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ISC0291 - DESENVOLVIMENTO HUMANO NO CICLO VITAL O Enigma de Kaspar Hauser Discente: Brenda Pereira de Jesus O filme mostra um jovem que passou a vida dentro de um calabouço, nem conhecimento do mundo exterior, sem conhecimento da fala, de locomoção, de nenhum estimulo, seja mental, físico ou espiritual. Por viver assim ele se torna “apenas um corpo”, vivendo de forma “animal”, com necessidades básicas de comer, dormir e das necessidades fisiológicas. Ele não possui nenhuma interação com o ambiente fora do buraco onde vive, então todo seu mundo se consiste naquilo, um calabouço, interagindo apenas com um cavalo de brinquedo. Não tem conhecimento de sua condição humana, pois vive só, sem saber de nada, nem interações de outro tipo, a não ser o homem que aparece vestido preto, lhe diz algumas palavras e o manda riscar um caderno, sendo aquele aparentemente seu primeiro contato com a escrita e possivelmente com a fala. Ele desenvolveu apenas os estímulos humanos básicos e isso é notado no momento em que o tiram daquele lugar onde está confinando e “abrem o mundo” para ele, levando para fora. O homem o deita no chão e ele fica ali, até que o obriga a ficar de pé e o estimula a andar, coisa que nunca fez. Ele leva um tempo para corresponder a esse novo estimulo, mas acaba conseguindo ficar de pé. O ser humano, desde o momento de concepção corresponde a estímulos, ao meio que o cerca. Quando nasce, ele recebe informações desse ambiente, informações de fala, cultura, movimento, modos, escuta. Os estímulos da sociedade em que está inserido. O desenvolvimento mental, físico, social, emocional está na forma como foi tratado, dependendo de até que ponto esses estímulos o atingem e fazem parte de sua formação. Kaspar, por viver fora de qualquer meio, não recebe qualquer estimulo, até certo momento. Quando falam com ele e o fazem repetir as falas, ele passa a desenvolver a fala, além da escuta “mais apurada”, que vai além de sons e ruídos. Ele não possui qualquer instinto protetor, se deixa manejar sem protestos pelo “homem de preto”, não criou a consciência do medo, da segurança. Kaspar é deixado na cidade de Nuremberg e atrai a curiosidade e atenção de todos ali. Ninguém sabe quem é ou de onde veio, sua “história” se consiste em uma carta que o “homem de preto” deixou com ele. Todos se interessam e passam a estuda-lo e estimulá-lo a se expressar, sentar, andar, e conviver entre outras pessoas. Uma criança ensina a ele sobre as partes do corpo e seu nome e Kaspar descobre que possui orelhas, além do nome de seus membros que ele já podia ver. Ainda com a fala muito prejudicada, Kaspar começa a aprender novas palavras e a formar pequenas frases. Ainda assim, suas capacidades são poucas e fracas. A única coisa que aceita comer é pão e água, porque foram os únicos alimentos que conheceu antes. Nunca antes tendo visto uma colher, ao ser posto para se sentar à mesa, ele não sabe o que fazer, até que lhe mostrem para que aquilo serve. Kaspar é como um bebê, uma criança muito pequena, que está descobrindo o sentindo e função das coisas e de si mesmo. Como nossa fala é construída através da fala de outros, daquilo de ouvimos, a fala dele também começa a ser construída assim. Uma criança recebe estímulos para se locomover, escutar, aprender e o mesmo acontece com Kaspar, é como se seu desenvolvimento humano tivesse ficado estagno durante todo o tempo que viveu preso e isolado e só agora começou a ser criado. Ele não tem “noção do perigo”, de suas capacidades e nem das dos outros. Não há medo nele, porque ele nunca foi ensinado a temer, como uma criança que brinca com fogo sem saber que pode se queimar, até que alguém a tira dali e diga que não pode fazer, que aquilo machuca. Não houve ninguém que o ensinasse a se proteger ou fugir e por isso ele não desenvolveu qualquer instinto de proteção. As pessoas e autoridades da cidade fazem estudos com ele, testando seus instintos e reflexos, mas não obtém nenhuma resposta. A primeira reação dele é a dor. Ao colocar a mão no fogo e se queimar, ele rapidamente a retira e chora. Os instintos dele são básicos. Ele responde a fome, a sede e a dor. Ao entrar alguns homens levando uma galinha para o “quarto dele”, Kaspar apresenta a primeira demonstração de medo. Ele nunca viu uma galinha e ao vê-la andado pelo lugar ele foge. Kaspar começa a demonstrar pequenas emoções, como ao segurar o bebê no colo e tratar a mulher por não e dizer a ela que é desprezado por todos. O convívio com a sociedade, a interação com outros humanos, começa a desenvolver nele novas reações, sentimentos e saberes. Para ajudar no seu sustento as autoridades resolvem usar Kaspar como uma “atração” de circo, sendo exposto como um tipo de enigma, junto com outras 3 pessoas. No fim do espetáculo, Kaspar foge junto com esses outros três, mas fica apenas escondido dentro de um galpão e não reage quando o encontram, além de dizer uma frase. Kaspar é apresentado a música por um homem que o assistiu no espetáculo e que o achou no galpão e isso parece provocar uma forte reação nele. Kaspar nunca havia ouvido música e ao ouvi pela primeira vez diz que isso lhe dá uma forte sensação no peito. Aquele é um novo ambiente para ele, um novo estimulo que acorda uma outra parte do seu desenvolvimento que tinha permanecido tão trancada quanto seu corpo. Kaspar indaga porquê tudo tem que ser difícil para ele, o porquê de não poder tocar piano da mesma forma como respira. O homem que já está com ele há dois anos, explica que ele já aprendeu muita coisa e que vai continuar aprendendo. Apesar de ter desenvolvido melhor a fala e seu pensamento cognitivo, Kaspar ainda tem dificuldades de interagir com os outros homens, que para ele são lobos, e de entender as coisas. Para ele, o quarto na terra é maior do que a torre, porque no quarto, para qualquer lado que olhe, só há o quarto, e na terra se lhe virar as costas ela “deixa de existir”. A forma como Kaspar interagi com o ambiente ainda é muito “limitada”, mas também é única. Ao tentarem trazer o conhecimento da fé e criação a ele, Kaspar questiona e não aceita que deve acreditar em algo que não entende. Para ele a maça tem vida e vontade própria, o ambiente interagi e tem vida e ele é só mais uma parte do lugar. Kaspar questiona tudo, os costumes e ações, o porquê de cada coisa. Ele desenvolve um senso crítico, como uma criança que quer saber de tudo, e não aceita uma resposta como única. Por ter vivido tantos anos em cativeiro, mesmo agora fazendo parte de uma sociedade, Kaspar ainda se sentir a parte dela. Sua vinda foi sem sentido, um golpe duro, como ele diz. Ele desenvolveu novos hábitos, conhecimentos, mas nunca será igual aos outros. A forma como ele compreende o mundo e seu entorno é reflexo da falta de pratica social da qual ele foi excluído até a adolescência. Sua percepção é diferente, ele compreende as coisas não como os outros, mas com uma compreensão própria, criada por ele, como o enigma das duas aldeias em que ele mesmo encontra uma resposta para si, muito diferente daquela resposta “logica” que o professor lhe dá. Kaspar muitas vezes não sabia sequer diferenciar o sonho da realidade. Depois do segundo atentado a sua vida, Kaspar não resiste por muito tempo e morre, antes, porém ele conta uma das suas histórias sem final. Na autopsia, os legistas encontram uma pequena deformação no cérebro de Kaspar, então estaria ali uma prova palpável que explicava todos seus “problemas” e singularidades. Um erro que coloca o desenvolvimento do ser humano como biológico, quando na verdade, toda a história de Kaspar mostra que o desenvolvimento vital se dar através do convívio, é uma consequência do meio social em que se está – ou não – inserido. Kaspar, por ter vivido tantos anos em completo exilio, mesmo depois de ser colocado no meio da sociedade, nunca foi capaz de compreendê-la por completo. Os convívios, regras e ditames eram tão estranhos para ele, quanto ele era fora do normal. Alguém como Kaspar, que podia ver montanhas que abrigavam no seu topo a morte, e caravanas guiadas por cegos, que ouvia os gritos do silêncio nunca poderia ser considerado um igual, apenas “civilizado”. Aquilo que somos, que nos tornamos, é construído e formado pelo meio em que nos vemos incluídos. Os estímulos que recebemos desde o ventre e que continuam “chovendo” sobre nós conforme crescemos, que nos levam a aprender, andar, falar, seguir regras e pensamentos “lógicos” é o que nos define como humanos, é o que define nosso desenvolvimento. Kaspar morreu da mesma forma que viveu, um desconhecido no meio do desconhecido.
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