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A construção da linguagem de jovens e adultos em duas perspectivas: Saussure e a Teoria Histórico - Cultural de Vygotsky 1 MENTZ, Almir 2 MAIA, Christiane Martinatti 3 Os limites da minha linguagem denotam os limites do meu mundo. Wittgenstein Como aprendemos a ler e escrever? Como ensinamos a ler e escrever? Como se aprende , como se ensina jovens e adultos que se encontram inseridos no contexto social? Jovens e adultos trabalhadores, que, de alguma maneira, já utilizam a escrita e a leitura em seu dia-a-dia? O presente artigo visa a problematizar a concepção de desenvolvimento de linguagem e o conceito de letramento vivenciado hoje pelos professores que atuam na educação de jovens e adultos. Propõe, ainda, discussão teórico-metodológica acerca da aquisição da leitura e escrita, dentro de um contexto sócio-econômico-cultural. Utilizar-se- ão as teorias de Vygotsky e Saussure. Conforme Saussure (1977), a língua é um sistema de relações; é uma forma (e não uma substância) que se impõe ao sujeito por coerção social. Neste sentido, salientava a construção da linguagem sob o aspecto da relação signo significado significante símbolo. Arrivé (1999) explicita o conceito de língua de Saussure para a melhor compreensão da relação explicitada acima: A língua é um sistema de signos que exprimem idéias, e por isso é comparável à escrita, ao alfabeto dos surdos-mudos, aos ritos simbólicos, às fórmulas de polidez, aos sinais militares etc. etc. Ela é apenas o mais importante desses sistemas. Para o autor, o signo lingüístico é constituído pela sua arbitrariedade, imotivação, mutabilidade e pelo caráter linear do significante. Assim, compreendemos o signo como a dualidade significado (o som, a forma) e significante (a imagem, a significação), ou seja, o signo lingüístico: (...) une, não uma coisa e um nome, mas um conceito e uma imagem acústica. Esta última não é o som material, coisa puramente física, mas a marca física desse som, a representação que nos é dada por nossos sentidos; ela é sensorial, e se nos ocorre chamá-la „material‟, é apenas 1 Artigo publicado em: SCHEIBEL, Maria Fani & LEHENBAUER, Silvana (Org.). Reflexões sobre educação de jovens e adultos – EJA. Porto Alegre: PALLOTTI, 2006. 2 Licenciado em Letras. Mestre em Letras. Professor da ULBRA/ São Jerônimo. 3 Pedagoga. Psicopedagoga. Mestre em Educação. Doutoranda em Educação pelo PPGEDU/UFRGS. Professora da ULBRA/São Jerônimo e Canoas. 2 neste sentido e por oposição ao outro termo da associação, o conceito, geralmente mais abstrato (SAUSSURE,1977). Quanto ao símbolo, devemos considerá-lo sob dois aspectos: primeiro, no sentido lato, como algo que é substituído, de acordo com as convenções, a qualquer coisa para ter uma função em seu lugar; em segundo, no sentido estrito, símbolo é, para o nosso espírito, o que tem semelhança com aquilo substituído, cuja função substituidora decorre de uma motivação. A partir dessa concepção, verifica-se, para a linguagem, o emprego de símbolo para a metáfora e o processo da linguagem poética. Assim, pode-se observar que Saussure passa a olhar o símbolo na linguagem humana. O referido autor atribui ao símbolo o caráter científico, sugerindo a Semiologia como a Ciência que se preocupa com um objeto específico para o seu estudo: a utilização do signo na sociedade. Vive-se num “universo de signos”, num “mundo de representações”, independentemente das formas de sua utilização ou dos comportamentos da sociedade. A partir da visão saussuriana, desenvolveremos as características do signo que já foram citadas anteriormente: a) Arbitrariedade: aqui, verifica-se que não há qualquer relação entre o significante e o significado. Observa-se que um mesmo significado pode ser representado por diversos significantes. Saussure (1977) colabora para essa explicação ao salientar que: A arbitrariedade do signo nos faz compreender melhor que o fato social pode, por si só, criar um sistema lingüístico. A coletividade é necessária para estabelecer os valores cuja única razão de ser está no uso e no consenso geral: o indivíduo, por si só, é incapaz de fixar um que seja. b) Imotivação: ao tratar da arbitrariedade, Saussure apresenta a imotivação absoluta, que é totalmente imotivada. Como comprovação, tem-se o tradicional exemplo da palavra “casa”, cuja forma nada aponta que sugira a idéia do imóvel. Ainda, o autor indica a imotivação relativa, isto é, nela há motivação para o significado, como no caso de algumas onomatopéias e nos derivados. Em relação ao exposto, temos três tipos de signos motivados: a) fônico (característica das onomatopéias); b) morfológico (própria dos derivados); semântico (ocorre a analogia semântica). c) Linearidade: aponta para o fato de a fala decorrer no tempo. Sua natureza é auditiva, razão pela qual o significante tem de realizar-se no tempo, numa sucessão fônica até que se formem os sintagmas. d) Mutabilidade: o signo é suscetível, isto é, com o passar do tempo, ele pode ser substituído, alterado, tanto em relação ao elemento fônico, como na relação significante/significado. Saussure dá uma guinada ao estudo da lingüística quando abre o caminho para o estruturalismo. Embora o estudo estruturalista sofra, atualmente, críticas muito fortes, é inegável a sua imensa contribuição para os avanços dessa área. Nesse momento, o que nos interessa é verificar a aplicação possível da lingüística. Inicialmente, este campo de conhecimento denota caráter descritivo, pelo qual o lingüista observa a língua e a descreve. Posteriormente, faz-se o estudo diacrônico, ou seja, considera que a língua está sempre em evolução e, por essa razão, o estudioso apenas poderá observar e descrever corretamente um momento. Seguindo, outro aspecto que merece destaque é aquele que descreve a forma oral da linguagem, que é a mais completa, 3 visto que a grafia constitui uma transcrição imperfeita da língua na sua totalidade. Para Saussurre (1977): A linguagem representa dois fatores: a língua e a fala. A língua é para nós a linguagem menos a fala. Ela é o conjunto dos hábitos lingüísticos que permitem a um sujeito compreender e fazer-se compreender. (...) Separando a língua da fala, separam-se ao mesmo tempo: 1) o que é social do que é individual; 2) o que é essencial do que é acessório ou mais ou menos acidental. (...) A faculdade da linguagem é um fato distinto da língua, mas que não pode se exercer sem ela. Por fala designa-se o ato do indivíduo que realiza a sua faculdade por meio da convenção social que é a língua. Cabe aqui ressaltar que os dois fatores apresentados por Saussure - língua e fala - já foram construídos pelos jovens e adultos em suas mediações sociais estabelecidas nos diversos espaços – culturais, profissionais etc. – nos quais esses sujeitos transitaram e ainda transitam. Língua e fala distanciadas da língua e fala requerida pelo espaço escolar. Enfatiza-se ainda, a necessidade dos distintos espaços educativos, principalmente a instituição escolar, de ressignificar seu conceito de habilidade lingüística, pois o aluno, ao ingressar nos muros da escola, o faz com uma linguagem previamente desenvolvida. Assim, os sujeitos que lá ingressam buscam uma formação que aprimore a estrutura e o funcionamento da língua, bem como o seu mecanismo. Existe, portanto, um quadro contrastivo entre o código oral e o código escrito. Kleiman (2001), nos auxilia ao colocar que: Do ponto de vista sociolingüístico, as diferenças funcionais entre a língua falada e a língua escrita são evidentes. (...)Como dizíamos anteriormente, as diferenças são, de fato, discursivas, se entendermos por discurso o conjunto de práticas que conformam e formam o mundo do falante: os objetos, o que pode ser dito deles, como pode ser dito, sob quais condições e por quem (cf. Fairclough, 1992). Em resumo, estamos diante de um quadro de diferenças de ordem social, lingüística e discursiva, que corresponde ao conjunto de condições necessárias para postular uma relação de conflito diglóssico entre duas línguas ou variedades lingüísticas; razão pela qual o abandono de um conjunto de práticas discursivas subalternas em favor de outro, dominante, faça da aprendizagem um processo difícil de sustentar. (...) Aprender a ler e escrever, envolve, então, um processo de aculturação, que é extremamente conflitivo quando tal aprendizagem acarreta a perda e substituição de práticas discursivas orais que até esse momento eram funcionais para o aluno. Uma das grandes problemáticas relacionadas à educação de jovens e adultos, que perpassa décadas sem solução, é o abandono por parte destes alunos das salas de aula. O que não se faz compreender, ainda hoje, apesar de diversas pesquisas já realizadas (Kleiman, Kato, Soares etc.) é o porquê desse abandono, visto que fatores motivacionais internos e externos movimentaram esses sujeitos em busca do conhecer, do ler e escrever. Alguns pesquisadores como Kleiman (1995), destacam, porém, fatores como diferenças culturais, econômicas e sociais. A metodologia utilizada pelos professores 4 também seria um dos fatores promotores do afastamento dos jovens e adultos das salas de aula, bem como o desconhecimento desses do processo de evolução lingüística do sujeito. Pesquisadores que utilizam a Teoria Histórico-Cultural, como a autora citada acima, destacam que para Vygotsky (1991) a função inicial da linguagem: é comunicativa. A linguagem é antes de tudo um meio de comunicação social, um meio de expressão e de compreensão. A Teoria Histórico-Cultural e a educação de jovens e adultos: novas paisagens! Maia (2004) destaca que Vygotsky, pesquisador russo nas décadas de vinte e trinta – buscou compreender a relação existente entre linguagem, desenvolvimento e a aprendizagem frente ao processo histórico-cultural e o processo de intervenção social. Rompendo com a visão de alguns representantes da Escola Psicológica Behaviorista em sua época, Vygotsky criticou as posições de Watson, Thorndike que acreditavam que a aprendizagem e o desenvolvimento seriam um processo único: ao aprender o sujeito se desenvolveria. Mas o teórico também iria criticar a postura adotada por Piaget, o qual salientava que o desenvolvimento precederia a aprendizagem, não compartilhando ainda dos estágios universais propostos por Piaget: Sensório-motor, Pré-operatório, Operatório-concreto e Operatório-formal. Divergiria, ainda, a respeito de o pensamento preceder a linguagem conforme Piaget. Vygotsky partia do pressuposto que o aprendizado seria um processo profundamente social e o desenvolvimento um complexo processo dialético, caracterizado pela periodicidade, irregularidade no desenvolvimento das diferentes funções, metamorfose ou transformação qualitativa de uma forma em outra, entrelaçamento de fatores externos e internos e processos adaptativos (1991, p. 137). Maia (2004) destaca que para o pesquisador, o desenvolvimento não seria linear, visto que o aprendizado e desenvolvimento estariam inter-relacionados desde o nascimento do sujeito, sendo os atos intelectuais decorrentes de práticas sociais. A interação social e o processo de intervenção social seriam fundamentais para o desenvolvimento do sujeito. Vygosky buscava, assim, formular a origem dos processos psicológicos superiores e inferiores. Para ele, os processos psicológicos superiores se originariam na vida social, na participação do sujeito em atividades compartilhadas com outros – representaria a maturidade biológica, desenvolvimento cultural, apropriação dos signos. Os processos psicológicos inferiores seriam caracterizados por um desenvolvimento cultural primitivo, uso das ferramentas e linguagem interna primitiva – ato de balbuciar (1996, p. 122 – 127). Propunha, então, que: O indivíduo humano se faz humano apropriando-se da humanidade produzida historicamente. O indivíduo se humaniza reproduzindo características historicamente produzidas do gênero humano (1996, p. 93). Neste sentido, buscava valorizar a transmissão da experiência histórico-social, do conhecimento socialmente existente, visto que o processo de internalização – reconstrução interna de uma operação externa, estaria presente através da transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal – estágios de internalização promovidos na relação com os aprendizes mais experientes. Vygotsky proporia, ainda, a investigação da riqueza de informações da criança, bem como o estudo de suas outras capacidades que não teriam ligação direta com o 5 conhecimento que ela possui, mas que desempenhariam papel importante em seu desenvolvimento cultural: A criança atravessa determinados estágios de desenvolvimento cultural cada um dos quais se caracterizando pelos diferentes modos pelos quais a criança se relaciona com o mundo exterior; pelo modo diferente de usar os objetos; por formas diferentes de intervenção e diferentes técnicas culturais (...) (1996, p. 214) Os mecanismos de mudanças individuais teriam suas raízes na cultura e sociedade, sendo a linguagem um processo extremamente social que, através da interação social, transformar-se-ia em um processo profundamente pessoal, precedindo desta forma o pensamento. Vygotsky introduziria, ainda, os conceitos de zona de desenvolvimento proximal e zona de desenvolvimento real que teriam relação direta com o processo educativo: “O desenvolvimento real caracteriza o desenvolvimento mental retrospectivamente, enquanto a zona de Desenvolvimento Proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivamente” (1989, p. 87). Assim, na zona de desenvolvimento real, encontraríamos o saber que já foi construído, elaborado, apropriado pelo sujeito, o que cada um sabe, as funções mentais. A zona de desenvolvimento proximal seria caracterizada pela apropriação do conhecimento, o que ainda não se conhece e, com a ajuda de um interventor, desenvolve-se. Permite-nos delinear o futuro imediato do sujeito, seu estado dinâmico de desenvolvimento (1989). Neste sentido, Vygotsky (1991, p. 95) chamava a atenção para as questões da aprendizagem escolar, atribuindo um valor significativo a esta. Colocava que a aprendizagem escolar seria responsável por produzir “algo fundamentalmente novo no desenvolvimento da criança”. Para o autor, a escola necessária seria a escola voltada a uma educação social. Retomando: Como se ensina jovens e adultos que se encontram inseridos no contexto social? Jovens e adultos trabalhadores, que, de alguma maneira, já utilizam a escrita e a leitura em seu dia-a-dia? Para Vygotsky ( 1991) a cultura não é um sistema estático ao qual o indivíduo se submete, mas um „palco de negociações‟, onde seus participantes estão em constante processo de recriação e ressignificação de informações, conceitos e significados, pois os significados das palavras são dinâmicos e não estáticos, modificando-se à medida em que os sujeitos desenvolvem-se, bem como de acordo com as várias formas pelas quais o pensamento funciona. O autor (1991) expõe o seu conceito de pensamento verbal: O pensamento verbal não é uma forma de comportamento natural e inata, mas é determinado por um processo histórico-cultural e tem propriedades eleis específicas que não podem ser encontradas nas formas naturais de pensamento e fala. Destaca ainda o autor que a relação entre pensamento e palavra constituir-se-ia em um processo contínuo, dinâmico, pois para esse: O pensamento não é simplesmente 6 expresso em palavras; é por meio delas que ele passa a existir. Cada pensamento tende a relacionar alguma coisa com outra, a estabelecer uma relação entre as coisas. O adulto e o jovem, ao defrontarem-se com os distintos discursos utilizados por eles em suas comunidades e não vivenciados no espaço educativo escolar, muitas vezes se angustiam com as diferenças culturais e lingüísticas que os cerceiam: como falar, como escrever, como pronunciar as palavras que se encontram impressas nos materiais escritos? Como organizar o pensamento através de estruturas sintagmáticas? O que é certo, o que é errado na fala e na língua? Dúvidas, questionamentos, problematizações que se fazem presentes no cotidiano desses sujeitos que buscam o espaço educativo para mudarem sua situação de vida: econômica, social e cultural. Porém esbarram, muitas vezes, em um ler e escrever considerado único: o culto, onde não há espaço para o saber popular, para as pronúncias e escritas diferenciadas: Por trás das palavras existe a gramática independente do pensamento, a sintaxe dos significados das palavras. O enunciado mais simples, longe de refletir uma correspondência constante e rígida entre o som e o significado, é na verdade um processo. As expressões verbais não podem surgir plenamente formadas; devem se desenvolver gradativamente. Esse complexo processo de transição do significado para o som deve, ele próprio, ser desenvolvido e aperfeiçoado. A criança deve aprender a distinguir entre a semântica e a fonética e compreender a natureza dessa diferença. (Vygotsky, 1991). Se Vygotsky salienta a importância de a criança compreender a natureza da diferença entre semântica e fonética, resta-nos afirmar a dificuldade da compreensão por parte do jovem e do adulto desta relação, visto que esses não ingressaram na escola na faixa etária considerada adequada, e quando ingressam os conceitos, as relações lingüísticas, o desenvolvimento da linguagem não são trabalhados, muito menos visualizados no cotidiano pedagógico, o que acarretaria em uma ausência de problematização por parte desse sujeito do que seria fala e língua – escrita e leitura: Na escrita, como o tom da voz e o conhecimento do assunto são excluídos, somos obrigados a utilizar muito mais palavras, e com maior exatidão. A escrita é a forma de fala mais elaborada. (1991). Novas formas de pensar a leitura e a escrita: a perspectiva do Letramento! Uma das grandes problemáticas atuais, porém resquício das décadas passadas, é a metodologia utilizada em sala de aula no processo de aquisição da leitura e escrita que infantiliza o jovem e o adulto ao não respeitar suas histórias de vida, bem como vivências que os distancia do universo infantil. Ainda hoje, encontramos, em muitas salas de aula, o famoso Método Abelinha, as Famílias Silábicas, a utilização de cartilhas – que retratam um universo infantil e descontextualizado com a realidade vivenciada. Acredita-se na proposta do letramento na Educação de Jovens e Adultos por considerar que o sujeito letrado modifica-se cognitiva, lingüística, social e culturalmente. 7 Ou seja, a utilização e o resultado da ação de ensinar e aprender das práticas sociais da leitura e da escrita que os transformam, mudando significativamente sua condição de vida. A palavra "letramento" é a "versão para o português da palavra da língua inglesa literacy. (...) Literacy é o estado ou condição que assume aquele que aprende a ler e escrever. Implícita nesse conceito está a idéia de que a escrita traz conseqüências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas, lingüísticas, quer para o grupo social em que seja introduzida, quer para o indivíduo que aprenda a usá-la. Em outras palavras: do ponto de vista individual, o aprender a ler e escrever – alfabetizar-se, deixar de ser analfabeto, tornar-se alfabetizado, adquirir a 'tecnologia' do ler e escrever e envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita – tem conseqüências sobre o indivíduo, e altera seu estado ou condição em aspectos sociais, psíquicos, culturais, políticos, cognitivos, lingüísticos e até mesmo econômicos; do ponto de vista social, a introdução da escrita em um grupo até então ágrafo tem sobre esse grupo efeitos de natureza social, cultural, política, econômica, lingüística. O 'estado' ou a 'condição' que o indivíduo ou grupo social passam a ter, sob o impacto dessas mudanças, é que é designado por literacy" (Soares, 1999, p. 17-18). Frente à perspectiva do Letramento e da Lingüística as atividades metodológicas propostas para jovens e adultos podem ser calcadas na exploração e problematização de filmes, letras de músicas - rap, funk, MPB etc. - textos de ficção, de informação, de propaganda, textos em versos, textos de linguagem iconográfica - charge, cartoon -, etc. Para o desenvolvimento das atividades com textos em sala de aula é importante que se verifiquem aspectos estruturais e internos com os quais foi construído esse universo lingüístico e literário, que tem como resultado final, dado através da relação existente entre a sintaxe e a semântica, a interação entre texto-contexto na formação crítica do sujeito diante de sua realidade. Um dos aspectos que devemos observar nos textos é o que diz respeito à linguagem conotativa (figurada) e à linguagem denotativa (real). Como conseqüência do emprego da conotação ou da denotação tem-se a distinção entre o texto literário (prosa e verso) e os demais textos. Assim, se nos apresenta uma das possíveis nuances dadas para o estudo textual em sala de aula: a exploração das funções da linguagem em diversos tipos de textos. A partir desse aspecto, por exemplo, pode-se focar as funções poética e expressiva, sobretudo para o texto literário (em versos ou em prosa); por outro lado, a exploração das funções referencial e metalingüística que são componentes de textos não-literários. Eis, então, a possibilidade de realizar uma análise da sociedade, possibilitando a visão-de- mundo e o posicionamento crítico do indivíduo. Mesmo textos ditos de cultura popular, como os raps, os funks, retratam a situação vivida pelos membros de determinada sociedade. A utilização desses textos oportuniza a análise de elementos externos como a estrutura de versos e estrofes, a presença de rimas, de ritmo (musicalidade) e sons, bem como questionamentos sócio-econômico-culturais desses sujeitos, além das relações de gênero estabelecidas na sociedade. É possível substituir a leitura de textos literários pelas releituras feitas dos mesmos pelo cinema e pela televisão? Eis uma questão que ultrapassa os limites do tempo e os limites escolares. 8 Infelizmente, constitui-se em uma prática educacional e familiar, substituir a leitura pelo assistir a filmes, seriados, novelas e documentários. É interessante destacar que a leitura da obra sempre se faz necessária para poder-se discutir, argumentar o que se encontra no texto e o que foi transposto para as telas – fidedignidade da obra versus a sociedade do espetáculo – imagem é tudo! É mais fácil ver, do que aprender a olhar, do que educar o olhar para problematizar, questionar o que está sendo visto e dito! Aprender a ler e escrever significa ir além do que está escrito e do que está sendo dito, significa apropriar-se e ressignificar o que está sendo lido, escrito e visto, ou seja, reconstituir-se a partir de novos processosde ensinar e aprender fundamentados nas distintas áreas do conhecimento, nos distintos saberes. (...) ter-se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e a escrever: aprender a ler e escrever significa adquirir uma tecnologia, a de codificar em língua escrita e de decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é tornar a escrita "própria", ou seja, é assumi-la como sua "propriedade" (Soares, 1999). Referências Bibliográficas: ARRIVÉ, M. O curso de lingüística geral: uma releitura. In: Linguagem e psicanálise; lingüística e inconsciente: Freud, Saussure, Pichon, Lacan – Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999. BAQUERO, Ricardo. Vygotsky e a aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artmed, 1998. DANIELS, H.(org.) 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