas e papéis valorizados de modo apropriado. Ao mesmo tempo, o terapeuta precisa tomar cuidado para não ultrapassar a linha tênue da desesperança. O papel do terapeuta ocupacional varia de acordo com o ponto em que entra no curso do tratamento do paciente. A duração do tratamento depende de quão aguda está a condição e a severidade da doença, além dos desejos do paciente. Independente de qualquer aspecto, o programa de tratamento deve ser individualizado e abordar habilidades de desempenho necessárias para a função naquele momento do tratamento. Nos casos em que ocorre cirurgia, metas pré-operatórias tipicamente têm foco na facilitação da manutenção do engajamento em atividades por controle ou compensação de efeitos colaterais do tratamento. Conservação de energia, controle da fadiga e exercícios são estratégias comuns que objetivam melhorar a capacidade de controlar a vida diária, apesar dos efeitos colaterais da quimioterapia e/ou da radioterapia. Outro objetivo importante do tratamento precoce é identificar padrões de desempenho, que possam estar alterados pelo futuro tratamento médico. No pós-operatório, o terapeuta e o paciente geralmente focam o aumento da independência em atividades de vida diária (AVD) e atividades instrumentais de vida diária (AIVD). Redução das habilidades de desempenho relacionadas às mudanças em estruturas corporais, podem tornar o engajamento nessas atividades bastante difícil. À medida que a pessoa se torna capaz ou inicia tratamento ambulatorial, muda o foco para a participação social. No período pós-operatório, o terapeuta também deve abordar os fatores psicossociais relacionados às estruturas e/ou funções corporais alteradas. Pode ser necessário auxiliar o paciente a compreender as expectativas realísticas para a recuperação funcional, como um resultado do procedimento e para ajudá-lo a identificar métodos de adaptação a essas mudanças. As metas de longo prazo do paciente devem orientá-lo para que o mesmo retome atividades como trabalho, dirigir, lazer, interação social, brincadeira e educação. Embora alguns procedimentos possam restringir permanentemente as atividades de alguns pacientes, a maioria deles é capaz de retomar atividades habituais com certas restrições de longo prazo, se houver alguma. Metas semelhantes podem ser consideradas para pacientes que não foram submetidos à cirurgia. Os diferentes cânceres e seu tratamento exercem impacto semelhante sobre a função e a imagem corporal. Tratamento de Terapia Ocupacional Os tipos de tratamento que os terapeutas ocupacionais empregam com seus pacientes com câncer não diferem muito daqueles utilizados com pessoas com outras doenças. Os tratamentos têm foco na promoção da saúde em face à doença; restauração de habilidades e padrões de desempenho; prevenção de incapacidade; modificação de contextos; demandas de atividades, ou padrões de desempenho; e fornecimento de suporte que ajudam o paciente a manter a função (AOTA, 2002). Assim, os tratamentos incluem controle da fadiga e conservação de energia; reeducação sensorial ou dessensibilização; posicionamento e uso de cadeira de rodas; controle de cicatriz, incluindo fibrose; condicionamento (resistência, amplitude de movimento e fortalecimento); prevenção de quedas e outras atividades para promoção de segurança domiciliar. Alguns tratamentos, como o uso de agentes físicos (consulte Notas de Segurança 50-1) ou o controle do linfedema, requerem treinamento especializado (consulte Exemplo de Caso 50-2 na seção sobre competência clínica). Os terapeutas ocupacionais também fornecem tratamento cognitivo, conforme necessário para problemas específicos. O tratamento pode abordar problemas psicossociais como as preocupações dos cuidadores quanto às atividades do cuidar, controle de estresse e ansiedade, técnicas de relaxamento, controle da dor. Os terapeutas ocupacionais podem ser solicitados a fornecer tratamento na fase final da vida da pessoa, que é descrito no encaminhamento do médico como tratamento paliativo nos estágios avançados do câncer. Mesmo ao final da vida, muitas pessoas lutam para se manter produtivas, e os terapeutas ocupacionais podem ajudá-las a planejar e participar de atividades em níveis realísticos. Por fim, o uso de atividade propositada, pode facilitar o encerramento do relacionamento entre a pessoa que está morrendo e os membros de seu grupo de apoio. 10 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. Em todas as fases do tratamento, o terapeuta precisa ser capaz de articular claramente os fundamentos do tratamento. Para isso, pode ser útil adotar um exemplo de como a reabilitação pode ser útil mesmo para pacientes em declínio (Procedimentos para a Prática 50-3). Reorganizando a Justificativa para a Reabilitação de Pacientes em Declínio Tem havido discussão acerca da fundamentação para o tratamento de pessoas com processos de doença progressiva e degenerativa. Em alguns diagnósticos, tais como as doenças neurodegenerativas, os profissionais da saúde têm adotado o pensamento de que essas são condições crônicas,com períodos de remissão, surto e progressão. Os cânceres também podem ser considerados de maneira semelhante. Por isso, as pessoas com câncer apresentam diferentes necessidades ocupacionais ao longo da trajetória da doença e do processo de tratamento. Alguns dos fatores que levam o profissional a considerar o câncer em tratamento como doença crônica são: ●Campanhas públicas de conscientização para promoção de exame e prevenção de certos tipos de cânceres. ●Para alguns tipos de câncer, o tratamento médico evoluiu, incluindo terapias hormonais, bioterapias, vacinas tumorais e novas técnicas cirúrgicas. ●Mais pessoas alcançam a sobrevida de 5 anos, de 50% de sobrevivência relativa no período 1974 a 1976 até 65% em 1995 a 2001 (ACS, 2006). ●Existe maior interesse no estudo e na promoção da qualidade de vida da pessoa com câncer. Além disso, a doença e o tratamento podem afetar de modo adverso a função e a participação das pessoas em papéis e atividades valorizados: ●A frequência do tratamento e os efeitos colaterais podem causar interrupções frequentes nas atividades e no estilo de vida. ●A progressão da doença e/ou dos efeitos colaterais do tratamento, podem causar perda funcional progressiva em taxas variáveis. ●Psicologicamente, as pessoas experimentam incerteza sobre o futuro, piora potencial e/ou morte. Para desenvolver uma justificativa para a reabilitação de pacientes em declínio é importante para os terapeutas ocupacionais: ●Reconhecer que, embora o tratamento médico possa reduzir a energia da pessoa durante a hospitalização, a pessoa irá recuperar alguma (não necessariamente toda) energia à medida que a contagem do sangue melhore. ●Estar conscientes que as pessoas com câncer podem apresentar fases de declínio e de estabilização, em que o planejamento realístico de atividades com foco em aspectos de curto prazo da função e da qualidade de vida, podem ser facilitados pelo terapeuta ocupacional. ●Reconhecer que, mesmo ao final da vida, muitas pessoas com câncer desejam participar de ocupações, embora limitadas. ●Conscientizar-se de seus sentimentos em relação ao ajustamento de seus pacientes à perda e acerca da morte e do morrer. ●Ter em mente uma das metas da reabilitação para pessoas com câncer apresentada por Cheville (2001): “Embora a reabilitação não possa eliminar os avanços do câncer sobre a autonomia funcional, ela certamente pode atenuar e desacelerá- los. Também pode levar os pacientes e as famílias a um objetivo construtivo, de modo que o declínio não seja vivenciado como inutilidade” (p. 1040). EVIDÊNCIA PARA OS RESULTADOS DE REABILITAÇÃO Embora a evidência que sustente a reabilitação do paciente com câncer seja limitada quando comparada a outros diagnósticos, a evidência que existe, sustenta sua eficácia quando utilizada nessa população. A maioria das fontes identificadas tem foco sobre a qualidade de vida e não identificam aspectos específicos de reabilitação que levaram a essa melhora. Alguns autores, porém, têm descrito o impacto de técnicas específicas sobre o resultado funcional. A evidência é, em alguns casos, de natureza qualitativa. A Tabela de Evidência 50-1 inclui exemplo de fora da literatura da terapia ocupacional e dois estudos de terapeutas ocupacionais. Até que mais evidência seja produzida pelos profissionais, os estudos produzidos por eles devem ser examinados, incluindo os estudos realizados por cientistas psicossociais e comportamentais, médicos, enfermeiros, fisiologistas do exercício e fisioterapeutas. O problema com esses estudos é que falta a perspectiva única do terapeuta ocupacional, e o profissional precisa adicionar sua própria interpretação aos achados. Tabela de Evidência 50-1 Melhor Evidência para Tratamento de Câncer em Terapia Ocupacional 11 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. Tratamento Descrição do Tratamento Testado Participantes Dosagem Tipo de Melhor Evidência e Nível de Evidência Benefício Probabilidade Estatística e Tamanho do Efeito do Resultado Referência Fadiga Exercício aeróbico (bicicleta estacionária) contra relaxamento progressivo 72 pacientes de pós- operatório de câncer de pulmão (n=27) e de câncer gastrintestinal (n=42). Grupo do exercício aeróbico: 30 minutos, 5 vezes por semana; grupo de relaxamento: 45 minutos, 3 vezes por semana; ambos por 3 semanas. Estudo randomizado de comparação entre grupos. IA2a. Ambos os grupos relataram melhora semelhante na fadiga: nenhuma diferença entre os tratamentos; o grupo do exercício melhorou o desempenho físico. Pontuação da fadiga (módulo principal do questionário para qualidade de vida para Pesquisa e Tratamento do Câncer da Organização Europeia): Grupo do exercício melhorou 21%, p = 0,01; grupo do relaxamento melhorou 19%, p = 0,01. Nenhuma diferença entre os grupos, p = 0,67. Dimeo et al., 2004 Tratamentos utilizados com pacientes de câncer de mama Questionários de avaliação, tratamento e uso do tempo 5 terapeutas ocupacionais em 2 locais, tratando de pacientes com câncer de mama; registro do tratamento de 35 mulheres. Preenchimento diário dos formulários durante 1 mês. Questionário (não pontuado). A3c. O tratamento é individualizado. Tratamentos mais comuns: programa educacional, grupos de suporte; treinamento para relaxamento; avaliação e fornecimento de cadeira de rodas; treinamento e fornecimento de equipamento para transferência. Estudo descritivo, impossível calcular. Vockins, 2004. Tratamento de patologia de plexo braquial Modificação de atividade com uso de dispositivo de assistência; modificação do ambiente (oferecida, mas rejeitada). Uma mulher de 67 anos de idade, tratada por causa de câncer de mama com mastectomia e radioterapia 12 anos antes do tratamento para o estudo. Documentação da avaliação e do tratamento. Estudo de narrativa de caso. VC3c. Tratamento baseado nos valores do paciente; individualizado de acordo com a natureza da condição. Estudo de narrativa, impossível calcular. Cooper, 1998. 12 RADOMSKI, Mary Vining; LATHAM, Catherine A. Trombly. Terapia ocupacional para disfunção física – São Paulo: Santos, 2013. Glossário Glossár
Compartilhar