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ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS INTRODUÇÃO Na introdução do Capítulo 8 foram apre- sentados alguns aspectos da dinâmica da absorção de nutrientes pelas plantas, resumidos na equação 8.1. Naquele capítulo nos preocupamos com a caracterização de M (solução) e com os processos de transferência dos nutrientes no solo. Neste capítulo desenvolveremos um pouco mais sobre o fluxo de íons do solo para as raízes e faremos uma introdução aos mecanismos de absorção de nutrientes pelas raízes. O MOVIMENTO DE NUTRIENTES DO SOLO À SUPERFíCIE DAS RAíZES A fração sólida do solo, tanto mineral como orgânica, é o reservatório de nutrientes para a planta. Para que esta se desenvolva satisfatoria- mente, é necessário que a atividade de cada nu- triente seja adequada na solução do solo. Essa atividade depende, sobretudo, da absorção pelas raízes e de sua "liberação" pela fase sólida. A libe- 16 ração dos nutrientes da fração sólida do solo é capítulo importante do estudo da fertilidade dos solos. No Capítulo 8 descrevemos os fenômenos de adsorção e troca iônica e não nos aprofun- daremos aqui neste assunto. Vamos apenas cha- mar a atenção do leitor para o fato de que os nutrientes, em suas diferentes formas, são liga- dos à fase sólida com diferente energia. Assim, por exemplo, o N03- e Cl são, praticamente, livres de adsorção na maioria dos solos que têm excesso de cargas negativas; o K+, Ca2+,Mg2+,NH/ são adsorvidos eletricamente; Fe3+e Cu2+podem for- mar complexos e quelatos; o P pode formar com- plexos de alta insolubilidade com os óxidos de AI e Fe, etc. A taxa de liberação desses íons para a fase líquida depende de todas essas formas de adsorção. Uma vez na fase líquida, cada nutriente pode ser absorvido pelas raízes, dependendo essa absorção de uma série de problemas que serão discutidos mais adiante neste capítulo. Para ser absorvido pela planta, um nutriente deve encontrar-se na solução do solo, em conta- to com a superfície ativa do sistema radicular, em uma forma passível de absorção e utilização pela planta. Essa forma "disponível" dos diferentes 342 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA nutrientes tem sido objeto de atenção dos quími- cos de solo, sendo extensa a literatura sobre o assunto. De maneira geral, pode-se dizer que os principais fatores que controlam a passagem de M (sólido) para M (solução) (ver equação 8.1) são solubilidade e potencial de oxirredução. Sposito (1989) é um texto completo sobre esses aspectos físico-químicos do solo. Uma vez em solução, dois processos são responsáveis pela transferência de um nutriente no solo: difusão e transporte de massa. A difusão compreende o transporte devido a gradientes de potencial químico, medido pela atividade do íon em questão na solução do solo, e o transporte de massa se refere a todo transporte de íons arras- tados pelo fluxo de água no solo. Olsen & Kemper (1968) apresentam extensa discussão teórica sobre os diferentes fatores envolvidos nesses processos de transporte de íons. Difusão A equação fundamental da difusão de um soluto no solo em dada direção x é a equação de Fick, vista no Capítulo 8: (16.1) em que jd é a densidade de fluxo de um dado íon no solo por difusão e x é a coordenada de posição medida diretamente no solo. Como já mencio- nado, a umidade à base de volume e é incluída na equação porque ela mede a área útil ao fluxo, pois o movimento ocorre apenas dentro da solução. Em uma seção transversal de solo A, apenas e.A é disponível ao fluxo de solução. Os outros fatores mencionados na equação 16.1 foram abordados no Capítulo 8. Assim, por exemplo, se em um ponto P do solo a concentração C, de N03- é 6,2 mg . L-I e em outro ponto M, distante de LU = 10 em de P, a concentração CM de N03- é 2,9 mg . L-I, haverá um fluxo de N03- de P para M, que poderá ser calculado pela equação de Fick. Seja o coeficiente de difusão D do N03- no solo igual a 0,54 x 10-5 cm2• S-I.°gradiente de concentração dC/dx pode ser aproximado por diferenças finitas (CM - Cp)/ LU e, assim teremos: . -0,54 X 10-5 (2,9 X 10-3 - 6,2 x 10-3) Jd = = 10 1 78 10-7 -2-)=, x mg· em . s Neste exemplo, P poderia ser um ponto gené- rico do solo que dista 10 cm de uma raiz absor- vente, na qual se encontra M . jd seria o fluxo iônico, por difusão, do solo para a raiz. Fluxo de Massa °transporte de nutrientes por fluxo de massa, também chamado de fluxo por convecção, de- pende estritamente do fluxo de água, pois com- preende a quantidade de nutrientes arrastados pela água por unidade de seção transversal ao fluxo por unidade de tempo. A densidade de fluxo de água q é descrita, de maneira conveniente, pela equação de Darcy, estudada no Capítulo 7: q = -K(e) (~~) (16.2) em que q é a densidade de fluxo de água (L H20 . m-2• dia-I), K(e), a condutividade hidráulica do solo (mm . dia-I) e dH/dx, o gradiente de poten- cial hidráulico (m· m"), Conhecida a densidade de fluxo de água q, a densidade de fluxo de massa de nutrientes jm de um nutriente pode ser calculada pela expressão: (16.3) ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 343 em que C é a concentração do nutriente na água. Se, por exemplo, o fluxo de água em determina- do solo é de 0,2 L· m" dia-I, ou 0,2 mm . dia-I, e a concentração de N03- da água é de 6,2 g . L-I, te- remos: i,= 0,2 x 6,2 = 1,24 mg de N03- • cm-2 • dia-I Neste exemplo, se o fluxo de água no solo em direção às raízes, provocado pela demanda eva- porativa da atmosfera, fosse q, o fluxo de massa de nitrato seria jm. Importância Relativa da Extensão do Sistema Radicular com Respeito à Absorção de Nutrientes Os dois processos acima descritos, em sepa- rado, ocorrem simultaneamente no transporte de nutrientes do solo às plantas. A importância de cada um varia de situação para situação. Além des- ses processos, a nutrição vegetal ainda é afetada pela extensão do sistema radicular das plantas. A ques- tão pode ser posta da seguinte forma: ou o nutri- ente se move do solo para a raiz (difusão e transporte de massa) ou a raiz "se dirige" ou cres- ce para um ponto onde encontra o nutriente (interceptação radicular). Com isso não pr~ten- demos dizer que as raízes têm crescimento dirigi- do; elas crescem aleatoriamente e, ao crescerem, exploram novos volumes de solo onde os nu- trientes se encontram. A importância relativa da interceptação radi- cular, da difusão e do fluxo de massa na manu- tenção de uma concentração adequada de um nutriente próximo das superfícies de absorção das raízes é de determinação difícil. Mesmo para uma dada condição solo-planta, a importância rela- tiva de cada processo varia com a hora do dia e de ponto para ponto dentro do perfil do solo. Barber & Olsen (1968) fizeram os primeiros esforços para determinar a contribuição de cada um desses três processos, partindo de hipóteses bem simplificadas. Alguns de seus exemplos en- contram-se no Quadro 16.1. Quadro 16.1. Importância relativa da interceptação radicular, fluxo de massa e difusão na nutrição do milho em um solo "barrento e fértil" (Barber & Olsen, 1968). Quantidade fornecida por: Necessidade do Interceptação Nutriente milho em kg . ha' radicular Fluxo de massa Difusão N 190 2,2 188,0 O P 39 1,1 2,2 35,8 K 196 4,5 39,2 152,5 Ca 39 67,3 168,2 O S 22 1,1 21,3 O Mo 0,01 0,001 0,02 O 344 I SOLO, PLANTA EATMOSFERA INFLUÊNCIA DA CONDiÇÃO FíSICA DO SOLO SOBRE O TRANSPORTE DE NUTRIENTES a) Umidade do Solo A umidade do solo varia muito durante o ci- clo vegetativo, diminuindo de modo gradual em quantidade, enquanto a evapotranspiração pros- segue, aumentando abruptamente com a preci- pitação pluvial ou irrigação. A descrição do regime de água em uma cultura é um problema que requ~r o conhecimento de variações de umi- dade e potencial da água no espaço eno tempo, o que é feito pelo balanço hídrico (Capítulo 15). Da mesma forma, do ponto de vista nutricional, é importante o conhecimento da umidade do solo e do seu potencial matricial. De maneira geral, o maior uso de nutrientes pelas plantas ocorre quando a umidade do solo é mantida tão alta quanto possível, sem, porém, causar problemas de aeração e temperatura. A umidade do solo, quando adequada, per- mite uma transpiração potencial pelas plantas; os nutrientes são arrastados por fluxo de massa à superfície radicular e, em muitos casos, arrastados para dentro da raiz até a parte aérea, pelo xilema. Lopushinsky (1964) demonstrou, nessas condi- ções, apreciável aumento no teor de cálcio e fósforo em tomateiro. O fluxo de massa de nu- trientes, diretamente proporcional ao fluxo de água no solo, descrito pela equação de Darcy (equação 7.3, Capítulo 7), é extremamente afetado pelas condições de umidade do solo. A conduti- vidade hidráulica K(8), que mede a propriedade do solo de transmitir água, é função pronuncia- da da umidade do solo 8. Ela se reduz de forma drástica para diminuições relativamente peque- nas de 8; em geral a relação K(8) pode ser expres- sa por uma exponencial. É comum uma redução de K de 100 a 1000 vezes para um decréscimo de 5% na umidade do solo. Também, o gradiente de potencial d':P/dx é importante. Muitas vezes um gradiente considerável implica um fluxo razoável apesar de baixa condutividade do solo. As raízes, retirando água do solo, diminuem seu potencial ao seu redor, aumentando o gradiente e possi- bilitando um fluxo adequado de água e nutrientes, mesmo para valores pequenos de K. Nota-se, então, que o fluxo de massa de nu- trientes do solo para as plantas é afetado pela transpiração que, por sua vez, depende das con- dições atmosféricas e pela umidade do solo que afeta a condutividade hidráulica do solo e o gra- diente de potencial. Com essas variações no es- paço e no tempo, torna-se bastante difícil a descrição do fenômeno. Assim, os resultados da maioria das pesquisas sobre o assunto, como os de Barber & Olsen (1968), apresentados no Qua- dro 16.1, não podem ser generalizados. Com o mesmo solo e a mesma planta, em condições di- ferentes, podem ser obtidos resultados opostos.A umidade do solo também afeta a difusão de nu- trientes. O efeito principal é a redução da área disponível ao fluxo, quando 8 diminui. Além dis- so, o caminho efetivo de difusão aumenta com a diminuição de 8, notando-se, ainda, aumentos significativos de viscosidade e adsorção negativa y. Porte r et al. (1960), Partil et al. (1963) e Olsen et al. (1965) foram os principais autores a estudar o efeito de 8 sobre o coeficiente de difusão D de diferentes íons no solo. De maneira geral, seus dados mostram redução da ordem de 10vezes nos valores de D para redução de 10% de umidade. Em condições de campo, as variações de 8 no espaço e no tempo dificultam muito a descrição analítica do fenômeno. Da mesma forma como discutimos o caso de fluxo de massa, não podem ser feitas generalizações com facilidade, para o caso da difusão de nutrientes. Cada situação em par- ticular deve ser analisada com cuidado levando em conta a influência de todos os fatores em conjunto. A umidade do solo afeta, ainda, o desenvol- vimento radicular e com isso a "interceptação radicular" dos nutrientes. Altos teores de água afetam a aeração do solo, prejudicando o cres- cimento radicular e baixos teores de água difi- cultam o fluxo de água no solo, aumentando seu potencial matricial, a ponto de impedir a absor- ção de água, prejudicando, também, o crescimen- to radicular. De modo indireto, variações da umidade também implicam variações na consis- tência do solo (propriedades mecânicas) de gran- de importância na penetração radicular. b) Ar do Solo A importância da aeração do solo na nutrição de uma cultura típica de terras altas está, em ge- ral, relacionada com a atividade de microrganis- mos e com a respiração radicular. O suprimento de ar no solo é inversamente proporcional ao suprimento de água. Daí o dilema: altos teores de água são benéficos à nutrição, mas podem com- prometer a atividade de microrganismos essen- ciais e a respiração radicular. Trata-se, portanto, de determinar um ponto ótimo entre o supri- mento de água e ar às plantas na zona radicular. Na maior parte das vezes, as atenções estão mais voltadas ao suprimento de água, uma vez que os problemas de aeração são, em geral, temporári- os, passando despercebidos em muitos casos. A aeração do solo dá-se, sobretudo, por di- fusão. A equação de difusão de um gás em outro é idêntica à equação 9.2 (Capítulo 9), variando apenas a magnitude do coeficiente de difusão. Neste caso: D=(a-8)Do(~J (16.4) em que a é a porosidade total do solo (equação 3.12) e (a- 8) a porosidade livre de água ~ (equa- ção 3.30). ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 345 Em condições de solo não-saturado, a água ocupa os poros de menor diâmetro, deixando para a difusão do ar os poros maiores. A relação entre o coeficiente de difusão D de um gás no solo e seu coeficiente de difusão Do no ar não é grande e, para condições médias de culturas de campo, a relação é da ordem de 0,6 vezes (a - 8). Estudos dos efeitos da aeração do solo sobre a nutrição vegetal encontram-se em grande nú- mero de trabalhos. No campo, qualquer restrição na aeração é, em geral, temporária e de difícil diagnose, sendo sua relação com a nutrição bas- tante complexa. Condições anaeróbicas podem, por exemplo, promover a disponibilidade de Fe, Cu, Mo e Mn. Variações de potencial de oxir- redução e pH, resultantes de variações na aeração aumentam a complexidade do problema. c) Textura do Solo A análise textural caracteriza um solo do pon- to de vista da distribuição dos tamanhos das par- tículas sólidas que o constitui. Essa distribuição lhe confere porosidade e arranjo de partículas característicos que, por sua vez, determinarão suas propriedades hídricas, como a condutividade hi- dráulica e a relação entre a umidade 8 e o poten- cial matricial (a curva característica da água do solo). Essas propriedades hídricas afetam direta ou indiretamente os processos de absorção de nutrientes, isto é, a difusão, o fluxo de massa e a interceptação radicular. De maneira geral, porém, para um dado sistema solo-planta, as caracte- rísticas texturais são, praticamente, invariáveis com o tempo. Sua influência passa a ser mais in- direta, isto é, por variações do teor de água do sistema. d) Temperatura do Solo A disponibilidade e a absorção dos nutrien- tes são afetadas pela temperatura em todas as fa- 346 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA ses da equação 8.1.Aatividade microbiológica, solu- bilidade de compostos, coeficientes de difusão, ab- sorção radicular, permeabilidade das raízes, atividade metabólica etc. são todos afetados por va- riações de temperatura. Estudos que relacionam va- riações de temperatura com absorção radicular e acúmulo de nutrientes nas plantas são numerosos e diversificados, dificultando uma interpretação glo- bal. De maneira geral, as atividades biológicas no solo aumentam com o aumento de temperatura, até um máximo em torno de 30°C.Parece que a absor- ção de nutrientes tem diferente dependência da tem- peratura para os diversos nutrientes. Por exemplo, Walker (1969) demonstrou que o crescimento de sementes de milho apresenta um máximo para uma temperatura do solo de 26°C, decrescendo rapi- damente com o resfriamento ou o aquecimento do solo. A absorção de nutrientes, expressa como concentração na parte aérea, teve diferentes curvas de resposta. A absorção de nitrogênio aumentou de 12 a 18°C,decresceu de 18 a 26°C e aumentou no- vamente de 26 a 34°C. A concentração de fósforo quando a temperatura aumentou de 12 a 25°C e depois aumentou de 25 a 34°C.O potássio aumen- tou mais de 100% quando a temperatura do solo foielevada de 12 a 18°C,permanecendo constante para temperaturas maiores. Por outro lado, Knoll et al. (1964) encontraram aumento da absorção do fósforo com um aumento de temperatura de 15 a 25°C. Esses resultados demonstraram a com- plexidade da relação entre a absorção de nutrientes e a temperatura. Mesmo sob condições muito con- troladas, é difícil separar causas de efeitos em expe- rimentos dessa natureza, tornando-se praticamente impossível uma generalização a respeito do efeito da temperatura sobre a nutrição vegetal. e) Sistema Radicular O tipo de sistema radicular e sua distribui- ção ao longo do perfil também são fatores de suma importância na absorção de nutrientes, em especial no que se refere à interceptação radicu- lar. As gramíneas, hoje denominadas poáceas, por exemplo, têm um sistema radicular fasciculado, bem distribuído nas camadas superficiais do solo. Dicotiledôneas apresentam sistema radicular pivotante, com raiz principal que pode atingir grande profundidade. Em geral, sua distribuição segue um modelo exponencial que decresce com a profundidade. Além disso, há os casos par- ticulares, como o do café e o da laranja, que proli- feram raízes absorventes em torno da saia da copa. Certas plantas do cerrado contam com uma raiz pivotante que alcança alguns metros de profun- didade e lhe garantem a sobrevivência em perío- dos prolongados de seca. Aspectos da influência dos fatores físicos no desenvolvimento radicular em condições tropicais são discutidos, entre outros, por Reichardt (1976,1980). ALGUNS EXEMPLOS DE MOVIMENTO DE NUTRIENTES Consideremos, de início, o modelo de uma raiz de raio r = a, em um solo de umidade constante, no qual o coeficiente de difusão de um nutriente qualquer é D.A raiz absorve o nutriente, só por difusão, a uma taxa constante de tal forma que sua concentração na superfície da raiz é Ca• Se o transporte de nutrientes ocorrer apenas por difusão, qual deve ser a concentração da solução do solo C em um ponto qualquer entre A e B, sendo o ponto B localizado na distância média entre duas raízes ativas (ver Figura 16.1)? No Capítulo 14 já dissemos que para proble- mas desse tipo a geometria cilíndrica (ver Fi- gura 14.4) se adapta melhor. Da mesma forma, como lá foi feito para a equação diferencial do movimento da água, podemos escrever a equa- ção 14.8 da seguinte forma, utilizando apenas a coordenada r: -+,--- - . I. •I ~ I Figura 16.1. Corte transversal de duas raízes. a(eC) = ~ ~ (rD ac) at r ar ar (16.5) Como no segundo membro aparece a deriva- da em relação a r de um produto de funções de r, isto é, r e DaC/ar, pela regra da cadeia, temos: ou ainda: (16.6) em que D' = D/e. É oportuno, neste momento, mostrar ao leitor que a equação 16.6 (coordenadas cilíndricas) fica idêntica à equação 8.41a (coordenadas cartesianas ortogonais) para r tendendo para 00, pois nesse ca- so dois raios próximos se tornam paralelos e a coor- denada r se confunde com x. Se r ~ 00, (L'r) = O,e: ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 347 r = b r = a 1 ac --=0 r ar '\ / \ I .'\ I...>, \, ,I ~----I----q - 1\B I \ I \<, I \ ........, I ~... i \ I \ e Assim, verifica-se que quando r ~ 00, a geo- metria cilíndrica tende para a cartesiana. Nosso problema, entretanto, é um caso de ge- ometria tipicamente cilíndrica, em equilíbrio di- nâmico, portanto ac/at = Oe a equação 16.6 fica: d2C 1 dC -+--=0 dr' r dr (16.7) sujeita às condições de contorno: r = a, C=C. e r = b, C = C, Seja a solução da equação 16.7 do tipo: (16.8) e, dessa forma, ela tem de satisfazer 16.7, que con- tém uma derivada primeira e uma derivada se- gunda. Lembrando que a derivada de ln r é 1/r, a derivada da equação 16.8 é: 348 I SOLO, PLANTA EATMOSFERA e: e, substituindo esses valores na equação 16.7, ob- temos: o que confirma que a equação 16.8 é a solução geral da equação 16.7. A solução particular será obtida utilizando as condições de contorno: c, = k, ln a + k, C, = k, ln b + k, donde: k = C,-Cb 1 ln(+) e k C C,-Cb= - -In a 2 'ln(+) e a solução particular será: C C, - C, C, - C, = . ln r + C - . ln a ln(+) 'ln(+) que pode ser apresentada na forma: C-C (r)C = C, + ' b • ln - ln(+) a (16.9) De posse de dados de Ca, Cb, a e b, é fácil cal- cular C para qualquer r entre A e B, como pede o problema. Além de C, poderíamos, ainda, estar in- teressados no fluxo de entrada de nutrientes da raiz: Como aCrôr = kJ/r, para r = a teremos aC/ar = kj/a, assim: Muitas vezes é interessante saber a quantida- de que penetra na raiz por unidade de compri- mento e de tempo. A área de 1 cm de raiz de raio a é (2na) cm-. Então: ). - Q - Q - D k,d-------- - A· t 2na· t a donde: Q- = 2nklD (g . s -I por cm de raiz) t Vejamos agora como o exemplo anterior se aplica a uma cultura de milho, logicamente com uma série de aproximações. Seja uma cultura de milho que em três meses produz 8 toneladas de matéria seca por hectare. A matéria seca desse milho tem, em média, 1,5% de nitrogênio. O número de plantas é de 20 mil por hectare e cada uma possui 900 m de raízes ativas de diâmetro médio de 0,1 cm. Todo N que chega à superfície da raiz é absorvido, por isso, nas equações anteriores, C, = O, isto é, trata-se de um solo defi- ciente de N.Assumindo que o único processo que transporta nutrientes até a raiz seja a difusão, cal- cular a concentração média da solução do solo em g Nicm', a uma distância de 5 cm das raízes, para que a absorção das raízes se dê constante- mente, sem prejuízo ao crescimento vegetal. Com os dados apresentados, pode-se, facil- mente, determinar a absorção de N, pelo menos em termos médios: 1) Massa de nitrogênio na cultura = = 8000 x 0,015 = 120 kg N .ha" 2) kg de N/planta 120 20000 = 6 X 10-3 ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 349 3) kg de N/cm de raiz 6 x 10-3--- = 0,67 x 10-7 90000 4) kg de N/cm de raiz· s 0,67 X 10- 7 = 7,76 X 10-13 86400 o que significa que o fluxo de N em cada em de raiz deve ter sido, em média, igual a 7,76 x 10-13 g.s' para que a cultura se estabelecesse e produ- zisse o que produziu. Se assumirmos as mesmas condições do pro- blema anterior, a solução será dada pela equação 16.9 e o fluxo é dado por: e derivando 16.9 com relação a r, obtemos o gra- diente: dC C,-Cb-=0+--- dr 1 1 em que para 1 cm de raiz de raio a, cuja área é 2na, temos: a ln- b a r Assim, o fluxo em r = a é dado por: t a v ln (+) Utilizando os dados do problema e conside- rando D = 2 X 10-10 m2• s', temos: 7,76 X 10-13=_ 211:·2 X 10-1°(0- Cb) ( 0,1 )O,OOOI·ln5 C, = 2,42 X 10-7 kg N . m" o leitor deve ter percebido que os exemplos vistos são bastante simplificados e foram apresen- tados aqui apenas por motivos didáticos, para se obter familiaridade com os conceitos utilizados. São casos de equilíbrio dinâmico. Na maioria das vezes, isso não acontece e as equações a serem re- solvidas são muito mais difíceis, dependendo de cada problema. ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS RAíZES No Capítulo 4, dissemos que a entrada dos nutrientes na planta pode ser passiva (por difu- são através dos espaços intercelulares) e ativa (por processos metabólicos através das membranas celulares). Na Figura 4.1 vimos o corte de uma raiz. Quando essa raiz está mergulhada na solução do solo, os nutrientes podem se difundir nos es- paços intercelulares, que incluem as paredes ce- lulares. Esse espaço é denominado "espaço externo" (outer space ou free space) livre para os processos de difusão e troca iônica entre os íons e os radicais eletricamente carregados das paredes celulares. Ele é separado do "espaço interno" 350 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA (inner space ou non free space) pelas membranas celulares, que são barreiras de permeabilidade seletiva.O espaço interno é acessível apenas por transporte ativo dos nutrientes, transporte esse que exige energia metabólica. As primeiras obser- vações que levaram os pesquisadores a reconhe- cer esse transporte ativo foram: 1) a absorção de nutrientes depende da tem- peratura, aproximadamente duplicando para cada 10°C de aumento, da mesma forma como todo o processo metabólico; 2) é necessário oxigênio; 3) o processo é sensível a inibidores (p.e.,CN-); 4) depende da natureza e da concentração do nutriente (p.ex., K é absorvido mais rapidamente quando fornecido como KCI do que como K2S04); e 5) há interferência de um nutriente na absor- ção de outro. O processo de absorção é, muitas vezes, des- crito adequadamente pela equação de Michaelis- Menten, que se baseia na hipótese dos carrega- dores. Essa equação pode ser escrita na forma: o a) Figura 16.2. Gráficos mais comuns de j versus C. (16.10) em que: taxa de absorção de um nutriente em kg . m-2. S-I. Muitas vezes emprega-se a unidade moI· s' . S-I, isto é, quantidade absorvida em moles por grama de raiz (à qual corresponde uma superfície) e por unidade de tempo; Jmax = taxa máxima de absorção; K; = constante de Michaelis-Menten, que for- nece uma idéia da afinidade entre o nu- triente e o carregador; C concentração da solução da qual o nu- triente é absorvido. Graficamente, o fenômeno é apresentado pela Figura 16.2a. Vê-se por esta figura que j aumenta com C, mas não linearmente, havendo um jmax para altas concentrações, que não pode ser ultra- passado por restrições biológicas. O valor de Km, para dada planta, em relação à absorção de um dado nutriente, é igual ao valor da concentração l/j l/C b) para a qual j = 1/2 jmax.Para verificar isso basta substituir j por 1/2 jmaxna equação 16.10 e verifi- car que, nessas condições, K,= C. Suas unidades, também, idênticas às unidades de C. A partir da equação 16.10, vê-se que a descri- ção de absorção de dado nutriente por dada planta,depende dos parâmetros jmaxe Km.Estes podem ser obtidos em experimentos em que a absorção j é estudada em função da concentra- ção C, que, tradicionalmente, tem sido feito com plantas ou raízes colocadas em soluções nutriti- vas de concentração variável. Obtém-se assim, ex- perimentalmente, uma curva do tipo da Figura 16.2a. Como ela é assintótica para valores de j pró- ximos à jmax'este último "torna-se difícil de ser de- terminado com precisão. Contorna-se o problema plotando 1/j versus 1/C, como indica a Figura 16.2b. Neste gráfico, a partir da equação 16.10, é fácil verificar que: Jmax 1 1 -+- C jmax é a equação de linha reta quando 1/j é tomado como variável dependente e 1/C como variável independente. Baseados num gráfico como o indicado na Figura 16.2b é muito fácil deter- minarmos jmaxe Km. Durante a absorção de vários nutrientes apa- recem, ainda, fenômenos de competição, um ele- mento interferindo ou inibindo a absorção de outro. Por outro lado, para altas concentrações, tudo indica que outros mecanismos de absorção passam a funcionar, pois j pode ser maior que jmax' havendo a superposição de outra curva seme- lhante à da Figura 16.2a, com um segundo jmax' para altas concentrações. O assunto é complica- do e foge um pouco aos objetivos deste livro. Epstein (1972) é um ótimo texto que apresenta detalhes sobre o assunto. Para o caso do potássio, Yamada et ai. (1982) apresentam aspectos sobre a disponibilidade de ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 351 K nos solos do Brasil, funções de K na planta, me- canismos de absorção e a nutrição potássica das principais culturas agrícolas do Brasil. É um exemplo de um trabalho que aplica os conceitos vistos neste capítulo. BALANÇO DE NUTRIENTES Da mesma forma como fizemos para a água no Capítulo 15, pode-se fazer um balanço de um dado nutriente em uma cultura, que é a conta- bilidade de todas as adições e subtrações do refe- rido nutriente em uma camada de solo. Balanços são feitos para qualquer nutriente, mas dada a importância do nitrogênio, a maioria dos tra- balhos encontrados na literatura refere-se a esse nutriente. Neste item, vamos apenas introduzir o assunto e falaremos, em especial, do nitrogênio. Dada uma camada de solo de espessura L (em), as seguintes componentes do balanço de nitrogênio são importantes: 1) Adição por fertilizante mineral (FM). Nesse caso, as formas mais comuns de fer- tilizante nitrogenado são: uréia, sulfato de amônio, nitrato de amônio, nitrato de sódio etc 2) Adição por fertilizante orgânico (FO). Es- tercos, adubações verdes, resíduos de culturas anteriores e outros compostos orgânicos são os mais comuns; 3) Adição por fixação biológica de nitro- gênio atmosférico (FB). As leguminosas - feijão comum, soja, mucuna etc. - pos- suem a capacidade de, em simbiose com microrganismos (como Rhizobium spp) , fixar o nitrogênio atmosférico N2 e, final- mente, transformá-lo em proteína. Outras plantas, como as gramíneas (poáceas), também podem fixar o N2 atmosférico por 352 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA uma associação não-simbiótica com mi- crorganismos encontrados no solo; 4) Adição pela chuva (AC). Pequenas (mas não desprezíveis) quantidades de nitro- gênio (em geral na forma de amônia) po- dem ser adicionadas às culturas pelas chuvas. Trata-se de nitrogênio trans- formado em amônia durante descargas elétricas na atmosfera. Hoje, dependendo da região, a poluição atmosférica pode, também, contribuir com compostos nitro- genados; 5) Adição pela água de irrigação (AI). Aqui incluímos apenas o N porventura pre- sente na água de irrigação. O caso da fertirrigação pode ser incluído aqui ou no item I, FM; vácuo -=.=::= A 6) Extração ou Exportação pelas culturas (EC). Cada cultura, no final de seu ciclo, possui quantidades razoáveis de nitro- gênio. Como os produtos são tirados da área (grãos, frutos, tubérculos, massa ver- de etc.) representam perda de N para o solo. Daí a necessidade da reposição do N por meio de fertilizantes, a fim de manter a produtividade do solo. Mesmo os resíduos vegetais, muitas vezes, são queimados na área e, nessas condições, representam perda de nitrogênio. Apenas quando incorporados ao solo é que não são totalmente perdidos; 7) Perdas por volatilização (PV). Trata-se da perda de nitrogênio pela passagem do estado sólido para o gasoso. Comumente tubo plástico flexível 1~","=""",o:::;mr.::õ~"'iU"="" superfície do solo solo z=L Figura 16.3. Esquema de extrato r de solução do solo. ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 353 Foto 16.1. Tensiômetros instalados em cultura de cana, para a estimativa da drenagem profunda. Ao centro, um extrato r de solução do solo utilizado para medida da lixiviação do nitrogênio. se dá com fertilizantes; assim a uréia e o sulfato de amônio podem volatilizar-se e uma boa proporção pode ser perdida. ° pH do solo, a temperatura e a forma de aplicação do fertilizante são os principais fatores que afetam a volatilização; 8) Perdas por desnitrificação (PD). Em con- dições especiais, sobretudo de falta de oxi- gênio, microrganismos podem suprir suas necessidades de oxigênio usando o íon nitrato (N03-). °resultado final dessa uti- lização é o N2, passando por N02-, NO e Np; 9) Perdas por lixiviação (PL). Nitrogênio pode, também, ser perdido pela parte in- ferior do elemento de volume, na pro- 354 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA fundidade L, sendo arrastado pela água na forma de N0 3 -, NH 4 - ou compostos orgâ- nicos humificados. Trata-se do arraste pela drenagem profunda. Uma forma de esti- mar a lixiviação é pela amostragem da solução do solo por meio de extratores de solução que se constituem de cápsulas po- rosas submetidas a vácuo (Figura 16.3). Quando instalados em solo não saturado, di- gamos ~ m de -100 a -200 cm H20, em uma pro- fundidade z = L,eles não se enchem de água, pois estão à pressão atmosférica, isto é, ~ = O.Ao apli- car um vácuo (por bomba elétrica ou manual), todo interior fica sob vácuo (pontos A, B, C, di- gamos -1 atm ou -1000 cm H20) e devido à di- ferença de potencial ~ ~ entre o interior da cápsula e o solo, a solução do solo se dirige para a cápsula. O fluxo de solução depende de ~~ e da umidade do solo, que, por sua vez, determina a condutividade hidráulica do solo. O nível da solu- ção na cápsula eleva-se acima do ponto B e deixa a ponta do tubo plástico flexível imerso na solu- ção. Depois de 1 a 2 horas de vácuo (dependendo da umidade do solo), o vácuo é desconectado e a pressão atmosférica fica aplicada em A. Como C ainda está sob vácuo, a solução sobe e vai se alo- jar no tubo de ensaio. É uma solução límpida, pronta para análise de concentrações iônicas Cio Como vimos no Capítulo 8, o produto do fluxo de água q, pela concentração C; nos dá o fluxo de soluto j. Se esses instrumentos forem emprega- dos em conjunto com tensiômetros, como mos- trado no Capítulo 15 para a determinação da drenagem profunda, pode-se estimar as quanti- dades de soluto lixiviado. Da soma algébrica dos nove itens anteriores, resulta o armazenamento (ou sua variação) de nitrogênio (MN) na camada considerada O - L (ver equação 3.22, Capítulo 3). Mesmo não ha- vendo adições ou perdas, o nitrogênio nessa ca- mada é extremamente dinâmico. Pelo processo de mineralização, ele passa de orgânico para mi- neral; por processos de absorção por microrga- nismos ele pode passar de mineral para a fase orgânica. N03- pode ser adsorvido por cargas positivas no solo e NH4+ por cargas negativas. Assim, a quantidade de N disponível para as plan- tas na solução do solo é bastante variável. Os pro- cessos que determinam essa disponibilidade são complexos e interdependentes. O balanço de nitrogênio (Figura 16.4) pode, então, ser escrito na forma: FM + FO + FB + AC + AI - EC - - PV - PD - PL ± MN = O (16.11) em que se vê que o número de componentes é bem maior do que no caso do balanço hídrico. A literatura sobre balanço de nitrogênio ou sobre os diversos componentes do balanço é vas- ta e não cabe aqui uma revisão. A título de exem- plo, indicamos alguns trabalhos realizados em nosso meio. Reichardt et al. (1977) discutem o problema da extração e da análise de nitratos na solução do solo; Libardi & Reichardt (1978) es- tudaram o destino da uréia aplicada a uma cul- tura de feijão, utilizando lSN como traçador; Reichardt et al. (1979b) apresentaram a dinâmi- ca do nitrogênio em uma cultura de milho; Cervellini et al. (1980) e Meirelles et al. (1980) estudaram o destino de "N aplicado na forma de sulfato de amônio a uma cultura de feijão e Reichardt et al. (1982) fizeram uma revisão sobre o balanço de nitrogênio em culturas tropicais. Reichardt (1990) discutiu o problema da varia- bilidade espacial do solo na estimativa da fixação biológica de nitrogênio atmosférico (FB). ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 355 EC . --- --- -----o Pl 1 ._._._._._._._._._._._._._._._.{_._._._._._._._._._._._._._._._._._.-.-._._._._._._._._._._.-.-.-.-._._.. z = L Figura 16.4. Esquema do balanço de nitrogênio: FM, fertilizante mineral; FO, fertilizante orgânico; FB, fixação biológica de nitrogênio atmosférico; AC, adição pela chuva e descargas elétricas; AI, adição pela água de irrigação (fertirrigação); EC, extração ou exportação pela cultura; PV,perdas por volatilização; PD, perdas por desnitrificação; PL,perdas por lixiviação. USO DE ISÓTOPOS EM EXPERIMENTOS DE NUTRiÇÃO DE PLANTAS nêutrons, que os faz diferentes em termos de massa. Sua maioria é natural, estando presentes na natureza desde a formação do planeta Terra; alguns são artificiais, produzidos em laboratório por reações nucleares. Quando estáveis diferem apenas no peso atômico e, quando radioativos, emitem radiações. O importante é que ambos diferem de uma forma mensurável e podem ser detectados. Os isótopos estáveis são detectados por espectrômetros de massa, instrumentos capazes de distinguir pesos atômicos. Os isótopos radioativos são detectados por detectores de radiação, que in- cluem uma série de instrumentos, dependendo do tipo de radiação emitida pelo radioisótopo. Os isótopos, tanto estáveis como radioativos, têm sido usados com sucesso como traçadores ou marcadores de seus respectivos elementos. Cada elemento da tabela periódica tem isótopos - áto- mos da mesma espécie -, se comportando quími- ca e biologicamente da mesma forma, diferindo apenas em algumas propriedades físicas. Eles têm no núcleo o mesmo número de prótons (que de- fine o elemento), mas um número diferente de 356 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA Os rad~oisótopos são isótopos instáveis que procuram sua estabilidade emitindo radiações. Estas podem ser detectadas facilmente e em quan- tidades mínimas, isto é, em concentrações tão baixas como 10-11(1 para 100 bilhões). Cada radioisótopo tem suas próprias características e emite um ou mais tipos de radiação (em especial radiações (X, ~-, ~+, 'Y e nêutrons), com uma ou mais energias e a uma taxa que depende de sua meia vida. Como essa taxa decresce exponen- cialmente com o tempo, definiu-se a meia vida T1/2como o tempo necessário para que qualquer taxa de emissão se reduza à sua própria metade. Dependendo dessas propriedades, cada radioisó- topo se apresenta adequado (ou não) para os di- ferentes usos como traçador. O tipo e a energia da radiação afetam sua detecção. Uma meia vida curta pode limitar seu uso em experimentos de maior duração. Os radioisótopos são encontrados na natu- reza, como é o caso do 3H (tritium), 14C,4°K, 226Ra, 235Ue outros; alguns são produzidos continua- mente por reações nucleares que ocorrem na atmos- fera por indução da radiação solar ou cósmica, de tal forma que sua taxa de produção está em equilíbrio com a taxa de desintegração radioativa, apresentando, por isso, um teor global constante, como é o caso do 14C;outros têm meias vidas mais longas que a idade de nosso planeta, estand~ até hoje presentes no ambiente e constituindo-se de séries radioativas que se iniciam com urânio, tório e actínio passando, por exemplo, pelo 226Ra,e ter- minando em algum isótopo do chumbo. A gran- de maioria dos radioisótopos utilizados como traçadores é, porém, produzida artificialmente em reatores nucleares. O Quadro 16.2 apresenta os principais radioisótopos usados como traçadores no SSPA. Para usá-Ias como traçadores, eles são adicio- nados ao respectivo isótopo estável, em quanti- dades que permitam sua detecção até o fim do experimento. Quando possível devem ser adicio- Quadro 16.2. Alguns radioisótopos usados como traçadores no 55PA. Isótopo mais Radioisótopo Energia da radiação (MeV) abundante traçado r Beta Gama Meia vida Cálcio - 40 45Ca 0,254 153 dias Carbono -12 14C 0,156 5.720 anos Césio -133 1l7Cs 0,52; 1,18 0,662 30 anos Cobalto - 59 6OCO 0,31 1,17; 1,33 5,27 anos Estrôncio - 88 8'5r 1,47 50,4 dias Enxofre - 32 355 0,168 86,7 dias Hidrogênio - 1 3H 0,0181 12,26 anos lodo -127 13'1 0,61; 0,25; 0,85 0,36; 0,08; 0,72 8,05 anos Magnésio - 24 28Mg 0,45 0,032; 1,35; 0,95 21,3 horas Manganês - 55 52Mn 0,60 0,94; 1,46 5,7 dias Fósforo - 31 32p 1,71 14,3 dias Potássio - 39 4°K 1,32 1,46 1,3 x 10' anos Rubídio - 85 86Rb 0,7; 1,77 1,08 18,7 dias Zinco - 64 65Zn 0,33 1,11 245 dias nados na mesma forma química em que se apre- senta o composto estável, sendo dessa forma ver- dadeiros traçadores. Se um estudo de fósforo envolve o superfosfato, o isótopo radioativo 32p também deve estar presente na forma de super- fosfato. Isso às vezes é mais difícil, como no caso de estudos com herbicidas, nos quais o 14Cdeve ser incorporado na molécula complexa do res- pectivo agrotóxico. A intensidade de materiais radioativos émedi- da em termos de atividade radioativa (Bequerel,1 Bq = 1 desintegração/s; Curie, 1 Ci = 3,7 x 1010 desintegrações/s). Como a cada radiação detec- tada corresponde uma contagem no instrumento de medida, a atividade também émedida em con- tagens por segundo (cps) ou contagens por mi- nuto (cpm). Além disso, como a atividade medida depende do tamanho da amostra (grandeza ex- tensiva), as atividades também são expressas em termos de atividade específica ae, que é a atividade por unidade de massa ou volume, isto é, cps . g', cpm· ug'. O uso de isótopos em experimentos abrange enorme gama de formas, desde a simples presença do traçador em determinado ponto do sistema até seu acompanhamento em estudos dinâmicos. A base da maioria das aplicações está no princí- pio da diluição isotópica, segundo o qual "dada uma quantidade constante de radioatividade, a atividade específica é inversamente proporcional ao total do elemento ou substância presente no sistema". Isso significa que para uma quantidade fixa de 4°CaC12, quanto mais for adicionado de CaC12 estável, menor será a atividade específica da mistura (quando homogênea). Esse princípio permite, por exemplo, estimar a quantidade de um nutriente em uma planta, que veio do fertili- zante aplicado ao solo. Se, em um estudo de adu- bação fosfatada for utilizado superfosfato marcado com 32p, pode-se fazer para o P que se encontra na planta, uma distinção entre aquele ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS 357 que vem do adubo e aquele que vem do solo. Nesse caso define-se o fósforo derivado do fertilizante (Pddf) que pode ser calculado pela expressão: ( a do 32p na Planta) % Pddf = e 32 t X 100 (16.12) a, do P no ert. Se um solo é fertilizado com um adubo que contém uma atividade específica a, = 102.441 cps/ umol P e uma planta é nele cultivada, ela possui duas fontes de P, o adubo marcado e o P nativo do solo que não é radioativo. É fácil de entender que se a planta só absorver P do fertilizante, no final sua atividade específica seria igual à do fer- tilizante. Ao contrário, se ela absorver só P do solo, sua atividade específica seria a, = O. Como ela absorve de ambos, e de acordo com a disponi- bilidade de cada um, seu valor de a, será interme- diário. Colhendo a planta e medindo seu a., por exemplo, 35.758 cps/urnol P, teríamos: % Pddf = (35.758/102.441) x 100 = 35%, o que significa que de todo P encontrado na planta, 35% vêm do fer- tilizante e 65%, do solo. Se a extração total da cul- tura foi de 15kg. ha' de P,0,35 x 15= 5,25kg ha' de P vem do adubo e 9,75 vem do solo. A eficiên- cia da adubação foi de (5,25/60) x 100 = 8,75%, se a adubação foi de 60 kg . ha' de P. Vê-se, portanto, que, com o uso de marca- dores, pode-se estudar eficiência de adubações, otimização da aplicação do fertilizante, taxas, épo- cas, respostas de culturas etc. Os isótopos estáveis também podem ser em- pregados com os mesmos propósitos. Nem sem- pre um certo elemento tem um radioisótopo adequado e aí se faz uso do isótopo estável, com a vantagem de não ser radioativo. O Quadro 16.3 apresenta os mais utilizados. A base do uso dos isótopos estáveis está no conceito de abundância. Abundância é a propor- ção em que os isótopos de um dado elemento - - -------~ 358 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA Quadro 16.3. Principais isótopos usados como traçadores no 55PA. Elemento Isótopo Abundância Carbono 12C 99,985 13C 0,015 Hidrogênio 'H 98,89 2H 1,11 Nitrogênio 14N 99,635 15N 0,365 Oxigênio 160 99,759 170 0,037 180 0,204 Enxofre 325 95,0 335 0,76 345 4,22 365 0,014 aparecem na natureza. O elemento nitrogênio, por exemplo, só possui dois isótopos naturais e está- veis, o 14Ne o ISN.A abundância do ISNem uma amostra é: 15 ( nº de átomos 15N ) at % N = o d ' 15 14 X 100 (16.13) n e atomos N + N Como o N é um elemento bastante dinâmico no SSPA,as abundâncias de 14Ne ISNsão pratica- mente constantes em qualquer amostra biológi- ca. Seus valores são 99,635% para o 14N (mais abundante) e 0,365% para o ISN. Por isso, as quantidades de ISN em amostras enriquecidas podem ser expressas em termos de % átomos em excesso sobre a abundância natural de 0,365%. Processos dinâmicos nos quais o fluxo de compostos nitrogenados é afetado pelo peso atô- mico, discriminam o 14Ndo ISN.Esse fenômeno é usado no laboratório para enriquecer amostras em ISN.Utilizando baterias de longas colunas de troca iônica, sulfato de amônia pode ser enrique- cido em ISN.Dessa forma, podemos ter esse com- posto, um fertilizante nitrogenado, enriquecido a altos níveis de ISN.Seja, por exemplo, uma amos- tra de sulfato de amônio com uma abundância de 10,365% de ISN.Sua abundância em 14Né 89,635% e ela tem 10,000% átomos em excesso de ISN. Esse fertilizante pode ser utilizado como um traçador em estudos agronômicos. Se um solo é fertilizado com esse material, a cultura nele es- tabelecida tem à sua disposição duas fontes de nitrogênio: o N nativo do solo com abundância 0,365% e o fertilizante com abundância 10,365%. Como a cultura faz uso das duas fontes, na pro- porção de sua disponibilidade, também podemos calcular o nitrogênio derivado do fertilizante (Nddf), dado pela expressão: %Nddf = = (átomos % I5N em excessonaPlanta)xioo (16.14) átomos % 15Nem excessono fert. Se, por exemplo, a planta apresentar uma abundância de 7,855%, ela terá um valor de áto- mos ISNem excesso de 7,855 - 0,365 = 7,490% e Nddf% = (7,490/10,000) x 100 = 65%. Sua inter- pretação é a mesma do Pddf. As leguminosas têm uma terceira fonte de nitrogênio, o N2 atmosférico, absorvido em simbiose com bactérias Rhizobium spp que for- mam nódulos em suas raízes. Quando se quiser fazer uma distinção dessa fixação biológica de nitrogênio (FBN) é preciso cultivar uma planta não fixadora de N2 ao lado da leguminosa, no mesmo solo adubado com ISN.Apesar de não ser uma leguminosa, ela deve ter porte e desenvolvi- mento semelhantes, para que a comparação seja razoável. Em muitos casos se utiliza uma poácea (gramínea), como o trigo, a cevada, a aveia, mas com a descoberta da fixação não simbiótica de nitrogênio atmosférico pelas poáceas, sobretudo a cana-de-açúcar, a escolha da planta não fixadora dever ser bem pensada. Imaginemos que no exem- plo anterior, a planta tenha sido a cevada e que plantas de soja cultivadas na mesma situação ti- vessem uma abundância de 5,136%. A abun- dância da soja é menor pelo fato de ela ter três fontes de N e, por isso, absorver menos fertilizante marcado. Nesse caso, calcula-se o nitrogênio de- rivado da atmosfera (Ndda) pela expressão: % Ndda = [( 1- átomos 0:0 15Nem excesso na_Ieguminosa )] X 100 átomos % 5Nem excesso na nao fixadora (16.15) e, no exemplo, teríamos Ndda% = [1 - (4,771/ 7,490)] x 100 = 36,6%. Assim, do N contido na ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS I 359 soja, 36,3% vieram da atmosfera, e os restantes 63,7% vieram tanto do solo como do fertilizante, em uma proporção que não pode ser calculada e, por certo, diferente daquela da cevada. O conceito de Nddf pode ser aplicado para qualquer compartimento do N na cultura, desde que cada um seja amostrado em separado. Em um estudo com cana-de-açúcar marcada com IS!'J, iniciado em 1997 e no qual o traçado r pôde ser acompanhado por cinco anos, Basanta et aI. (2003) calcularam, separadamente, o Nddf para folhas, palha, colmos, solo e solução do solo, se- guindo o "pulso" de fertilizante aplicado à cana- planta, até a terceira soca, conseguindo fazer um balanço do nitrogênio. A palha marcada da cana- planta também foi usada como cobertura e pode- se acompanhar sua mineralização ao longo dos anos. O conceito do Valor A do solo, que se refere à disponibilidade de nutrientes, sobretudo em re- lação ao nitrogênio e ao fósforo, também está li- gado ao uso de isótopos. Manuais muito bons para essas aplicações de energia nuclear na agri- cultura são os de Vose (1980), L'Annunziata(1998), Hardarson (1990) e IAEA (2001). Outra forma de usar isótopos estáveis como traçadores é por meio de pequenas (mas signifi- cativas) variações naturais de abundância. Como já dissemos, processos dinâmicos que ocorrem no SSPAlevam à discriminação de isótopos. No pri- meiro exercício do Capítulo 2 vimos os dezoito tipos de moléculas de água, que diferem apenas em peso. Quando a água de um tanque Classe A evapora, esse processo de mudança de fase discri- mina os dezoito tipos, sendo que os mais leves evaporam com mais facilidade. Assim, depois de algum tempo, a água que permanece no tanque fica um pouco enriquecida em 180e 2H. Em ou- tros processos dinâmicos há discriminação do ISN em relação ao 14N,do 13Cem relação ao 12C,e as- sim por diante. Como essas variações de abun- 360 I SOLO, PLANTA E ATMOSFERA dância são muito pequenas, uma medida mais sensível é utilizada, que é a razão isotópica dada em valores Õ. Para a relação l3C/12C,por exemplo, o valor de Õ é calculado por: [( I3C/2C na amostra) 1 Õ'3C%O= 13C 12 d _ -1 X 1000 (16.16) / C no pa rao sendo que os padrões são amostras reprodutíveis e escolhidas internacionalmente. As razões isotópicas mais utilizadas são 2H/1H; l3C/12C;lsN/ 14Ne 180p60 (Quadro 16.3). As plantas discri- minam os isótopos do>C no processo fotos- sintético. As plantas C3 (ver Capítulo 4) tem valores de Õ l3C0/00 na faixa de -11 a -14, ao pas- so que as plantas C4, de -25 a -30 C 0/00. Esse fato torna possível o estudo de aspectos interes- santes no ciclo do carbono em diferentes ecossistemas, como é feito na comparação do ar- mazenamento de carbono (ou estoque de carbo- no) no solo em florestas naturais tropicais (constituídas sobretudo por espécies C4) e em pastagens introduzi das (principalmente com plantas C3). Até diferenças no pastoreio de gado (entre gramíneas e leguminosas) podem ser es- tudadas pelos valores de Õ l3C encontrados em suas fezes. EXERCíCIOS o uso da relação Õ DCtambém é bastante útil em estudos do balanço global do carbono na at- mosfera. O aumento da concentração de CO2 no ar atmosférico é uma preocupação em relação às mudanças globais que ocorrem no planeta Terra, incluindo o efeito estufa. No balanço do carbo- no, são importantes as emissões de CO2pela quei- ma de combustíveis fósseis e, do ponto de vista agrícola, a mudança de áreas com florestas para pastagens e culturas agrícolas, que também pro- voca emissões pela queima do estoque de carbo- no contido nas florestas de forma estável. A retirada de carbono da atmosfera, chamada nes- ses estudos de seqüestro de carbono, é feita pela fotossíntese, sobretudo por algas marinhas, flo- restas, pastagens e culturas agrícolas. O balanço entre emissão e seqüestro define os níveis de CO2 na atmosfera. Cerri et alo (1991) é um exemplo de estudo dessa natureza e Rosenzweig & Hillel (1998) abordam o assunto de maneira global. Estudos hidrológicos fazem uso do Õ 180 de formas bem variadas. O valor de Õ 180 é diferente para a água do mar (tomada como padrão) e a água doce, a tal ponto que diferentes corpos de água podem apresentar diferenças consistentes. Utilizan- do essa ferramenta, Matsui et alo (1976) mediram a proporção em que os rios Solimões eNegro con- tribuem na formação do rio Amazonas. 16.1. Se você tivesse de organizar um exemplo como o da página 364 com cultura de feijão, que dados você utilizaria para produção de matéria seca por hectare, % nitrogênio, nº de plantas por hectare, comprimento do sistema radicular e diâmetro médio das raízes? Qual seria o fluxo de nitrogênio por cm de raiz por segundo? 16.2. Em um experimento de absorção radicular foram obtidos os seguintes resultados: ABSORÇÃO DE NUTRIENTES PELAS PLANTAS I 361 j (moi. s': s' X 10'5) C (moi· L-I x 10') 4,6 7,8 11,1 14,6 17,5 19,1 19,6 19,8 0,5 1,0 2,0 4,0 7,0 10,0 15,0 20,0 Faça os gráficos i versus C e 1li versus 1/C e estime os valores de Km e imax' RESPOSTAS 16.1. 5000 kg; 3 %; 125000; 500 m; 0,05 cm; fluxo de N = 4,63 x 10-12 para um ciclo de 60 dias; 16.2. imax = 2,2 x 1014 mal· s' . s' e Km = 1,89 x 10-3 mal· L-1.
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